As homenagenspixbet x1Bolsonaro a Pinochet e por que o general ainda divide o Chile:pixbet x1
O posicionamento foi reverberadopixbet x1falas recentespixbet x1seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), quepixbet x1dezembro visitou o Chile e declarou que Pinochet havia sido responsável por impedir que o país "se convertesse numa nova Cuba"; e pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
No dia da chegada do presidente ao país, Lorenzoni afirmou,pixbet x1entrevista à Rádio Gaúcha, que "o Chile tevepixbet x1dar um banhopixbet x1sangue" no período Pinochet. "Triste, o sangue lavou as ruas do Chile, mas já passaram oito governospixbet x1esquerda e nenhum mexeu nas bases macroeconômicas colocadas no Chile no governo Pinochet", afirmou.
Boicote a encontro
As declaraçõespixbet x1Lorenzoni revoltaram os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados do Chile. O presidente da Câmara, Ivan Flores, disse ao jornal O Globo que as falas eram um "desatino sem paralelo" e uma grave ofensa às vítimas da ditadurapixbet x1Pinochet - engrossando as manifestaçõespixbet x1resistência à chegada do presidente brasileiro.
Os presidentes das duas casas legislativas já haviam anunciado a recusapixbet x1participar do almoço para recepcionar Bolsonaro que será oferecido pelo presidentepixbet x1centro-direita do Chile, Sebastián Piñera, no palácio presidencial, La Moneda. A solenidade no sábado tem 90 convidados.
Deputados da oposição apresentaram uma moção pedindo que Piñera declarasse Bolsonaro persona non grata por seus "claros incentivos à discriminaçãopixbet x1classe,pixbet x1gênero epixbet x1orientação sexual", "por não defender a democracia e endossar a tortura" e "pela incitação ao ódio e a violaçõespixbet x1direitos humanos", nas palavraspixbet x1parlamentares da oposição.
Movimentos sociais, estudantis e grupospixbet x1esquerda convocaram protestos contra Bolsonaro para esta sexta-feira.
Quem foi Pinochet?
Augusto Pinochet liderou o golpe que derrubou o presidente Salvador Allende e o chamado governo da Unidade Popular, eleito democraticamente,pixbet x111pixbet x1setembropixbet x11973, com apoio dos Estados Unidos.
Instaurou uma ditadura militar que durou até marçopixbet x11990, mantendo-se como homem forte do país durante todo o período.
Na ditadura chilena, 3.065 militantes, liderançaspixbet x1esquerda e intelectuais foram assassinados pelo Estado, e quase 40 mil foram torturados,pixbet x1acordo com relatórios produzidos por comissões da verdade após o fim do regime.
Pinochet é visto como uma figura nefasta por muitos chilenos, imagem que se consolidou internacionalmente devido aos milharespixbet x1crimes ocorridos sob a ditadura.
Mas conta até hoje com simpatizantes nos segmentos mais conservadores do país, que veem o golpepixbet x11973 como um freio ao socialismo - e suas medidas econômicas como base para o Chile ter hoje o maior PIB per capita na América do Sul, e manter um nívelpixbet x1crescimento robusto (o PIB cresceu 4%pixbet x12018, contra 1% no Brasil).
Pinochet promoveu privatizações, abriu o mercado e promoveu políticas baseadas na cartilha neoliberal da chamada Escolapixbet x1Chicago, onde estudaram diversos membrospixbet x1sua equipe econômica. Os "Chicago Boys" da ditadura inspiram a admiração dos Bolsonaros - "Agora nós também temos o nosso Chicago Boy", gabou-se Eduardo recentemente, referindo-se ao Ministro da Economia, Paulo Guedes.
"Pinochet ainda tem muitos seguidores, mas tem muitos detratores", diz o cientista político chileno Raul Elgueta, professor do Institutopixbet x1Estudos Avançados da Universidadepixbet x1Santiago do Chile. "Em todo caso, hoje existe um consenso no Chilepixbet x1torno da condenação à violação dos direitos humanos", destaca.
