Como Irã ajudou Venezuela a ser 1º país latino-americano com drones armados:
As autoridades venezuelanas nunca confirmaram o usodrones armados no conflitofevereiro. Entretanto, alguns meses depois, o governoNicolás Maduro exibiu, durante um desfile militar, drones com capacidadeataque.
Assim, a Venezuela tornou-se, segundo especialistas, o primeiro país da América Latina a ter drones armados.
Para saber como o país conseguiu isso, é preciso voltar a atenção para suas relações com o Irã.
Armados e não tripulados
Em 5julho, durante o desfile militar para comemorar o Dia da Independência, as Forças Armadas da Venezuela mostraram dois modelos diferentesdrones com capacidade ofensiva.
O Antonio JoséSucre 100 (ANSU 100) foi apresentado como um meio"observação, reconhecimento e ataque". Já o Antonio JoséSucre 200 (ANSU 200) foi descrito como uma aeronave"velocidade, alto sigilo e capacidadeobservação, reconhecimento, ataque, caça antidrones e supressão da defesa aérea inimiga".
Segundo o narrador do desfile, ambos os dispositivos eram"design e fabricação venezuelana".
No entanto, vários especialistas apontaram que pelo menos o ANSU 100 é na verdade uma versão modernizada do drone iraniano Mohajer 2.
Esses dispositivos não tripulados foram os primeiros comprados pela Venezuela do Irã durante o governoHugo Chávez.
De acordo com as informações disponíveis no bancodadosequipamentos militares ODIN, pertencente ao Exército dos Estados Unidos, a Venezuela assinou um acordo com o Irã2007 para montar 12 unidades do Mohajer 2, a partirpartes e peças fornecidas pela Força Quds da Guarda Revolucionária do Irã.
Os aparelhos começaram a ser montados2009 pela Cavim, a estatal venezuelana responsável pela produçãoarmas e munições.
Em junho2012,uma transmissão pela televisão, Chávez mostrou pela primeira vez esses dispositivos não tripulados. Foi dito que eles seriam usados em missõesreconhecimento e que os funcionários venezuelanos que trabalharam no projeto haviam sido treinados no Irã.
Foi dito ainda que o modelo montado pela Cavim dispunhacâmerasvídeo e fotografiaalta resolução e que, emboraprincípio ele só pudesse ser utilizadovoos diurnos, estavacurso a adaptação para voos noturnos.
Os ANSU 100 exibidos no desfile5julho são vistos como uma versão modernizada do Mohajer 2.
Nos últimos anos, a relação entre Irã e Venezuela só se fortaleceu, principalmente porque os dois países são alvossanções impostas pelos Estados Unidos, que consideram autoritários tanto o governoCaracas quanto oTeerã.
"Em teoria, supõe-se que é uma modernização baseada no Mojaher 6 [o modelo mais avançado desse tipodrone]. Se você olhar as fotos do Mohajer 2, verá quevezum trempouso eles tinham tipo esquis, porque eram lançadosuma plataforma", diz Serbin Pont.
"Como parte da modernização recente, o que se fez foi colocar um trempouso com rodas, com a ideiaque possam operar diretamentepistas normais."
O analista afirma que esses dispositivos foram exibidos juntamente com um tipomunição guiada Qaem, também fabricada no Irã, que permite atacar alvos no ar com considerável precisão.
Ele ressalva, porém, que ainda há muitas incógnitas sobre o funcionamento desses drones mais modernos.
"Não temos evidências sobre as condiçõesoperação desse novo modelo e se ele foi usado com essa arma. Há fontes que indicam que sim", aponta Serbin.
Deve-se notar que, durante o desfile5julho, tanto o ANSU 100 quanto o ANSU 200 foram exibidos enquanto eram transportados por veículos terrestres.
Este detalhe é especialmente importante no caso do ANSU 200, pois antes do desfile, apenas eram conhecidos desenhos e maquetes dele, sem queoperacionalidade tenha sido demonstrada.
Em novembro2020, durante uma transmissão televisiva, Maduro anunciou que a Venezuela também iria fabricar drones multiuso e "para defesa nacional". O presidente disse que os aparelhos seriam construídos com alumínio venezuelano e seriam produzidos também para exportação. As imagens mostram um objeto que parece ser uma maquete do Mohajer 6.
Um projeto ambicioso e opaco
O desenvolvimentodrones na Venezuela tem sido marcado por duas características: o apoio do Irã e o sigilo.
