Brasil chega à COP28 com trunfo contra desmatamento e 'esqueletos' no armário:
Segundo Stella Herschmann, especialista ambiental do Observatório do Clima, todas essas pautas têm chances reaisserem aprovadas, principalmente por causa da composição política do Congresso, que não compartilha da agenda ambiental do governo federal.
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"O Brasil quer ser o líder climático do mundo. Isso é clarotodos os discursos do Lula desde que ele ganhou a eleição, mas dentrocasa, nós não fazemos o nosso devercasa. E pior, nós podemos atrapalhar e muito esse papellíder que o Brasil quer ter", disse Herschmann à BBC News Brasil.
Outro "esqueleto ambiental" no armário brasileiro é o Cerrado, que está batendo recordesdesmatamento neste ano. Segundo dados do Instituto NacionalPesquisas Espaciais (Inpe), entre janeiro e maio deste ano foram desmatados mais3.320 km² do bioma, um aumento27%relação ao mesmo período do ano passado.
Alémsofrer com incêndios, o Cerrado possui leis mais permissivas do que a Amazônia, o que torna mais difícil o combate ao desmatamento.
Desmatamento zero na Amazônia
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Mas na COP28, o governo vai tentar focar nos recentes dados positivos.
Desde que assumiu o governo, Lula tem reiteradotodos os compromissos internacionais duas metas claras para a Amazônia: atingir o desmatamento zero até 2030 e promover o desenvolvimento sustentável da região —veztransformar a Amazôniaum santuário intocável.
O governo vem buscando alianças com países amazônicos ou com outras grandes florestas tropicais. Em agosto, o Brasil sediouBelém uma cúpula amazônica.
Agora na COP 28, Lula pretende mostrar resultados concretos do que seu governo fez no combate ao desmatamento.
Após quatro anosaltas taxasdesmatamento da Amazônia, o número ficou abaixo10 mil quilômetros quadrados pela primeira vez, segundo dados oficiais divulgados no começo do mês. De agosto2022 a julho2023, foram perdidos 9.001 quilômetros quadradosfloresta, uma redução22,3% na comparação com o período anterior.
Ambientalistas ressaltam que os primeiros cinco meses analisados ainda ocorreram durante o governo Bolsonaro — e que nesse período o desmatamento da Amazônia continuou crescendo. Mas nos primeiros seis meses do governo Lula, o desmatamento caiu tudo que havia crescido no governo Bolsonaro — e seguiu caindo, a pontoficar 22% abaixo dos dez meses anteriores.
Segundo Herschmann, a queda do desmatamento pode ser creditada às políticas públicas, como maior fiscalização e multas pelo Ibama,
Objetivos do Brasil
Mas afinal qual é a pauta do Brasil na COP28? O que o país espera alcançar na reunião ambiental?
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, diz que um dos principais desafios do Brasil é ajudar a "encerrar a pauta" atualdiscussões — já que o Brasil sediará a cúpula do clima da ONU2025,Belém.
"Sabemos que os resultados da COP 30 que iremos sediar2025 dependerão do sucesso na COP 28 e na COP 29 com os desafios que estão postos", diz a ministra.
No encontroDubai, há quatro pontos centraisdiscussão: compromisso global com a metanão deixar o planeta se aquecer mais do que 1,5 graus, um fundoperdas e danos - uma promessapaíses ricos feita há maisdez anos - e a diminuição do uso do petróleo no mundo.
Espera-se que a COP28 ajude a manter vivo o objetivolimitar o aumento da temperatura global a 1,5ºC. Isto foi acordado por quase 200 paísesParis2015.
A meta1,5ºC é crucial para evitar os impactos mais prejudiciais das alterações climáticas, segundo o Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC, o órgão da ONU sobre o assunto).
Atualmente o planeta está cerca1,1ºC ou 1,2ºC mais quente do que a era pré-industrial, quando a começou a queimar combustíveis fósseisgrande escala.
Mas as estimativas mais recentes sugerem que, se nada for feito, o planeta vai se aquecer 2,4°C a 2,7°C até 2100, embora seja difícil precisar os números exatos.
A janela para se atingir a meta1,5ºC está diminuindo "drasticamente", segundo a ONU. O Brasil está entre os países que defende essa meta — e pretende trabalhar para reiterar issoDubai.
O fundoperdas e danos foi um mecanismo criado na COP do ano passado — um montantedinheiro destinado a países que emitem poucos gases nocivos ao ambiente mas que sofrem muito com fenômenos climáticos extremos, como o Paquistão, por exemplo.
Os detalhes práticos do fundo — como quem deve contribuir e quem tem direitosacar — nunca foram acertados e ele não saiu do papel. Espera-se queDubai possa haver algum avanço nesse mecanismo.
Um tema parecido com o fundoperdas e danos é o do financiamento — uma promessa feita2009 por países ricosdestinar por ano US$ 100 bilhões aos países mais pobres para combate aos efeitos do aquecimento global.
O Brasil e outros países insistem que essa promessa seja cumprida, mas o tema não avançou nas reuniões passadas.
