Novo Códigobet 3 5Ética mira preconceito contra médicos com deficiência: 'Achavam que a Medicina não era mais para mim':bet 3 5
O goiano afirma ter sido o primeiro tetraplégico a se formarbet 3 5Medicina no Brasil, e nas últimas eleições alcançou outro feito: se tornou o vereador mais bem votadobet 3 5Goianésia.
Silva está entre os que celebram um inciso do novo Códigobet 3 5Ética Médica que estipula ser "direito do médico com deficiência ou com doença, nos limitesbet 3 5suas capacidades e da segurança dos pacientes, exercer a profissão sem ser discriminado".
Censobet 3 5médicos com deficiência
Em vigor desde 30bet 3 5abril, o Códigobet 3 5Ética Médica ganhou esse adendo sobre profissionais com deficiência por sugestão do pediatra Sidnei Ferreira, professor da Universidade Federal do Riobet 3 5Janeiro (UFRJ) e conselheiro do Conselho Federalbet 3 5Medicina (CFM).
Em 2015, após ser convidado para um congresso sobre acessibilidade, Ferreira propôs ao CFM uma campanha que levantasse o númerobet 3 5médicos ebet 3 5alunosbet 3 5Medicina que portassem alguma deficiência visual, auditiva ou motora. Queria saber também se essa deficiência era congênita ou adquirida. As perguntas constariam dos cadastros dos Conselhos Regionaisbet 3 5Medicina, que a campanha estimularia seus membros a responder. "Ao conhecer melhor esse universo, poderíamos apresentar propostasbet 3 5políticas públicas que melhorassem a acessibilidade nas áreasbet 3 5saúde não só para os médicos, mas também para pacientes", diz Ferreira.
Passados quase três anos do início da campanha (ela começoubet 3 5julhobet 3 52016), 512 médicos,bet 3 5um universobet 3 5450 milbet 3 5atividade no país, afirmaram ter algum tipobet 3 5deficiência. Grande parte deles (124) atuabet 3 5Minas Gerais, seguidosbet 3 5Rio Grande do Sul (50), Santa Catarina (43), Distrito Federal (35) e Goiás (32). Na próxima fase da campanha, o CFM buscará reunir esses médicos para conhecer suas dificuldades no trabalho e saber se sofrem ou não discriminação.
Ferreira dá como exemplobet 3 5adversidade a acessibilidade nos centrosbet 3 5atendimento à saúde do Rio. Uma fiscalização do Conselho Regionalbet 3 5Medicina do Estado do Riobet 3 5Janeiro (Cremerj) feitabet 3 5março a junhobet 3 52016 mostrou que,bet 3 524 unidadesbet 3 5saúde, nenhuma tinha condições adequadasbet 3 5acessibilidade tanto para profissionais quanto para pacientes e acompanhantes.
Sem acessibilidade
O cardiologista e cirurgião vascular alagoano Hemerson Casado tem certeza absolutabet 3 5que o preconceito começa pela faltabet 3 5condiçõesbet 3 5trabalho para o médico com necessidades especiais, seja nos hospitais, nos consultórios médicos ou nos postosbet 3 5saúde. "Uma multidão acha que acessibilidade é apenas rampa para cadeirabet 3 5rodas, mas a estrutura das construções, a ergonomiabet 3 5portas, corredores, salas, mesas, armários, equipamentos hospitalares, tudo conspira para que o portadorbet 3 5necessidades especiais passe dificuldades, constrangimentos, humilhações", elenca Casado. "Fora o preconceitobet 3 5funcionários e colegas médicos que acham que deveríamos ficarbet 3 5casa esperando a morte chegar."
Aos 45 anos, no augebet 3 5uma carreira sólida - atuoubet 3 5hospitais no Brasil, Canadá, Estados Unidos, Reino Unido e Escócia -, Casado recebeu o diagnósticobet 3 5uma grave e rara doença neurodegenerativa, a esclerose lateral amiotrófica (ELA). Ele, um triatleta que treinava para a prova do Ironman, viu-se às voltas com uma paralisia que lhe tolhe gradualmente os movimentos.
"Contei primeiro para a minha esposa, depois para o meu melhor amigo, então para os meus sócios, mas ninguém conseguia absorver a notícia", diz. "Primeiro porque a ELA é uma doença ainda pouco conhecida, segundo porque eu apenas puxava um pouco a perna e ninguém poderia imaginar que eu tivesse uma doença fatal."
Casado manteve o consultório e as cirurgias cardíacas por mais um ano. "Mas, aos poucos, as pessoas que sabem da doença vão falando para os que não sabem e, quando você se dá conta, muitos já comentam às escondidas, alguns com pena, outros criticando, por ignorância ou preconceito, o fatobet 3 5eu continuar a trabalhar constantemente nesse período."
Com a evolução da doença, já então sem condiçõesbet 3 5operar nembet 3 5examinar os pacientes, anunciou para suas duas equipes o afastamento definitivo da profissão. "Chorei como nunca tinha chorado na vida."
Aos 52 anos, o alagoano, que vivebet 3 5Maceió, hoje não anda nem fala. Comunica-se por meiobet 3 5um software sueco, cujo mouse ótico lhe permite teclar com o piscar dos olhos. Colegas o convidaram para continuar trabalhando como professor e consultor. "Mas eu não conseguia suportar as conversasbet 3 5pébet 3 5ouvido, os olhares pesados sobre mim", diz. Virou ativistabet 3 5combate às doenças raras. Tem um instituto que foca nessa linha, atua politicamente para conseguir verbas para pesquisa e luta para construir um polobet 3 5biotecnologia e biomedicinabet 3 5doenças raras.
