‘Preferia dormir nas ruas do Brasil a voltar ao Afeganistão’, diz refugiadajogo de pintarPorto Alegre:jogo de pintar

Nabila e a mãe

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Nabila Khazizadah (direita) foi reassentada no Brasiljogo de pintar2002, fugindo da guerra e do Talebã

"O Afeganistão sempre estevejogo de pintarguerra, desde que eu nasci foi assim, bombas e medo. Até que os talebãs tomaram a nossa casa e perdemos tudo", contou à BBC News Brasil.

Nabila, o pai, a mãe e o irmão se mudaram para a Índia depoisjogo de pintarperderem a casa para o Talebã. No novo país, chegaram a dormir nas ruas e passar fome, enquanto o pai tentava manter a família vendendo chinelos entre carros e transeuntes.

Nabila e a mãe

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Legenda da foto, Nabila (à esquerda), a mãe (direita), o pai e o irmão moraram por um tempo na Índia. Ela se casou e foi com o marido para o Brasiljogo de pintar2002

Alguns anos depois, o paijogo de pintarNabila a casou com um afegão, também refugiado na Índia, e o casal teve dois filhos. "Meu marido decidiu pedir ao governo indiano para sermos reassentadosjogo de pintaroutro país que desse auxílio e tivesse mais oportunidadesjogo de pintartrabalho".

Foi assim que começou a jornada para o Brasil. Meses depois do pedido, receberam a notíciajogo de pintarque o governo brasileiro havia aceitado reassentá-los. A notícia surpreendeu. Brasil? Eles tinham uma ideia muito remota do que era esse país tão distantejogo de pintartudo o que conheciam.

"A gente disse: 'mas a gente não sabe como é o Brasil, como é a língua, a cultura'. Saímos com olhos fechados, no escuro, jogando na sorte", conta.

"Tudo o que a gente queria era um futuro para nossos filhos, mais calmo, mais saudável."

O início da vida no Brasil

Jornal com foto da famíliajogo de pintarNabila

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, O maridojogo de pintarNabila não se adaptou ao Brasil e resolveu voltar ao Afeganistãojogo de pintar2007

Nabila, o marido e os dois filhos,jogo de pintar7 e 8 anos, embarcaram num avião junto com outras quatro famílias afegãs que seriam reassentadas num programa do Ministério da Justiça com a Agência das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), lançado logo após o início da Guerra do Afeganistão,jogo de pintar2001.

Eles foram encaminhados para Porto Alegre e passaram a receber ajuda financeira mensaljogo de pintarR$ 260, mais R$ 13 por criança, alémjogo de pintaraluguel, energia, cesta básica, remédios e transporte escolar, pagos pela Acnur.

Mas a esperançajogo de pintarrecomeçar num país onde teria direitos assegurados se misturava à dor da saudade dos pais e irmão, que ficaram na Índia.

"Fiquei três meses fechada dentrojogo de pintarcasa chorando, pensando no que eu faria longe da minha família. Depois eu pensei, isso não adianta, chorando dentrojogo de pintarcasa eu não vou conseguir fazer nada. Eu tenho que colocar a cara à tapa e aprender português", contou à BBC News Brasil.

"Saí pelo bairro falando com as vizinhas, tentando fazer amizades."

'Cuidado com a mulher-bomba'

Mas a adaptação não foi fácil. E, depoisjogo de pintarum ano, os benefícios pagos pela Acnur, que eram temporários, cessaram.

"O português é uma língua muito difícil e a gente não sabia ainda como funcionavam as coisas. Começamos a correr atrás e meu marido conseguiu emprego."

Ao andar pelas ruasjogo de pintarPorto Alegre com os cabelos totalmente cobertos pelo hijab, Nabila sentia os olhares desconfiados dos brasileiros que nunca tinham convivido com mulheresjogo de pintarvéu. Alguns chegavam a reagir com hostilidade e se recusavam a sentar ao lado dela no ônibus.

Nabila com hijab

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Nabila chegou a ser hostilizada nas ruasjogo de pintarPorto Alegre por usar o hijab

"Não tinha afegãos lá naquela época, não tinha muçulmanos. As pessoas me viam com o hijab e saíamjogo de pintarperto, não queriam sentar ao meu lado no ônibus. Alguns falavam: saijogo de pintarperto, é mulher-bomba, vai explodir."

Os filhos, no entanto, se adaptaram rapidamente e, aos poucos, Nabila fez amizades com as vizinhas, a quem chama hojejogo de pintarirmãs.

