Aceito na Antiguidade, aborto é debatido desde a Grécia Antiga:poker mini

Protesto pela manutenção do direito ao aborto nos EUA no início dos anos 1990

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Legenda da foto, Protesto pela manutenção do direito ao aborto nos EUA no início dos anos 1990

Tanto na Grécia como na Roma da Antiguidade, o aborto era visto como algo comum. A oposição à prática, quando havia, não se davapoker minidefesa do embrião ou do feto, mas nos casospoker minique o pai argumentava que não queria ser privado do direitopoker minium filho que julgava já ser seu. Vale ressaltar que eram sociedadespoker minique a mulher era considerada propriedadepoker miniseu marido.

A possibilidade do aborto foi considerada inclusive por teóricos da época. O grego Aristóteles (384 a.C - 322 a.C) escreveu que "quando os casais têm filhospoker miniexcesso, faça-se o aborto antes que o sentido e a vida comecem". No seu entendimento, esse marco inicial da vida ocorreriapoker miniforma distinta no casopoker minimeninos — a partir do quadragésimo dia da concepção — epoker minimeninas — a partir do octogésimo dia.

Religião

Na Bíblia, também há indicaçõespoker minique o aborto era praticado nas sociedades antigas do Oriente Médio. Há uma menção no Livro do Êxodo e, principalmente, uma passagem no Livro dos Números. Nesta, está a instrução do que fazer "quando a mulherpoker minialguém se desviar, e transgredir contra ele".

"De maneira que algum homem se tenha deitado com ela, e for oculto aos olhospoker miniseu marido, e ela o tiver ocultado, havendo-se ela contaminado, e contra ela não houver testemunha, e no feito não for apanhada", enfatiza a passagem.

O texto orienta a apresentar essa mulher a um sacerdote e detalha um ritual com "água santa". Muitos interpretam essa passagem como o entendimentopoker miniuma prática abortiva.

Estátuapoker miniAristóteles

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Legenda da foto, Filósofo grego Aristóteles (384 a.C - 322 a.C) escreveu que 'quando os casais têm filhospoker miniexcesso, faça-se o aborto antes que o sentido e a vida comecem'

Curioso é que, no princípio do cristianismo, a nova religião se apresentava como um porto seguro para mulheres que não queriam abortar, mesmo que estivessem gerando filhospoker minirelacionamentos considerados ilícitos —poker miniuma Roma onde a prática era disseminada.

"A questão religiosa foi sendo construída ao longo do tempo. O mundo antigo era um mundo onde o aborto e o infanticídio eram práticas muito comuns. Isso aparece nos filósofos gregos e no mundo romano", pontua o historiador, filósofo e teólogo Gerson Leitepoker miniMoraes, professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie. "O cristianismo se apresenta como uma tentativapoker miniacolher mulheres que não queriam abortar."

"Na medidapoker minique o cristianismo se aproxima e, depois, se apropria do Estado, a gente percebe que a visão cristã que antes era marginal passa a fazer prevalecer a visão contrária ao aborto", conclui Moraes.

A camada teórica dessa discussão sempre foi a ideiapoker miniinício da vida — ou,poker miniforma religiosa,poker minique momento a alma seria colocada no novo ser. Para o mundo ocidental, na maior parte do tempo o consenso foi que isso ocorriapoker minialgum momento entre a semana 18 e a semana 20 da gravidez, justamente quando passa a ser possível perceber movimentações do feto no ventre materno.

"Sobre a questão histórica,poker minique sociedade o aborto era aceito ou não, e como mudou, na verdade a história implica não só a culturapoker minisociedades tradicionais e antigas mas também o conhecimento, o que se sabiapoker miniépocas antigas a respeito do que seria uma gravidez", pontua a socióloga Rosado.

Ela ressalta, por exemplo, que entre os indígenas pré-colombianos "não havia nenhuma restrição ao abortamento", e que a prática era "uma questão resolvida entre mulheres e, mais tarde, por parteiras que cuidavam, realizavam os abortos, muitos por meiopoker miniervas, naturalmente, a partirpoker miniconhecimentos ancestrais".

"O que aconteceu no Ocidente foi que a influência judaico-cristã se tornou muito forte, ao mesmo tempopoker minique se desenvolveu o domínio dos homens na sociedade, o patriarcado. Para nós, mulheres, a possibilidadepoker minicontrolar aquilo que queremos ou não fazer com nossos corpos é fundamental", acrescenta a socióloga.

Novo Mundo

Na América colonial, por exemplo, práticaspoker miniabortamento foram incorporadas mesmo por famíliaspoker minicolonizadores. Em geral, contudo, era um tabu, mantidopoker minisegredo — seja por razões religiosas, seja pela moralidade, pois o procedimento costumava ser utilizado para interromper gravidezes oriundaspoker miniadultérios.

