Excesso ou justiça? As denúncias e polêmicas sobre as prisões dos envolvidos nos ataques8janeiro:
Réuma ação no Supremo Tribunal Federal (STF), Alessandra foi solta no iníciojulho para responder ao processoliberdade provisória, mediante algumas condições — como o usotornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar à noite e nos finssemana e comparecimento todas as segundas-feiras ao fórum.
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A empreendedora, donauma pizzariaCuiabá (MT) eum trailerlanchesVitória da Conquista (BA), ficou seis meses presa, enquanto seu marido — também detido nos atos — segue na cadeia. O casal tem três filhos, dois deles menoresidade.
A filmagem do reencontro da mãe com os filhos pequenos após o tempo dela na prisão foi apresentada nas redes bolsonaristas como uma cena emocionante e um exemplo das injustiças que estariam ocorrendo contra aqueles que foram presos e que são acusados na Justiça pelo 8janeiro.
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O STF, a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) afirmaram à BBC News Brasil que as prisões e os processos judiciais estão correndo dentro da normalidade (confira os posicionamentos ao longo do texto).
Em nota, o STF garantiu que os processos têm corrido com "garantia do contraditório e ampla defesa". "O Supremo Tribunal Federal vem garantindo o devido processo legal a todos os investigados pela Polícia Federal e denunciados pela Procuradoria Geral da República pelos gravíssimos crimes contra a Democracia ocorridos8/1."
Até a publicação desta matéria, a reportagem ainda aguardava um posicionamento do Ministério da Justiça sobre como o governo vem acompanhando os casos8janeiro e como avalia as denúnciassupostas violações.
Na postagem mais recente sobre o acontecimentosuas redes sociais,9julho, o ministro da Justiça, Flávio Dino, afirmou: "O dia 8janeiro ainda terá toda aterrível história contada. Os covardes que estão nas sombras serão revelados e julgados."
Ao defender a Constituição — cuja réplica sumiu nos atosjaneiro —, Dino acrescentou que a Carta Magna "venceu os vândalos, golpistas e terroristas".
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Já para a AssociaçãoFamiliares e Vítimas08janeiro (Asfav), criada no finalabril para auxiliar os acusados pelos atos e seus parentes, há uma série"violações" aos direitosréus e presos.
Em 12julho, a associação divulgou um relatório assinado por três advogados apontando, entre outros pontos, que os réus são alvoacusações muito semelhantes, sem evidências do que cada um teria feito individualmente.
O documento também diz que a longa duraçãoalgumas prisões preventivas, especialmenteidosos e mãesfilhos pequenos, seria injustificada e excessiva.
Além disso, os réus enfrentariam condições precárias nas prisões edefesa estaria sendo prejudicada por não ter acesso a um inquérito mantidosigilo.
"Não se trata nemquestões políticas, são violaçõesdireitos. As pessoas dizem: ah, tem que pagar mesmo, porque Bolsonaro é um grosso, é um fascista... Mas não se trata dessas questões, se trataque estão abrindo precedentes que depois podem ser usados contra qualquer um", diz a advogada Gabriela Ritter, presidente da Asfav cujo pai foi preso no 8janeiroBrasília e permanece na cadeia.
As denúncias têm o apoioalguns senadores e deputados no Congresso, onde uma comissão parlamentar mistainquérito (CPMI) investiga quem organizou e financiou os atos8janeiro.
Uma audiência foi realizadajunho na ComissãoSegurança Pública do Senado para ouvir os familiares e defensores dos presos.
A audiência foi convocada pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE), para quem os detidos são “presos políticos” que estão passando por situações vexatórias.
No último dia 21, Girão e mais três parlamentares entregaram um documento com denúncias ao embaixador do Brasil nas Nações Unidas, Sérgio Danese.
