Contraditório e 'bígamo', peronismo chega aos 75 anos ainda decisivo na Argentina:
Recentemente, sem citar especificamentecolegachapa, Fernández disse que o peronismo é "bígamo", por serdireita eesquerda.
Na cédula eleitoral da coalizãoFernández eCristina, FrenteTodos, está uma foto do casal Perón e Evita, como lembra o historiador Santiago Régolo, do Instituto NacionalPesquisas Históricas Eva Perón,Buenos Aires.
'María Eva'
Perón e Evita formaram o casal mais poderoso da Argentina entre 1946, quando ele foi eleito presidente pela primeira vez, e 1952, quando ela morreu aos 33 anos.
E ainda hoje é possível ouvirBuenos Aires e no interior do país - emboramenor frequência que tempos atrás - expressões como "um dia peronista" (ensolarado), "Santa Evita" e "São Perón". E mulheres argentinas são comumente batizadas com nomes como María Eva,homenagem a Evita, que se chamava María Eva DuartePerón.
Seu rosto e oPerón são constantes - junto ao do ex-guerrilheiro Ernesto 'Che' Guevara - nos cartazes dos protestos dos movimentos sociais no país. Em uma das principais avenidasBuenos Aires, a NoveJulho, é possível ver um imenso desenhoEvita, inaugurado na gestãoCristina, no prédio histórico do MinistérioObras Públicas.
Duas raízes?
Mas aqueles sete anosvida pública juntos,Perón eEvita, geram ainda hoje um debate sobre as raízes do peronismo.
Há quem entenda que Perón (1895-1974) e Evita (1919-1952) representam duas raízes diferentes do movimento político. Há quem diga que os dois foram complementares. E há quem entenda que o peronismo é principalmente ele, tendo ela como umasuas facetas.
A BBC News Brasil entrevistou os principais biógrafosPéron eEvita, pesquisadores argentinos e peronistas. Para alguns deles, esta visão, da Evitaesquerda, foi alimentada, por exemplo, pelo estiloEvita para quem,um lado estavam os pobres (que chamava"descamisados") e do outro os ricos ("as oligarquias").
"Historicamente, enquanto Evita viveu, houve um setor do poder, como os sindicatos, que respondia a ela. Mas esse setor não se caracterizava por seresquerda, como se reivindicou, mais tarde, nos anos 1970. Isso é um mito. Ela era conservadora e dominante, com a ideia totalitária do poder", disse o cientista político argentino Vicente Palermo, do centroestudos Conicet, da Argentina.
Para ele, Evita não era politicamente pragmática como Perón. "Ela era mais divisória. Quem não estava com Péron, que para ela era um deus, era um inimigo", observa.
Palermo e um dos principais biógrafosPerón, o professor americano Joseph A. Page, da Universidade Georgetown,Washington, lembraram que Evita chegou a comprar armas na Europa para distribuir nos sindicatos argentinos para que eles protegessem o então presidenteum possível golpe. Quando o golpe ocorreu1955 e quando as armas chegaramBuenos Aires, ela já tinha morrido.
Questionado se concordava com a ideiaque o peronismo tem duas raízes, aPerón e aEvita, Page responde: "Sim e não".
Ele argumenta que, primeiro, é preciso entender o contexto do início do peronismo. "Quando Perón foi eleito, seus inimigos políticos diziam que era Eva que tinha o poder e a chamavam'a presidenta'. Mas isso não tinha que ver com a política, mas sim com uma formadizer que ele era 'menos macho', porque dependia dela".
Page acha que essa visão foi transmitida na ópera e no filme Evita, interpretado por Madonna (em 1996), mas que o roteiro pode ter sido influenciado por antiperonistas. Dizer que Evita era mais poderosa que Perón era uma formaatacá-lo, interpreta o biógrafo.
"Se fosse viva, Evita seria guerrilheira"
Já nos anos 1960 e início dos anos 1970, quando o ex-presidente retornou do exílio (para onde embarcou depois do golpe1955), os jovensesquerda que idealizavam o ex-guerrilheiro argentino cubano 'Che' Guevara (1928-1967) queriam atrair a classe trabalhadora para uma revolução.
"Mas eles tinham um problema porque,acordo com Marx a revolução era feita com a classe trabalhadora, mas a classe trabalhadora na Argentina era totalmente peronista. E o peronismo era direita, esquerda, tudo. Os jovens perceberam, então, que não poderiam criar na Argentina a revolução que eles pensavam. Quando Perón voltou à Argentina, nos anos 1970, esses jovens levantaram a bandeiraque Evita eraesquerda. E com o slogan: 'Se Evita vivesse, seria montonera'", disse Page.
Os montoneros eram um grupo guerrilheiro ligado ao peronismo. O episódio da "Evita guerrilheira" foi rechaçado por Perón, recordam historiadores, contribuindo para alimentar a suposta divisão dos peronistas e das raízes do peronismo.
Na visão da biógrafaEvita, a espanhola Marysa Navarro, do CentroEstudos Latino-Americanos David Rockefeller, da UniversidadeHarvard, a ex-primeira-dama era "principalmente peronista".
"Na minha pesquisa não achei nada que pudesse indicar que ela fosseesquerda. O apoio que ela tinha dos sindicatos eretórica apaixonadadefesa dos mais necessitados não a levaram a seresquerda", disse Navarro.
Para Santiago Régolo, professor da Universidade Nacional LomasZamora (UNLZ), Perón e Eva se complementavam. "ApesarPerón ter sido presidente e ela não, Eva era responsável pela ramificação feminina, pela vinculação com os sindicatos e com a questão social como um todo a partir da Fundação Eva Perón", disse.
Vem daí a imagemque ela era maisesquerda e eledireita?
"Ela era mais contestatória e tinha um trabalho político e social, e ele, por ser militar, deixava uma imagem mais conservadora e mais à direita. Mas acho que não se pode explicar Eva sem Péron e Perón sem Eva".
Foi Eva, lembra Régolo, que impulsou o voto feminino na Argentina e a primeira eleiçãomulheres para o Congresso Nacional, defendendo o mesmo espaço para homens e mulheres na política já nos anos 1950.
"Furacão"
Para o intelectual peronista Pascual Albanese, que há anos se dedica ao peronismo, a comparação entre Perón e Evita não pode ser similar e a raiz do movimento político é centrada no ex-presidente.
"Sem dúvida Eva é um emblema importante para o peronismo. Teve papel fundamental para a ala feminina da política. Mas ela é um dos rostos do peronismo. Perón, porém, é muito mais integral porque, como homemEstado, ele tinha uma visão mais ampla, incluindo o doméstico, a justiça social e o internacional", opina Albanese.
Ele recorda que Perón foi presidente da Argentina por quase dez anos seguidos e, mais tarde, entre outubro 1973 e junho 1974, até morrer, e Evita nunca teve mandato. Em contrapartida, Evita foi, ainda na opiniãoAlbanese, como "um furacão" que passou pela história argentina - com pouco tempovida pública, teve grande impacto, organizando, inclusive, o primeiro partido feminino (Partido Peronista Feminino), extinto no golpe1955.
"Foi como um furacão na Argentina. Mas ela e Perón não estão no mesmo patamar. O peronismo se chama peronismo e não evismo. É verdade que muita gente acha que, se ela estivesse viva, porpersonalidade, Perón não teria caído (em 1955). Mas essas são especulações, porque a história teve outro curso", diz.
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