Chico Xavier: o médium filhoae esportiva apostaanalfabetos que vendeu 50 milhõesae esportiva apostalivros:ae esportiva aposta

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Em 1932, quando ele ganhava a vida como vendedor e tecelão e costumava publicar poesiasae esportiva apostajornais — sempre atribuindo os textos a autores mortos —, ele lançou a antologia Parnasoae esportiva apostaAlém-Túmulo, uma coletâneaae esportiva aposta60 poemas, assinados por nove poetas brasileiros, quatro portugueses e um anônimo.

A edição ficou por conta da Federação Espírita Brasileira. E o livro alcançou repercussão no meio literário. "Ele tinha pouco maisae esportiva aposta20 anos e era um matuto, um menino do interiorae esportiva apostaMinas Gerais, filhoae esportiva apostapais analfabetos, que colocava no papel poemas assinados por nomes como Castro Alves, Augusto dos Anjos… E afirmava: 'foram eles que escreveram, não fui eu'", conta o jornalista e escritor Marcel Souto Maior, autor de, entre outros, As Liçõesae esportiva apostaChico Xavier e As Vidasae esportiva apostaChico Xavier.

Chico Xavier aos 37 anos, uma imagem ainda distante da que o consagrou

Crédito, Arquivo CB/D.A Press

Legenda da foto, Chico Xavier aos 37 anos, uma imagem ainda distante da que o consagrou

"Era uma épocaae esportiva apostaque ele, que já havia trabalhado numa fábricaae esportiva apostatecidos, trabalhava 12 horas seguidas por dia como vendedor no armazémae esportiva apostaum tio. Tinha pouco tempo para leitura e para exercíciosae esportiva apostaescrita", comenta Souto Maior. "O livro foi publicado e provocou uma grande comoção, atraindo a curiosidade dos principais escritores da Academia Brasileiraae esportiva apostaLetras."

Segundo o biógrafo, "95% dos escritores ficaram impressionados com a qualidade e a versatilidade da escrita", sendo que alguns a comparavam com textos escritosae esportiva apostavida pelos autores ali citados e encontravam muitas semelhanças no estilo, na métrica e na temática.

"Foi um impacto muito forte. E isso levou jornalistas a Pedro Leopoldo, alguns interessadosae esportiva apostadesvendar aquele enigma, outros querendo 'desmascarar aquela fraude'", prossegue Souto Maior. "Houve um impacto positivo e também um impacto negativo na repercussão."

Tal dicotomia perseguiu Xavier por toda a vida. "De um lado, admiradores;ae esportiva apostaoutro, profunda desconfiança", comenta o jornalista. "Mas neste início dele, vejo algo forte e interessante. Ele foi se tornando uma figura conhecida. E polêmica."

E se ele sempre manteve a simplicidade no seu dia a dia — três anos depois, assumiu um postoae esportiva apostaescrevente-datilógrafoae esportiva apostauma fazenda modelo ligada ao Ministério da Agricultura —, a escrita passou ser parte indissociávelae esportiva apostaseu dia a dia como médium.

De certa forma, foi essa obra literária mediúnica que atraiu Souto Maior ao universoae esportiva apostaXavier. Ele se recorda que, nos anos 1990, era então subeditorae esportiva apostaCultura do Jornal do Brasil quando ficou curioso para ver uma peçaae esportiva apostacunho espírita que estava arrebatando as bilheterias no Rioae esportiva apostaJaneiro. Era Nosso Lar, baseada no best-seller homônimo psicografado por Xavier.

"Recordo-me até hoje do que escrevi depois, no jornal, sobre a experiência, aquele universoae esportiva apostaque o centro era Chico Xavier. Coloquei no papel que ele havia então escrito maisae esportiva aposta400 livros, vendido maisae esportiva aposta30 milhõesae esportiva apostaexemplares e doado toda a renda dos direitos autorais a instituições beneficentes", relata o jornalista.

