De máscaras à cloroquina, o que idas e vindas na pandemia ensinam sobre a ciência:afun com casino
Esses comentários vieram das rede sociais da BBC News Brasil, como reaçõesafun com casinoleitores a reportagens sobre tratamentosafun com casinoestudo, recomendaçõesafun com casinoautoridades e pesquisas científicas na atual pandemiaafun com casinocoronavírus — mas, vale dizer, ao ladoafun com casinomuitos outros comentáriosafun com casinointernautas que acrescentaram informações e opiniões ou que exaltaram o conhecimento científico das novas descobertas.
Pesquisadores, professores e pessoas dedicadas à divulgação científica que conversaram com a BBC News Brasil apontaram que a atual pandemia está explicitando desafios para a compreensão do público do que é a ciência e o seu "tempo" e, também, para que os especialistas se comuniquem bem para alémafun com casinoseus muros. E, claro, nesse meio do caminho está a mídia, que também passa por suas críticas e desafios.
A atual pandemiaafun com casinocoronavírus é uma oportunidadeafun com casino"tempo real" para que estes pontos sejam melhorados, dizem os entrevistados — um esforço, porém, que não éafun com casinohoje e nem deve se limitar ao momento crítico pelo qual o mundo passa.
O que explica mudançasafun com casinoposicionamento da Organização Mundial da Saúde (OMS) ao longo da pandemia, entidade que sempre verbaliza a importância das evidências científicasafun com casinosuas decisões? Por que,afun com casinoum dado momento, um remédio parece ser promissor para tratar a covid-19 e, depois, aparece um novo estudo indicando que não é bem assim?
A BBC News Brasil debateu com entrevistados episódios polêmicos envolvendo o conhecimento científico nesta pandemia — e também lições que podemos tirar deles.
Pedimos para "especialistas" e educadores apontarem ainda noções científicas que recomendam serem melhor conhecidas por mais pessoas, independentementeafun com casinoidade, se está estudando no momento ou não, classe social ou…. posição política. Estas noções são apresentadas ao longo da reportagem. Confira.
Ciência não produz dogmas
Presidente do Instituto Questãoafun com casinoCiência, dedicado ao uso das evidências científicas nas políticas públicas, a bióloga Natalia Pasternak destaca que mudar faz parte do processo científico, pois ele não é orientado por "dogmas" — no dicionário Aurélio, dogma aparece primeiro como algo associado à religião, mas não só.
Segundo o dicionário, dogma é um "ponto fundamental e indiscutívelafun com casinodoutrina religiosa e, por extensão,afun com casinoqualquer doutrina ou sistema".
Algo diferente dos princípios científicos, aponta Pasternak.
"A ciência não é dogmática, ela tem um processo contínuoafun com casinoacúmuloafun com casinoevidências. Neste momento, trabalhamos com as melhores evidências existentes. Esse processo às vezes passa a impressãoafun com casinoque o cientista não sabe o que está fazendo, que ele mudaafun com casinoideia. A ciência mudaafun com casinoideia, sim — tem que mudar, quando está diante das melhores evidências", diz a cientista, doutoraafun com casinomicrobiologia pela Universidadeafun com casinoSão Paulo (USP).
"Isso às vezes não transmite a segurança que as pessoas gostariamafun com casinoter,afun com casinouma verdade absoluta."
Entre os médicos, inclusive, há um bordão que reflete essa mutabilidade do conhecimento e, ao mesmo tempo, a impossibilidadeafun com casinose saber tudo: "na medicina, nem nunca, nem sempre".
Noções básicas sobre o conhecimento científico sugeridas pelos entrevistados
- afun com casino Ciência: Vamos entender aqui como uma organização metódica e racionalafun com casinofenômenos do mundo, sejam naturais ou sociais. Ela também tem raízes históricas — apesarafun com casinoter descobertas e métodos que remontam à Antiguidade e com origemafun com casinovárias parte do mundo, a ciência como conhecemos hoje ganhou corpo e maior importância, inclusive social e política, na Europa a partir do século 17.
