'Por que decidi abandonar coquetel e injetar fórmulatopbets clubbiohackers contra o HIV':topbets club
"Nós não aconselhamos que ninguém que esteja assistindo a esse vídeo faça o que está sendo feito aqui", disse Traywick, que não é cientista e se identifica como um "organizador comunitário", durante a transmissão.
"Tristan Roberts está agindo completamente dentrotopbets clubseus direitos etopbets clubacordo com as regulamentações da FDA (Food and Drug Administration, a agência americana que controla alimentos e remédios) e dentro da lei deste país para se automedicar da maneira que achar apropriada. É o seu corpo e o seu direito."
Roberts, um programadortopbets club28 anos, não tem nenhum treinamento oficialtopbets clubmedicina outopbets clubengenharia genética. Ele e Traywick são membrostopbets clubuma comunidade crescentetopbets clubbiohackers, o movimento conhecido como "faça você mesmo" da biologia, da ciência médica e da genética, que surgiu e se espalhou fora das universidades e clínicas farmacêuticas.
Hoje existem conferênciastopbets clubbiohackers e comunidades deles no Vale do Silício, Boston, Nova York e Austin, nos EUA, onde alunos do ensino médio, proprietáriostopbets clubstartupstopbets clubbiomedicina e cientistas que se reúnem para ensinar e fazer experimentos juntos - que vão dos mais simples, como produzir cerveja que brilha no escuro, até aqueles que tentam curar doenças ou combater o envelhecimento.
O que Roberts estava prestes a fazer tem sido considerado pelos cientistas e especialistastopbets clubbioética como algo "arriscado" e "alarmante". A opinião mais áspera veiotopbets clubScott Burris, especialistatopbets clubpolíticastopbets clubsaúde pública para combater o HIV na Temple University, na Pensilvânia.
"Esse comportamento é delirante. Não me parece plausível nem mesmo que esse cara esteja no planeta Terra."
Mas Roberts acredita que essas avaliações são excessivamente cautelosas, cercadastopbets clubconvenções.
"Somos pessoas que correm riscos, mas não somos estúpidos", disse. "Acho que estamos caminhando para um momentotopbets clubque pacientes e indivíduos sujeitos aos testes terão uma participação maior no resultado do experimento."
Em buscatopbets clubcura
Roberts não é a primeira pessoa a injetartopbets clubsi mesmo uma terapia genética não testada.
Pelo menos três pessoas já tentaram fazer algo parecido, injetando genes para melhorar a performance do organismo, inibindo a morte celular ou estimulando o crescimento muscular.
Mas essas autoaplicações aconteceramtopbets clubforma privada. O programador é a primeira pessoa a fazer isso publicamentetopbets clubbuscatopbets clubuma cura.
Seis anos atrás, ele foi diagnosticado com HIV. Nos últimos dois anos, decidiu parartopbets clubtomar o coqueteltopbets clubmedicamentos antirretrovirais.
Os motivos dele eram muitos. Ele odiava os efeitos colaterais dos remédios e temia que perder uma única dose pudesse dar ao vírus imunidade ao tratamento. Além disso, rejeitava a ideiatopbets clubtertopbets clubtomar um medicamento para o resto da vida. Roberts queria simplesmente ser curado.
"Estou animado com a possibilidadetopbets clubeventualmente curar isso talvez por alguns meses, talvez por alguns anos, ou indefinidamente", disse. "Mas só há uma formatopbets clubdescobrir isso."
Roberts encheu uma das seringas do frasco, levantoutopbets clubcamisa e expirou bruscamente. "Queria dedicar isso a todas as pessoas que morreram sem poder ter acesso a esse tratamento", afirmou.
Então ele beliscou uma camada finatopbets clubpele do lado direitotopbets clubseu umbigo e injetou a agulha. A pequena quantidadetopbets clublíquido inserida nas suas célulastopbets clubgordura continha trilhõestopbets clubplasmídeos, pedaçostopbets clubDNA que teoricamente poderiam ativar a produção do antibiótico N6.
Um estudo do Instituto Nacionaltopbets clubSaúde (NIH) americano mostrou que o N6 conseguiu neutralizar 98% dos vírus HIVtopbets clubtestes realizados no laboratório. A substância veiotopbets clubuma única pessoa, uma das poucas conhecidas pelos cientistas cujos anticorpos conseguem combater o vírus sozinhos.
A esperançatopbets clubRoberts e dos criadores do tratamento na Ascendance étopbets clubque os plasmídeos conseguissem atravessar os núcleos das células dele e fazê-los produzir os anticorpos N6.
O objetivo é conseguir uma cura para o HIV - os biohackers acreditam que podem levar um tratamento ao mercado mais rapidamente e barato do que instituições cercadastopbets clubregulamentos e preocupações corporativas sobre lucro.