Xavier costumava dizer que os livros não pertenciam a ele. Que ele não havia escrito nada, mas que eram obras dos espíritos. "Aquilo para mim era muito intrigante. Por isso decidi ir até Uberaba, apesarae esportiva apostamuito cético, muito descrente", diz.

Eraae esportiva apostaum centro espírita na cidade do Triângulo Mineiro que o médium então exercia suas atividades.

O símbolo do espiritismo brasileiro

Esse fascínio e todo o carismaae esportiva apostaXavier fizeram dele o maior nome do espiritismo kardecista brasileiro. E também foi o que trouxe muitos adeptos para a doutrina fundada na França no século 19, pelo autor e educador Allan Kardec.

Chico durante psicografia

Crédito, Arquivo O Cruzeiro/EM/D.A Press)

Legenda da foto, Chico durante psicografia

"Chico Xavier não foi só o grande médium, mas todo o espiritismo brasileiro ganhou uma feição diversa depoisae esportiva apostasua aparição. Ele não é apenas um médium carismático, é antesae esportiva apostatudo um modeloae esportiva apostaespírita exemplar, que é também um modeloae esportiva apostasanto cristão exemplar a ser seguido e imitado emae esportiva apostacaridade, humildade e renúncia, não por acaso temas do catolicismo", contextualiza o filósofo e antropólogo Bernardo Lewgoy, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e autor do livro O Grande Mediador: Chico Xavier e a Cultura Brasileira.

"Ele nacionalizou o espiritismo kardecista francês, criando uma escatologia nacional própria nos anos 30 e 40. Por outro lado, aproximou o antigo kardecismo elitista das pessoas mais simples, valorizou as mulheres como personagens ativas nos centros espíritas e na prática familiar do espiritismo", complementa.

O antropólogo avalia que Xavier consagrou-se "como uma espécieae esportiva aposta'santo informal' do espiritismo". "Os livros e as mensagensae esportiva apostaEmmanuel e André Luiz [os dois principais nomes a quem ele atribuiu a autoriaae esportiva apostaseus textos psicografados] são presença e leitura obrigatóriaae esportiva apostacentros espíritas brasileiros", comenta.

Um dos temas centrais do livro O Grande Mediador é como Xavier conseguiu popularizar o espiritismoae esportiva apostaum paísae esportiva apostaraízes fortemente católicas como o Brasil. "O espiritismo chegou ao Brasil no século 19, quando o catolicismo era religião oficial do Império", pontua Lewgoy.

"Mas o catolicismo nunca foi homogêneo: sempre houve devoções populares e misturas sincréticas com outras religiosidadesae esportiva apostaorigem indígena e africana. A crençaae esportiva apostaespíritos que sobrevivem após a morte do corpo e que retornam periodicamente parece ser uma moeda comum dessa espiritualidade difusa abrigada no grande manto católico-popular", avalia o pesquisador.

Lewgoy entende o espiritismo como "uma religião urbana", que encontrou espaçoae esportiva apostacrescimentoae esportiva apostameios profissionais típicos desse fenômeno pós-êxodo rural — por exemplo, entre médicos, militares e professores. Segundo ele, o apelo da experiência mediúnica eae esportiva apostacontatos com parentes falecidos e práticasae esportiva apostacaridade e cura, "numa épocaae esportiva apostadifusão do positivismo e do evolucionismo é fatorae esportiva apostamuita importância para esse segmento".

Na visão do antropólogo, estabeleceu-se então "um longo e invisível diálogo sincrético, misturado a uma forte competição" entre espiritismo e catolicismo. Este foi o caminho encontrado por Xavier, um homem hábilae esportiva apostacosturar "uma agenda nacional cristã-espírita, com influência do catolicismo popular".

"Seu discurso era fundamentalmente cristão. E ele sempre fazia questãoae esportiva apostadizer que a Igreja Católica era o berçoae esportiva apostatodos nós", ressalta o jornalista Souto Maior.

