Barãostake casa de apostasItararé: a vida trágica e o humor anárquicostake casa de apostasum ícone do jornalismo:stake casa de apostas
"O Barão é daqueles que começam uma partida do zero. É como se tivesse inventado as regras do jogo", afirma o jornalista Cláudio Figueiredo, autor da biografia Entre Sem Bater - A vidastake casa de apostasApparício Torelly - O Barãostake casa de apostasItararé (2012). "Foi muito mais do que 'frasista'. Foi um humorista revolucionário, anárquico, inovador. Colocar o foco sobre um único aspectostake casa de apostassua obra seria como julgar Pelé porstake casa de apostasatuação no Cosmos, já no seu fimstake casa de apostascarreira".
'Tudo seria fácil se não fossem as dificuldades'
Fernando Apparíciostake casa de apostasBrinkerhoff Torelly nasceu no Rio Grande, município a 317 quilômetrosstake casa de apostasPorto Alegre (RS), no dia 29stake casa de apostasjaneirostake casa de apostas1895. Seu pai, João da Silva, era brasileiro, estake casa de apostasmãe, Maria Amélia, uruguaia. O pequeno Apparício ainda não tinha completado dois anos quando a mãe, então com 18, tirou a própria vida, com um tiro na cabeça. Até hoje, não se sabe ao certo a razão do suicídio. Especula-se que tenha sido por causa do temperamento violento do marido.
Órfãostake casa de apostasmãe, Apparício foi mandado para um colégio jesuítastake casa de apostasSão Leopoldo. Apesarstake casa de apostassua pouca idade, já esbanjava a irreverência que o tornaria famoso. Tanto que foi lá, no Colégio Nossa Senhora da Conceição, que criou seu primeiro jornalstake casa de apostashumor, o Capim Seco, totalmente escrito à mão.
Certa vez, o professorstake casa de apostasportuguês pediu a Apparício que conjugasse um verbo qualquer no tempo mais que perfeito. "O burro vergara ao peso da carga", respondeu o jovem. Nada demais, não fosse Oswaldo Vergara o nome do tal professor.
Antesstake casa de apostasseguir carreira como jornalista, Apparício Torelly tentou a medicina. Tinha 17 anos quando se matriculou na Escolastake casa de apostasMedicina e Farmáciastake casa de apostasPorto Alegre. Ao chegar atrasado a uma aulastake casa de apostasanatomia, o professor Sarmento Leite pegou um fêmur e lhe perguntou: "O senhor conhece este osso?". Ainda ofegante, o estudante respondeu, estendendo a mão: "Não, muito prazer!".
Em outra ocasião, durante uma prova oral, o professor, vendo que Apparício não sabia as respostas, pediu, irônico, a um funcionário da faculdade: "Me traga um poucostake casa de apostasalfafa, por favor". "E, para mim, um cafezinho", completou o aluno que, no entanto, não chegou a concluir o curso e largou a faculdadestake casa de apostas1919.
"A vida do Barãostake casa de apostasItararé é cheiastake casa de apostaspassagens trágicas. A começar pelos seus problemasstake casa de apostassaúde, como a hemiplegia (paralisia total ou parcial da metade lateral do corpo)", conta Mary Stela Surdi, mestrestake casa de apostasLetras pela Universidade Federalstake casa de apostasSanta Catarina (UFSC), com a dissertação Barãostake casa de apostasItararé - A Linguagem do Humor (1998). "Desde muito jovem, foi preso e apanhou incontáveis vezes. Mas, sempre lidou com a perseguição político-ideológica com humor e inteligência".
'Quem inventou o trabalho não tinha o que fazer'
Com passagem por diversos jornais e revistas, tanto da capital gaúcha quanto do interior do Estado, Apparício Torelly tentou a sorte no Riostake casa de apostasJaneiro. Na bagagem, trazia seu primeiro e único livro, Pontasstake casa de apostasCigarro,stake casa de apostaspoesia,stake casa de apostas1916, e seu primeiro jornalstake casa de apostashumor, O Chico, que teve tiragemstake casa de apostasoito mil exemplares,stake casa de apostas1918.
Aos 30 anos, foi bater à portastake casa de apostasO Globo. "O que quer fazer aqui?", perguntou o então dono do jornal, Irineu Marinho (1876-1925). "Qualquer trabalho serve", respondeu Apparício. "De varredor a diretor do jornal, até porque não vejo muita diferença". Sua primeira coluna, intitulada Despreso, foi publicada na versão matutina do jornal,stake casa de apostas10stake casa de apostasagostostake casa de apostas1925.
