Como acontecem os surtos psicóticos coletivos:load zebet code
Entenda a seguir como acontecem esses surtos psicóticos coletivos e o que pode ser feito para prevenir ou combater eventos desse tipo.
Emoções são transmissíveis
O psiquiatra José Gallucci Neto explica que a reação psicogênicaload zebet codemassa é um problema "coletivo e compartilhado, que envolve sintomas físicos ou emocionais e para os quais não existe uma causa biológica ou um fator externo".
Em outras palavras, a reação daqueles indivíduos não pode ser explicada por uma doença infecciosa ou pela intoxicação por um gás que contaminou o ambiente que eles compartilham, por exemplo.
"O que desencadeia esse processo é o psicológico, a proximidade e o compartilhamentoload zebet codecrenças entre as pessoas", diz o especialista, que é diretor do Serviçoload zebet codeEletroconvulsoterapia e Eletroencefalografia do Institutoload zebet codePsiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicasload zebet codeSão Paulo.
"Ao ver alguém passando mal, nosso próprio psiquismo pode nos sugestionarload zebet codeque também estamos sofrendo com aqueles mesmos sintomas. Na sequência, começamos a 'monitorar' o corpo e interpretar qualquer sinal como algo preocupante."
"Isso, porload zebet codevez, gera uma reaçãoload zebet codecadeia e leva a surtos coletivos", completa o médico.
Entre os sintomas típicos da reação psicogênicaload zebet codemassa, Gallucci lista faltaload zebet codear, tontura, sensaçãoload zebet codedesmaio, ânsiaload zebet codevômito, náuseas, crisesload zebet codeansiedade, contrações musculares, convulsões e paralisias.
E tudo isso acontece justamente pelo fatoload zebet codevivermosload zebet codesociedade e nos importarmos com os sentimentos dos outros, especialmente daquele grupo mais próximo e com o qual nos relacionamos.
"A sociabilidade é uma necessidadeload zebet codesobrevivência da nossa espécie", analisa o psiquiatra Lucas Spanemberg, pesquisador do Instituto do Cérebro do Rio Grande do Sul.
"Nosso psiquismo é estruturado a partir dessa capacidade humanaload zebet codese importar, se empatizar, se comunicar e se afetar pelo comportamento dos outros", complementa o especialista, que também é professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Embora adolescentes sejam o grupo com maior propensão a ter reações coletivas do tipo (por serem naturalmente mais influenciáveis pelo ambiente externo), já foram registrados fenômenos do tipoload zebet codevários perfis.
Na Primeira Guerra Mundial, por exemplo, alguns soldados que ficavam meses ou anos nas trincheiras tiveram o chamado shell shock, um quadroload zebet codetorpor profundo, com uma incapacidadeload zebet codese mover, falar ou fazer qualquer outra atividade.
Vale dizer aqui que muitos desses conceitos ainda são temaload zebet codeintenso debate dentro da comunidade médica. A própria Organização Mundial da Saúde (OMS), por exemplo, não gosta do uso da palavra "psicogênico" para descrever essas reações emocionais massivas.
No passado, inclusive, chegou-se a classificar esse quadro como "histeria coletiva". Mas o termo caiuload zebet codedesuso e hoje é até considerado inadequado. Histeria, que vem do grego histerus, ou útero, era um quadro que os médicos do passado erroneamente associavam somente às mulheres, como se transtornos mentais apenas acontecessem no sexo feminino e estivessemload zebet codealguma maneira relacionados à faltaload zebet codesexo ou às disfunções no aparelho reprodutor.
Agudos ou crônicos
De forma geral, as reações psicogênicasload zebet codemassa podem ser divididasload zebet codedois grandes grupos: os casos agudos e os crônicos.
"A reação aguda normalmente aconteceload zebet codeforma repentina, é transitória e a maioria dos quadros se resolveload zebet codemenosload zebet code24 horas", resume o médico Renato Luiz Marchetti, que coordena o Projetoload zebet codeEpilepsia e Psiquiatria do IPq,load zebet codeSão Paulo.