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Mas o planoGirãoprotocolar uma denúncia ao ComitêDireitos Humanos ainda não foi concretizado. Segundo a assessoriaimprensa dele, não há previsão para isso ocorrer porque o parlamentar espera que, após o encontro com Danese, providências sejam tomadas tanto pelo Brasil quanto pela ONU.
O Itamaraty disse à BBC News Brasil que não cabe à pasta avaliar o mérito das denúncias no atual estágio, o que será feito pelos órgãos internacionais competentes, e esclareceu que o governo brasileiro responderá oportunamente se for demandado pela ONU, caso esta entenda que as denúncias são procedentes.
As denúncias não partem somenteparentes dos presos epolíticos que saíramseu apoio.
O defensor público federal Gustavo Ribeiro, que coordena a defesa dos réus do 8janeiro e diz falarnomeseus colegas da Defensoria Pública da União (DPU), disse à BBC News Brasil que vê “excessos” nas prisões e processos judiciais.
"Tem uma sériecoisas completamente descabidas", diz Ribeiro, dando como exemplo prisões prolongadaspessoas cuja culpabilidade não teria sido demonstrada.
Quem está preso?
Segundo o STF, 2.151 pessoas foram presasflagrante a partir do dia 8janeiroBrasília, tanto nos atos que levaram à depredação das sedes dos Três Poderes, quanto no acampamento bolsonaristafrente ao quartel general do Exército.
Após a identificação, 745 pessoas foram liberadas imediatamente, incluindo maiores70 anos, idosos com problemassaúde e mulheres que estavam acompanhadasfilhos menores12 anos nos atos.
Atualmente, 251 pessoas (66 mulheres e 185 homens) continuam presas preventivamente — situaçãoque ainda não há condenação, mas a Justiça avalia que o acusado deve permanecer detido para garantir a ordem pública ou porque a liberdade dele pode trazer perigos, entre outros motivos listados pelo CódigoProcesso Penal.
De acordo com o STF, permanecem nesta condição aqueles acusadoscrimes mais sérios.
Em linhas gerais, o caminho que levou presosjaneiro a se tornarem atualmente réus foi o seguinte: a PGR conduziu os inquéritos, fazendo investigaçõesparceria com a Polícia Federal, e ofereceu denúncias contra manifestantes ao STF.
As denúncias, então, foram julgadas como procedentes ou não pelo STF — nos casosque elas foram aceitas, os investigados passaram a ser réusações penais que correm na Corte.
Um levantamento da BBC News Brasil a partircomunicados do STF chegou ao númeropelo menos 1.291 denúncias oferecidas pela PGR e aprovadas pela Corte.
"Esse é o sistema acusatório clássico: existe um órgãoacusação, o Ministério Público. Ele, junto com a polícia, faz a investigação e pede que o Judiciário tome determinadas medidas — por exemplo, que determine ou flexibilize a prisão”, explica Álvaro Jorge, professorDireito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) no Rio.
O relatório da Asfav lista o que seriam irregularidades nos processos — a começar pelo próprio julgamento dos casos no STF, uma vez que a rigor apenas pessoas com foro especial por prerrogativafunção são julgadas desde o início ali. A crítica é endossada pelo defensor Gustavo Ribeiro.
"Muitas dessas pessoas que estão sendo processadas não têm foro. Por que estão no STF?", questiona Ribeiro.
Normalmente, pessoas sem foro têm seus casos julgados inicialmente na primeira instância e, havendo recursos, as ações podem eventualmente chegar ao STF. Uma vez que os presos do 8janeiro já começaram a ser julgados no STF, a Asfav argumenta que eles perderam a possibilidaderecorrer a outras instâncias.
A assessoriaimprensa do STF não respondeu a essa críticaparticular, mas fato é que em 2020 a Corte julgou que pode abrir investigação quando ataques criminosos forem cometidos contra a própria Corte e seus membros.
Em inquéritos como o das chamadas Fake News, que corre no Supremo, há vários acusados sem foro, e algumas dessas investigações anteriores estão sendo usadas como base para as ações do 8janeiro.