Ao longo da carreira, Apparício Torelly teve dois pseudônimos: Apporelly, uma fusãostake casa de apostas"Apparício" e "Torelly", e Barãostake casa de apostasItararé, o mais famoso deles,stake casa de apostashomenagem à batalha que nunca aconteceu, na divisa entre São Paulo e Paraná, entre as tropasstake casa de apostasWashington Luís estake casa de apostasGetúlio Vargas.
Com a mortestake casa de apostasIrineu Marinhostake casa de apostas21stake casa de apostasagostostake casa de apostas1925, vítimastake casa de apostasinfarto, Torelly migrou para as páginas do jornal A Manhã,stake casa de apostasMário Rodrigues (1885-1930), pai dos jornalistas Mário Filho (1908-1966) e Nelson Rodrigues (1912-1980). Batizada de Amanhã Tem Mais..., a coluna diáriastake casa de apostasApporelly estreoustake casa de apostas2stake casa de apostasjaneirostake casa de apostas1926 e fez enorme sucesso entre os leitores.
"Eles não perdiam aquela saraivadastake casa de apostasfrases, versinhos e trocadilhos com nomesstake casa de apostaspolíticos", afirma o jornalista e escritor Ruy Castrostake casa de apostasO Anjo Pornográfico - A Vidastake casa de apostasNelson Rodrigues (1992). "Algumas das melhores frases já tinham sido inventadas por Bernard Shaw, Mark Twain ou Oscar Wilde, a quem Apporelly esqueciastake casa de apostascitar. Outras, às vezes muito engraçadas, eram dele mesmo".
Entre outros trocadilhos famosos, Getúlio Dornelles Vargas (1882-1954), líder da Revoluçãostake casa de apostas1930, virou "Getúlio Dor Neles Vargas" e Filinto Müller (1900-1973), o torturador do Estado Novo, "Filinto Mula". Sobre Getúlio, aliás, disse, certa ocasião: "Sabe como se chama nosso caro presidente? Gravata Preta. Adapta-se a qualquer roupa e a qualquer regime".
Alémstake casa de apostasfazer trocadilhos com nomesstake casa de apostaspolíticos, Torelly se especializoustake casa de apostascriar paródias para frases famosas. "Os vivos são sempre e cada vez mais governados pelos mortos", do filósofo francês Auguste Comte (1798-1857), por exemplo, virou "Os vivos são sempre e cada vez mais governados pelos mais vivos". Já o lema integralista "Deus, Pátria e Família",stake casa de apostasPlínio Salgado (1895-1975), ganhou nova versão: "Adeus, Pátria e Família!".
Apenas quatro meses depoisstake casa de apostascomeçar a trabalhar no jornal A Manhã, Torelly decidiu fundar seu próprio jornal: A Manha. "O jornalstake casa de apostashumor que ele criou e manteve com ímpeto quixotesco sobreviveustake casa de apostas1926 a 1959", explica o jornalista Rodrigo Jacobus, Mestrestake casa de apostasComunicação e Informação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com a tese Um Nobre Bufão no Reino da Grande Imprensa (2010). "Ao longo desse período, pontuou com seu humor alguns dos maiores acontecimentos do século 20, como a Revoluçãostake casa de apostas30, o Estado Novo, a Segunda Guerra Mundial...".
Em 10stake casa de apostasoutubrostake casa de apostas1929, A Manha passou a circular como suplemento do jornal Diário da Noite, do jornalista Assis Chateaubriand (1892-1968), o "Chatô". A sociedade, porém, durou pouco: cinco meses.
Além da edição diária, Torelly publicou, ainda, três númerosstake casa de apostasAlmanhaque, ou seja, o almanaque do jornal A Manha. Um número saiustake casa de apostas1949 e dois,stake casa de apostas1955. Todos traziam jogos, piadas e adivinhações. Seu principal parceiro na nova empreitada foi o chargista e ilustrador paraguaio Andrés Guevara (1904-1963).