Para a historiadora Elisa Borges, é preciso olhar para o governopixbet x1Salvador Allende, estabelecido como uma coalizão entre os partidos Comunista e Socialista, para entender a controvérsia.
"A propaganda política da ditadura fez uma contraposição muito forte com o período anterior, negando qualquer tipopixbet x1visão positiva do governo Allende. A ditadura se vendeu como tendo salvado o país do comunismo, apresentando o neoliberalismo e o próprio Estado autoritário como uma medida necessária para enfrentar o comunismo no país", afirma Borges, professorapixbet x1História da América Contemporânea na Universidade Federal Fluminense (UFF). Ela ressalta que na época não havia liberdadepixbet x1imprensa nem espaço para o contraditório.
"Essa é uma imagem da ditadura que muitos chilenos sustentam até hoje, apixbet x1que Pinochet salvou a economia e era a única saída contra o comunismo", diz Borges, pesquisadora da História chilena.
Detençãopixbet x1Londres
Enquanto o Brasil publicavapixbet x1nova "Constituição Cidadã",pixbet x11988, Pinochet, sob crescente oposição interna e externa, convocou um plebiscito para que a população decidisse se poderia concorrer a um novo mandato. A vitória do "não" o pegoupixbet x1surpresa, epixbet x1marçopixbet x11990 entregou o cargo ao primeiro presidente que os chilenos puderam eleger desde 1970, Patricio Aylwin.
Mesmo após o fim da ditadura, o general se mantevepixbet x1posiçõespixbet x1poder por quase uma década. Ocupou o cargo mais alto nas Forças Armadas até 1998, e permaneceu intocável à Justiça apesar dos esforços da Comissão Rettig, montada no início do governo Aylwin para revelar as violaçõespixbet x1direitos humanos ocorridas durante a ditadura. Em 1998, assumiu o postopixbet x1senador vitalício.
No mesmo ano, entretanto,pixbet x1viagem a Londres para realizar uma cirurgia, o general foi preso, aos 82 anos, a pedido do juiz espanhol Baltasar Garzón - o magistrado acusava Pinochet por execuções, torturas e desaparecimentopixbet x1pessoas durante a ditadura, baseando-sepixbet x1casospixbet x1vítimas espanholas. Pinochet ficoupixbet x1prisão domiciliar por 503 dias.
No Brasil, o então deputado Jair Bolsonaro subiu à tribuna do Congresso para repreender a ação do juiz e defender Pinochet. O que seria pior para um país, questionou: "O que o general Pinochet talvez tenha feito no passado, exterminando, matando baderneiros, ou a democracia no país (Brasil), que hoje mata milhões pelo descaso?", comparou.
O Reino Unido negou a transferênciapixbet x1Pinochet para a Espanha, mas o caso foi um marco na jurisprudência internacional sobre crimes contra a humanidade.
Corrupção e tráfico
Outra polêmica que rondou a imagempixbet x1Pinochet após o fimpixbet x1seu governo foi a revelaçãopixbet x1contas mantidas secretamentepixbet x1bancos no exterior. Enquanto investigava casospixbet x1lavagempixbet x1dinheiro, uma subcomissão do Senado dos EUA acabou encontrando os valores mantidos pelo ex-general epixbet x1família no Riggs Bank, organização com sedepixbet x1Washington e filiaispixbet x1Londres.
Pinochet epixbet x1família mantinham, segundo o Senado americano, cercapixbet x1US$ 8 milhõespixbet x1contas na instituição - os valores teriam sido depositados entre 1994 e 2002. Somado aopixbet x1outras contaspixbet x1outros bancos estrangeiros, o valor subia para quase US$ 15 milhões.
