O esquecido Massacrenordeste esporte betZong, quando 132 escravizados foram lançados vivos ao mar:nordeste esporte bet

Legenda do áudio, Em áudio: O esquecido Massacrenordeste esporte betZong,nordeste esporte betque 132 escravizados foram jogados vivos ao mar

nordeste esporte bet Em 1781, 132 africanos escravizados foram lançados vivos ao marnordeste esporte betum navio negreiro britânico chamado Zong para morrerem afogados.

Eles estavam doentes e, na visão do capitão da embarcação, representavam uma ameaça ànordeste esporte betmargemnordeste esporte betlucro — ao passo que a perda do que ele considerava na épocanordeste esporte bet"mercadoria" poderia ser compensada com o pagamento .

Os responsáveis pela atrocidade, conhecida como Massacrenordeste esporte betZong, acabaram impunes, apesar dos esforçosnordeste esporte betativistas do movimento abolicionista britânico para que fossem julgados por homicídio.

E o episódio, que teria sido imortalizado na pintura abaixo do artista britânico William Turner, é hoje um dos símbolos dos horrores do tráfico negreiro.

Pintura 'Navio Negreiro',nordeste esporte betWilliam Turner,nordeste esporte betexposição no Museunordeste esporte betBelas Artesnordeste esporte betBoston

Crédito, Museum of Fine Arts Boston

Legenda da foto, A obra 'Navio Negreiro',nordeste esporte betWilliam Turner, é considerada por muitos como a interpretação do artista sobre o Massacrenordeste esporte betZong
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A ironia do nome

Entre o século 16 e o início do século 19, pelo menos 12 milhõesnordeste esporte betafricanos foram capturados e levados para serem vendidos como escravos nas colônias do continente americano — cercanordeste esporte betum terço delesnordeste esporte betnavios britânicos.

Entre estas embarcações, estava o Zong, que originalmente era um navio negreiro holandês e ironicamente se chamava Zorg, que quer dizer algo como "zelo" ou "cuidado".

A embarcação foi capturada pelos britânicosnordeste esporte bet1781 na costa africana durante uma das guerras anglo-holandesas e vendida a uma conhecida famílianordeste esporte bettraficantesnordeste esporte betescravosnordeste esporte betLiverpool, os Gregson, que administravam um sindicato na época.

"Eles rebatizaram o navionordeste esporte betZong, instituíram um novo capitão, chamado Luke Collingwood, e o Zong passou então mais alguns meses ao longo da costa oeste africana negociando mais (africanos) capturados", explica Jake Subryan Richards, professornordeste esporte bethistória da Universidade London School of Economics (LSE), no Reino Unido,nordeste esporte betentrevista ao programanordeste esporte betrádio da BBC In Our Time.

Foi assim que,nordeste esporte betsetembronordeste esporte bet1781, o Zong zarpounordeste esporte betAcra, atual capitalnordeste esporte betGana, com 442 africanos escravizados a bordo rumo à Jamaica — uma das colônias mais importantes e lucrativas do Império Britânico —, onde seriam vendidos e forçados a trabalhar nas plantaçõesnordeste esporte betcananordeste esporte betaçúcar.

Ilustraçãonordeste esporte bethomens escravizados cortando cananordeste esporte betaçúcar

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, As plantaçõesnordeste esporte betcananordeste esporte betaçúcar faziam da Jamaica uma das colônias britânicas mais lucrativas

Condições desumanas

Naquela época, as viagens da África para as Américas duravamnordeste esporte betseis semanas a vários meses, dependendo das condições meteorológicas. E estima-se quenordeste esporte bet15% a 16% dos africanos capturados morriam nesse trajeto devido às condições deploráveis a bordo dos navios.

"As condiçõesnordeste esporte betqualquer navio negreiro eram muito difíceis e opressivas. Tipicamente os homens adultos eram mantidos acorrentados, deitados no porão, e levados ao convés talvez uma vez por dia para se exercitar", diz Richards.

"Mulheres e crianças eram frequentemente mantidas no convés, não necessariamente acorrentadas, mas atrásnordeste esporte betbarricadasnordeste esporte betmadeira, uma grande cerca que atravessava horizontalmente o deque do navio (...), onde a tripulação poderia colocar armasnordeste esporte betfogo para matá-lasnordeste esporte betcasonordeste esporte betuma insurreição."

Além disso, as doenças se espalhavam rapidamente a bordo desses navios — que costumavam transportar o maior número possívelnordeste esporte betcativos para aumentarnordeste esporte betmargemnordeste esporte betlucro, amontoando as pessoas no porão.