- afun com casino Hipóteses: Um esquema genérico do método científico, inclusive ensinado nas escolas, normalmente segue uma ordem parecida com esta: perguntas>hipóteses>teste>resultado. Perguntas costumam vir da simples observação, explica Ayanda Lima, bióloga e professoraafun com casinoensino médioafun com casinoGoiás. Pode ser algo simples, como observar que as folhasafun com casinouma árvore são verdes e perguntar: por que elas têm essa cor? Daí vêm as hipóteses, possíveis explicações a serem averiguadas, como: será que elas ficam verdes porque tem algo dentro das plantas que as deixa assim?
- afun com casino Teste, método e resultados: Em seguida, vem um teste, queafun com casinoalguns casos é um experimentoafun com casinolaboratório — mas nem sempre, dependendo da área ou objetoafun com casinopesquisa (a antropologia, por exemplo, desenvolveu ao longo tempo o método clássico da etnografia). O teste exige um método planejado e,afun com casinopreferência, avaliado, aceito e capazafun com casinoser repetido por outros cientistas. No exemplo das folhas verdes, um teste seria macerá-las e depois analisar, com microscópio, seus componentes. Spoiler! Como o acúmuloafun com casinopesquisas já nos mostrou, um teste como esse revela que há organelas nas células vegetais, os cloroplastos, que dão essa coloração às plantas. Assim, depoisafun com casinoum teste, pode haver um resultado satisfatório como esse — que, com o acúmuloafun com casinopesquisas semelhantes, forma um conjuntoafun com casinoevidências; mas também podem vir resultados que não correspondem à hipótese inicial, no entanto contribuem também para se pensarafun com casinopesquisas com novos caminhos.
- afun com casino Teorias: Trata-seafun com casinoum conjuntoafun com casinoevidências maior, não apenas amplamente aceito pela comunidade científica, mas uma referência para ela — como a Teoria do Big Bang para a criação do Universo e a Teoria da Evolução na biologia. As teorias conseguem explicar várias situações e exemplos relacionados. Por mais difícil que seja, teorias podem eventualmente ser superadas.
Para Jarbas Barbosa, médico brasileiro e diretor-assistente da Organização Pan-Americanaafun com casinoSaúde (Opas), braço regional da OMS nas Américas, mudar dianteafun com casinomelhores evidências científicas é "absolutamente esperado" — ainda maisafun com casinouma pandemia como a atual, causada por uma doença nova como é a covid-19.
"Estamos tratandoafun com casinouma doença nova, completamente diferenteafun com casinoqualquer coisa que a gente viu antes nos últimos 100 anos na saúde pública. Com essa característicaafun com casinodisseminar rápido e produzir muitos casos graves, é a primeira que temosafun com casino100 anos", destaca Barbosa, médico sanitarista e epidemiologista e doutorafun com casinosaúde coletiva pela Universidadeafun com casinoCampinas (Unicamp).
"Claro queafun com casinouma situação como essa, adaptar, mudar recomendações, é absolutamente esperado. O inesperado seria o contrário. Se você pegar o que se diziaafun com casinojaneiro e o que se diz agora, quem não mudou ou adaptou foi só teoria da conspiração — eles continuam pensando exatamente igual. Mas quem se baseiaafun com casinociência viuafun com casinoseis mesesafun com casinopandemia coisas absolutamente inovadoras."
O diretor-assistente da Opas menciona como exemplos teorias da conspiraçãoafun com casinoinfluência da China na OMS, acusação frequente partindo dos EUA; ou vice-versa. Ele destaca, entretanto, que a estrutura da organização "garante decisões técnicas e proteção à pressãoafun com casinopaísesafun com casinoparticular" — como a existênciaafun com casinoum setorafun com casinocontroleafun com casinoqualidade das recomendações e estudos produzidos pela entidade; a exigênciaafun com casinodeclaraçãoafun com casinoconflitoafun com casinointeressesafun com casinoreuniõesafun com casinoalto escalão; uma rede com maisafun com casino800 centros colaboradoresafun com casinotodo o mundo, como universidades e secretariasafun com casinosaúde no Brasil; e a própria assembleia mundial da saúde, com maisafun com casino190 países com votos equivalentes.
"Às vezes vejo comentários como se a OMS fosse uma forçaafun com casinoocupação, que poderia ter entrado na China… Isso é ficção científica. Nenhum país vai abrir mão daafun com casinosoberania para nenhum organismo internacional", afirma. "No limite do que é possível, a OMS tem mecanismosafun com casinoproteção contra influências bem estabelecidos."
