'É como matar um cão': o dilema do abatex6bet como funcionajegues no Nordeste para produçãox6bet como funcionaremédio na China:x6bet como funciona

Jumentox6bet como funcionamatagal

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, O jumento brasileiro entrou na mirax6bet como funcionaempresários chineses para a produçãox6bet como funcionaremédio sem comprovação científica

Estima-se que o produto movimente bilhõesx6bet como funcionadólares por ano. Uma peçax6bet como funcionacouro, por exemplo, pode ser vendida na China por até U$ 4 mil (cercax6bet como funcionaR$ 22,6 mil) — uma caixax6bet como funcionaejiao sai por R$ 750. No Brasil, os valores do comércio são bem menores — jumentos são negociados por R$ 20 no sertão, e depois repassados aos chineses.

Legenda do vídeo, O trágico destino dos jumentos do Nordeste, abatidos para fazer remédio na China

A alta demanda e lucratividade fizeram com que empresários chineses mirassem o Brasil, país com uma população abundantex6bet como funcionajegues —x6bet como funciona2013, havia 900 mil deles, a maior parte no Nordeste, segundo o IBGE. Hoje,x6bet como funcionaacordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) há por voltax6bet como funciona400 mil. Entre 2010 e 2014, o Brasil abateu 1 mil jumentos — já entre 2015 e 2019, foram 91,6 mil.

Mas esse número hoje é maior. Apenasx6bet como funcionaAmargosa, são 4,8 mil animais por mês — 57,6 mil por ano. Há outros dois frigoríficos com permissão para a atividade nas cidadex6bet como funcionaSimões Filho e Itapetinga, também na Bahia.

Nos últimos meses, a reportagem da BBC News Brasil se debruçou sobre o comércio e abatex6bet como funcionajumentos e como esse mercado vem afetando parte do Nordeste. Embora tenha sido permitida recentemente, a exportação para a produção do ejiao tem sido apontada por especialistas, autoridades e defensores da causa animal como um mercado extrativista.

Para fabricar o produto, os animais são recolhidos da caatiga ex6bet como funcionazonas ruraisx6bet como funcionagrande volume, sem que exista uma cadeiax6bet como funcionaprodução que renove o rebanho, como ocorre com o gado. Ou seja, eles são abatidosx6bet como funcionauma velocidade maior do que a capacidadex6bet como funcionareprodução, o que acendeu um alertax6bet como funcionaque a populaçãox6bet como funcionajegues pode ser eliminada nos próximos ano no Nordeste.

Além disso, o setor cresceux6bet como funcionaconsonância com o aumento da fome e da pobrezax6bet como funcionauma região historicamente já castigada por esses problemas. Mas também cresceux6bet como funcionameio a denúnciasx6bet como funcionamaus-tratos, contaminaçãox6bet como funcionaanimais por mormo, uma doença mortal, trabalho análogo à escravidão e abandonox6bet como funcionajegues à morte por inanição.

Dependência econômica

Vista da cidadex6bet como funcionaAmargosa

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Em Amargosa funciona o frigorífico com maior númerox6bet como funcionaabatesx6bet como funcionajumentos no Brasil

A cidadex6bet como funcionaAmargosa,x6bet como funciona40 mil habitantes e conhecida porx6bet como funcionamovimentada festax6bet como funcionaSão João, é o ponto final do jumento nordestino antesx6bet como funcionaele ser abatido e exportado para virar remédio na China. Ela ficax6bet como funcionauma região conhecida como Vale do Jiquiriçá, um dos lugares mais bonitos do Brasil, com formações rochosasx6bet como funciona80 metrosx6bet como funcionaaltura espalhadas pelo cenáriox6bet como funcionacaatinga.

Desde 2017, o município é o local onde mais se abate jegues no país.

Segundo o prefeito, Júlio Pinheiro (PT), o setor é o terceiro maior empregadorx6bet como funcionaAmargosa, atrás só da própria prefeitura ex6bet como funcionauma fábricax6bet como funcionasapatos. Para ele, o recente mercado é fundamental para a economia do município, gerando empregos, renda e impostos.

