A história que deu origem ao mito da ligação entre vacinas e autismo:slots888

Vacina

Crédito, Fundação Oswaldo Cruz

Essa história está sendo resgatada por um livro recém-lançado no Brasil, Outra Sintonia,slots888que os autores John Donvan e Caren Zucker narram a história do autismo na sociedade. O livro dedica um capítulo inteiro à polêmicaslots888torno das vacinas - num momentoslots888que, no Brasil e no mundo, debates sobre vacinação continuam fortes.

Na Europa, uma epidemiaslots888sarampo resultante da queda da imunização teve ao menos 500 infectados no primeiro trimestre deste ano e deixou as autoridadesslots888alerta. Em resposta, países como Itália e Alemanha passaram a discutir punições para quem deixeslots888vacinar seus filhos.

Andrew Wakefield

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Andrew Wakefield, autorslots888estudo sobre autismo e vacinas, quando foi julgado 'inapto' para o exercício da medicina

No Brasil, alguns pais se reúnemslots888gruposslots888Facebook e WhatsApp para discutir seus temoresslots888relação às imunizações. As preocupações vãoslots888efeitos colaterais das injeções à segurança das doses;slots888possíveis benefícios à indústria farmacêutica ao medoslots888que as vacinas múltiplas exponham os bebês a uma carga excessivaslots888substâncias.

De volta ao livro, nos anos seguintes ao estudoslots888Wakefield, a polêmica chegou aos EUA. Lá o vínculo com o autismo não foi feito com a MMR, mas sim com o timerosal, componente antibactericida que está presenteslots888algumas vacinas.

Foram necessários muitos anosslots888debate para que ambas as teorias fossem desmontadas e para que o elo entre autismo e vacinas fosse descartado pela comunidade científica.

'Irresponsável'

Em 2004, o Institutoslots888Medicina dos EUA concluiu que não havia provasslots888que o autismo tivesse relação com o timerosal. "Aliás, na Dinamarca, o timerosal fora retirado das vacinasslots8881992, mas o autismo estava mais prevalente do que nunca", escrevem Donvan e Zuckerslots888seu livro.

A conclusão foi reforçada por análises na Califórnia, onde o timerosal foi tirado da composição das vacinas no início dos anos 2000. E, no entanto, a prevalência do autismo aumentou por alislots8882007.

Quanto a Wakefield, tambémslots8882004 descobriu-se que antes da publicação do artigo na Lancet,slots8881998, ele havia feito um pedidoslots888patente para uma vacina contra sarampo que concorreria com a MMR, algo que foi visto como um conflitoslots888interesses.

Capaslots888'Outra Sintonia'

Crédito, Divulgação

Legenda da foto, Livro resgata a história que fez com que o autismo fosse ligado à polêmica das vacinas

Mas as acusações foram muito além disso: no estudo original, Wakefield dizia haver vestígios do vírus do sarampo nas 12 crianças pesquisadas. No entanto, um médico que o auxiliou no trabalho veio a público dizer que, na verdade, não havia encontrado o vírusslots888nenhuma delas - e que Wakefield ignorou essa informação para não prejudicar o estudo.

Em 2010, o Conselho Geralslots888Medicina do Reino Unido julgou Wakefield "inapto para o exercício da profissão", qualificando seu comportamento como "irresponsável", "antiético" e "enganoso". E a Lancet se retratou do estudo publicado uma década antes, dizendo que suas conclusões eram "totalmente falsas".

Por fim, a entidade americana Autism Speaks, dedicada a estudos e debates sobre o autismo, decidiu se posicionar a favor da vacinação. "Vacinas não causam autismo", escreveu a entidadeslots888seu siteslots8882015. "Pedimos encarecidamente que todas as crianças sejam vacinadas."

Imunidade coletiva

No Brasil, estudiosos têm observado na última década um movimento, sobretudo nas classes A e B,slots888pais que evitam vacinar seus filhos.

"Pelos dados que temos, são pessoas que têm acesso a informação e levantam a associação entre a vacinação e algumas patologias, apesarslots888muitos estudos comprovarem que essa relação não existe", diz à BBC Brasil José Cássioslots888Moraes, especialistaslots888imunização e professor da Faculdadeslots888Ciências Médicas da Santa Casaslots888São Paulo.