Para ele, o CFM e a Associação Médica Brasileira (AMB) têm feito um trabalho para corrigir distorções, mas ainda é pouco. "O preconceito tem que ser combatido com açõesbet 3 5classe, políticas públicas e muita informação, mas não aquela que vitimize o profissional, e sim que prove que ele é mais do que capaz".
Bom senso ante obstáculos
Formadobet 3 51982 na Universidadebet 3 5São Paulo (USP), o patologista Raymundo Soaresbet 3 5Azevedo Neto diz nunca ter notado preconceito ou restrição por partebet 3 5colegas ou chefias. Aos nove mesesbet 3 5idade, ele contraiu poliomielite durante um surto dessa infecção viral nabet 3 5cidade, Uberaba (MG). Para lidar com a paraplegia e a escoliose, consequências da doença, ele usa muletas e órteses nas duas pernas, o que lhe garante sustentação e equilíbrio.
Diantebet 3 5tecnologias que possam compensar eventuais problemas locomotores no exercício da profissão, Azevedo Neto defende o bom senso. "Em tese, toda especialidade médica permite adaptações a eventuais deficiências profissionais, ao mesmo tempo que impõe limitaçõesbet 3 5ordem prática", afirma.
Um médico com deficiência seria mais sensível ao sofrimento dos pacientes? Azevedo Neto discorda. Para ele, essa atitude humanista e empática está mais ligada à personalidade do profissionalbet 3 5saúde. "Há médicos e médicas que despertam uma empatia enorme sem nunca apresentar problemasbet 3 5saúde significativos com eles ou com pessoas próximas", diz.
Embet 3 5experiência, C. Lee Cohen, médica residente no Hospital Geralbet 3 5Massachusetts, nos Estados Unidos, afirma que a perda parcialbet 3 5audição nos seus dois ouvidos a ajuda a lidar com pacientes que tiveram perda auditiva, principalmente os idosos. "Sei com quais sons eles têm dificuldade, então explico com outras palavras, para que compreendam o que estou dizendo."
Para o advogado Henderson Fürst, doutorbet 3 5Bioética e professorbet 3 5pós-graduação na PUC-Campinas, a mudança no Códigobet 3 5Ética Médica se alinha à Convenção da Organizações das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência,bet 3 52008, ebet 3 5incorporação no Brasil por meio do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146bet 3 52015).
Fürst, portadorbet 3 5uma rara doença degenerativa, a encefalomielite miálgica, também conhecida como síndrome da fadiga crônica, afirma que "essas normativas refletem a mudança na compreensão do que é deficiência, saindo do modelo técnico para o modelo social, ou seja, entendendo que o fator limitador é o meiobet 3 5que a pessoa está inserida, e não a deficiênciabet 3 5si".
Para ele, a principal mudança seria a formulaçãobet 3 5políticasbet 3 5acessibilidade que diminuam ou eliminem restrições aos profissionais.
Preconceito sentido na pele
O Códigobet 3 5Ética Médica também inclui profissionais com doenças. A psiquiatra Kátia Maria Monteiro Rodriguesbet 3 5Carvalho, que atendebet 3 5Rio Claro (SP), ouviu certa vez esta confissão desinformadabet 3 5uma paciente: "Doutora, eu tinha medobet 3 5vir aqui porque falaram que a senhora era esclerosada". Carvalho ri. "Alguém deve ter dito que eu tenho esclerose múltipla, quebet 3 5fato tenho, e ela pensou que isso era sinalbet 3 5demência."
Graduada pela Faculdadebet 3 5Medicinabet 3 5Ribeirão Preto, da USP, Carvalho fez mestradobet 3 5saúde mental na Unicamp e estava prestes a se tornar docente na Escolabet 3 5Medicina da Universidade Estadual Paulista (Unesp),bet 3 5Botucatu, quando tevebet 3 5primeira crise provocada por essa doença autoimune que afeta primordialmente os nervos. Tinha 28 anos e entroubet 3 5insuficiência respiratória. Recuperou-se, mas haveria outras crises - uma delas a deixou acamada por um ano -, que culminaram na interrupção do atendimentobet 3 5alguns pacientes seus.
"Do pontobet 3 5vistabet 3 5consultório, eu várias vezes tivebet 3 5recomeçar, recomeçar, recomeçar, e isso é muito difícil", diz.
Quando daquela longa crise, Carvalho esteve prestes a ser aposentada por invalidez. "Entreibet 3 5desespero profundo, entendi como 'seu trabalho acabou'." Os papéis não andaram, e Carvalho acabou por se aposentar por tempobet 3 5serviçobet 3 52016. No entanto, continua atuando quase com a mesma carga horária. Ela entende que, aos 55 anos, seu organismo está mais estabilizado diante da esclerose múltipla.
Desde 2017, Carvalho é diretora clínica e técnica da Casabet 3 5Saúde Bezerrabet 3 5Menezes, hospital psiquiátricobet 3 5Rio Claro. Também manteve o consultório e há um ano iniciou o curso semipresencialbet 3 5Engenhariabet 3 5Computação na Universidade Virtual do Estadobet 3 5São Paulo (Univesp).
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