"Mas comecei a ter problemas com meu marido. Ele passou a ter ciúmes. Não queria deixar os nossos filhos saíremjogo de pintarcasa, nem que eu trabalhasse, apesarjogo de pintara gente precisar do dinheiro", conta.

Em 2007, o maridojogo de pintarNabila decidiu voltar ao Afeganistão. Ela se recusou a sair do Brasil e não deixou que ele levasse os dois meninos. Mesmo sem dinheiro e emprego, Nabila se separou do marido e decidiu que daria um jeitojogo de pintarsustentar a família sozinha.

"Eu preferia dormir nas ruas do Brasil a voltar ao meu país. Eu conseguiria alimentar meus filhos mesmo na rua, mas não podia deixar que eles vivessem na guerra", disse.

"Eu me sentiria mais segura dormindo na rua no Brasil que numa casa no Afeganistão, que pode ser bombardeada a qualquer momento."

A busca por emprego

O marido voltou ao Afeganistão e Nabila ficou com os meninos. Sem a renda do marido, ela teve que batalhar muito para garantir o aluguel do apartamento e comida para a família.

"Eu nunca tinha trabalhado na minha vida e comecei a trabalhar. Desde que comecei a trabalhar, não parei mais. Eu nunca disse não. Eu cuidei atéjogo de pintartartaruga e do gato do vizinho", conta.

Faz 15 anos que Nabila trabalha na casajogo de pintaruma família pela manhã. "Façojogo de pintartudo: limpo, passo, cozinho. São pessoas muito boas. E confiamjogo de pintarmim. Isso não tem preço."

De tarde, ela cuidajogo de pintaruma idosa. "Ficojogo de pintar14h às 20h com ela. É uma pessoa maravilhosa." Atualmente, os filhosjogo de pintarNabila têm 27 e 28 anos, trabalham e são independentes financeiramente.

"Eles são rapazes bons. Um é o braço direito do donojogo de pintarum restaurante japonês. O chefe tem confiança total nele para tomar conta do restaurante. O outro é auxiliarjogo de pintarcabelereiro, mas já corta cabelo, faz tudo."

O reencontro com os pais

Nabila e a mãe

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Legenda da foto, A mãe e o paijogo de pintarNabila conseguiram visitar a filha no Brasil há dois anos, depoisjogo de pintar17 anos sem se verem

Há dois anos, Nabila conseguiu realizar o sonhojogo de pintarrever os pais, depoisjogo de pintar17 anos. O casaljogo de pintaridosos hoje mora nos Estados Unidos - eles foram reassentados após pedido feito ao governo americano, alguns anos depoisjogo de pintarNabila vir ao Brasil.

"Eu queria muito ver meus pais. Eles têm diabetes, são idosos e eu precisava abraçá-los mesmo que fosse uma última vez", conta.

Ela tentou obter o vistojogo de pintarturista para viajar aos EUA, mas teve o pedido negado. "Fiquei arrasada, mas aí meu pai deu um jeitojogo de pintarvir ao Brasil com a minha mãe, mesmo estando muito idosos."

O reencontro foi emocionante. "Meus pais não entendiam como eu podia ter conseguido sustentar minha família sozinha. Eles diziam: 'Mas minha filha, você está sozinha, sem um afegão? Pensavam coisas que não tinham nada a ver."

Ao chegar ao Brasil, o pai e a mãejogo de pintarNabila reviram os netos, já adultos, e conheceram as muitas amigas que a afegã, hoje com 43 anos, fez no país. Perceberam que ela tinha construído, àjogo de pintarmaneira, uma nova família.

Famíliajogo de pintarNabila

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Legenda da foto, Nabila, os dois filhos, a mãe e o pai passeando por Porto Alegre

"Quando estava indo embora meu pai disse: 'agora não tenho uma filha, tenho várias filhas'. Eles viram que eu estava rodeadajogo de pintarpessoas. A gente também pode construir famíliajogo de pintarafeto. Tenho amigas que me amam como irmã."

Quase 20 anos depoisjogo de pintarchegar ao Brasil, Nabila diz que, apesar das dificuldadesjogo de pintaradaptação nos primeiros anos, hoje se sentejogo de pintarcasa. Ela fala português fluentemente, com um leve sotaque. Não abre mãojogo de pintarusar o hijab nas ruas ejogo de pintarfrequentar a mesquita da cidade.

"O Brasil é um país bom. Se não fossem os roubos, seria o melhor país do mundo. Eu, mesmo se tivesse oportunidadejogo de pintarmorar no Canadá ou nos Estados Unidos, iria querer continuar a morar no Brasil. As pessoas aqui são maravilhosas, são acolhedoras, sabem olhar para a dor do outro."

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