Apesarafun com casinoa entidade afirmarafun com casinoindependência, isso não foi suficiente para impedir que o presidente Donald Trump anunciasse a retirada dos EUA da OMS, acusando-aafun com casinosofrer influência desmedida da China eafun com casinoter falhado no combate ao coronavírus. Entretanto, apesarafun com casinoter sido formalmente iniciada, a saída dos Estados Unidos da OMS não necessariamente vai se concretizar.
Mudançaafun com casinorecomendação sobre uso generalizadoafun com casinomáscaras
A OMS classificou a crise sanitária causada pelo coronavírus como uma pandemia — disseminação mundial e simultâneaafun com casinouma nova doença — em março. Desde então, a organização, um organismo multilateral vinculado às Nações Unidas, mudou por exemploafun com casinoposiçãoafun com casinorelação ao uso generalizadoafun com casinomáscaras contra a covid-19. Até junho, a entidade afirmava não haver evidências científicas suficientes para dizer que pessoas saudáveis deveriam usar o item — que deveria, sim, ser prioridade para pessoas doentes e profissionaisafun com casinosaúde.
Mas, naquele mês, a OMS anunciou que, mediante novas evidências científicas avaliadas por um comitê e a consideraçãoafun com casinopreferências individuais e fatores sociais, como a dificuldadeafun com casinorealização do distanciamento físico, o uso disseminadoafun com casinomáscaras passou a ser encorajado.
Mesmo assim, o documento que respaldou a novidade é modestoafun com casinorelação ao usoafun com casinomáscaras como medidaafun com casinoproteção: "No momento, o uso generalizadoafun com casinomáscaras por pessoas saudáveisafun com casinocontextos comunitários ainda não é respaldado por evidências científicas diretas ouafun com casinoalta qualidade, e existem possíveis benefícios e riscos a serem considerados (...)".
Jarbas Barbosa afirma que,afun com casinotodo esse período, a organização manteve uma posição: a preocupaçãoafun com casinoapontar que apenas o usoafun com casinomáscara é insuficiente como medida preventiva.
"Do que sabíamos até o começo do ano, não havia muitas evidências sobre o usoafun com casinomáscaras — no caso da influenza, as evidências existentes falavam que ela praticamente não tinha muita importância. Agora, já temos evidênciasafun com casinoqueafun com casinodeterminadas circunstâncias, principalmenteafun com casinoambientes com aglomeração quase natural, como transporte público e lojas, o usoafun com casinomáscara pode ter um papel. Então, várias coisas surgiram neste período", lembra Barbosa, que já foi presidente da Agência Nacionalafun com casinoVigilância Sanitária (Anvisa) entre 2015 e 2018.
"Mas mesmo hoje, quando a gente faz revisão sobre as máscaras, não encontra evidências fortes para recomendar o uso. Continuamos com a preocupaçãoafun com casinoque as pessoas achem que só com aquilo estão protegidas. O mau usoafun com casinomáscara — a pessoa que toca muito, que faz o uso da mesma máscara uma semana seguida — pode ser até um fator agravante. Nas últimas recomendações, a OMS sugere que os países que estão adotando (a orientação) façam estudos para que possamos construir evidências mais robustas."
Como também mostrou a BBC News Brasilafun com casinojunho, uma fala da epidemiologista Maria Van Kerkhove durante coletivaafun com casinoimprensa da OMS gerou confusão no público e reaçõesafun com casinoespecialistas apontando que a fala foi mal colocada.
Van Kerkhove afirmou que era "muito raro" que pessoas assintomáticas transmitissem a doença, mas depois a organização precisou esclarecer que ela estava se referindo a pessoas realmente assintomáticas — não incluindo pessoas pré-sintomáticas, por exemplo. O posicionamento oficial da organização diz que revisão da literatura científica mostra que os casos assintomáticos poderiam variar entre 6% e 41% dos casosafun com casinocontaminação — ou seja, ainda há grande incerteza sobre qual a proporçãoafun com casinocasos assintomáticos entre os contaminados.
Cloroquina, Lancet e OMS
Outro episódioafun com casinogrande repercussão nesta pandemia envolvendo a OMS foi relacionada aos estudos com a cloroquina e hidroxicloroquina — um derivado mais brando da primeira. Estes medicamentos são usados hoje, respectivamente, para tratar malária; e, no caso da hidroxicloroquina, reumatoide, lúpus e outras doenças autoimunes.