"O frigorífico têm ajudado na geraçãox6bet como funcionarenda ex6bet como funcionaempregos diretos, ainda mais num momento tão complicado da economia do país, sobretudo com a pandemia. O frigorífico tem sido a sustentaçãox6bet como funcionacentenasx6bet como funcionafamílias aqui na cidade", diz Pinheiro,x6bet como funcionaseu gabinete.

Prefeitox6bet como funcionaAmargosa, Júlio Pinheiro

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Prefeitox6bet como funcionaAmargosa, Júlio Pinheiro afirma que setor hoje é fundamental para economia da cidade

Essa importância econômica foi o principal argumento da cidade ao entrar na Justiça para tentar liberar o abate, que havia sido suspenso após denúnciasx6bet como funcionamaus-tratos,x6bet como funciona2018. Mas não apenas Amargosa procurou a Justiça. O governo estadual, do petista Rui Costa, e o federal,x6bet como funcionaJair Bolsonaro (PL), fizeram o mesmo.

Quem decidiu o caso foi Kassio Nunes Marques, hoje ministro do STF e à época, desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). Ele não entrou no mérito da ação civil-pública, que ainda corre na Justiça e pede a proibição dos abates. Em decisãox6bet como funcionapouco maisx6bet como funcionaduas páginas, Nunes Marques concordou que a liminar da Justiça baiana que suspendeu o setor prejudicava a economia da Bahia.

"[A atividade] é legal e está amparada por normativos legais editados pelos órgãos competentes e a interrupção abrupta da referida atividade industrial é passívelx6bet como funcionacausar não só as empresas criadas e dedicadas às atividades danos irreparáveis oux6bet como funcionadifícil reparação, como aos municípios que hospedam os referidos abatedouros, como o próprio Estado da Bahia", escreveu, liberando novamente o setor.

Em Amargosa, o prefeito Júlio Pinheiro considerou a decisão justa, mas diz não conhecer bem os empresários responsáveis pelo abatedouro que funciona na cidade. "É um grupo chinês. Eles vieram aqui (na prefeitura) uma vez, mas não são pessoas conhecidas na cidade", diz.

O CNPJ do Frinordeste aponta um quadro societário com dois chineses, Ran Yang e Zhen Yongwei, ambos residentes no exterior, e o brasileiro Alex Franco Bastos. Funcionários da empresa, ouvidos sob condiçãox6bet como funcionaanonimato, relatam que raramente os proprietários chineses visitam o espaço, e que, no dia a dia, a atividade é comandada por Bastos.

A reportagem tentou entrevistá-lo diversas vezes, indo ao frigorífico, ligando e enviando mensagens pelo WhatsApp, mas nunca obteve retorno. Também enviou mensagem para Zhen Yongwei, mas ele não respondeu.

Já a JBS, que arrendou o espaço para o triox6bet como funcionaempresários há três anos, afirmou que "toda a operação da planta mencionada está sob responsabilidade da empresa" que arrendou a planta.

Fachada do Frinordeste

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, A planta industrial do Frinordeste pertence à JBS, mas foi arrendada pordois empresários chineses e um brasileiro

'É como matar um cachorro'

Três vezes por semana, cercax6bet como funciona400 jumentos chegam ao Frinordestex6bet como funcionacaminhões fechados — 50 por veículo. Funcionários relatam que, diante do calor,x6bet como funcionaviagensx6bet como funcionaaté 500 km e da condição física debilitada, animais chegam a desembarcar na empresa machucados ou até mortos.

Com pouca variação, a maioria dos 150 trabalhadores ganha por voltax6bet como funcionaR$ 1.300 por mês. Eles vivemx6bet como funcionacomunidades pobres perto do frigorífico, locais onde o fornecimentox6bet como funcionaágua só é feito três vezes por semana e onde ainda é possível ver um ou outro jumentos tralhandox6bet como funcionatarefas agrícolas.

Embora dependam do serviço para sobreviverx6bet como funcionaum momentox6bet como funcionaalta do desemprego ex6bet como funcionauma cidade sem muitas alternativas, os funcionários dizem ter dificuldadex6bet como funcionalidar com a mortex6bet como funcionamassax6bet como funcionaum animal que faz partex6bet como funcionaseu cotidiano — desejam que o frigorífico mude o modelox6bet como funcionanegócios para o abatex6bet como funcionabovinos.