No século 19, contudo, começaram a surgir leis específicas contra o aborto nos Estados Unidos. Em 1900, ali só era aceita a práticapoker minicasospoker mininotório riscopoker minivida para a mãe.

Essas legislações ecoavam as discussões que vinham da Inglaterra, onde desde 1803 o aborto podia ser punido até mesmo com a penapoker minimorte. Lá, o abortopoker minicasopoker miniriscopoker minivida para a gestante só foi autorizado por lei a partir dos anos 1920.

E se na Antiguidade mulheres procuraram refúgio no cristianismo para condenarem o aborto, na América do século 19, o incipiente feminismo foi a salvaguarda argumentativa para quem se posicionava contra a prática.

A precursora da luta feminista Susan Brownell Anthony (1820-1906) considerava o aborto como "assassinatopoker minicrianças". A também ativista Alice Stokes Paul (1885-1977) classificou o aborto como "a exploração final das mulheres".

Em protesto nos EUA, pessoas seguram placas com os dizeres 'Pare o aborto agora'

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Legenda da foto, Em protesto nos EUA, pessoas seguram placas com os dizeres 'Pare o aborto agora'

O panopoker minifundo para essas visões é o mesmo que hoje condena o aborto, afinal: o prisma machismo da sociedade. Afinal, se o aborto era utilizado como uma tentativapoker miniacobertar um adultério, como se a tal honra fosse maior do que o direito da mulherpoker miniter aquele filho, as feministas precisavam lutar contra essa imposição. Hoje, se a criminalização do aborto impede que as mulheres exerçam o controle sobre seus corpos e tenham direito à escolha, as feministas entendem a necessidadepoker minilutar pela liberação.

"Em vários casos, não só no cristianismo, a principal causa para se criminalizar a prática não é a vidapoker miniquestão, mas, na verdade, o poder dos homens", analisa a socióloga Rosado. "Porque aquilo que se desenvolvia no corpo feminino era consideradopoker minialguma maneira propriedade dos homens. E, portanto, a mulher não poderia dispor desse ser que se desenvolvia sem o que o homem permitisse."

Onda conservadora

"O controle do corpo da mulher está sempre colocadopoker minipauta, está sempre pressuposto. E o [direito ao] aborto é fundamental porque temospoker miniter o direitopoker minidecidir sobre nosso corpo", afirma a historiadora Rosin. "Uma mulher não é um hospedeiro, não é uma chocadeira."

"Em última instância, [praticar ou não o aborto] essa é uma decisão da mulher, não deveria, um tema tão espinhoso e tão delicado, um tema como este não deveria ser politizado nesse nível", diz Moraes.

O historiador demonstra preocupação porque "a onda conservadora que vemos nos Estados Unidos" tem "reflexos aqui, porque o Brasil é uma cópia malfeita do que acontece lá, uma espéciepoker minipuxadinho".

"É um tema que inicialmente quem assumia uma posição muito clara era a Igreja Católica, mas que os evangélicos acabaram copiando esse modelo também. Determinados grupos encontraram no assunto um tema catalisador, que aglutina, faz com que vire uma bandeira. São grupos mais conservadores, mais radicais, fundamentalistas", explica Moraes.

"É um aspectopoker minimanifestaçãopoker miniuma onda conservadora muita forte e os grupos conservadores no Brasil copiam esses exemplos norte-americanos tentando cooptar pessoas para essa causa, demonizando quem é contrário", complementa ele. "E essas mesmas pessoas que assumem uma posição 'a favor da vida', são pessoas que defendem a penapoker minimorte. Há contradições nesse sentido."

Protesto a favor do abortopoker miniSão Paulo, 2017

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Legenda da foto, Especialistas se preocupam com os reflexos da onda conservadora dos Estados Unidos no Brasil

Rosado acrescenta que "essa discussão sobre uma vida" a partir da concepção "é moderna, muito recente". "Ela se desenvolveu naquele setor mais conservador da sociedade, que passou a penalizar as mulheres, criminal e religiosamente, considerando o aborto um delito sujeito a pena ou um pecado sujeito a uma pena simbólica", diz a socióloga.

Para a antropóloga Debora Diniz, professora na Universidadepoker miniBrasília (UnB), "nunca foi uma questão sobre um processo evolutivo da sociedade", mas sim um indicativopoker mini"maior ou menor fragilização democrática desde que começamos a tratarpoker minidireitos das mulheres e direitos humanos".

"Desde o momentopoker minique temos Estado com suas próprias leis, [permitir ou não o aborto] é um sinalpoker miniestabilidade democrática epoker miniproteção aos direitos fundamentais", defende a pesquisadora. "O que está ocorrendo nos Estados Unidos parece um contraprocesso históricopoker minidireitos fundamentais, porque houve uma fragilização democrática no período do governo [Donald] Trump."

'Este texto foi originalmente publicadopoker minihttp://vesser.net/internacional-61950222'

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