"O DNA é basicamente uma linguagem, e eu acredito que pessoas que já vivem nessa geração vão aprender a ser poetas nela", disse Machiavelli Davis, um amigotopbets clubRoberts que ajudou a desenvolver o tratamento, durante a transmissão o vivo no Facebook.
Riscos x eventuais benefícios
Muitos cientistas e especialistastopbets clubbioética argumentam que experimentos como esse são muito amadores para produzir qualquer resultado significativo, e que os perigostopbets clubuma autoaplicação são muito maiores que os possíveis benefícios ou que pacientes que aceitam esse tipotopbets clubtratamento muitas vezes nem sequer sabem com o que estão lidando.
"Eu temo fortemente que, sem uma estrutura robusta para a realizaçãotopbets clubavaliação e manuseiotopbets clubriscos e questõestopbets clubresponsabilidade, o modelo Ascendance Biomedical só transferirá todas essas responsabilidades pesadas e complexas para os indivíduos, que assumirão custo e perigo", escreveu Eleonore Pauwels, um especialistatopbets clubpolíticas científicas do Centro Internacional Woodrow Wilson,topbets clubWashington, e especialistatopbets clubgenômica.
Mas como agora qualquer um pode conseguir uma sequência genética customizada - inclusive com a facilidade e a conveniênciatopbets clubuma compra online -, pessoas como Roberts podem se aventurar nessa área da genética, antes completamente restrita aos especialistas.
A FDA, equivalente à Anvisa (agênciatopbets clubvigilância sanitária brasileira), tem poder para reprimir os testestopbets clubmedicamentos não licenciadostopbets clubhumanos, e a vendatopbets clubprodutos e kits que alteram códigos genéticos para autoexperimentos é contra a lei. Mas ainda não está claro se é crime o atotopbets clubse automedicar com o usotopbets clubuma substância ainda não testada - e os cientistas amadores e biohackers se aproveitam disso para alimentar seu mercado.
"Nós temos um sistema médico que é muito paternalista,topbets clubque você não sabe o que acontece com seu corpo. O que você vê agora é o surgimentotopbets clubum novo 'biocidadão'", disse Pauwels.
"Como você democratiza (a medicina) sem assumir um certo risco? Essa é a grande questão."
Checando os resultados
Três semanas depois, Roberts foi fazer seu segundo exametopbets clubsangue desde a primeira injeção. Em poucos dias, veria se aquilo estava ou não causando algum efeito no vírus.
"Estou animado para ver os resultados. Mas ao mesmo tempo mantendo os pés um pouco no chão. É raro que você acertetopbets clubprimeira", afirmou ele. "Estou aqui pensando no longo prazo."
Amigos e família ficaram apreensivos com seu desejotopbets clubse tornar o "paciente zero", mas sabiam que não adiantaria tentar demovê-lo da ideia. Alguns anos antes, ele havia deixado um emprego que pagava US$ 75 mil (R$ 241 mil) por ano dizendo que o dinheiro e o apartamento confortável onde vivia não o faziam feliz.
Agora, Roberts não tem endereço fixo - fica perambulando entre as casas do namorado, dos amigos e da família. Trabalha como freelancer na áreatopbets clubprogramação e insistetopbets clubser pago somente com bitcoins, apesartopbets clubisso representar alguns desafios logísticos - ele quase não pôde pagar seu teste sanguíneo por causatopbets clubproblemas para converter suas moedas virtuaistopbets clubdólares.
No ano passado, foi preso durante um protesto sob a acusaçãotopbets clubter pichado a palavra "corrupto" na sede do FBI.
"Ocupem a cidade", gritou depoistopbets clubser colocado dentro do carro da polícia (após prestar serviços comunitários, ele conseguiu limpartopbets clubficha criminal).
Mas apesartopbets clubseu apetite pelo perigo, Roberts começou a se sentir um pouco mal três semanas após injetar o tratamento experimental.
Primeiro veio a erupçãotopbets clubferidas vermelhas na peletopbets clubsuas costas - ele achou que havia sido picado por mosquitos, mas não tinha certeza. Depois, ficou febril por quatro dias, perdeu a fome e teve problemas gastrointestinais.
"Estou com medotopbets clubque possa ser o plasmídeo", afirmou. "Tenho 98%topbets clubcertezatopbets clubque está tudo bem, mas há aqueles 2% que me fazem temer que possa ser algo horrível."
O pior cenário era otopbets clubque o plasmídeo estivesse se multiplicando fora do controle. Mas será que os médicostopbets clubum pronto-socorro conseguiriam ajudá-lo mesmo sem conhecer a substância que ele injetoutopbets clubsi mesmo?
Outra ideia passou então portopbets clubcabeça: tudo isso seria, na verdade, um sinaltopbets clubque o tratamento realmente funciona?