"Para mim é como matar um cachorro, um bichox6bet como funcionaestimação. A gente cresce montando jegue, e agora tem que ver jegue morrendo sem parar. É muito jegue, amigo. Muito mesmo, tem semana que são 1,2 mil. Ninguém aguenta mais ver essa situação", diz João (nome fictício), que trabalha no frigorífico e depende do salário para sustentar a família. Ele passou meses desempregado e, sem opção, aceitou um emprego. "Trabalho por que preciso, não por concordar. Mas, se fechar, como ficam as famílias aqui?", diz.

Outro funcionário, José, também diz ter dificuldadex6bet como funcionaassistir todos os dias a tantos abates. "A gente nem sabe direito porque estão fazendo isso, o que vão fazer com eles... Muitos chegam aqui machucados, morrendo. É um animal que a gente vê desde pequeno, faz parte da nossa vida. É complicado participar disso, mas a precisão exige. Tenho filhos para criar, a situação está bem difícil", afirma.

Três jumentosx6bet como funcionaáreax6bet como funcionacaatinga

Crédito, Felix Lima

Legenda da foto, Antes do abate, animais ficam armazenadosx6bet como funcionaáreasx6bet como funcionacaatinga na Chapada Diamantina

Pobreza e abate

O caminho do jumento até Amargosa é longo.

Os animais são recolhidosx6bet como funcionavários pontos do Nordeste, como nos arredores da cidadex6bet como funcionaPaulo Afonso, no norte da Bahia, a 534 km do frigorífico. Eles são pegos ou comercializados por agricultores pobres que trabalham no setor para fugir da fome, sob a supervisãox6bet como funcionafazendeiros.

Um desses núcleos tinha um sertanejox6bet como funcionasituaçãox6bet como funcionafome como personagem. Em abril, ele foi abordado pela Polícia Militar depoisx6bet como funcionauma denúncia anônima apontar furtox6bet como funcionajeguesx6bet como funcionaPaulo Afonso, alémx6bet como funcionasupostos maus-tratos.

Com ele foram encontrados 13 animais, embora ele tenha negado os furtos. Segundo o Boletimx6bet como funcionaOcorrência, os jegues estavamx6bet como funciona"claro estadox6bet como funcionamaus-tratos", machucados, e sem água e comida por pelo menos três dias. Mas os jumentos não eram do sertanejo.

No BO, ele narra que recebia R$ 20 por animal recolhido, o único sustento da família. "Com esse dinheiro é que estava vivendo, utilizando-o para comprar leite para os meninos, fraldas e comida para a casa", narra o documento. Diz ainda que era a segunda vez que ele caçava e vendia jumentos, mas que não tinha dinheiro para alimentá-los. "Narra que os pegou apenas para colocar o que comer para o filhos."

jumentos na caatinga

Crédito, Felix Lima

Quem comprava os jegues do sertanejo era um policial civil e fazendeiro chamado Antônio Fernando Filho,x6bet como funciona59 anos, morador da cidadex6bet como funcionaRodelas, também no norte da Bahia.

No BO, ele afirmou que tinha maisx6bet como funciona100 emx6bet como funcionafazenda e que os repassava aos chineses — também argumentou que alimentava os animais e seguia todas as regras sanitárias.

Em entrevista à BBC News Brasil por telefone, Filho diz que trabalhou na área por dois anos, mas parou depois do caso narrado acima. Ele ainda tem 30 animais emx6bet como funcionafazenda, mas diz que o local foi arrendado por outra pessoa, que recolhe jegues no interior do Piauí e do Maranhão. "Estão todos comendo feno e bebendo água do rio", afirma.

O fazendeiro afirma que recebia uma comissão dos frigoríficosx6bet como funcionaaté R$ 50 por animal coletado — era um complemento parax6bet como funcionarenda como policial civilx6bet como funcionaRodelas. "A gente pegava no mato, na estrada,x6bet como funcionaqualquer lugar. Quando juntava uns 50, colocava num caminhão e enviava pro frigoríficox6bet como funcionaAmargosa, Simões Filho e Itapetinga (locaisx6bet como funcionaoutros abatedouro licenciados)."