A investigação revelou,pixbet x12004, que Pinochet conseguira transferir, enquanto estava detido, cercapixbet x1US$ 1,6 milhão do total para uma conta nos EUA.
No ano passado, a Suprema Corte chilena ordenou à família do ex-general que devolvesse aos cofres públicos parte dos valores - cercapixbet x1US$ 5,1 milhões,pixbet x1acordo com a sentença.
Segundo a historiadora Elisa Borges, se no exterior a imagem negativa do general já era consolidada devido aos crimes da ditadura, no Chile as acusações foram "um divisorpixbet x1águas".
"A partir daí, a imagem dele passa a ser questionada por setores da população que até então o apoiavam, principalmente segmentos da classe média e da classe média alta que tinham um discursopixbet x1que militares não estavam envolvidospixbet x1corrupção", afirma Borges.
A partir daí, afirma, começou a haver também um questionamento moralpixbet x1torno do ex-ditador. "As pessoas começaram a se perguntar: 'ele dizia que salvou a pátria, mas roubapixbet x1benefício próprio e da família? Como se explica o crescimentopixbet x1seu patrimônio?'".
O general foi alvopixbet x1300 processos judiciais no fim da vida, alémpixbet x1acusaçõespixbet x1corrupção epixbet x1enriquecimento com a venda cocaína produzidapixbet x1instalações do Exército - mas nunca foi a julgamento.
Alguns dos ex-chefes dos órgãospixbet x1repressãopixbet x1seu governo, entretanto, foram condenados a dezenaspixbet x1anos na prisão por crimes como tortura, sequestro e desaparecimentopixbet x1pessoas.
'Nunca mais!'
Durante a ditadura chilena, o governo usava fortemente o aparatopixbet x1repressão para controlar a narrativa sobre suas políticas.
Segundo Samantha Quadrat, professorapixbet x1História da América na UFF, as medidas neoliberais econômicas foram implementadas sem espaço para debate na sociedade, ao mesmo tempopixbet x1que se alimentava a ideiapixbet x1que o governo Allende havia sido um caos.
"Havia uma disputa muito grande da memória, e isso é visível até os diaspixbet x1hoje", afirma a historiadora.
Essa memória começou a ser "desconstruída" com uma sériepixbet x1políticas implementadas a partir dos anos 1990.
No esforçopixbet x1promover uma reconciliação com o passado e dizer "nunca mais!", o Chile tem operado uma extensa revisão dos crimes que ocorreram na ditadura, buscando responsabilizar e punir militares e civis envolvidos na violaçãopixbet x1direitos humanos, indenizar vítimas e revelar a extensão dos crimes - processo radicalmente diferente do ocorrido no Brasil, onde agentespixbet x1Estado nunca foram punidos por crimes cometidos durante a ditadura.
O marco inicial desse processo no Chile foi a instalaçãopixbet x1uma Comissão da Verdade logo após o fim do regime, cujo relatório foi publicadopixbet x11991, um ano depois. Já o Brasil só instalou uma Comissão da Verdadepixbet x12012, durante do governo da ex-presidente Dilma Rousseff, quase 30 anos após o fim do regime militar brasileiro.
Os esforços incluíram o estabelecimentopixbet x1maispixbet x1200 centros ligados à memória da ditadura ao redor do país, como a Clínica Santa Lucía, Londres 83 e o Estádio Nacionalpixbet x1futebol,pixbet x1Santiago, usados como centrospixbet x1detenção e tortura durante o regime - e hoje abertos a visitação para que não se esqueça esse passado.
"A ideia épixbet x1que é preciso lembrar para não repetir, não deixar acontecerpixbet x1novo", diz Maria Paula Nascimento Araujo, professorapixbet x1História contemporânea na Universidade Federal do Riopixbet x1Janeiro (UFRJ).
Disputaspixbet x1narrativa
Entretanto, visões diferentes sobre passado ainda dividem o país, como ilustram frequentes disputaspixbet x1narrativa.
