'Meninas são ensinadas a ficar caladas e sorrir quando discordam', diz autora feminista que estourou na vozaposta grátis no registroBeyoncé:aposta grátis no registro

Chimamanda

Crédito, Ivara Esege

Legenda da foto, 'Eu queria um mundo onde pudéssemos criar crianças sem pensaraposta grátis no registrogênero', disse Adichie

Autoraaposta grátis no registroromances como Americanah, Hibisco Roxo e Meio Sol Amarelo, com livros traduzidosaposta grátis no registromaisaposta grátis no registro30 línguas, ela diz se ver como "uma feminista feliz, que não odeia homens, que gostaaposta grátis no registrobatom e usa salto alto".

Seu foco no momento é na educação; ela acha que a noçãoaposta grátis no registroigualdade deve ser levada às crianças desde o berço.

"Eu queria um mundo onde nós pudéssemos criar crianças sem pensaraposta grátis no registrogênero. Ou simplesmente limitar gênero à biologia. Então, por exemplo, é ok você dizer a um menino que ele deve fazer xixi desse jeito específico porque o órgão sexual dele é desse jeito, mas para mim é aí que (a diferença) acaba", disse a autora, que está lançando Para Educar Crianças Feministas, à BBC Brasil.

Veja os principais trechos da entrevista:

aposta grátis no registro BBC Brasil - A ideiaaposta grátis no registro aposta grátis no registro Para Educar Crianças Feministas aposta grátis no registro veio da carta para uma amiga que teve uma menina e pediu conselhos a você sobre como criá-la. Quais foram os principais problemas que você identificou pela experiência pessoal?

aposta grátis no registro Chimamanda Ngozi Adichie - Acho que a primeira coisa que me vem à cabeça é trabalho doméstico. Considero meus pais bastante "modernos", não tão feministas como gostaria que fossem, mas modernos para os padrões. Para a minha mãe, havia uma expectativaaposta grátis no registroque eu soubesse cozinhar - uma expectativa que não existia para os meus irmãos. Não era uma situação extrema, e nós tínhamos uma empregada que ajudava, mas era importante para a minha mãe que eu soubesse cozinhar e eu sabia que era porque eu sou uma garota.

Além disso, minha mãe conversava comigo sobre coisas como etiqueta, comportamento social, "para nós, que somos mulheres", e essas conversas sempre tinham a ver com "ficar calada", "fingir", "se não concordarmos, é melhor só sorrir", porque é isso que as mulheres fazem. E eu não eraaposta grátis no registroficar calada e sorrir quando discordavaaposta grátis no registroalgo, meu perfil eraaposta grátis no registrofalar,aposta grátis no registrome manifestar. E eu só pensava: isso não faz sentido, porque não é assim que eu sou. Ainda tinham coisas menores, como por exemplo: meu irmão aprendeu a dirigir muito antesaposta grátis no registromim, porque eu sou menina.

Beyonce

Crédito, Reprodução YouTube

Legenda da foto, Escritora nigeriana teve trechoaposta grátis no registropalestraaposta grátis no registrousadaaposta grátis no registrocançãoaposta grátis no registroBeyoncé

E também existem todas essas pequenas coisas práticas que eu gostariaaposta grátis no registrosaber fazer, mas não sei. E não é porque eu nasci com uma vagina, é porque ninguém me ensinou. Mas eles ensinavam aos meninos todas essas coisas, e eu queria muito poder saber.

aposta grátis no registro BBC Brasil - Existe uma divisão comumaposta grátis no registrolojasaposta grátis no registrobrinquedos com seções para meninas - que,aposta grátis no registrogeral, têm brinquedos rosas e muitas vezes relacionados a afazeres domésticos ou 'tarefasaposta grátis no registromãe' - e para meninos - que costumam ter carrinhos, helicópteros, super-heróis e a cor azul predominante. O que acha dessa divisão?

aposta grátis no registro Adichie - Estava conversando com uma amiga minha e, aqui nos EUA, você tem aqueles kits completosaposta grátis no registrocozinha para criança, e eles são sempre rosas. E ela tem isso na casa dela, suas duas filhas amam esse brinquedo, e minha filha foi lá, elas estavam brincando com aquilo e eu disse a ela: sabe, não sei se eu gostariaaposta grátis no registrocomprar isso para a minha filha.

Fiquei pensando sobre isso e concluí: quando minha filha for mais velha, se ela realmente quiser esse brinquedo, talvez eu precise fechar meus olhos, engolir meu desgosto e comprar. Mas quando eu fizer isso, eu vou passar todos os dias falando para ela sobre como aquele brinquedo é péssimo e o que ele representa e por que não é legal gostar dele.

Eu tenho um problema com a seçãoaposta grátis no registrobrinquedos para meninas nas lojas. Não só pelo fato disso dar início a uma lavagem cerebral muito cedo na cabeça das crianças sobre o que elas devem gostar. Mas porque acho também que priva as meninasaposta grátis no registrohabilidades muito importantes que elas poderiam desenvolver.