O que dizem cientistas e outro biohackers
Os sintomas diminuíram dia depois, o que levou Roberts a ficar especulando sobre o que poderia estar acontecendotopbets clubseu corpo.
Quando fez o exametopbets clubsangue, o vídeo que o mostrava injetando a terapia experimentaltopbets clubsi mesmo já havia sido visto maistopbets club20 mil vezes.
Mark Connors, cientista da NIH que descobriu o anticorpo N6, foi um dos assistiram às imagens - após serem transmitidas ao vivo, elas ficaram disponíveis no Facebook para quem quisesse vê-las.
O pesquisador ficou nada impressionado com o raciocínio por trás do tratamento.
"Eles parecem jovens muito inteligentes, que sabemtopbets clubalguns fatos. Mas nãotopbets clubtodos."
O N6 é o anticorpo mais versátil a combater o HIV já descoberto, mas Connors explica que ele não pode simplesmente acabar com o vírus sozinho - e que ainda há um debate sobre ser possível ou não curar alguém do vírus apenas com anticorpos.
A proteína do HIV muta constantemente para impedir que nossos anticorpos a neutralizem. Mesmo com a potência do N6, o vírus ainda pode desenvolver resistência a ele, fazendo com que a "monoterapia" com esse anticorpo seja pouco eficiente como único tratamento, diz o cientista.
"Na maioria dos casos, não são as regras que fazem com que se demore tanto tempo (no desenvolvimentotopbets clubmedicamentos)", afirma. "Não se tratatopbets cluba FDA estar sentadatopbets clubcimatopbets clubremédios. A verdade é que esse é um processotopbets clubque há muita discussão."
O que também preocupa os cientistas sobre os experimentos da Ascendance é a faltatopbets clubinformações detalhadas a respeito da empresa no site dela - não há telefone, listatopbets clubfuncionários ou conselheiros.
Traywick disse que isso acontecetopbets clubparte por questõestopbets clubpropriedade intelectual, etopbets clubparte porque a empresa ainda é muito nova. Além disso, afirmou, é preciso preservar a identidade dos cientistas que estão por trás do desenvolvimento dos tratamentos para evitar que eles fiquem suscetíveis a problemas legais.
Por meio dele, a BBC conseguiu entrartopbets clubcontato por telefone com o pesquisador que elaborou o tratamentotopbets clubRoberts, que se recusou a revelar seu nome. Ele pediu para ser chamadotopbets club"M McConaughey",topbets clubreferência ao ator Matthew McConaughey, que ganhou o Oscartopbets clubMelhor Ator ao interpretar um pesquisador amador do HIV nos anos 1980 no filme Clubetopbets clubCompras Dallas (2013).
Na ligação, "McConaughey" disse que discordava da decisãotopbets clubTrawick e Robertstopbets clubmostrar ao vivo a primeira injeção - sobretudo mencionando a palavra "cura" no vídeo. Ele concorda com Connors sobre a baixa probabilidadetopbets clubessa primeira aplicação ter um impacto e teme que isso gere falsas expectativas nas pessoas que assistiram à transmissão.
"Mesmo dando o seu melhor para fazer as coisas rápido, você não é a natureza. A biologia é muito lenta e difícil", afirmou.
Entre o pequeno númerotopbets clubbiohackers e pesquisadores que se autoaplicaram uma terapia genética publicamente, há um desacordo sobre o que hátopbets clubciência no tratamento a que Roberts se submeteu.
A BBC procurou Josiah Zayner, diretor-executivotopbets clubuma empresa que vende kitstopbets clubengenharia genética para serem autoaplicados e que também fez transmissões ao vivotopbets clubque injetou as substânciastopbets clubsi mesmo. Mas ele se recusou a comentar sobre a Ascendance ou Roberts, escrevendo que eles "têm pouca ideia do que estão fazendo".
Brian Hanley, um especialistatopbets clubmicrobiologia que aplicoutopbets clubsi mesmo uma terapia genética para aumentar seu vigor, diz que odeia ser chamadotopbets clubbiohacker. Ele disse não ver problemastopbets clubcientistas que fazem experimentos envolvendo tratamentostopbets clubsi mesmos, mas teme que biohackers usem isso para promover esse tipotopbets clubtestetopbets clubpessoas totalmente inexperientes, que vão assumir riscos que não entendem.
"Você pode ter problemas sérios, até mesmo morrer. O maior perigo é se infectar mesmo com alguma coisa", explicou.
Por outro lado, George Church, um pioneiro no estudo do genoma que virou referência para pessoas interessadastopbets clubautoexperimentação, avaliou que, apesartopbets clubsempre ter recomendado cautela, testes clínicos e o envolvimentotopbets clubmédicos, os resultados mais surpreendentes às vezes podem virtopbets clubum único paciente.