Inauguradopixbet x12011 pela então presidente Michelle Bachelet, cujos pais foram perseguidos pela ditadura, o Museu da Memória e dos Direitos Humanos,pixbet x1Santiago, foi construído para lembrar as vítimas das violaçõespixbet x1direitos humanos.
Em agosto do ano passado, o recém-empossado ministro da Cultura do governo Piñera foi derrubado dias por fazer críticas ao museu. Mauricio Rojas havia tachado o espaçopixbet x1"um museupixbet x1esquerda, para contar uma versão falsa da históriapixbet x1Chile", e disse que era uma "montagem" para deixar o espectador "atônito" e "impedir-lhepixbet x1raciocinar". As críticas geraram protestos e Rojas foi destituído.
As disputas sobre como a história do golpe e da ditadura deve ser contada também se deu nas salaspixbet x1aula. Após a ditadura, os currículos escolares foram reformulados, e o ensino sobre a ditadura e sobre o governo da Unidade Popular,pixbet x1Allende, se tornou obrigatório.
Até então, diz a historiadora Samantha Quadrat, predominava o modelo estabelecido por Pinochet, que introduziu disciplinas como Educação Moral e Cívica, como no Brasil durante a ditadura, e privilegiava um modelopixbet x1ensino sem contestação, baseadopixbet x1uma história "tradicional,pixbet x1heróis, fatos e datas, sem uma pedagogia crítica", afirma.
Em 2012, entretanto, o governo do presidente Piñera,pixbet x1seu primeiro mandato, enfrentou protestos acirrados quando tentou mudar a terminologia usada nos livros escolares. A orientação era usar a expressão "regime militar", e nãopixbet x1ditadura, e suprimir a palavra "golpe". A oposição denunciou tentativaspixbet x1maquiar a realidade, e o governo voltou atrás.
Bolsonarismo
Quando Pinochet morreu,pixbet x12006, Bolsonaro remeteu ao Itamaraty um telegrama para ser entregue ao seu neto, Augusto Pinochet Molina, cumprimentando o neto do "saudoso general" e afirmando que o "elevado índicepixbet x1desenvolvimento humano ora desfrutado pelos irmãos chilenospixbet x1muito se deve às ações desenvolvidas" no governo autoritário. À época, o Itamaraty se negou a transmitir o telegrama.
A morte gerou forte debate no país sobre "como fazer o velóriopixbet x1um ex-ditador", lembra Samantha Quadrat, ilustrando as divisões no país.
"Teve gente que considerou o fimpixbet x1uma era e comemorou a mortepixbet x1uma figura nefasta. Outros lamentaram, e buscaram alguma formapixbet x1se despedir", lembra. O governopixbet x1Bachelet acabou optando por não prestar honraspixbet x1Estado, nem declarar luto oficial.
"O Brasil é um país importante para as políticas latino-americanas, e as decisões tomadas aqui impactam os países vizinhos", lembra a historiadora. "Você ter um presidente que defende a ditadura, não só a nossa como dos países vizinhos, repercute nos demais países."
"Em um momentopixbet x1que a América Latina caminha para governospixbet x1direita", afirma, um presidente externar publicamente posiçõespixbet x1que "a ditadura não foi tão ruim assim" tem preocupado especialistas e organizaçõespixbet x1direitos humanos na região.
Elisa Borges ressalta que o Chile está até hoje se esforçando para resolver os problemas deixados pela ditadura, e engajado no processopixbet x1apuraçãopixbet x1seus crimes políticos. Nesse contexto, a chegadapixbet x1um líder político com o históricopixbet x1posicionamentospixbet x1Bolsonaro sobre minorias e sobre a ditadura gera incômodo:
"A pauta dos direitos humanos é muito cara ao país. O Chile tem ainda vários traumas e questões abertas sobre o processo ditatorial", diz a historiadora da UFF.
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