O documento da Asfav também aponta que as audiênciascustódia dos presos não foram realizadas no prazo24h, como determina a lei. Essas audiências servem para que um preso seja apresentado ao juiz, que vai ouvir manifestações das partes (como a defesa e o Ministério Público), avaliar a necessidade da manutenção da prisão e observar eventuais ocorrênciastortura ou maus-tratos.
Comunicados do próprio STF e da PGR dizem que houve um mutirão na Justiça para realização das audiênciascustódia, que foram concluídas17janeiro — ou seja, ultrapassando o prazo24h.
Álvaro Jorge, da FGV, aponta que o atraso nas audiênciascustódia não costuma levar à anulação da prisão. O CódigoProcesso Penal determina que a ilegalidade da prisão será decretada apenas quando o atraso não tiver justificativa idônea (adequada).
Para o professor, a justificativa para os atrasosjaneiro é óbvia: a enorme quantidadepresos.
"Era muita gente. Houve inclusive uma delegação da PGR e do próprio Supremo utilizando forças auxiliares, como promotores do Distrito Federal, para poder dar conta", diz Jorge, referindo-se aos mutirões.
Acusações
Uma das principais críticas das defesas dos réus é quanto à generalização das acusações e decisões.
“As denúncias são todas muito próximas, as decisões são todas muito iguais e nós estamos lidando com o processo penal. Precisaum mínimoindividualização", diz o defensor público Gustavo Ribeiro.
Ribeiro argumenta que nem todos que estavam na praça dos Três Poderes participaram das depredações.
“Essa presunção absolutarelação a todo mundo que simplesmente pisou na praça [dos Três Poderes] me parece um pouco excessiva. Teve gente que foi meio na curiosidade, meio ‘vamos ver lá o que está acontecendo’ e já chegou com tudo quebrado e acabou sendo preso”, afirma Ribeiro.
“E teve gente que disse assim: eu fui à praça porque eu queria rezar pelo meu país. Às vezes uma pessoa que teve menos acesso à educação, que tem menos acesso a jornais, por uma sériefatores, não consegue entender o que está acontecendo."
Gabriela Ritter, da Asfav, afirma que “a decisão que mantém as pessoas presas e o parecer da PGR que pede a prisão são iguais para todos, só muda o nome das pessoas”.
Como um breve teste, a BBC News Brasil usou a ferramenta antiplágio Plagiarism Checker X para comparar as denúncias contra Alessandra Rondon, que protagonizou o vídeo que gerou comoção nas redes sociais e foi detida no Congresso, e Miguel Ritter, paiGabriela detido no Planalto.
Foi constatado que 79% do conteúdo dos dois documentos é similar.
Após a publicação da reportagem, Gabriela Ritter enviou uma nota contestando os dados. Na ferramenta online antiplágio usada por ela, do site GoTranscrip, os números encontrados seriam diferentes: 93%.
Ela argumenta também que é mais justo comparar denúncias por localque as pessoas foram detidas, pois as acusações teriam sido apresentadasbloco — por exemplo, blocosdenúncias contra pessoas que entraram no Senado e outras no Planalto.
A denúncia contra Alessandra diz que a acusada alcançou o interior do Congresso Nacional “participando ativamente e concorrendo com os demais agentes para a destruição dos móveis que ali se encontravam”.
Contra Miguel Ritter, é dito que as sedes dos Três Poderes ficaram “parcialmente destruídas pela ação do denunciado eseus coautores".
A PGR disse à BBC News Brasil que as críticasgeneralização não procedem porque os envolvidos nos atos8janeiro estão sendo acusados por crimes multitudinários.
Os crimes multitudinários não são tipificados por leis específicas, mas esse termo é comumente usado para falar das circunstânciasum crime.
De acordo com o órgão, eles são crimes “praticados por uma multidãotumulto, que deliberadamente e espontaneamente se organiza para a práticaum comportamento comum contra pessoas ou coisas”.