Mas, nos últimos meses, o comércio na regiãox6bet como funcionaPaulo Afonso diminuiu muito, diz. "Tem muito jumento ainda, mas eu parei também porque tem muita concorrência hoje, todo mundo atrásx6bet como funcionajumento pra vender pros chineses. Aqui quase não tem mais animal, caiu 80%. Mas o povo precisa, está muito necessitado."

Morte e maus-tratos

Jumento morto, observado por outro animal

Crédito, Reprodução

Legenda da foto, Dezenasx6bet como funcionaanimais foram encontradosx6bet como funcionasituaçãox6bet como funcionamaus-tratosx6bet como funcionaItatimx6bet como funcionajulho deste ano

Depoisx6bet como funcionarecolhidos, os animais percorrem maisx6bet como funciona530 kmx6bet como funcionacaminhão até a Chapada Diamantina, onde são armazenadosx6bet como funcionafazendas arrendadas nas cidadesx6bet como funcionaIaçu, Milagres e Itatim, a cercax6bet como funciona40 km do destino finalx6bet como funcionaAmargosa.

No dia 18x6bet como funcionanovembro, a reportagem encontrou cercax6bet como funciona20 jeguesx6bet como funcionauma áreax6bet como funcionacaatinga, às margensx6bet como funcionauma rodovia praticamente deserta que liga as três cidades. Eles estavam sozinhos, pastando, algumas fêmeas grávidas e um filhote — um dia depois, desapareceram do local. Havia vegetação e água porque tinha chovido dias antes, mas nem sempre é assim.

Em 9x6bet como funcionajulho deste ano, por exemplo, a Polícia Militar da Bahia recebeu uma denúncia: centenasx6bet como funcionajumentos que seriam abatidos no Frinordeste estavam morrendox6bet como funcionafome e sede na fazenda Boa Esperança,x6bet como funcionaItatim. Quem os encontrou foi o tenente Benjamin Pereira e Silva, comandante do pelotão da PM na cidade.

"Infelizmente a situação era pior do que imaginávamos. Eram uns 200 animais, que tinham vindo da cidadex6bet como funcionaRodelas. Eles estavam bem debilitados, machucados, muitas fêmeas prenhas, muitas abortando. Não tinha mais capim nem água, nenhuma comida para eles. Era uma área totalmente árida. Encontramos muitos animais mortos, com urubusx6bet como funcionacima. Não havia nenhum tipox6bet como funcionaapoiox6bet como funcionaequipe veterinária. Levamos o gerente para a delegacia e ele foi autuado por maus-tratos", relata o tenente.

"No dia seguinte, voltamos à fazenda e não havia mais nenhum animal. Todos foram levados para outro lugar", diz o policial.

Não foi a primeira vez que isso aconteceu. Em 2019, centenasx6bet como funcionajegues foram encontradosx6bet como funcionasituação parecida nas cidadesx6bet como funcionaCanudos e Itapetinga, também no interior da Bahia. Nestes casos, os animais seriam destinados a outros abatedouros, não ox6bet como funcionaAmargosa.

Em Canudos, estima-se que 200 dos cercax6bet como funciona1 mil jumentos encontrados morreramx6bet como funcionainanição. Os outros estavam bastante debilitados. No local, foram encontrados dois imigrantes chineses, responsáveis por cuidar do rebanho.

"Eram dois jovens que não recebiam salário para trabalhar ali. Não falavam português, tivemos que usar o Google Tradutor", conta Patrícia Tatemoto, PHDx6bet como funcionabiologia e pesquisadora da ONG britânica The Donkey Sanctuary, que atua na defesa do jumento contra o mercadox6bet como funcionaejiao. "Quando os encontramos, eles não tinham comida na fazenda, estavam com fome, não tinha nem banheiro. O laudo da polícia apontou que eles estavamx6bet como funcionatrabalho análogo à escravidão."

Os dois imigrante ainda foram autuados por maus-tratos, mas nunca mais foram vistos na regiãox6bet como funcionaCanudos.