'Banquete' para tubarão

Quando alguém morria, o corpo poderia permanecer por horas acorrentado a outros escravizados vivos, antesnordeste esporte betser jogado ao mar.

Ilustraçãonordeste esporte betnavio negreironordeste esporte bet1881

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, As condições nos navios negreiros,nordeste esporte betgeral superlotados, eram desumanas

"Em geral, os mortos eram lançados ao mar porque sob a perspectiva do empreendimento comercial, eles eram 'cargas' estragadas, haviam perdido seu valor", explica à BBC Vincent Brown, professornordeste esporte bethistória da Universidadenordeste esporte betHarvard, nos Estados Unidos.

Por isso, não são raros os relatosnordeste esporte bettubarões que seguiam os navios negreiros.

"Eles sabiam que poderiam fazer um banquete com os corpos que eram jogados ao mar", acrescenta o pesquisador.

No caso do Zong, no entanto, os africanos capturados foram lançados ao mar ainda vivos.

Superlotação

Mesmo para os padrõesnordeste esporte betum navio negreiro, o Zong estava superlotado. Havia 442 cativos a bordo, cercanordeste esporte betduas vezes a quantidade que um navio do seu porte era capaznordeste esporte bettransportar.

"O Zong era particularmente opressor por vários motivos. Um deles é que ele levava muito mais escravizados do que a médianordeste esporte betum navio negreiro daquela época. Havia 2,26 escravizados por tonelada da embarcação,nordeste esporte betcomparação com a médianordeste esporte bet1,6 por toneladanordeste esporte betum navio negreiro", afirma Richards.

Além disso, o historiador lembra que a tripulação do Zong foi recrutada às pressas, sem muito critério, já que a original abandonou o navio quando o mesmo foi capturado — e não era compatível com a quantidadenordeste esporte betcativos a bordo.

"Quando saíram da África, havia 23 pessoas capturadas para cada membro da tripulação que estava servindo a bordo do navio, quando a média eranordeste esporte betcercanordeste esporte betnove ou 10 cativos para cada tripulantenordeste esporte betnavio negreiro."

"Ou seja, a tripulação tinha essencialmente o dobro da carganordeste esporte bettrabalho", resume Richards.

O massacre

Condições meteorológicas desfavoráveis e errosnordeste esporte betnavegação resultaramnordeste esporte betuma viagem que demorou meses,nordeste esporte betveznordeste esporte betsemanas.

E, a cada dia que passava, o capitão Luke Collingwood vianordeste esporte betmargemnordeste esporte betlucro diminuir à medida que doenças se espalhavam pelo convés e porões do navio.

Foi assim que,nordeste esporte bet29nordeste esporte betnovembronordeste esporte bet1781, ele tomou a decisãonordeste esporte betlançar os africanos capturados mais debilitados ao mar para morrerem afogados — alguns deles ainda algemados.

Uma decisãonordeste esporte betcunho comercial, com o objetivonordeste esporte betminimizar seu prejuízo.

Dado seu estadonordeste esporte betsaúde, os africanos lançados ao mar valiam mais para a tripulação do navio mortos do que vivos.

"Eles foram jogados no marnordeste esporte betparte porque o capitão disse à tripulação que eles estavam doentes, que iriam morrernordeste esporte betqualquer maneira, e era improvável que obtivessem um preço alto no mercado", afirma Brown.

"Isso teria sido uma preocupação especial para os oficiais, que geralmente gozavam do que chamavamnordeste esporte betprivilégionordeste esporte bet(receber o pagamento no valor de) dois africanos escravizados."

E,nordeste esporte betacordo com o historiador, esse cálculo era feito com base na médianordeste esporte betpreço da vendanordeste esporte bettoda a carga.

"Ao jogar ao mar africanos doentes e moribundos, que podiam ou não ter sobrevivido, mas certamente teriam baixado o preço médio da carga do navio, eles estavam ganhando no valor médionordeste esporte betseu privilégio", explica.

Falta d'água

A tripulação da embarcação alegou, no entanto, que não havia mais água potável suficiente para todos a bordo e que não teve escolha a não ser lançar parte dos africanos capturados ao mar.

Mas esta versão é controversa, conforme explica Brown.

Segundo ele, registros históricos revelam que as vítimas foram jogadas ao mar ao longonordeste esporte bettrês dias consecutivos — e no terceiro dia, choveu, o que teria permitido à tripulação coletar água potável suficiente para abastecer o navio por três semanas antesnordeste esporte betlançar a última levanordeste esporte betafricanos ao mar.