Ele citou o exemplotopbets clubBarry Marshall, um médico quetopbets clubmeados dos anos 1980 provou que as úlceras eram causadas por bactérias após tomar um "caldo infeccioso".
"Foi notável a pontotopbets clubfazer com que ele ganhasse o prêmio Nobel", contou Church. "Tudo é possível."
Com a palavra, os exames
Em uma nova transmissão ao vivo no Facebook, Roberts decidiu mostrar para o público os resultadostopbets clubseus examestopbets clubsangue - ele ainda não havia aberto o envelope.
A sala estava cheiatopbets clubgente. Uma equipetopbets clubfilmagem para uma série documental sobre biotecnologia estava ali preparada para captartopbets clubreação. Aaron Traywick observou da cozinha, e três amigostopbets clubRoberts sussurravam ao fundo.
Sem os meios para testar a presençatopbets clubN6 no sanguetopbets clubRoberts, eles estavam confiando na contagemtopbets clubcarga viral que existisse nele para atestar os efeitos da terapia.
Um dia antestopbets clubinjetá-la, seu sangue continha 11.912 cópias do vírus por mililitro. Ele esperava ver esse número cair para 2 mil ou menos. Se estivesse entre 2 mil e 8 mil, seria mais difícil fazer qualquer conclusão. Uma carga viral estável ou aumentada poderia indicar que o tratamento falhou.
Apesartopbets clubRoberts ter se entusiasmado com a ideiatopbets clubum futuro no qual uma doença seria controlada pelo próprio paciente,topbets clubque a democratização dos medicamentos derrubaria a indústria farmacêutica, também se tratavatopbets clubalgo muito pessoal. Ele reconheceu que estava sonhandotopbets clubpoder contar para seu familiares,topbets clubpleno jantartopbets clubAçãotopbets clubGraças, que o tratamento havia funcionado.
Ele também lembrou como se sentiu, após descobrir ser HIV positivo, ao se cortar com um papel - ao olhar paratopbets clubmão, viu seu sangue como um veneno.
"Isso é o que mais queria mudar. Não necessariamente curar a infecção, mas ao menos acabar com a possibilidadetopbets clubpassá-la para outras pessoas", afirmou.
Ele abriu o envelope com o resultado do exame bem devagar. E sorriu. "Ok... é, isso não era muito bem o que a gente esperava".
A cargatopbets clubvírustopbets clubRoberts passoutopbets club28.800 na segunda semana para 36.401 na terceira semana - níveis baixos, mas longe do resultado desejado.
Sua contagemtopbets clublinfócitos T-CD4 - a célula do sistema imunológico que o HIV ataca - foi a maior que ele já havia visto, mas não havia como saber o que isso significava.
"Precisamostopbets clubmais informações", disse Traywick, que estava fora da câmera. Ele entrou na sala, se sentou ao ladotopbets clubRoberts e disse, brincando. "Nós não te matamos."
Nada a comemorar
Depois que a transmissão foi finalizada, Traywick se recostou no sofá. Um dos amigostopbets clubRoberts silenciosamente devolveu o baldetopbets clubespumante que estava na cozinha para a geladeira. Preferiram abrir um vinho vermelho.
Traywick disse que isso era parte da visãotopbets clubsua empresa - mostrar falhas e sucessos publicamente.
"Estou um pouco desanimado. É difícil", disse, portopbets clubvez, o paciente.
Apesar do fracasso inicial, Roberts afirmou continuar acreditando que as terapias genéticas que ele e outras pessoas estão testando serão a chave para erradicar o HIV, bem como as demais doenças que ainda intrigam a medicina.
"Essas experiências têm aberto muitas possibilidades, estão redefinindo o que significa ser humano."
Em dezembro, pesquisadores da Ascendance vão testar a segunda versão da substância, que contémtopbets club10 a 100 vezes o númerotopbets clubplasmídeos da primeira. Roberts planeja aplicá-la também. Ele não pensatopbets clubvoltar aos tradicionais coquetéistopbets clubremédio, e diz esperar ser plenamente curado um dia.
Connors, o pesquisador da NIH, também assistiu à transmissão ao vivotopbets clubque o rapaz revelou os resultados dos exames.
Ele discorda da opinião dos biohackerstopbets clubque métodos tradicionaistopbets clubpesquisa avançamtopbets clubmaneira muito devagar - testes humanostopbets clubinjeçõestopbets clubN6 deverão acontecer ainda no iníciotopbets club2018, diz.
Para ele, Roberts deveria voltar para os antivirais.
"Me corta o coração ver isso", afirmou.
Mas ele reforçou que o jovem tem algotopbets clubcomum com os pacientes cujos corpos naturalmente criam anticorpos como N6, bem como com outros que estão sendo estudados na luta para combater o vírus.
"As pessoas que compõem esse grupo são aquelas que recusam o tratamento", disse ele.