'Há qualquer coisa no ar além dos aviõesstake casa de apostascarreira'
No dia 9stake casa de apostasdezembrostake casa de apostas1935, Apparício Torelly sofreu a primeirastake casa de apostassuas muitas prisões. O motivo da detenção nunca foi totalmente esclarecido. Uma das hipóteses é pelo fatostake casa de apostasele ter sido um dos fundadores da Aliança Nacional Libertadora (ANL), no Riostake casa de apostasJaneiro. Na manhã seguinte, Torelly foi levado para um navio-presídio ancorado na Baíastake casa de apostasGuanabara. Nem mesmo preso perdeustake casa de apostasverve cômica. A certa altura, o comandante afirmou: "O senhor está convidado a depor". Nisso, o Barão respondeu, cínico como sempre: "Depor o governo? Me admira muito que o senhor tenha a coragemstake casa de apostasfazer um convite desses".
Noutra ocasião, durante um interrogatório, ouviu do juiz Castro Nunes: "A que o senhor atribuistake casa de apostasprisão?". "Só posso atribuir ao fatostake casa de apostasestar tomando um cafezinho", respondeu. "Na minha família, sempre disseram que café faz mal". No exato momento da prisão, Torelly estavastake casa de apostasuma padaria, na avenida Rio Branco, tomando cafezinho.
No dia 21stake casa de apostasmarçostake casa de apostas1936, Apparício Torelly foi transferido para a Casastake casa de apostasDetenção, na rua Frei Caneca. Lá, dividiu cela, entre outros, com o jornalista e escritor Graciliano Ramos (1892-1953). "Aporelly contava piadas satirizando a situação política do país", conta o escritor e biógrafo Dênisstake casa de apostasMoraes em O Velho Graça - Uma Biografiastake casa de apostasGraciliano Ramos (2012). "Só se referia, por exemplo, ao carrancudo general Góis Monteiro como 'Gás Morteiro' e adorava compor paródias para músicas famosas como Cidade Maravilhosa".
Mas, aos poucos, a prisão começou a deixar marcasstake casa de apostasTorelly. É o que relata Fábio César Alves, doutorstake casa de apostasLetras pela Universidadestake casa de apostasSão Paulo (USP), com a tese Vivência, Reflexão e Combate: Sobre Memórias do Cárcere (2013). A obra-primastake casa de apostasGraciliano, explica o pesquisador, revela o quanto a prisão destruiu Aparício Torelly. "De dia, era aparentemente alegre. Mas, à noite, passava muito mal. A pontostake casa de apostassofrer tremores e ranger os dentes. O que obrigava o Graciliano a agarrá-lo até que se acalmasse".
Soltostake casa de apostasdezembrostake casa de apostas1936, já ostentandostake casa de apostasfamosa barba, Torelly virou-se para o amigo e disse, com indisfarçável admiração: "Às vezes, tenho vontadestake casa de apostaspartir-lhe a cabeça só para ver o que tem dentro".
'Um dia é da caça... Os outros da cassação!'
Graciliano Ramos não foi o único escritor famoso que Apparício Torelly conheceu. No jornal A Manha, trabalhou ao ladostake casa de apostasRubem Braga (1913-1990), José Lins do Rego (1901-1957) e Marques Rebelo (1907-1973). No casostake casa de apostasJorge Amado (1912-2001), foi Torelly quem apresentou o escritor baiano astake casa de apostasfutura mulher, Zélia Gattai (1916-2008). Foistake casa de apostasjaneirostake casa de apostas1945, durante o 1° Congresso Brasileirostake casa de apostasEscritores,stake casa de apostasSão Paulo. O encontro se deu na Boate Bambu. "Me apresente à moça, Barão", pediu Amado. E, assim, os dois se conheceram.
"Não houve no Brasil, na décadastake casa de apostas1940, escritor mais unanimemente lido e admirado do que o humorista cujo riso, ao mesmo tempo bonachão e ferino, fazia a crítica aguda e mordaz da sociedade brasileira e lutava pelas causas populares", declarou Jorge Amado,stake casa de apostas1985. "Mais do que um pseudônimo, o Barãostake casa de apostasItararé foi um personagem vivo e atuante, uma espéciestake casa de apostasDom Quixote nacional, malandro, generoso e gozador, a lutar contra as mazelas e os malfeitos".