"Nesses três dias, Collingwood enordeste esporte bettripulação causaram a mortenordeste esporte bet132 africanos, sendo que os últimos foram mortos depoisnordeste esporte beteles terem coletado água potável", resume Brown.

Quando o Zong chegou à Jamaica, apenas três semanas depois, havia 420 galõesnordeste esporte betágua a bordo.

Reivindicação do seguro

Ao lançar os africanos ao mar, alegando a escasseznordeste esporte betágua potável, o capitão esperava que a perda do que ele considerava na épocanordeste esporte bet"mercadoria" fosse ressarcida financeiramente com o pagamento do seguro.

Como era prática comum na época, os armadores haviam feito uma apólicenordeste esporte betseguro para a "carga" humana do navio.

"O tráfico negreiro era um negócio muito arriscado, os riscos para os lucros eram vários, não apenas escravizados doentes, como também escravizados que se rebelavam contra o navio e eram muitas vezes atirados ao mar, então o papel do seguro era garantir alguma margemnordeste esporte betlucro", explica à BBC Bronwen Everill, professoranordeste esporte bethistória da Universidadenordeste esporte betCambridge, no Reino Unido.

"Algumas das viagens demoravam maisnordeste esporte betum ano para serem concluídas, e errosnordeste esporte betcálculo podiam custar caro, como no caso do Zong, que calculou mal a quantidadenordeste esporte betágua."

Mas a seguradora não acreditou na versão da tripulação e se recusou a pagar a indenização, o que levou os proprietários do navio a reivindicar o pagamento na Justiça.

Em 1783, a disputa foi parar no tribunalnordeste esporte betLondres, onde o júri decidiu inicialmente a favor dos traficantesnordeste esporte betescravos, determinando o pagamento do seguro, como se os africanos assassinados fossem uma mera mercadoria.

"O que é surpreendente no caso do Zong é que, na verdade, não havia nenhuma norma específica que diferenciasse os escravizadosnordeste esporte betqualquer tiponordeste esporte betcarga", aponta Everill.

Movimento abolicionista

É justamente esse aspecto que acabou despertando a revoltanordeste esporte betativistas abolicionistas da época.

Dois personagens históricos na luta pelo abolicionismo britânico se empenharamnordeste esporte bettornar pública a atrocidade do Zong: o nigeriano Olaudah Equiano e o inglês Granville Sharp.

"Juntos, Sharp e Equiano começam a divulgar o caso, levando-o ao conhecimentonordeste esporte betvários parlamentares, com quem tinham influência, e para outras pessoasnordeste esporte betquem já tinham ouvido falar, como ministros, que estavam começando a se agitar contra o tráficonordeste esporte betescravos", conta Everill.

"Para mostrar que este era um exemplo perfeito dos problemasnordeste esporte betganância e excesso que o tráfico negreiro havia trazido para a costa britânica."

Olaudah Equiano

Crédito, Universal History Archive/Getty Images

Legenda da foto, Equiano foi sequestrado quando era criança, na Nigéria, e vendido como escravo — mais tarde, acabou conseguindo comprarnordeste esporte betliberdade e viajou para Londres, onde se juntou ao movimento abolicionista

Na visão deles, o que aconteceu no Zong foi "uma mercantilização e financeirização repugnante dos seres humanos com fins lucrativos", explica a historiadora.

"Eles basicamente acusam (os proprietários do navio)nordeste esporte betcometer fraudenordeste esporte betseguronordeste esporte betalgum nível, ao descobrir que não ganhariam o suficiente no mercado e jogar os africanos ao mar antes que baixassem o valor da carga do navionordeste esporte betmaneira geral. E, assim, serem capazesnordeste esporte betobter esse lucro por meio do prêmio do seguro,nordeste esporte betvez do preçonordeste esporte betmercado para os escravos que teriam sido afetados pela escasseznordeste esporte betágua."

Acusaçãonordeste esporte bethomicídio

Acimanordeste esporte bettudo, os ativistas protestaram contra o fatonordeste esporte betque o caso estava sendo julgado meramente como uma questãonordeste esporte betapólicenordeste esporte betseguro — e nãonordeste esporte bethomicídio.

"Sharp achou que era realmente repreensível que as vidas dos africanos estivessem sendo equiparadas a dinheiro e que a única questão ali era sobre a responsabilidade legal do pagamento do seguro como compensação", diz Richards.

Para embasar seu protesto, o ativista, que era uma espécienordeste esporte betadvogado autodidata, fez transcrições das audiências no tribunal — o que,nordeste esporte betacordo com o historiador, é a principal fonte que temos hoje do caso Zong.