"Provavelmente, se forem tomadas as condutas corretas, episódios do tipo não se repetirão e não vão ser incapacitantes para quem for acometido", completa.
Pelas poucas informações disponíveis, os especialistas acreditam que o episódio recente no Recife se encaixe nessa primeira definição.
Já nas reações psicogênicasload zebet codemassa que são crônicas, a situação se torna um pouco mais desafiadora.
"Nesse caso, normalmente existe um tempo entre o estímulo e a ocorrência dos sintomas. O curso da crise também é arrastado e bem mais incapacitante", descreve Marchetti.
Os indivíduos acometidos por esse tipo podem desenvolver tremores, tiques, perdaload zebet codeforça muscular e até paralisiaload zebet codemembros — manifestações relacionadas à influência das emoções no sistema nervoso.
O exemplo mais recenteload zebet codeuma reação massiva e crônica aconteceu no Acreload zebet codemeadosload zebet code2012 a 2017.
Um grupoload zebet code74 adolescentes (emload zebet codemaioria meninas) começou a apresentar incômodos sérios, como convulsões e paralisias, após tomarem a primeira dose da vacina que protege contra o HPV, vírus que está por trás do câncerload zebet codecoloload zebet codeútero e diversos outros tiposload zebet codetumores.
Dianteload zebet codemanifestações tão atípicas, a primeira reaçãoload zebet codetodos os envolvidos foi suspeitar que o imunizante era o culpado.
O assunto ficou tão sério que o Ministério da Saúde resolveu lançar uma investigação formal e convocou Gallucci e Marchetti, dois dos médicos ouvidos nesta reportagem, para conduzir os estudos.
"Nós selecionamos os 12 pacientes mais graves e trouxemos para São Paulo, onde ficaram internados e passaram por uma sérieload zebet codeexames, como ressonância magnética e análise do líquor [líquido que circunda o cérebro e a medula espinhal]", relata Gallucci.
A partir dessa bateladaload zebet codetestes, a meta dos especialistas era descobrir se havia alguma evidênciaload zebet codeum efeito das dosesload zebet codevacina no sistema nervoso desses adolescentes. Os resultados mostraram que não havia nenhuma lesão ou substância que explicasse as convulsões e as paralisias.
"O caso do Acre, na verdade, foi uma reação psicogênicaload zebet codemassa que se tornou crônica, sem que ninguém fizesse o diagnóstico correto e propusesse um tratamento adequado", analisa Gallucci.
Os resultados da investigação brasileira foram publicadosload zebet codeoutubroload zebet code2020 no periódico especializado Vaccine.
"No Acre, nós vimos como a ocorrênciaload zebet codeum quadro desses é algo complexo, que dependeload zebet codeum conjuntoload zebet codefatores. As meninas acometidas faziam parteload zebet codegrupos sociais com problemas importantes, que envolviam uma cultura patriarcalload zebet codecrise, conflitos familiares, uso inadequadoload zebet coderedes sociais, influência religiosa e uma crença antivacina muito importante", lista Marchetti.
Em suma, o próprio medoload zebet codeque a vacina contra o HPV pudesse causar algum efeito colateral foi suficiente para que esses jovensload zebet codefato desenvolvessem reações graves (sem que o imunizante tivesse algo a ver com isso). E, considerando que as emoções são contagiosas, esse cenário gerou uma reaçãoload zebet codecadeia num grupo que apresentava uma sérieload zebet codesimilaridades.
Marchetti conta que existe até um termo específico para falar desse surto psicogênicaload zebet codemassa quando o assunto são as vacinas: reação relacionada ao estresse da imunização.
"Desde 1972, a OMS tem um grupo que monitora e estuda essas reações psicogênicas associadas aos imunizantes. Já foram descritos casos na Bolívia, no Japão, na Dinamarca, no Brasil e, mais recentemente, na Tailândia com a vacina contra a covid-19", lembra.