Inicialmente, a hidroxicloroquina foi escalada para o projeto Solidarity, da OMS, que está conduzindo estudos clínicos com potenciais tratamentos para a covid-19afun com casinodiversos países. No entanto, a organização anunciouafun com casinojulho que, seguindo recomendação do conselho diretivo do projeto, os testes com a droga foram definitivamente descontinuados.
"Resultados parciais (do projeto Solidarity) comprovaram o que vários outros estudos consistentes já tinham mostrado:afun com casinopacientes hospitalizados, a hidroxicloroquina não traz nenhum benefício e tem um risco, ainda que raro,afun com casinoproduzir arritmia cardíaca. Em um estudo, você não pode piorar — medicamente, é inaceitável. Este comitê diretivo tem o papelafun com casinorevisar tudo o que é informação, comoafun com casinorelação à segurança (do medicamento). Então, não é que a OMS 'mudouafun com casinoopinião' — ela agiu como deveria agir", afirma o diretor-assistente da Opas.
Mas, antes que a OMS decidisse definitivamente retirar a hidroxicloroquina do Solidarity, houve uma grande pedra no meio do caminho envolvendo outra marcaafun com casinorenome — a revista científica Lancet, considerada o segundo periódico com maior fatorafun com casinoimpacto (métrica composta por vários indicadores da influênciaafun com casinouma publicação científica) no mundo, atrás apenas do New England Journal of Medicine, segundo o relatório Journal Citation Reports 2018, da consultoria Clarivate Analytics.
Em 22afun com casinomaio, foi publicado no Lancet um artigo do tipo observacional (entenda a definição abaixo) que afastou os benefícios do tratamentoafun com casinocovid-19 com a cloroquina e hidroxicloroquina usando informaçõesafun com casino96 mil pacientesafun com casinovários países, coletadasafun com casinouma baseafun com casinodados da empresa Surgisphere.
Logo após a publicação, a OMS anunciou a suspensão — naquele momento, ainda temporária — do estudo com hidroxicloroquina no Solidarity.
Entretanto, no inícioafun com casinojunho, veio um novo contratempo: os autores solicitaram a retrataçãoafun com casinoseu próprio artigo ao Lancet, um procedimento raro mas previsto nos protocolosafun com casinoperiódicos renomados quando há algum tipoafun com casinomá conduta, fraude ou erro detectado.
Após a publicaçãoafun com casinomaio, outros pesquisadores não envolvidos no estudo cobraram mais detalhes sobre os dados da Surgisphere, ao que os autores contrataram auditores independentes para atender à cobrança dos colegas. No entanto, a empresa se recusou a fornecer o conjuntoafun com casinodados completo, pois isso violaria contratos com clientes e o compromisso com a confidencialidade.
Assim, os autores escreveram ao Lancet que não poderiam garantir mais a qualidade dos dados primários — os dos milharesafun com casinopacientes envolvidosafun com casinotestes com a cloroquina e hidroxicloroquina.
Para a matemática Tatiana Roque, coordenadora do Fórumafun com casinoCiência e Cultura da Universidade Federal do Rioafun com casinoJaneiro (UFRJ), o episódio do Lancet reflete um descompasso que pode acontecer entre a pressão por respostas, como vemos na atual pandemia; e o tempo "natural" da ciência, que por vezes precisaafun com casinoanos, décadas e até séculos para avançar.
"O que aconteceu com o Lancet chama a atenção justamente porque, por conta da pressa, alguns critérios (de rigor científico) não foram observados: a origem e confiabilidade dos dados. Se para dar respostas rápidas a ciência queimar etapas, atropelar a temporalidade necessária para gerar resultados sólidos, pode acabar sendo pior — quando um resultado precisa ser revisto, por exemplo", avalia Roque, também doutoraafun com casinohistória das ciências e epistemologia.
Natalia Pasternak concorda. Ela avalia que potenciais remédios e vacinas, queafun com casinocondições normais podem levar anos e até décadas para serem desenvolvidos, testados e aprovados para uso, estão no caso da covid-19 já sendo acelerados a uma velocidade talvez nunca antes vista. E isto, às vezes, beira a riscos.
