Brasileiras contam como foi 1º diamulheres ao volante na Arábia Saudita:

Alice no carro

Crédito, Alice Souza/Arquivo pessoal

Legenda da foto, Alice Ferreira Souza na foto que postouseu perfil nas redes sociais para mostrar apoio ao fim da proibiçãomulheres dirigirem na Arábia Saudita

Na verdade, Alice vai ter que aguardar um pouco para ir além da voltinha no quarteirão. Por enquanto, a validação da carteira internacional só está disponível, entre as estrangeiras, para americanas e inglesas, informa ela.

"Todo dia entro no sistema para ver se vão liberar para nós", conta. "Com a carteira, minha vida vai mudar. Se eu quiser sair para almoçaralgum lugar, tomar um café com alguém ou resolver qualquer coisa, vai ser muito mais simples", afirma.

Gabriela pertoplaca sinalizando placaestacionamento para mulheres

Crédito, Gabriela Delfino/Pra láBagdá

Legenda da foto, Gabriela Delfino mostra espaçoestacionamento para mulheresAl Khobar, na Arábia Saudita

A brasileira, que ficou "chocada" com as restrições às mulheres quando se mudou para o país, afirma que nos últimos anos as transformações na sociedade saudita são nítidas.

"Hoje a mulher pode votar, as empresas são obrigadas a contratar trabalhadoras do sexo feminino. Nos eventospetróleo, já vejo mulheres com a abaya (veste longa obrigatória) aberta, mostrando a roupa, algo que antes não acontecia", diz.

Mulheres na academia

Também moradoraAl Khobar, a gaúcha Gabriela Lirio Delfino, 29, é outra brasileira que vivencia as mudanças no país árabe. Personal trainer numa academia para mulheres, ela diz que até dois anos atrás quase não existiam lugares para as sauditas se exercitarem, por exemplo.

Sobre o fim do veto à direção, Gabriela afirma que há tempos existia um rumorque iria acontecer.

"As pessoas estavam desacreditadas, porque todo ano falavam que iam permitir e nada", lembra. "Mas hoje eu cheguei ao trabalho e me emocionei. Minhas alunas estão super felizes. Uma delas disse que já veiocarro para a academia. E os policiais estão distribuindo flores para as mulheres na direção", relata.

Ela se mudou para a Arábia Saudita há três anos, acompanhando o marido, que é químicouma petroleira. Diz que está gostando do país, apesar das restrições:

"Tudo tem um lado bom e um ruim. Aqui abri minha cabeça, tenho contato com uma cultura diferente. Tento compensar as limitações indo para o Bahrein, que fica a uma horacarro. Lá tem muito mais liberdade. Eu e meu marido vamos ao cinema, as mulheres dirigem normalmente."

Huda al-BadricarroRiad

Crédito, EPA

Legenda da foto, Tão logo a proibição foi retirada, mulheres como Huda al-Badri,30 anos, posaram para fotos atrás do volante

Em seu blog Pra láBagdá, onde conta seu dia a dia no país, Gabriela fez um post com o passo a passocomo validar a carteira internacional com a nova lei.

Ela também fez um vídeo e tirou fotosum dos estacionamentos com vagas específicas para mulheres que foram criados após o anúncio do fim da proibição.

Para se deslocar, atualmente a brasileira usa táxi, Uber e um concorrente desse aplicativo muito utilizado na região, o Careem. Para ir e voltar do trabalho,empresa envia um motorista particular.

Motoristas privativos

Na Arábia Saudita, muitas famílias contratam motoristas para ficarem à disposição das mulheres –geral, são trabalhadores paquistaneses ou indianos levados para lá com esse objetivo. Segundo o jornal local Arab News, o númerofamílias com chofer privativo supera 80%.

Por isso, muitas sauditas não têm pressatirar a carteira para dirigir. "Tem mulheres que nem vão querer dirigir. E tem algumas que agora querem contratar motoristas mulheres, algo que antes não era possível", conta a mineira Herika Santos, 30, que mora na capital saudita, Riad, há dois anos com o marido canadense.

Estacionamento para mulheresAl Khobar, na Arábia Saudita

Crédito, Gabriela Delfino/Pra láBagdá

Legenda da foto, Placas como essa seriam inimagináveis na Arábia Saudita alguns anos atrás

Muçulmana, ela comemora a nova lei. "Dirigir ou não tem que ser uma escolha da mulher, assim como usar o hijab (lenço que cobre a cabeça). No Islã não existe base para esse tipoproibição. É uma questão política", afirma.

Segundo Herika, muitos homens sauditas apoiam o fim do veto: "A geração mais jovem é mente aberta. E vai aliviar para eles, porque não vão ter que pagar motorista ou ficar levando e buscando a esposatodo lugar".

O trânsito caótico do país é outro fator que tem impedido algumas sauditasassumir o volante. "É uma bagunça. Os motoristas aqui não são muito civilizados, não respeitam as leis, não dão sinal", diz Gabriela Delfino, acrescentando que algumassuas alunas preferiram esperar um pouco para ver como vai ser a nova lei na prática, até porque existe um receioque as mulheres ao volante sejam hostilizadas.

"Vou comprar um carro bem duro, tipo um jipe usado, porque sei que eles vão se jogarcimamim, ainda mais eu sendo mulher", confirma Alice Souza. À medida que foi se aproximando o domingo do início da nova lei, ela recebeu diversas mensagensconcessionáriasveículos oferecendo "test drives".

O fim do veto à direção feminina é tido também como uma estratégia do príncipe Salman para aquecer a economia. Além dos novos carros que serão vendidos, a aposta éque haverá mais consumocombustível, mais mulheres poderão trabalhar livremente, novos negócios surgirão e o gasto que antes as famílias destinavam aos motoristas particulares estrangeiros será investidooutros setores dentro do país.