E que fique claro mais uma vez: a vacinaload zebet codesi não tem nada a ver com esse efeito. A questão ocorre por um misto do ambiente, do grupo social, das emoções e do estresse.
Mas será que existem formasload zebet codetratar essas condições?
A chave está na comunicação
Os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil destacam que tratar as reações psicogênicasload zebet codemassa envolve muito cuidado e uma dose extraload zebet codediálogo.
"A grande dificuldade está no fatoload zebet codeos próprios médicos desconhecerem esse fenômeno, o que dificulta o diagnóstico. As doenças psicogênicasload zebet codemassa sempre ocorreram, mas elas ficaram meio esquecidas nos últimos 40 ou 50 anos", aponta Marchetti.
Nos casos agudos (como possivelmente foi o do Recife), o primeiro passo estáload zebet codeseparar as pessoasload zebet codecrise para que elas se acalmem aos poucos. A ideia é limitar o contágio emocional dentro daquele grupo — e evitar que outros indivíduos também sejam afetados.
"Já nas situações crônicas, é preciso lançar mãoload zebet codeuma modalidadeload zebet codepsicoterapia cognitivo-comportamental desenvolvida especificamente para a reação psicogênicaload zebet codemassa", diz Gallucci.
Esse tratamento psicológico envolve não apenas os pacientes, mas também a família e todo o grupo social. A meta é analisar comportamentos e pensamentos,load zebet codemodo a modificar as crenças arraigadas que levaram àquela situação.
Marchetti reforça como a comunicação é parte primordialload zebet codetodo o processoload zebet codediagnóstico e tratamentoload zebet codeuma enfermidade dessas.
"Nós, como médicos, precisamos explicar o que a pessoa teve e deixar claro que ela não foi acometida por uma doença orgânica grave", recomenda o psiquiatra.
"Mas aí vem um risco grande: quando você diz que não é uma doença grave, o paciente e os familiares podem achar que tudo não passouload zebet codefingimento ou frescura", continua.
Como sabemos, não é só porque um problema é "coisa da cabeça"load zebet codealguém que ele se torna falso ou menos relevante — quadrosload zebet codeansiedade, depressão e outros transtornos que afetam a mente são debilitantes e podem ter sérias repercussões na saúde.
"É por isso que é importante deixar claro que se trataload zebet codeuma reação psicogênicaload zebet codemassa, uma condição médica que, na maioria das vezes, é transitória e pode ser resolvida adequadamente", complementa Marchetti.
O que aconteceu depois
Nos dois exemplos principais que ajudaram a ilustrar essa reportagem — a vacinação no Acre e os alunos do Recife — a situação ainda estáload zebet codeaberto e sem muitas definições.
"No caso do Acre, nós propusemos que as equipesload zebet codesaúde que lidam com os adolescentes fossem treinadas para aplicar a terapia cognitivo-comportamental, mas a pandemiaload zebet codecovid-19 acabou paralisando o projeto", informa Gallucci.
"Infelizmente, muitas famílias acabaram aderindo a tratamentos para os quais não há evidência científica alguma", lamenta.
Para entender o que ocorreu no Recife após o surto, a BBC News Brasil entrouload zebet codecontato com a Secretariaload zebet codeEducação e Esportesload zebet codePernambuco.
A superintendênciaload zebet codecomunicação da entidade enviou as respostas por email, dizendo que a escola onde o episódio aconteceu "recebeu, no primeiro dia útil após o caso, uma psicóloga para uma escuta com os estudantes, que alegaram estarem passando por uma criseload zebet codeansiedade na última semana".
"A profissional fará um levantamento dos que não têm acompanhamento psicológico para encaminhá-los a um atendimento."
"A unidadeload zebet codeensino também agendou uma reunião com outra psicóloga e com os responsáveis pelos estudantes para falar sobre o tema e as responsabilidadesload zebet codecada um (escola e família) neste processo", continua a nota.
Por fim, a escola promete criar projetos para reforçar a "escuta ativa e as rodasload zebet codediálogos com os estudantes".
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