"Nem sempre dá tempoafun com casinofazer padrão ouro (ou máximo) — inclusive muitos estudos estão sendo feitos sem duplo cego, sem placebo. Pela pressa, a gente já está perdendo o rigor. Mas a gente não pode perder tanto o rigor a pontoafun com casinoa resposta ser inútil", aponta a bióloga.
"Na áreaafun com casinovacinas, há muita preocupação com a pressa. Porque com vacina, você não pode errar — milhõesafun com casinopessoas vão receber as doses. E elas já estão sendo desenvolvidasafun com casinotempo recorde, principalmente por ter muita gente trabalhando junto. A gente não pode se dar o luxoafun com casinoerrar, porque estamos vivendo um ambiente mundialafun com casinodesconfiança das vacinas."
O rigor exigido hojeafun com casinovacinas e remédios, lembra Pasternak, não existia quando a penicilina foi usada na Segunda Guerra Mundial — este é um exemplo frequente apresentado como argumento por quem defende o uso da cloroquina contra a covid-19, fazendo uma analogia entre a urgência do conflito bélico com a pandemia do coronavírus.
"Gosto muito deste exemplo da penicilina. Naquela época, realmente, nem se fazia estudo clínico controlado. A penicilina foi testadaafun com casinocamundongos, mas o tamanho do efeito foi tal que não poderia ser ignorado — simplesmente, todos os animais tratados com penicilina sobreviveram, e todos que não foram, morreram. Se você tem uma pessoa entre a vida e a morte e um remédio que funcionou 100%afun com casinocamundongos, manda ver. Não podemos esquecer, porém: quantos soldados morreram porque eram alérgicos a penicilina, como foi descoberto depois?", questiona.
"E, para a covid-19, pode não haver tratamento específico, mas ninguém está jogado à própria sorte. Existe protocoloafun com casinoatendimento, com suporteafun com casinooxigênio, ventilação mecânica, entre outros", diz, criticando a analogia da atual pandemia com uma guerra.
Como são feitos os estudos na área médica
As definições se baseiamafun com casinoum guia da Academiaafun com casinoCiências Médicas do Reino Unido feito com o objetivoafun com casinomelhorar a comunicação entre instituiçõesafun com casinopesquisa e jornalistas, trazendo um sistemaafun com casinoclassificaçãoafun com casinotiposafun com casinopesquisa e suas explicações — documento que usamos frequentemente aqui, na BBC News Brasil.
- afun com casino Estudo observacional: Autor investiga se X está correlacionado a Y, não sendo capazafun com casinodemonstrar causa e efeito pois não há manipulaçãoafun com casinovariáveis — diferenteafun com casinoum estudo do tipo RCT, por exemplo.
- afun com casino Ensaio clínico randomizado controlado, o RCT (randomised controlled trial,afun com casinoinglês): Experimento que envolve pacientes (clínico), divididos aleatoriamente (randomizado)afun com casinoum grupo que recebe o tratamento testado; e um grupoafun com casinocontrole, que não recebe o item testado — mas sim um placebo ou tratamento diferente. Experimentos assim podem ter ainda a característicaafun com casinoter "duplo cego", quando nem pesquisadores nem participantes sabem quem estáafun com casinoqual grupo. Estudos RCT são considerados o "padrão ouro"afun com casinopesquisas com remédios e vacinas.
O papel dos 'experts' e da mídia
Tatiana Roque, que alémafun com casinopesquisadora tem também passagem pela política, tendo sido candidata a deputada federalafun com casino2018 pelo PSOL, acrescenta que o caso da cloroquina ensina mais uma coisa: a confusão entre ciência, política e experts — especialistas que frequentemente opinam na mídia e aconselham governos para embasar decisões.
"A cloroquina mostrou uma confusão entre esses três âmbitos, porque eles têm temporalidades muito diferentes. Era completamente impossível ter resultados sobre a cloroquina a tempo do que exigia a pressão política. Mas acabou sendo muito urgente ter resultados rápidos, porque presidentes como Trump e Bolsonaro estavam defendendo o remédio para tratamento da covid-19. Os protocolosafun com casinoestudos clínicos foram atropelados", diz Roque, que aponta, neste caso, o médico francês Didier Raoult no papel do expert — que vem defendendo o uso da cloroquina no tratamentoafun com casinocovid-19.