Isso torna “impossível especificar a contribuição individualcada participante”, disse a PGR.
As penas variamacordo com os crimes cometidos na ocasião, como crimedepredaçãopatrimônio público e outros elencados na denúncia.
O próprio ministro AlexandreMoraes já indicou,um evento da revista Piauíjunho, que está interpretando os acontecimentosjaneiroforma semelhante.
“Quem estava lá participou. Não preciso dizer que fulano quebrou a cadeira A ou riscou o quadro B. Estar lá já é crime. Mas se [a pessoa] comprovar a partir das imagens que nada fez, alguns crimes caem”, disse Moraes.
'Punição desproporcional'
Outra crítica às prisões diz respeito aos casosque não foi concedido aos réus o direitoaguardar o processoliberdade provisória — e muitos deles seriam réus primários, segundo a Asfav.
Gustavo Ribeiro afirma que, entre as pessoas que permanecem presas, "muitas" não participaram ativamente do planejamento do ato e das depredações. Mantê-las presas seria, na visão do defensor público, uma punição desproporcional.
"O caso éjaneiro, e há prisõespessoas que não têm qualquer capacidadeliderança, que não tem o menor sentido ficarem presas preventivamente”, argumenta Ribeiro.
Entre os que permanecem presos, a Asfav diz que há pessoas com necessidades especiais, como idosos e mãesfilhos pequenos.
O CódigoProcesso Penal prevê que um juiz pode converter a prisão preventiva para prisão domiciliaralguns casos, como para idosos maiores80 anos, pessoas extremamente debilitadas por motivodoença grave, gestantes e mulheres com filhosaté 12 anosidade.
A Asfav aponta que há pelo menos quatro pessoas com mais60 anos entre os presos. A informação foi confirmada pela BBC News Brasil.
Porém, nenhum deles tem idade acima80 anos: o mais velho tem 72.
Álvaro Jorge, da FGV, explica que a concessão destes benefícios não é automática.
“Se você pratica um crime com 30, 50, 70 ou 80 anos, você responde da mesma forma. O que acontece é que existem algumas exceções que devem ser consideradascada caso concreto pelo juiz", explica o professor da FGV-Rio.
A Asfav afirma ainda que seis mães com filhos menores12 anos continuam presas. A reportagem não conseguiu confirmar essa informação nos documentos dos processos aos quais teve acesso.
“Algumas pessoas foram soltas nas audiênciascustódia lájaneiro, mas isso sem critério nenhum, porque jovens foram soltos e idosos doentes ficaram”, diz Gabriela Ritter, presidente da Asfav.
Jorge ressalta que o juiz tem acesso privilegiado às evidências, aos acusados e às testemunhas — e diz que isso pode ajudar a entender decisões que parecem injustas a princípio.
“O juiz é o senhor da prova no sentidoque ele está sentado ali, é ele quem está conversando com o réu, ele consegue pegar o cara no contrapé, ele consegue ter intuiçãose o cara está mentindo", exemplifica.
O STF disse à BBC News Brasil que permanecem presos aqueles acusados por crimes mais graves e que “mãesmenoresidade e idosos tiveram análise preferencial, sendo que a maioria foi liberada para responderliberdade”.
Alessandra Rondon, por exemplo, é acusada dos crimesassociação criminosa armada, abolição violenta do Estado DemocráticoDireito, golpeEstado, dano qualificado e deterioraçãopatrimônio tombado. Sua defesa diz que ela é inocente.
Seis meses antes do vídeoreencontro com os filhos que causou comoção, ela protagonizou um outro,que aparece sentadauma cadeira no Senado pedindo a prisãopolíticos “traidores” e a intervenção militar no país.
O advogadoAlessandra, Bruno Jordano, diz quecliente não participou nem concorda com as depredações. Ele argumenta não ser possível “enquadrar uma fala como um golpeEstado”.