Biografia do médium

Nos anos 1990, um Chico já alquebrado mantém-seae esportiva apostaatividade

Crédito, Valterae esportiva apostaPaula/EM/D.A Press

Legenda da foto, Nos anos 1990, um Chico já alquebrado mantém-seae esportiva apostaatividade

A mãeae esportiva apostaXavier era católica e morreu quando o garoto tinha apenas 5 anos. Segundo alguns biógrafos, um ano antes ele já relatava ouvir vozes do além. Quando se tornou órfão, passou a "ter diálogos" diários com o que seria o espírito da mãe.

Diante da estranheza dos familiares — ele acabou sendo criado por uma madrinha retratada como mulher violenta, que o castigava e açoitava —, seu conselheiro na infância foi um padre da cidade natal.

"Ele foi fundamental para que Chico Xavier não fosse internado pelo pai como um louco quando começou a ouvir vozes e ter visões", conta Souto Maior. "O padre dizia para ele ter cuidado com que falava, não contar tudo o que vivia… Por isso ele sempre teve um profundo respeito e gratidão pelo catolicismo."

Foi só aos 17 anos que Xavier teve contato com a doutrina espírita kardecista — e assim colocar o que vivenciava dentro dos métodosae esportiva apostauma doutrina.

Mas se os livros ajudaram a sistematizar o legadoae esportiva apostaXavier, foram suas aparições na TV que renderam fama nacional. É considerada um marcoae esportiva apostaparticipação, ao vivo, no programa Pinga-Fogo da TV Tupi,ae esportiva apostajulhoae esportiva aposta1971.

Ele acabou repetindo a participação no fim do mesmo ano e o sucesso foi tamanho que, segundo a metodologia da época, 86% dos televisores estavam sintonizados no programa.

Na décadaae esportiva aposta1980, o dinheiro arrecadado por meioae esportiva apostasuas obras já havia sido suficiente para fundar ou auxiliar 2 mil entidadesae esportiva apostacaridadeae esportiva apostatodo o país. Para a doutrina espírita, a caridade é um princípio fundamental. Na época houve uma campanha para que ele fosse indicado ao Prêmio Nobel da Paz. "A mobilização rendeu 2 milhõesae esportiva apostaassinaturas", afirma o biógrafo Souto Maior.

Segundo o último censo,ae esportiva aposta2010, são 3,8 milhõesae esportiva apostapraticantes do espiritismo kardecista no Brasil. Como bem define o antropólogo Lewgoy, trata-seae esportiva aposta"uma minoria religiosaae esportiva apostamuito prestígio" e isso se traduz no sem-númeroae esportiva apostafilmes, telenovelas e outros materiais midiáticos que retratam o assunto.

"O cristianismo evangélico tem uma clientela muito distinta dos espíritas, que sãoae esportiva apostaclasses médias urbanas,ae esportiva apostamaior educação formal e renda", compara o professor.

Por outro lado, é importante pontuar que o kardecismo, no Brasil, acabou assumindo para si o títuloae esportiva aposta"espiritismo", como se não houvesse também no país outras religiões espíritas,ae esportiva apostamatriz africana e indígena.

"Creio que sempre houve esse diálogo [do kardecismo com outras religiões] embora marcado por condescendência e atitudeae esportiva apostasuperioridade moral dos espíritasae esportiva apostarelação às religiõesae esportiva apostamatriz africana", comenta Lewgoy. "A disputaae esportiva apostatorno da 'propriedade' e legitimidade do uso do termo 'espírita' e a crítica às manifestaçõesae esportiva apostaentidadesae esportiva apostaumbanda e candombléae esportiva apostacentros kardecistas são indíciosae esportiva apostatensõesae esportiva apostalonga duração nessa relação."

- Este texto foi publicadoae esportiva apostahttp://vesser.net/brasil-61975677

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