Granville Sharp defendendo a causanordeste esporte betum africano escravizado

Crédito, API/Gamma-Rapho via Getty Images

Legenda da foto, O abolicionista Granville Sharp, uma espécienordeste esporte betadvogado autodidata, defendendo a causanordeste esporte betum escravo

"Sharp disse que, na verdade, (o Zong) deveria ser julgado como um casonordeste esporte betassassinato, que a tripulação do navio negreiro deveria ser indiciada por homicídio."

Ele escreve então uma longa carta ao Almirantado, pressionando para que a tripulação do navio fosse processada pelas mortes. Mas,nordeste esporte betacordo com o historiador, nunca houve resposta.

'Almasnordeste esporte betperigo'

O esforçonordeste esporte betSharp e Equiano para condenar os responsáveis pela atrocidade pode ter sidonordeste esporte betvão.

Mas o fato é que o Massacrenordeste esporte betZong reforçou o argumento abolicionista da épocanordeste esporte betque as almasnordeste esporte bettodos os britânicos estavamnordeste esporte betperigo à medida que o caráter homicidanordeste esporte betseu tráfico negreiro era tratado como uma mera transação comercial — e não um erro moral.

"Na décadanordeste esporte bet1780, principalmente Sharp, mas também Equiano, temiam que a escravidão fosse uma ameaça à própria alma do Império Britânico. Sharp não era evangélico, ele era um anglicano da Alta Igreja, mas compartilhava da crença evangélica na providência (divina) e no mundo regido pela moral", diz Brown.

"Ele acreditava que esses pecados cometidos pela tripulação também eram pecados cometidos pela nação britânica. E que o julgamento divino poderia ser o resultado."

O historiador cita uma sérienordeste esporte betincidentes que deixaram as pessoas preocupadas na época, como a independência dos EUA,nordeste esporte bet1776, que marcou o fim da colonização inglesa sobre o território; e vários furacões que varreram o Caribe, destruindo plantações e causando muitas mortes.

Eventos como esses eram interpretados como julgamentos divinos.

"No momentonordeste esporte betque esse movimento antiescravidão estava realmente esquentando, na décadanordeste esporte bet1780, as pessoas estavam preocupadas com uma ameaça imediata vindanordeste esporte betDeusnordeste esporte betcontinuar essa prática", contextualiza Brown.

"Evangélicos e dissidentes cristãos estavam entre os líderes desse movimentonordeste esporte betparte porque temiam esse julgamento."

Fim do tráfico negreiro

Mas, apesar dos esforços do movimento abolicionista, nas décadas seguintes ao Massacrenordeste esporte betZong, o tráfico negreiro continuou a se expandir.

Somentenordeste esporte bet1807, o tráficonordeste esporte betpovos escravizados foi abolido pelo Parlamento britânico.

Já a exploração da mãonordeste esporte betobra escravizada continuaria nas colônias britânicas por mais quase 30 anos.

O fim da escravidão só foi alcançadonordeste esporte bet1833, com a aprovação da Lei da Abolição da Escravatura, que entrounordeste esporte betvigornordeste esporte bet1834.

"Não há nenhuma conexão direta entre o massacrenordeste esporte betZong e a abolição. Eu diria que a conexão mais importante é que ele incentivou aqueles atores-chave, ativistas como Sharp e Equiano, e chocou a consciêncianordeste esporte betquem veio a saber do ocorrido", avalia Brown.

"O projetonordeste esporte betlei da abolição dependia dos interesses dos legisladores que o aprovaram."

"Esses movimentos ativistas existem, mas só conseguem ter sucessonordeste esporte betoportunidades particulares,nordeste esporte betcontextos particulares. Os legisladores só ouvem os ativistas quando consideram que é do seu interesse político imediato ouvi-los", completa o historiador.

Legado

Na opinião dele, o principal legado do massacre é que serve como um "exemplo impressionante da priorização da ganâncianordeste esporte betdetrimento da vida humana".

"Acho que isso conta muito. É algo que acontece na história, e as pessoas podem se horrorizar e se horrorizam diante da priorização da ganâncianordeste esporte betdetrimento da humanidade", diz Brown.

O historiador traça um paralelo com a pandemianordeste esporte betcovid-19 no que se refere aos debates sobre a abertura da economia e os riscos para a saúde.

"Ainda se vê o argumentonordeste esporte betquenordeste esporte betalguma forma se pode escolher a vida econômicanordeste esporte betvez da vida humana."

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