"Muitas vezes, um especialista individualmente vai defender pontos que não são validados pela comunidade científica. Não adianta colocar um especialista contra o outro como se fossem opiniões pessoais. É preciso pensar nas instituições e na comunidade que validam este conhecimento."
Publicações científicas
- afun com casino Peer review afun com casino , ou revisão dos pares: Etapa comum antes da publicaçãoafun com casinoum artigoafun com casinoperiódico,afun com casinoque o material é avaliadoafun com casinoforma independente por pesquisadores da área, que recomendamafun com casinorejeição ou aceitação — muitas vezes, nesse caso, com pedidosafun com casinoalteração. A independência é garantida, por exemplo, por plataformasafun com casinoenvioafun com casinotrabalhos que impedem a identificação dos autores e avaliadores.
- afun com casino Preprint, ou pré-publicação: Como está sendo visto frequentemente na atual pandemia, há plataformas na internet para envioafun com casinopreprints, ou seja, artigos que não passaram ainda pelo processo completoafun com casinoavaliação dos pares e publicaçãoafun com casinoum periódico. Segundo a bióloga Natalia Pasternak, os preprints têm uma funçãoafun com casinocomunicação entre os cientistas — para que uns saibam o que outros estão produzindo, por exemplo, podendo levar a colaborações —, entretanto muitas vezes tendo o objetivo desviado quando lidos e divulgados pela mídia e pelo público leigo.
- afun com casino Conflitosafun com casinointeresse: Periódicos renomados costumam ter regras para tentar blindar pressões como, por exemplo, aafun com casinouma empresa farmacêutica interessada que uma drogaafun com casinoteste tenha bons resultados e, por outro lado, efeitos colaterais mostrando-se insignificantes. Um dos principais mecanismos para isso é a declaraçãoafun com casinoconflitosafun com casinointeresse, um campo preenchido por autores e publicado no artigoafun com casinoque estes apresentam eventuais financiamentos recebidos para pesquisa, expondo o nome dos financiadores e a forma com que eles interferiram no estudo.
A participação e validação entre colegas, na comunidade científica, acontece a todo momento na rotinaafun com casinoum pesquisador. Para se entrarafun com casinoum mestrado ou doutorado, e depois, para defender uma dissertação ou tese, há sempre bancasafun com casinopesquisadores para avaliar o trabalho do candidato. O mesmo acontece para alguém concorrendo a uma vagaafun com casinoprofessorafun com casinoalguma universidade. Um artigo publicadoafun com casinoperiódico ou apresentadoafun com casinoum congresso frequentemente precisa passar antes pela avaliaçãoafun com casinopares.
E,afun com casinotodos tiposafun com casinopublicação,afun com casinoum artigo a uma tese, são presenças certas o chamado "estado da arte" — a apresentaçãoafun com casinoestudos anteriores naquela área ou assunto — e as referências bibliográficas, uma formaafun com casinodestacar e reforçar pesquisas já feitas por outros estudiosos.
Ao falar da diferença entre pesquisadores atuando individualmente ouafun com casino"comunidade", Roque menciona um vídeo que é um queridinho entre cientistas e pessoas que trabalham com divulgação científica — um episódio do programa Last Week Tonight, do comediante britânico John Oliver,afun com casinoque ele brinca com a proporçãoafun com casinocientistas que concordam haver evidências do papel humano nas mudanças climáticas, versus os chamados negacionistas.
O apresentador está na bancada com um representanteafun com casinocada "lado" quando,afun com casinorepente,afun com casinonomeafun com casinoum "debate estatisticamente representativo sobre as mudanças climáticas", convida mais 96 cientistas que reconhecem o papel humano nas mudanças climáticas — ou seja, mostrando que não há dois lados com mesmo peso sobre a questão, mas sim a preponderânciaafun com casinouma mesma avaliação entre os cientistas.
A cientista diz que a mídia deve estar atenta à colocação dos experts e também para a coberturaafun com casinociência a longo prazo.
"Espera-se dos experts que eles enunciem certezas — ninguém chama um especialista para falar 'não sei' na TV. Mas é mais interessante que o especialista seja aquele que ajude a refletir, e menos alguém que vá dar respostas", sugere Roque.
