Brasil tem êxodoum milhãoalunos da rede privada:
E menos alunos significam menos turmas para professoresescolas particulares, cujo salário no fim do mês depende do númerohorassalaaula.
"Muita gente não conseguiu manter os filhos na rede privada e a carga horaria diminuiu. O nosso salário também diminuiu", ele continua.
E dados oficiais confirmam a impressãoMoraes sobre o esvaziamentocolégios privados: segundo o Censo Escolar 2021, o númeroestudantes matriculadosescolas particulares no Brasil caiu 10%, ou quase um milhãoestudantes, entre 2019 e 2021.
Êxodoescolas privadas
A surpreendente queda interrompeu uma sequência históricacrescimento no númeroalunoscolégios privados.
No mesmo período, 2019 a 2021, a rede pública teve redução bem menor no númeroalunos: 0,5%.
"O empobrecimento das famílias, principalmente neste caso o da classe média, impacta diretamente nos diversos tiposserviço, e no serviçoeducação isso é bastante significativo", avalia Fausto Augusto Junior, diretor-técnico do Departamento IntersindicalEstatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Para o especialista, os números do censo escolar sugerem uma transferênciaestudantes entre as redes particular e pública — resultado da crise econômica (aumentomensalidades e do custovidageral) e agravada pela pandemia.
"A classe média está sendo bastante atingida por conta da inflação e da taxadesemprego, o que tem a ver com essa saídaalunos da rede privada para a rede pública. Isso tem a ver com empobrecimento", diz.
É o casoLidiane Rosa, do Rio Grande do Sul.
"Eu tirei a minha filha da escola privada causa dos custos, estava muito caro e não tinha mais como bancar escola particular. Ela estava no primeiro ano do ensino fundamental e eu tinha que comprar muitos livros", ela diz à BBC News Brasil.
A economia no casoRosa foi além do ensino. "Na escola pública, ela aprendeu muito mais. Na escola particular, eles não tinham nenhuma refeição. Na pública, eles almoçam e tomam café da tarde."
Retrocesso
"É constrangedor. Você projeta o futuro, tem esperançauma condiçãovida melhor, começa um processoconquistas e,repente, cai num retrocesso muito grande", diz o professor.
Filhooperários, funcionáriouma fábrica local, ele conseguiu bolsaestudos para se preparar para o vestibular e trabalhou para pagar a faculdade.
Depoisse formar, Moraes, que conta que chegou a passar fome na infância, viu seu padrãovida se transformar — inicialmente, para melhor.
"Eu estava muito bem estabilizado nas escolas particulares e tinha uma carga horária muito boa", ele conta.
"Morava no centro da cidade, dividia um apartamentoaluguel muito alto com um amigo. Sobrava muito: eu gastava com viagem, móveis para a residência, eletrônicos. Jamais cogitava na vida ter um iPhone e consegui comprar um", recorda.
Em 2019, no entanto, os alunos começaram a migrar. No ano seguinte, com a pandemia, a situação piorou muito e o professor precisou reorganizarvida.
"Quando senti que não seria mais possível pagar o aluguel, procurei outros imóveis, dessa vez na periferia, para continuar tendo independência e autonomia. Mas os valores não ficavam muito diferentes e continuava pesado", ele conta.
"Quando ficou inviável, me vi na urgênciaentrarcontato com a família. Foi quando minha mãe sugeriu que eu retornasse e esperasse até que as coisas melhorassem."
"Nada contra voltar a morar com meus pais", continua Moraes, "mas é algo que abate muito psicologicamente."
Pobreza
O êxodoalunos da rede privada para a pública, razão principal da crise enfrentada pelo professor, é sintoma da redução na renda das famílias brasileiras desde 2019.
Segundo a Fundação Getúlio Vargas, entre 2019 e 2021, o Brasil ganhou 9,6 milhõesnovos pobres — ou pessoas com renda domiciliar per capitaaté R$ 497.