Em novembrostake casa de apostas1946, Torelly arriscou-se na carreira política. Em temposstake casa de apostasfalta d'água estake casa de apostasleite adulterado, adotou como lemastake casa de apostascampanha: "Mais água! Mais leite! Mas menos água no leite!". Deu certo. Com 3,6 mil votos, elegeu-se vereador pelo PCB. Certa ocasião, ouviustake casa de apostasum parlamentar: "O que Vossa Excelência fala entra por um ouvido e sai pelo outro". "Impossível, excelência", rebateu o Barão. "O som não se propaga no vácuo".
Em maiostake casa de apostas1947, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou o registro do PCB. Com isso, Torelly perdeu seu mandato. "Na época, emissorasstake casa de apostasrádio transmitiam os discursos dos vereadores", relata o jornalista Mouzar Benedito, autorstake casa de apostasBarãostake casa de apostasItararé: Heróistake casa de apostasTrês Séculos (2007). "Quando discursava, lavadeiras e operários paravamstake casa de apostastrabalhar para ouvir o Barão. Em seu discursostake casa de apostasdespedida, disse: 'Deixo a vida pública para entrar na privada'".
'O que se leva dessa vida é a vida que a gente leva'
No dia 12stake casa de apostasjaneirostake casa de apostas1965, Torelly sofreu mais um duro golpe. Sua companheira, Aída Costa, encharcou as roupasstake casa de apostasálcool e ateou fogo ao corpo. Foi a quinta tragédia pessoal que Torelly sofreu emstake casa de apostasvida:stake casa de apostas1897, perdeu a mãe;stake casa de apostas1935, Zoraide,stake casa de apostassegunda mulher, vítimastake casa de apostascâncer;stake casa de apostas1939, Juracy,stake casa de apostasterceira mulher,stake casa de apostasleucemia;stake casa de apostas1944, Ady,stake casa de apostasfilha,stake casa de apostasproblemas no coração e apendicite; estake casa de apostas1965, Aída, por suicídio.
Recluso, Apparício Torelly morreu enquanto dormia no dia 27stake casa de apostasnovembrostake casa de apostas1971, aos 76 anos, há exato meio século. Ele morava, sozinho, num apartamentostake casa de apostasquatro cômodos, todos abarrotadosstake casa de apostaslivros, revistas e jornais, no bairrostake casa de apostasLaranjeiras, Zona Sul do Rio. No atestadostake casa de apostasóbito, "arteriosclerose cerebral, seguidastake casa de apostascoma diabético".
Apparício Torelly deixou três filhos: Arly, Ady e Ary, frutosstake casa de apostasseu primeiro casamento, com Alzira Alves. Os sucessores são incontáveis. Os mais famosos, na opiniãostake casa de apostasJorge Amado, foram o Stanislaw Ponte Preta, criado por Sérgio Porto (1923-1968), e o Analistastake casa de apostasBagé,stake casa de apostasLuís Fernando Veríssimo. Mas, houve outros, conforme lista o jornalista e escritor Luís Pimentelstake casa de apostasEntre Sem Bater - O Humor na Imprensa (2004): da revista Pif-Paf,stake casa de apostasMillôr Fernandes (1923-2012), a Bundas, do cartunista Ziraldo.
"O pessoal do Pasquim assumia ser 'neto' do Barão e 'filho' do Stanislaw Ponte Preta", observa o designer gráfico Sérgio Papi, responsável, ao ladostake casa de apostasJosé Mendes André, pelo relançamento dos três volumes do Almanhaque, entre 1989 e 1995. "Não por coincidência, o jornalista Sérgio Porto foi 'foca' (jornalista iniciante) do Apparício no jornal Folha do Povo". Reza a lenda que foi o Barão quem convenceu Sérgio Porto, que estreou no jornalismo como críticostake casa de apostascinema,stake casa de apostasque tinha vocação para o humor.
stake casa de apostas Dez máximas do Barãostake casa de apostasItararé:
1. "De onde menos se espera, daí é que não sai nada."
2. "Quando pobre come frango, um dos dois está doente."
3. "Tempo é dinheiro. Vamos, então, pagar as nossas dívidas com o tempo."
4. "O fígado faz muito mal à bebida."
5. "Negociata é todo bom negócio para o qual não fomos convidados."
6. "Para este mundo ficar bom, é preciso fazer outro."
7. "Quem foi mordido por cobra tem medo atéstake casa de apostasminhoca."
8. "Sabendo levá-la, a vida é melhor do que a morte."
9. "O tambor faz muito barulho, mas é vazio por dentro."
10. "Este mundo é redondo, mas está ficando muito chato."
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