O macarrão mais raro do mundo, que só três mulheres sabem fazer:

Paola Abraini

Crédito, Eliot Stein

Legenda da foto, Paola Abraini,62 anos, prepara o 'su filindeu'seu apartamento na Sardenha

Mas há mais300 anos, a receita e a técnicapreparo só foram ensinadas pelas mulheres da família Abraini - cada uma guardando os segredos a sete chaves até mostrar a suas filhas.

Nem Jamie Oliver

Jamie Oliver

Crédito, AP

Legenda da foto, O famoso chef Jamie Oliver desistiu da massa depoishoras observando Abraini

Não que não haja outras pessoasolho. No ano passado, uma equipeengenheiros da Barilla, uma das maiores fabricantesmassa da Itália, vistou Abraini para ver se poderiam reproduzir a técnica dela com uma máquina. Não funcionou.

Este ano, ela recebeu o presidente da ONG Slow Food International, Carlo Petrini, encantado pelos rumoresum macarrão secreto. E ainda abriu as portasseu apartamento para o festejado chef britânico Jamie Oliver, que implorou para que Abraini o ensinasse a preparar a massa.

Depoisduas horas tentando, sem sucesso, Oliver simplesmente desistiu. "Eu faço massa há 20 anos e nunca vi nada assim", afirmou.

A cozinheira se diverte com tudo isso e diz que o segredo pode ser visto por qualquer um: suas mãos.

Exclusivo para peregrinos

Paola Abraini

Crédito, Eliot Stein

Legenda da foto, Com medover tradição desaparecer, Abraini está empenhadadivulgar técnica e receita

Para fazer o su filindeu, ela puxa e dobra uma massasemolina256 tiras perfeitamente idênticas, usando as pontas dos dedos. Em seguida, estica os finíssimos fios sobre uma forma circular,um intricado padrão com três camadas.

Tudo é tão difícil e toma tanto tempo que nos últimos 200 anos esse prato sagrado só era sido servido para os fiéis que completassem uma peregrinação33 quilômetros, a pé ou a cavalo,Nuoro à vilaLula durante as festasSão Francisco, que ocorrem duas vezes por ano.

Quando fui convidado à casaAbraini,outubro, faltavam três dias para as festas. A cozinheira tinha acabadofabricar su filindeu suficiente para alimentar os 1,5 mil peregrinos esperados para a comemoração.

Ela trabalhou cinco horas por dia, todos os dias, durante um mês para fazer 50 quilosmassa. Para as festasmaio - ainda maiores - ela deve preparar uma quantidade quatro vezes maior.

'Trigo, água, sal e suor'

Sopasu filindeu

Crédito, Eliot Stein

Legenda da foto, Macarrão é usadosopa servida apenas para peregrinosfesta religiosa

"Uso apenas três ingredientes: semolinatrigo, água e sal", conta Abraini. "Mas como tudo é feito à mão, o componente mais importante é o suor."

A massa é trabalhada vigorosamente até obter uma consistênciamassinhamodelar. Ela então separa tudopequenas partes e forma pequenos cilindros. Chega, então, a parte mais difícil, que a cozinheira chama"entender a massa com as mãos".

"É algo que uma pessoa leva anos para perceber, um equilíbrio perfeito entre cada ingrediente. Mas quando você consegue, algo mágico acontece", diz.

Depoisesticada e dobradaoito sequências, a massa obtém a espessura equivalente a metadeum fiomacarrão "cabeloanjo".

Após serem dispostos comouma base circular,três camadas, os fios são levados para secar ao sol. Depoishoras, a massa seca mais parece uma tramarenda fininha.

O macarrão então é embalado e levado para a festa, onde será fervidoum caldocarneovelha e servido como uma sopa, com queijo pecorino ralado, para os peregrinos.

Tradição ameaçada

Su filindeu

Crédito, Eliot Stein

Legenda da foto, Cozinheira passou a fornecer massa a restaurantes e já faz versões com tintalula

Mas depoismais300 anos dentro da mesma linhagem matriarcal da família, os fiosDeus devem precisarum milagre se quiserem sobreviver para as próximas gerações.

Apenas uma das duas filhasAbraini conhece a técnica, mas não tem a mesma paixão e a mesma paciência da mãe.

Nenhuma das moças tem filhas. As outras duas mulheres que ainda ajudam a cozinheira têm mais50 anos e ainda não conseguiram convencer suas próprias filhas a aderir à tradição.

"O su filindeu é uma das comidas com maior riscoextinção, muito porque é tão difícilfazer", explica Raffaella Ponzio, coordenadora da iniciativa Arca do Sabor, da Slow Food International, que pretende classificar e preservar as tradições culinárias ameaçadastodo o mundo.

Por causa disso, Abraini quebrou a tradição familiar e tentou ensinar outras jovensNuoro a preparar a massa. "Mas não deu muito certo", conta. "Quando elas viam como fazer, diziam 'dá muito trabalho' e não voltavam mais."

Mas a cozinheira se recusa a deixar a massa desaparecer, e adotou a missãoespalhar o su filindeu pelo mundo.

Recentemente, ela foi filmada no preparo pela equipe da revistagastronomia Gambero Rosso, uma das maiores da Itália. E agora começou a fazer o macarrão para três restaurantes da Sardenha - permitindo que não peregrinos experimentem o prato pela primeira vez.