Isso significa que uma população equivalente aPortugal formada só por brasileiros passou a ser classificados como pobres, segundo a instituição. O totalpessoas nessa situação no país é62,9 milhões — ou 29,6% dos brasileiros.
Junto ao empobrecimento, vem a fome. O númerobrasileiros que não teve dinheiro para alimentar a si ou afamíliaalgum momento nos últimos 12 meses subiu30%2019 para 36%2021 — um novo recorde da série iniciada2006.
Segundo Marcelo Neri, diretor do grupopesquisas FGV Social, "é a primeira vez que o Brasil ultrapassa a média mundial e o aumento foi quatro vezes maior do que a elevação ocorrida no mundo, entre 2019 e 2021".
Para o diretor do Dieese, "inflação, fome e desemprego são fatores decisivos na eleição".
"Nós estamos falandomais33 milhõespessoas que hoje passam fome no Brasil. E uma taxadesemprego que, apesarvir se reduzindo, ainda se mantém num patamar muito alto, próximo aos 10 milhõesdesempregados", diz.
"Esse talvez seja um dos principais temas, ou o tema mais relevante, até porque a gente precisa olhar com muita atenção quais são as propostas dos candidatos paraalguma forma sair desse buraco que nós caímos. Do pontovista econômico, é essencial para melhorar a vida média da população, para voltar a ter elevaçãorenda, ampliação do nívelconsumo e redução da taxadesemprego", continua Fausto Augusto Junior.
Propostas dos candidatos
Segundo a última pesquisa DataFolha, divulgada2setembro, 57% dos brasileiros dizem que emprego e renda estão entre os três principais critérios na escolhaum candidato a presidente — junto com saúde e educação.
Em seu programagoverno, o presidente Jair Bolsonaro (PL) promete que o Auxílio Brasil, seu programatransferênciarenda, seja no valorR$ 600 a partir2023.
O valor original,R$ 400, foi aumentado para R$ 600 até dezembro deste ano, coincidindo com o período eleitoral.
A propostaOrçamento para 2023 enviada ao Congresso Nacional pelo presidente, no entanto, prevê que o auxílio volte ao valor médioR$ 405.
Questionado, o presidente disse que o valor arrecadado com privatizações poderá bancar a promessaseu programagoverno.
Já o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT), primeiro colocado na maioria das pesquisasintençãovoto, prometeseu programagoverno "retomar centralidade e urgência no enfrentamento da fome e da pobreza, assim como a garantia dos direitos à segurança alimentar e nutricional e à assistência social".
O petista diz que vai resgatar o Bolsa Família, uma das principais marcassua gestão,versão "renovada e ampliada, viabilizando a transição por etapas, rumo a um sistema universal e uma renda básicacidadania".
O ex-presidente também diz querer manter o valorR$ 600 para os beneficiários do programa e anunciou a criaçãouma parcela extraR$ 150 por criança até 6 anos no Bolsa Família.
Ciro Gomes (PDT), terceiro colocado nas pesquisas, promete um programarenda mínimaR$ 1 mil reais para 60 milhõespessoas.
Já Simone Tebet (PMDB) também anunciou planosum programa permanenterenda mínima e disse que erradicar a fome será "prioridade máxima"seu governo.
Futuro
"Para quem já passou fome na infância, acho impossível que hoje, formado, eu volte a estaca zero", diz o professor Moraes à reportagem.
Isso significa otimismo?
"Não, não acho que vou voltar à situaçãoque estava há cinco, dez anos. De qualquer forma, avançar vai ser muito difícil, mesmo que o governo mude", ele diz.
"Muita gente bota uma esperança muito grandecima do Lula, dizendo que ele vai salvar o país e fazer o Brasil voltar a sorrirnovo... Eu não acho que ele vai fazer um governo economicamente muito diferente do Bolsonaro, infelizmente."
Esta reportagem é resultadoum relato enviado por Guilherme à BBC News Brasil.
Você também pode terhistória pessoal transformadareportagem nessas eleições — clique no link abaixo.
- Este texto foi publicadohttp://vesser.net/brasil-62795996
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