Por fim existe a questão dos poçospetróleo. Cientistas dizem que é preciso acelerar o processotransiçãocombustíveis fósseis para energia renovável. A COP28 está sendo sediada justamente na região que mais produz petróleo no planeta — e nenhum dos países têm sinalizado que pretende diminuirprodução no futuro.
Esta semana a BBC revelou que os Emirados Árabes Unidos planejaram usar o papel como anfitrião da COP como uma oportunidade para fechar acordospetróleo e gás, apurou a BBC. Documentos vazados revelam planos para discutir acordos relacionados aos combustíveis fósseis com 15 nações — inclusive o Brasil.
"Esta é uma COP que precisa ser a do abandono dos combustíveis fósseis. Nada menos do que isso", diz Natalie Unterstell, do Instituto Tanaloa.
"É difícil e delicado e muitos países não alcançaram sequer o seu picoprodução [de combustíveis fósseis] — como o Brasil, que almeja ser o quarto maior produtorpetróleo até o final dessa década e está no rumo para isso."
A ministra do Meio Ambiente diz que a COP28 será um sucesso se conseguir reconfirmar o compromisso do planeta com a meta1,5ºC e, além disso, definir um plano mais clarocomo se chegar à essa meta.
"Quem está nos cobrando é a ciência, é o bom senso", disse Marina Silva.
Na sessãoabertura da COP28,Dubai, aprovou-se a criação do Fundo para Perdas e Danos.
A decisão foi seguidadeclaraçõesvários países doadores anunciando que farão aportes. Até o momento, os valores anunciados superam 400 milhõesdólares.
"Obter uma decisão logo na abertura da COP28 – algo inédito na história das COPs – reforça que é no multilateralismo que vamos encontrar as soluções. Começamos com o Fundo para Perdas e Danos e esperamos que este momento nos inspire a assegurar uma transição justa para combater a mudança do clima", afirmou o negociador-chefe do Brasil para mudança do clima, Embaixador André Aranha Corrêa do Lago.
Lula na COP28
Lula retorna pela primeira vez à uma conferência do clima da ONU como presidente após 13 anos. No ano passado, ele participou da COP27 no Egito sem ter assumido o cargo ainda, mas já tendo sido eleito.
Lula terá compromissos apenas na sexta-feira e sábado (1/12 e 2/12), como também a maioria dos líderes mundiais. Depois disso ele segue para a Alemanha, última paradaum giro internacional que incluiu também Arábia Saudita e Catar.
O encontrolíderesalto nível da COP28 ocorrerá no começo da cúpula. Depois disso, a maioria dos líderes vai embora. FicamDubai os negociadores diplomáticos e ministros. A conferência chega ao fim daqui a duas semanas, no dia 12 — quando se espera algum tipoacordo final com as resoluções tomadas na COP.
Na sexta-feira, Lula fará discurso na sessãolíderesalto nível e participaráum evento sobre financiamento climático, da entregaum prêmiosustentabilidade e do lançamentoum planotransformação ecológica. Ao final do dia, o Brasil oferecerá um jantar ao presidente dos Emirados Árabes, xeique Mohamed bin Zayed Al Nahyan, chamado"A Amazônia: uma experiência imersiva".
No sábado, o presidente participaráeventosdiálogo da sociedade civil,proteção às florestas,transição energética euma reunião do G-77+China (grupo conhecido anteriormente comopaíses não-alinhados) sobre mudanças climáticas.
Além da pauta ambiental, Lula terá vários compromissos não relacionados necessariamente com o tema.
Ao longo dos dois dias, estão na agenda do presidente encontros bilaterais com o premiê britânico Rishi Sunak, o presidenteIsrael, Isaac Herzog, o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, o presidente da Espanha, Pedro Sanchez, o presidente da Guiana, Mohamed Irfaan Ali, o presidenteCuba, Miguel Diaz-Canel, o presidente da França, Emmanuel Macron, o presidente da União Africana, Moussa Faki e o premiê da Etiópia, Abiy Ahmed Ali.
Alguns pontos importantes da política externa do governo são o acordo Mercosul-União Europeia e o conflito entre Israel e Hamas.
Líderes sul-americanos e europeus têm pressa para concluirdezembro o acordo que vem sendo negociado há anos — antes que o novo presidente argentino Javier Milei assuma o cargo, já que ele vem se mostrando contra a participação do seu país no Mercosul. Sobre a crise no Oriente Médio, Lula disse que está disposto a conversar com o presidenteIsrael para ajudar qualquer brasileiro que ainda queira sair da região.
A COP28 é o último grande evento do ano na diplomacia internacional — e nos próximos anos o Brasil se prepara para assumir grandes compromissos internacionais.
A partirsexta-feira (1/12), o Brasil assume — com mandatoum ano — a presidência temporária do G20, o grupo que reúne as 19 principais economias do mundo, a União Europeia e, agora, também a União Africana.
É a primeira vez que o Brasil assume essa função no formato atual do grupo — e o país teráorganizar uma cúpula do G20 no RioJaneironovembro2024.
E2025 o Brasil sediará a COP30Belém. A sede da COP do ano que vem ainda não foi definida.