"O programadrones da Venezuela vem do Irã. A Venezuela não tinha um programadrones antessua cooperação com o Irã", diz Joseph Humire, diretor executivo do Centro para uma Sociedade Segura e Livre (Center for a Secure Free Society), um centroestudos com sedeWashington.
Humire indica que, quando estas parcerias foram lançadas, entre 2006 e 2007, acordoscooperação militar foram embutidosacordos comerciais eacordos energéticos — nos quais participavam as empresas estataispetróleoambos os países.
No início, essa cooperação avançou lentamente. Levou anos para que os primeiros drones iranianos fabricados na Venezuela ficassem prontos, por volta2011. Os aparelhos foram fabricados e montados nas instalações da Cavim na base aérea Libertador, na cidadeMaracay, no centro da Venezuela.
Apesar dos contratempos, Humire avalia que se tratauma iniciativa séria que pode até ter dupla aplicação: civil e militar.
O analista lembra que o programa foi pausado entre 2013 e 2016. A partir daí, os dois países decidiram fortalecer a cooperação na áreadefesa, mas tiveram que lidar com as restrições impostas pelas sanções das Nações Unidas, que impediam o Irãexportar sistemasarmas.
Logo depois, a Venezuela criou seu primeiro batalhãodrones, incluindo não apenas aeronaves iranianas, mas também outros aparelhosvigilância vindos da China e da Rússia.
"Assim, a Venezuela se equipou pela primeira vez, com sucesso,um verdadeiro programadrones — já que, inicialmente, o que houve foi como um programa piloto", diz o especialista.
Segundo Humire, foi graças ao usodrones iranianos que as autoridades venezuelanas conseguiram detectar a chamada Operação Gideon, a tentativa fracassadapousoum grupoexilados venezuelanos acompanhados por dois ex-veteranos dos Estados Unidosmaio2020, com o suposto objetivocapturar Maduro.
"Portanto, temos visto o usodrones principalmentetarefasvigilância, mas isso vai muito além do que eles faziam no passado: voosteste e pequenas missõesreconhecimento."
A modernização venezuelana do Mohajer 2 foi realizada pela empresaserviços aeroespaciais Eansa — uma subsidiária da companhia aérea estatal Conviasa, que também tem sede na base aérea Libertador,Maracay.
Não está claro o quão avançado está o programadrones armados da Venezuela, pois eles não foram vistosação e não se sabe quantos deles existem. Tampouco há respostas sobre se os drones são apenas Mohajer 2 atualizados ou se foram fabricados do zero ou comprados.
A BBC New Mundo (serviçoespanhol da BBC) entroucontato com o Ministério das Comunicações venezuelano para solicitar informações sobre seu programadrones, mas até o momento da publicação, nenhuma resposta havia sido recebida.
O que os especialistas concordam é que a Venezuela seria o primeiro país da região a ter drones com capacidade ofensiva.
Jochen Kleinschmidt, pesquisadorrelações internacionais do CentroEstudos Latino-Americanos da Universidade Católica Eichstätt-Ingolstadt (Alemanha), afirmou que o Brasil está buscando formasintegrar mísseis antitanque modernosseus veículos aéreos não tripulados (UAVs, como drones são conhecidos porsiglainglês), alémse equipar com drones suicidas.
"Como tudo isso estáseus estágios iniciais, seria correto, até onde eu sei, dizer que os únicos drones armados na América Latina são talvez os Mohajers venezuelanos e seus derivados, e os drones civis armados usados por algumas organizações criminosos mexicanas", diz Kleinschmidt.
Joseph Humire, porvez, avalia que a Venezuela tem objetivos que vão muito alémusar os drones ofensivamente.
"É muito mais do que apenas os drones. A Venezuela não quer produzir os drones apenas localmente, mas também exportá-los", diz o analista.
"Na Venezuela, eles estão criando uma estrutura local endógena para produzir dronesmeio a uma estratégia militar mais ampla — algoque os iranianos são muito bonstermosusodrones: capacidades anfíbias assimétricas, basicamente a combinaçãodrones com lanchas rápidasataque e com sistemassatélite que permitem monitorar as águas", explica.
"O Irã faz isso constantemente no EstreitoOrmuz e no Golfo Pérsico. A Venezuela não tem essa capacidade hoje, mas pretende obtê-la no futuro", conclui.
- Este texto foi publicadohttp://vesser.net/internacional-63816546