"Também é importante que a mídia faça um trabalhoafun com casinodivulgação científicaafun com casinolongo prazo — e não apenas na hora da pandemia. É importante passar para o público o gosto pela ciência, mostrar que ela tem uma história longa —afun com casinovez da afirmaçãoafun com casinocertezas absolutas, o que passa uma imagem às vezes arrogante."
"Na verdade, a especificidade da ciência é ter métodos para lidar com as incertezas. Ela não elimina a incerteza. Método confiáveis vão sendo formados ao longo do tempo, validados e protocolados por uma comunidade ampla; seus resultados podem ser reproduzidos no ambiente ouafun com casinooutras pesquisas. Mas a ciência não enuncia certezas absolutas."
Natalia Pasternak também brinca que não existe cientista "a favor ou contra" a cloroquina — "o que tem são as evidências", diz.
"Se for um bom cientista, ele vai saber analisar essas evidências", aponta Pasternak, que aproveita para recomendar, para cientistas ou não, o livro O mundo assombrado pelos demônios, do biólogo e astrofísico Carl Sagan — segundo ela, "um dos melhores livros que ensina a pensarafun com casinoforma científica".
Parece mas não é
- afun com casino Correlação: Trata-seafun com casinouma conexão entre duas coisas, mas não necessariamente com causalidade. "São eventos que acontecemafun com casinoforma concomitante e dão a impressãoafun com casinocausa e efeito, principalmente se uma coisa acontece antes da outra — como observar que o galo canta logo antes do nascer do sol e deduzir que o sol só nasce porque o galo cantou", brinca Natalia Pasternak, dando o exemploafun com casinouma correlação que poderia equivocadamente ser tomada como uma relaçãoafun com casinocausalidade. Ela, aliás, recomenda o site e um livro intitulados Spurious Correlations, ouafun com casinoportuguês, "correlações espúrias". Seu autor, Tyler Vigen, ficou famoso ao criar diversos gráficos divertidos com aparente causalidade, mas que não têm nada a ver, como o númeroafun com casinopessoas afogadasafun com casinopiscinas relacionado ao númeroafun com casinofilmesafun com casinoque Nicolas Cage atuou; e a taxaafun com casinodivórcios no Estado do Maine associada ao consumoafun com casinomargarina.
- afun com casino Causalidade: Aparentemente, é algo simples — um evento X causa Y, ou seja, Y é uma consequênciaafun com casinoX. Mas, para ir além da correlação, é preciso coletar dados e fornecer evidências descrevendo esta conexãoafun com casinocausa e efeito. Por exemplo, há várias correlações entre tiposafun com casinocâncer e estiloafun com casinovida, como na alimentação, práticaafun com casinoesportes e estresse. Mas como provar causalidade? No caso do tabagismo e câncerafun com casinopulmão, foi assim: nos EUA, começou-se a observar que a curvaafun com casinocigarros fumados por pessoa no país acompanhava o padrão da taxaafun com casinomortes por câncerafun com casinopulmão. Quando uma crescia, a outra também. Depois, isso foi associado a outras evidências, como aafun com casinoque pelo menos 70 substâncias químicas presentes na fumaça do cigarro causaram câncerafun com casinocobaias no laboratório ouafun com casinohumanos. Assim, uma conexãoafun com casinocausalidade foi demonstrada.
Jarbas Barbosa, ao mesmo tempo, considera problemática a posturaafun com casinoalguns médicos no Brasil. O sanitarista conta ter se surpreendido, na pandemia, com médicos brasileiros postando protocolosafun com casinotratamento no Facebook ou vídeos no Instagram recomendando medicamentos ainda não validados pela comunidade científica.
Como mostrou recentemente a BBC News Brasil, entidades médicas no país estão preocupadas com esse comportamentoafun com casinoprofissionais nas redes sociais na atual pandemiaafun com casinocovid-19.
"Deveria estar mais presente no currículoafun com casinomédicos brasileiros a separação do que é evidência do que é informação anedótica", conclui Barbosa.
A ciência está ao alcanceafun com casinotodos
Mas, antes do conhecimento especializado que se obtém nas faculdades, há um lugarafun com casinoque o método científico pode e deve ser ensinado: as escolas.