Jordano defende que os atos8janeiro não poderiam ser considerados um ataque à democracia, porque não teriam sido empregadas “armasguerra”.
O advogado diz ainda que os filhos do casal passaram por um período difícil enquanto Alessandra e o marido estiveram presos ao mesmo tempo.
“Eles chegaram a pensar que os pais os tinham abandonado ou morrido”, diz Jordano.
Após a publicação, alegando que a reportagem não fez jus ao posicionamento da defesa, Jordano enviou um novo posicionamento, apresentado na íntegra ao final do texto. Nele, Jordano afirma que "não houve a práticaatosdepredação por parte da ré, que inclusive nega estaracordo com quem tenha se envolvido na práticatais atos".
Miguel Ritter, paiGabriela Ritter, é acusadoassociação criminosa armada, abolição violenta do Estado DemocráticoDireito, golpeEstado e dano qualificado.
Masfilha diz que ele não participou das depredações e que entrou no Palácio do Planalto para se abrigar da repressão policial aos atos.
“Era uma manifestação que se tornou uma tragédia, porque ninguém concorda com atosvandalismo”, diz Gabriela Ritter.
Os autos do processo apontam que o mecânico60 anos não tem antecedentes criminais. A advogada diz que o pai tem vários problemassaúde, como diabetes, hipertensão e complicações ligadas à próstata e à mobilidade limitada no ombro.
Segundo ela, Miguel não estaria recebendo atendimento médico adequado na prisão e seria melhor cuidado se estivesseliberdade provisóriaSanta Rosa (RS), onde a família mora.
"Meu pai sempre foi uma pessoa muito forte, com autoestima, bom humor... Nunca nada abalou ele. Só que, dos últimos dias para cá, está sendo bem difícil, porque não tem uma perspectiva. Temos notado uma tristeza profunda no olhar dele”, afirma Gabriela Ritter, que se reveza com o irmão para visitar o paiBrasília a cada 15 dias.
“A sensação que temos é que a condenação está pronta.”
A presidente da Asfav preferiu não responder à reportagem se votouJair Bolsonaro (PL), como muitos dos que participaram dos atos8janeiro, e minimizou os ataques do ex-presidente e seus apoiadores ao sistema eleitoral.
“Não é a primeira vez que se questiona no Brasil e no mundo o resultado das eleições.”
Direitodefesa
Outro ponto levantado pela associaçãofamiliares dos presos é que adefesa tem sido sistematicamente prejudicada por decisões da Justiça.
A associação aponta que o inquérito 4879, aberto2021, tem sido usado como base para os inquéritos e ações penais do 8janeiro. Entretanto, ele é físico e sigiloso, e as defesas reivindicam acesso a ele.
A associação diz ainda que as defesas dos réus têm sido avisadas das datas das audiências com prazos muito curtos e que o STF tem pedido que a sustentação seja enviadavídeo, não sendo possível fazer isso presencialmente — como seria a preferência da defesa dos presos.
A Asfav afirma que fez denúncias à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a qual não teria tomado as medidas adequadas, segundo a associação.
A OAB disse à BBC News Brasil que “até o momento, todas as requisições da OAB sobre prerrogativas profissionais foram atendidas pelo STF”.
O defensor público Gustavo Ribeiro acrescenta que as defesas têm dificuldadespleitear a liberaçãopresos, uma vez que o STF tem como jurisprudência não conceder um habeas corpus contra decisão monocráticaseus ministros.
Restariam, então, recursos — mas, segundo Ribeiro, eles não colocadosjulgamento pelo relator dos inquéritos e ações penais relacionados ao 8janeiro, o ministro AlexandreMoraes.