Bebê sendo vacinado

Crédito, Fiocruz Imagens

Legenda da foto, Médico diz que não há problemasslots888dar diversas vacinasslots888uma só vezslots888crianças

A pediatra Carolina Luisa Alves Barbieri conversou com diversos desses pais paraslots888teseslots888doutorado sobre vacinação, defendidaslots8882014 na Faculdadeslots888Medicina da USP.

"Os casais que não vacinaram relataram sentimentoslots888medo diante da perdaslots888autonomia nas decisões sobre a saúdeslots888seus filhos", escreve Barbieri emslots888tese.

Ela cita, por exemplo, um casal que decidiu não dar a vacina da gripe a seu filho por insegurança com "vacinas novas"; ou outro que escolheu quais vacinas dariaslots888seus bebês por causa das reações adversas que as injeções poderiam causar - evitando, por exemplo, a MMR "por medoslots888sua associação com o autismo"; há também uma mãe que decidiu pela não vacinação totalslots888seus filhos porque "buscava um modoslots888vida mais natural, sem intervenções nem medicamentos".

Para José Cássioslots888Moraes, a coberturaslots888vacinação do Brasil ainda é satisfatória, "mas se aumenta o númeroslots888pessoas suscetíveis (aos vírus), corremos o riscoslots888perder a imunidade coletiva".

'Um contamina dez'

Carla Domingues, coordenadora do Programa Nacionalslots888Imunização do Ministério da Saúde, argumenta que o medo dos pais por possíveis efeitos adversos da vacina não pode se sobrepor ao perigo, muito mais grave, da doençaslots888si.

"A diminuição da mortalidade infantil no Brasil se deve à vacinação", argumenta à BBC Brasil. "E não procede achar que 'meu filho é bem nutrido e não precisaslots888vacina'. Ainda temos no mundo casosslots888pólio e sarampo, como mostra o surto na Europa. Com o livre-comércio e turismo, sempre há a chanceslots888se pegar e passar adiante."

"Uma pessoa com sarampo, por exemplo, consegue contaminar outras dez. E é uma doençaslots888elevada mortalidade e sequelas importantes, como cegueira e surdez", prossegue.

Ainda assim, Domingues acredita que as oscilações nos índicesslots888vacinação se devem mais à "desinformação" do que a uma contrariedade às vacinas.

"Muitos pais já não veem mais algumas doenças acontecerem e acham que não precisam mais vacinar", diz ela. "No ano passado, quando houve surtoslots888influenza, a cobertura da vacina da gripe chegou a 96% no Brasil. Neste ano, porém, só nove Estados tiveram uma cobertura acimaslots88890%."

Criança com sarampo

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Europa viu o retorno do sarampo após baixa na imunização

Moraes diz também que as rotinasslots888mães e pais que trabalham precisam ser levadasslots888conta.

"Às vezes há dificuldadesslots888acesso ao sistemaslots888saúde pública: muitos pais não conseguem ir (durante o horárioslots888expediente) ao postoslots888saúde dar as vacinas, o que diminui a cobertura, por exemplo, das dosesslots888reforço ou das que são dadas quando a criança tem um anoslots888idade."

Segundo o especialista, muitos dos questionamentos que afastam os pais da vacinação têm resposta.

Ele argumenta que as doses múltiplasslots888vacinas não causam problemasslots888bebês. "Quando a criança nasce, entraslots888contato com milharesslots888substâncias novas. Ela dá conta com folga do volumeslots888antígenos (presente nas vacinas múltiplas)."

Sobre o timerosal, que causa temores por causa do mercúrio,slots888fato a substância pode causar problemas neurológicos, masslots888doses mais altas. "A vacina tem uma dose mínima, eslots888qualquer forma o timerosal é só usado para as multidoses (em que um mesmo frasco serve para vacinar múltiplos pacientes), cada vez mais raras no Brasil."

Em relação às críticas à indústria farmacêutica, Moraes afirma que "uma parcela importante das vacinas brasileiras é feita por laboratórios públicos, como o Butantan. É claro que há interesses comerciais, mas acredito que a exigênciaslots888segurança para vacinas seja maior do que para os medicamentos comuns".

Hoje, segundo a OMS, as vacinas salvamslots8882 a 3 milhõesslots888vidas por ano no mundo.