Doutoraafun com casinobiologia celular, a professora Ayanda Lima bem sabe disso — ela dá aulasafun com casinociências no ensino fundamental eafun com casinobiologia no ensino médio e já foi destaque, junto com seus alunos do Centroafun com casinoEnsinoafun com casinoPeríodo Integral (Cepi) Dom Veloso, escola estadualafun com casinoItumbiara (GO),afun com casinopremiações nacionais para projetos científicosafun com casinoescolas. No casoafun com casinotrabalhos desenvolvidos sobafun com casinoorientação, já foram destaqueafun com casinoprêmios por exemplo um tijolo ecológicoafun com casinoalta durabilidade e um biofertilizante feito com soroafun com casinoleite bovino reutilizado.
"Não é clichê, não é utopia: a ciência realmente é para todos", disse à BBC News Brasil, por telefone.
"A metodologia científica pode ser aplicada por qualquer pessoa, independentemente da faixa etária e classe social. Todo mundo é capazafun com casinoobservar uma problemática e levantar hipóteses", afirma, lembrando que o conhecimento antigo e popular também pode ser científico.
"Por exemplo, quem cria aves e coloca uma galinha poedeira para cruzar com um galo bom, buscando uma linhagem muito boa — a pessoa observou, experimentou e viu que dava bons resultados. Isso é ciência. Ou quando você pergunta para uma pessoa se a mandioca dela cozinha bem e pede uma rama — ou seja, eu quero uma reproduçãoafun com casinoum produto igual àquele."
Das salasafun com casinoaula, a professora aprendeu que na verdade é importante sair delas — para que o aprendizado dos livros se conecte com a observação e seja impulsionado pela curiosidade. Isso pode acontecer tantoafun com casinolaboratórios quantoafun com casinouma simples volta na área externa da escola, onde tudo é passívelafun com casinoobservação —afun com casinoplantas a formigas e cupins.
O antropólogo Gersem Baniwa, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), também lembra do valor do conhecimento não só dito popular — mas também daqueles saberem que vêmafun com casinooutros lugares, povos e tempos algo distantes da origem europeia e racional que a ciência dominante carrega.
Sua posição éafun com casinoquem vive esse encontro — e às vezes desencontros — na pele.
"A ciênciaafun com casinohoje,afun com casinogrande medida, está fundamentada no racionalismo cartesiano,afun com casinouma visão positivista do homem. Issoafun com casinoalguma maneira condiciona as possibilidades da própria ciência. Podemos perceber isso sobretudo quando vivemos outras lógicas, como é meu caso: estudei a ciência 'eurocêntrica' para me formar, mas também guio minha percepção do mundo com a lógica indígena, do meu povo Baniwa", conta o cientista social, graduadoafun com casinofilosofia e mestre e doutorafun com casinoantropologia pela Universidadeafun com casinoBrasília (UnB).
"Sim, claro, a ciência ocidental, eurocentrada, temafun com casinoimportância — até porque suas conquistas são gigantescas, dignasafun com casinocomemoração civilizatória, não tenho a menor dúvida", diz, mencionando seu contato, nos últimos anos, também com filosofias orientais, negras e neoafricanas.
"Mas quando percebemos essa pluralidadeafun com casinoperspectivas, acho fantástico: é isso que forma a grande ciência, esta sim a ciência universal. Se pensássemos na complementaridade entre elas, quem sabe ganharíamos velocidade para compreender mais o mundo."
O antropólogo exemplifica como a perspectivaafun com casinoseu povo difere da visão dominanteafun com casinouma doença como a covid-19 — enquanto esta, representada pela medicina ocidental, tende a focar no elemento biológico (o vírusafun com casinosi), a perspectiva indígena é mais holística ao considerar fatores espirituais e comunitários do adoecimento.
E, ainda que reconheça que a ciência eurocentrada formou um método que se destaca por seu rigor, sobretudo ao se fecharafun com casinoexperimentos dentroafun com casinolaboratórios, Baniwa lembra que saberes milenares também têm características dessa ciência dominante.
"Como o pajé chega ao seu domínioafun com casinoconhecimento? São décadas (de aprendizado). O saber indígenaafun com casinomodo geral é resultadoafun com casinolongos anosafun com casinohistória —afun com casinoobservação, experimentação, comprovação, contrapontos. Os índios conhecem hoje plantas que matam — são resultadoafun com casinoexperimentações", aponta.
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