"Tudo que tenha qualquer relação [com os atos8janeiro], por ínfima que seja, vai para o ministro AlexandreMoraes. O STF entende que não cabe habeas corpus (HC) contra ministro do próprio STF. Sendo assim, como escapar e levar certas discussões sem depender do ministro AlexandreMoraes? Depende dele colocar o recurso para julgar, e ele não coloca. A gente faz o HC, e dizem que não cabe o HC”, aponta o defensor público federal.
O STF não respondeu especificamente às críticas à faltaacesso ao inquérito 4879 e nem sobre a impossibilidadeimpetrar habeas corpus e a dificuldadeter recursos julgados, apesar desses pontos terem sido apresentados pela reportagem.
Condições dos presídios
O documento da Asfav, assim como um relatório publicado no finalfevereiro pela DPU e pela Defensoria Pública do Distrito Federal, criticou as condições dos presídios para os quais foram levados os presos a partir8janeiro: o CentroDetenção Provisória II, no Complexo da Papuda; e a Penitenciária Feminina do Distrito Federal, conhecida como "Colmeia".
Os documentos apontaram para superlotação dos presídios, alimentação insuficiente e insatisfatória, dificuldadeacesso a medicamentos e atendimento médico e a não realizaçãobanhossol, entre outros pontos.
Responsável pelos dois presídios, a SecretariaAdministração Penitenciária do Distrito Federal (Seape/DF) afirmou que, atualmente, o presídio masculino tem no total 1.282 presos para 980 vagas (portanto, com lotação acima da capacidade); e o feminino, 591 presas para 1.028 vagas.
Sobre a alimentação, a Seape afirmou que todo detento recebe quatro refeições diárias (café da manhã, almoço, jantar e ceia) e que "a alimentaçãoboa qualidade é um dos aspectos contratuais a serem seguidos pelas empresas contratadas".
Por isso, os contratos para esse serviço "são objetosextrema diligência" por parte da pasta.
O órgão garantiu também que todos os detentos que chegam aos presídios passam por triagem médica, recebem vacinas e fazem consultas para identificar doenças crônicas.
"Além disso, no que diz respeito à saúde, é válido informar que todas as unidades prisionais do DF possuem uma Unidade BásicaSaúdeseu interior, que conta com médico, odontólogo, enfermeiro, técnicosaúde bucal, auxiliarenfermagem, psicólogo, assistente social, farmacêutico, terapeuta ocupacional, psiquiatra, fisioterapeuta, ginecologista (no caso do presídio feminino) e um infectologista que atende todo o sistema prisional", acrescentou a secretaria.
Gabriela Ritter, da Asfav, reconhece que a situação do pai preso a fez se deparar com a realidade dos presídios brasileiros — que ela não sabia serem "tão ruins".
"Às vezes a gente julga algumas situações, mas quando a gente passa por elas, vê que a gente sempre pode aprender e mudar o nosso pensamento", diz Ritter.
"A prisão deve ser sempre o último lugar que um criminoso deve estar, mas estando lá, deve-se ter as condições para que ele se reabilite na sociedade."
*Nota enviada pelo advogado Bruno Jordano, que defende Alessandra Faria Rondon, às 16h4002/08/2023, após publicação da reportagem: "Os depoimentos testemunhais e as provas contidas nos autos indicam que não houve a práticaatosdepredação por parte da ré, que inclusive nega estaracordo com quem tenha se envolvido na práticatais atos. Além disso, afirma não possuir qualquer tipoarmamentoqualquer espécie enão ter empreendido atosviolência ou ameaça contra quem quer que seja. Por fim, ressalta que a manifestação, a princípio, tinha intuito pacífico e se encontrava nos limites do direito estabelecido na Constituição. Eventuais excessos,quem quer que seja, precisam ser apurados individualmente, com a devida proporcionalidade, eacordo com os limites da leimodo a impedir a imputação objetivaum crime impossível àqueles que não anuíram às finalidades específicas das condutas que lhes são imputadas no curso dos processos. Tudo isso somente seria possívelum processoque a ampla defesa e contraditório fossem preservados."