Por exemplo: você pode trocar a fraldaaposta grátis no registroum boneca e, quando você a vira, ela chora. Isso é interessante, mas o que isso está ensinando à minha filha? Eu queria que ela aprendesse outras coisas que são úteis também, queria que ela aprendesse a consertar as coisas quando elas quebram, queria que ela fosse criativa, queria dar a ela alguns blocos para ver o que ela poderia construir com eles. Por isso não sou a favor dos brinquedos "tradicionais"aposta grátis no registromeninas.

aposta grátis no registro BBC Brasil - No Brasil, já houve uma discussão sobre inserir uma disciplina escolar sobre igualdadeaposta grátis no registrogênero. O que você acha disso?

aposta grátis no registro Adichie - Acho que sou um pouco resistente a isso, a ter uma aula só sobre igualdadeaposta grátis no registrogênero. Porque acho que igualdadeaposta grátis no registrogênero deveria ser parteaposta grátis no registrotoda matéria,aposta grátis no registrotoda aula. Porque acho que quando nós fazemos issoaposta grátis no registrouma aula separada, faz parecer que isso seria algo especial - quando acho que deveria ser algo convencional.

Acho que todo professor deveria ser treinado para usaraposta grátis no registrotodas as matérias uma linguagem igualitáriaaposta grátis no registrotermosaposta grátis no registrogênero. Então quando ele for ensinar química, por exemplo, que fale das mulheres que contribuíram para a química também, quando for falaraposta grátis no registrohistória, falar da história da luta das mulheres por direitos… acho que tinhaaposta grátis no registroser parteaposta grátis no registrotodas as aulasaposta grátis no registrovezaposta grátis no registroalgo especialaposta grátis no registrouma aula só.

Fotoaposta grátis no registroJeongMee Yoonaposta grátis no registroensaio sobre dicotomia criada por marketingaposta grátis no registro'gênero'

Crédito, JeongMee Yoon

Legenda da foto, 'O que uma boneca está ensinando à minha filha? Queria que aprendesse a consertar as coisas quando elas quebram, dar a ela alguns blocos para ver o que ela poderia construir com eles'

aposta grátis no registro BBC Brasil - Quais são os principais pontos na educaçãoaposta grátis no registromeninos e meninas para que eles cresçam "feministas", como você deseja no livro?

aposta grátis no registro Adichie - Acho que definitivamente existem pontosaposta grátis no registrocomum. O que eu quero dizeraposta grátis no registromaneira geral aqui é que queria um mundo onde nós pudéssemos criar crianças sem pensaraposta grátis no registrogênero. Ou simplesmente limitar gênero à biologia. Então, por exemplo, é ok você dizer a um menino que ele deve fazer xixi desse jeito específico porque o órgão sexual dele é desse jeito, mas para mim é aí que acaba.

Quando seu filho está chateado e chora, você diz a ele: "Não, não chore, seja duro". Eu não gosto disso. Acho que deveríamos falar mais para os meninos sobre a ideiaaposta grátis no registrovulnerabilidade, não fazê-los pensar que eles precisam provar que são fortes.

Isso é parte do problema com a masculinidade, é parte do problemaaposta grátis no registroos homens serem emocionalmente reprimidos. Porque eles não aprenderam isso, não receberam as ferramentas para isso. A gente precisa redefinir masculinidade.

Também acho que há certas coisas que nós ensinamos aos meninos que nós precisamos ensinar às meninas também. A ideiaaposta grátis no registroser confiante,aposta grátis no registronão se desculpar por defender suas ideias, seus direitos.

aposta grátis no registro BBC Brasil - Uma pesquisa recente da Universidadeaposta grátis no registroNova York apontou que meninas começam a perder a confiançaaposta grátis no registrosi mesmas a partir dos 6 anos. Como é possível mudar isso?

aposta grátis no registro Adichie - Gostariaaposta grátis no registroter essa resposta. Mas acho que se uma criança tem essa baseaposta grátis no registrocasa, a probabilidadeaposta grátis no registroisso acontecer diminui. E acho que sempre há alternativas. Procurar livros sobre mulheres fortes, que conquistaram coisas para apresentá-las às meninas é uma.

