Conheça a mulher que é alérgica a água:

Janela molhada

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Legenda da foto, Condição que afeta apenas 32 pessoas no mundo impede que Rachel saiacasadiaschuva

Mas a águanosso corpo não parece ser um problema para quem sofre da urticária aquagênica. As reações alérgicas são detonadas pelo contato com a pele e ocorrem a despeitotemperatura, pureza ou salinidade. Mesmo a água destilada várias vezes vai causar problemas.

Copo d´água

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Legenda da foto, Um simples copo d'água pode causar dores terríveis a pessoas com urticária aquagênica

"Quando as pessoas sabem da minha condição, elas fazem perguntas do tipo 'como você faz para comer ou beber' ou 'como toma banho'. A grande verdade é que você precisa aguentar a dor e seguir a vida", diz Rachel.

A doença confunde os cientistas tanto como nós. Tecnicamente, a urticária aquagênica não é uma alergia, pois é uma provável reação imunológica despertada pelo corpovezuma reação a agentes externos, como pólen ou amendoins.

Uma das primeiras teorias para explicar como a doença funciona é que a água interage com a camada mais externa da pele, composta majoritariamentecélulas mortas e substância oleosa que mantém a pele úmida. Contato com a água pode fazer com que esses componentes liberem compostos tóxicos, levando a uma reação imunológica. Especialistas também sugerem que a água simplesmente pode dissolver elementos químicos na camadapele morta, fazendo com que eles penetremcamadas mais profundas, onde causam a reação imunológica.

A teoria mais ousada é que a condição é deflagrada por diferençaspressão que acionam por osmose o alarme imunológico quando a água deixa a pele.

Quaisquer que sejam as causas, porém, a urticária é uma doença devastadora e que pode transformar vidas, como explica o dermatologista Marcus Maurer, fundador da ECARF, um centro alemãoestudosalergias. "Tenho pacientes que sofremurticária há 40 anos e que ainda acordam com manchas e edemas diariamente", explica.

Piscina

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Legenda da foto, Nadar é uma tortura para Rachel

Pessoas que sofrem deste mal pode desenvolver ansiedade ou depressão, preocupando-se constantemente com o próximo ataque. "Em termosqualidadevida, é um das piores doençaspele que se pode ter", acrescenta Maurer.

Rachel tinha 12 anos quando foi diagnosticada, depoisperceber uma irritação na pele quando nadava. Ela não foi enviada para testes. O método padrãodiagnóstico é manter a parte superior do corpo molhada por meia hora e ver o que acontece. "Meu médico conhecia a condição e me disse que o teste seria pior".

Sobreviver com a urticária não é um problema, mas suportá-la diariamente é outra história. Em períodosmuita chuva, por exemplo, Rachel não pode saircasa. Atividades corriqueiras como lavar a louça precisam ser executadas pelo marido. Ela limita os banhos a apenas um por semana. Para minimizar o suor, ela usa roupas leves e evita exercícios.

Assim como outras pessoas com a condição, Rachel bebe muito leite, já que a reação não é tão ruim quanto com a água. E ninguém sabe o porquê. O tratamento até agora é feito basicamente através do usoanti-histamínicos, e para entender a razão da pouca evolução da busca por uma cura, é preciso primeiro entender o que acontece durante uma reação.

Tudo começa quando células imunológicas na pele, conhecidas como mastócitos, liberam proteínas inflamatórias (histaminas). Em uma reação imunológica normal, as histaminas são extremamente úteis, fazendo com que os vasos sanguíneos se abram o suficiente para a entradaglóbulos brancos, que atacam invasores. Mas durante uma reação à água, tudo o que você recebe são os efeitos colaterais: os fluidos causam inchaços na pele. Ao mesmo tempo, as histaminas ativam neurônios cuja principal função é fazer com que tenhamos coceiras. Isso provoca as lesões conhecidas como vergões.

Campo nevado

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Legenda da foto, A neve também é inimigoquem sofre desse mal misterioso

Na teoria, os anti-histamínicos deveriam funcionar todas as vezes, mas na prática as drogas tiveram resultados mistos. Em 2014, Rachel foi enviada para o ECARF,Berlim, como parteum documentário. Médicos sugeriram que ela tomasse uma dose maior do remédio. Ela fez isso e, a pedido dos médicos, nadouuma piscina. Não funcionou. "Fiquei me coçando loucamente e parecia que tinha uma doença horrívelpele", lembra Rachel.

Mas, desde 2008, o ECARF vinha estudando uma alternativa aos anti-histamínicos, concentrando-se nos mastócitos - mais precisamente no que poderia acionar a produçãohistaminas. Estudoslaboratórios apontaram para um culpado - o anticorpo IgE, responsável por alergias "verdadeiras", como a pólen ou pelosanimais. "Em vezreagir a algo do mundo exterior, essas pessoas (os portadoresurticária aquagênica) estão produzindo IgEresposta a algo acontecendo no interiorseus corpos", diz Maurer.

Tudo do que precisavam erauma droga que pudesse bloquear os efeitos do IgE. E já havia uma no mercado. O Omalizumab foi originalmente desenvolvido como tratamento para asma. "O laboratório que produzia a droga não acreditou quando pedimos para usá-la", lembra o dermatologista. Em agosto2009, os médicos testaram o Omalizumabuma mulher48 anos com outra forma raraurticaria, acionada por pressão. Por três anos, a paciente desenvolvia irritações na pele com o mínimo toque. Era ruim ao ponto das irritações aparecerem até quando se vestia ou penteava.

Mas após apenas uma semanatratamento, os sintomas diminuíram sensivelmente. No finalum mês, desapareceram. Desde então, os cientistas descobriram que o Omalizumab é eficaz contra mesmo as formas mais obscurasurticária. "Essa droga mudou o jogo completamente", diz Maurer.

Antihistamínico

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Legenda da foto, Antihistamínicos são até agora o único tipomedicamento receitado para a urticária aquagênica

Umseus primeiros pacientes foi um professor que reagia ao próprio suor. Não podia mais dar aulas porque seu rosto inchava durante as aulas. Mas apenas uma semanatratamento mudouvida.

Isso deveria ter representado um final feliz para Rachel. Mas há um porém: a droga ainda não passou por testes clínicos extensivos que comprovemeficácia e, por isso, sistemassaúde pública como o NHS britânico não custeiam seu uso. Esse foi o problema que Rachel encontrou2014 quando teve o Omalizumab receitado. Sem cobertura do NHS, a droga custaria milhareseuros por mês.

Como a urticária aquagênica afeta apenas umacada 230 milhõespessoas no mundo, isso significa que apenas 32 pessoas no planeta sofrem da doença. Um número insuficiente para grandes testes clínicos. E a droga está chegando ao fimsua patente, o que faz com que a Novartis, a empresa que fabrica droga, não pense investir pesadamentetestes ou mesmo no desenvolvimentonovos tratamentos. A barreira final para cuidar da urticária aquagênica não é científica, mas sim econômica.

Pelo menos por enquanto, Rachel vai ter que esperar para realizar o sonhopoder fazer natação. Ou dançar debaixo da chuva.

Leia a versão original dessa reportagem (em inglês) no site BBC Future