Acho que faz diferença também a dinâmicaaposta grátis no registrotrabalhos domésticosaposta grátis no registrocasa. Porque uma coisa é levar a criança à biblioteca, mostrar a ela livrosaposta grátis no registromulheres que fizeram coisas importantes, e outra é ela voltar pra casa e ver a mãe lavando louça, varrendo a casa, fazendo todo o trabalho domésticoaposta grátis no registrocasa sozinha, como se fosse uma cidadã secundária.

aposta grátis no registro BBC Brasil - Sua palestra no TED - que virou o livro aposta grátis no registro Sejamos Todos Feministas aposta grátis no registro - fez bastante sucesso e teve maisaposta grátis no registro3,5 milhõesaposta grátis no registrovisualizações no YouTube. Mas você já disse no passado que feminismo é uma palavra que traz uma "bagagem negativa". Por que você acha que isso acontece - e quando você descobriu a palavra?

aposta grátis no registro Adichie - Desde que me entendo por gente... A ideiaaposta grátis no registromulheres serem iguais aos homens foi algoaposta grátis no registroque eu sempre acreditei, então sou feminista desde os 4 anosaposta grátis no registroidade. Mas nunca realmente parava para pensar sobre a palavraaposta grátis no registrosi. Isso até um amigo me chamaraposta grátis no registrofeministaaposta grátis no registrotomaposta grátis no registroinsulto. Aí que eu fui atrás, procurei o significado, fui ler sobre o conceito, aprender sobre. E pensei: é exatamente isso que eu sou, é isso que me descreve.

Acho que existe uma ideia dominante que associa essa palavra com o extremo. Aquela ideiaaposta grátis no registroque toda feminista odeia homens, que elas são cheiasaposta grátis no registroraiva, desagradáveis… essa negatividade extrema ficou muito conectada com aquela palavra.

Mas acho que nós precisamos da palavra. Se nós queremos resolver um problema, temos que saber lhe dar um nome. É uma palavra que tem sido demonizada. Talvez esteja na horaaposta grátis no registropegá-laaposta grátis no registrovolta e fazer dela o que realmente é: ligada a direitos humanos, justiça, igualdade para homens e mulheres - o que inclui mulheresaposta grátis no registrotodos os lugares do mundo.

Acho que a nossa cultura ainda não gosta disso, tanto homens quanto mulheres… nós simplesmente ainda não gostamosaposta grátis no registromulheres se manifestando.

Chimamanda Ngozi Adichie

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Chimamanda teveaposta grátis no registroobra traduzida para maisaposta grátis no registrotrinta idiomas

Eu mesma tive experiências com essa hostilidade. Mas por outro lado, eu também tive experiência com pessoas que disseram que, lendo as coisas que eu escrevo, passaram a pensaraposta grátis no registroalgo que não tinham pensado antes. Ouvi issoaposta grátis no registroalguns homens.

Claro, ainda não é o suficiente, ainda há muito mais hostilidade do que elogios, mas acho que é importante continuar falando, se manifestando.

aposta grátis no registro BBC Brasil - E quanto ao racismo? Em quais situações você vivenciou isso nos Estados Unidos? E como era na Nigéria?

aposta grátis no registro Adichie - Nós temos muitos problemas na Nigéria, mas o racismo que é baseado na cor da pele, nós não temos. Até eu vir para os Estados Unidos, eu não pensavaaposta grátis no registromim como uma mulher negra. Porque eu não tinha que pensar sobre mim dessa maneira.

Mas quando cheguei aos EUA, isso veio como algo enorme para mim. A coisa interessante sobre o racismo aqui é que ele não se manifesta da forma dramática como é colocado nos filmes antes dos anos 1960. Agora, ele é muito sutil, às vezes ele acontece e você não se dá conta.

Pelo fatoaposta grátis no registroser negra, houve muitas conclusões prontas a meu respeito, sobre minha capacidade, por exemplo - quando o professor ficou surpreso quando escrevi o melhor trabalho da sala. E ele ficou surpreso porque sou negra, ele não esperava que o melhor trabalho fosse viraposta grátis no registrouma pessoa negra.

Há outras coisas sutis, como entraraposta grátis no registrouma lojaaposta grátis no registrocoisas caras e se deparar com as pessoas olhando para vocêaposta grátis no registrouma forma diferente. E isso acontece porque você é negro e porque eles provavelmente estão pensando que você não pertence a esse lugar ou que você vai roubar algo.

aposta grátis no registro BBC Brasil - Você já esteve no Brasil? Quais são suas impressões sobre o país?

aposta grátis no registro Adichie - Fui para a Flipaposta grátis no registroParaty, depois fiquei dois dias no Rio. Eu amei o Brasil, me senti muito confortável ali, muito bem acolhida. Mas eu também lembro que nós fomos a um restaurante muito bom e chique e eu não vi nenhum negro lá. E perguntava: onde estão os negros do Brasil? Por que eles são invisíveis?

Fiquei surpresa com a quantidadeaposta grátis no registrovezes que ouvi que "no Brasil somos uma misturaaposta grátis no registroraças" e eu não fiquei convencida disso, porque eu vi que era uma sociedade muito marcada por uma hierarquiaaposta grátis no registroraças. Mas quero voltar.

Existe algo no Brasil que me parece familiar e ao mesmo tempo não familiar. Eu costumava achar que era parecido com a Nigéria. E tem uma região particular que eu queria conhecer, que é a Bahia. Tenho muito interesse nas histórias da cultura africana que foram preservadas lá.