Casax6bet como funcionafazendax6bet como funcionaCanudos, com imigrante chinês ao fundo

Crédito, Patrícia Tatemoto

Legenda da foto, Dois imigrantes chineses foram encontradosx6bet como funcionafazenda com centenasx6bet como funcionajumentosx6bet como funcionaestadox6bet como funcionamaus-tratosx6bet como funciona2019

Mormo

Outro problema envolvendo o comérciox6bet como funcionajumentos é uma doença chamada mormo, zoonose contagiosa que afeta equídeos e asininos e pode ser transmitida ao ser humano — o índicex6bet como funcionamortalidade é alto, segundo pesquisadores. Ela é transmitida por contatox6bet como funcionagotículas contaminadas com olhos, pele, mucosas e aparelho respiratório.

Em 2019, a Agênciax6bet como funcionaDefesa Agropecuária da Bahia (Adab) decidiu examinar o sanguex6bet como funciona694 jumentos que foram apreendidosx6bet como funcionaCanudos. Dez deles estavam infectados com Mormo e precisaram ser sacrificados — outros 14 tinham anemia infecciosa equina, doença causada por um vírus.

"O contágio pela bactéria do mormo ocorre pelo contatox6bet como funcionaanimais infectados com os indivíduos, como fazendeiros e veterinários", explicou Eusébio Lino Filho, médico-residentex6bet como funcionainfectologia no Hospital das Clínicas da Faculdadex6bet como funcionaMedicina da USP,x6bet como funcionauma audiência pública sobre o assunto na Assembleia Legislativa da Bahia.

Não havia relatosx6bet como funcionamormo no Brasil até 2020, quando uma criançax6bet como funciona11 anos, da periferiax6bet como funcionaAracaju, apresentou sintomas da doença, como dor no tórax e faltax6bet como funcionaar — ela tinha contato constante com cavalos.

"No raio-X foi constatado um aumento no tamanho do coração incomum para a idade. Mesmo medicado, o paciente evoluiu mal. A pressão caiu, ele tinha vários nódulos no pulmão e abcessos pelo corpo", relata o médico, que participou do tratamento do paciente. Diagnosticada com mormo e tratada por 21 dias no hospital, a criança depois melhorou e recebeu alta.

Mesmo com casosx6bet como funcionainfecçãox6bet como funcionajumentos, a Adab decidiu retirar a obrigatoriedade do examex6bet como funcionamormox6bet como funcionajumentos que são abatidos nos três frigoríficos.

A agência diz que a decisão seguiu orientação do Ministério da Agricultura: "Do pontox6bet como funcionavistax6bet como funcionasaúde animal, visando o controle e erradicação da doença no país, não há ganhosx6bet como funcionavigilânciax6bet como funcionase realizar examesx6bet como funcionamormox6bet como funcionaanimais destinados ao abate". Também informou que os estabelecimentos funcionam sob SIF (Serviçox6bet como funcionaInspeção Federal). No Frinordeste, fiscais do ministério checam "condiçõesx6bet como funcionatransporte e saúde visual" dos animais, diz a pasta.

Porém, o Ministério Público e médicos veterinários pensamx6bet como funcionaoutra forma. Para eles, a atividade está colocando a saúde dos trabalhadoresx6bet como funcionarisco, alémx6bet como funcionacriar um possível problema sanitário que não existia no país.

"A exportação criou um risco sanitário, inclusive para o agronegócio. Esse animais são recolhidosx6bet como funcionavários lugares, e depois transportados pelo Nordeste sem que a gente conheça a procedência. Os empresários que negociam os jumentos não têm ideia do risco que estão criando. É uma bomba-relógio", explica Chiara Oliveira, professorax6bet como funcionaMedicina Veterinária da Universidade Federal da Bahia (UFBA), e uma das pesquisadoras que acolheramx6bet como funcionauma fazenda todos os jegues apreendidosx6bet como funcionaCanudos — dos maisx6bet como funciona690 inicias, cercax6bet como funciona150 sobreviveram.

Em nota técnica do ano passado, o Conselho Regionalx6bet como funcionaMedicina Veterinária da Bahia (CRMV-BA) afirmou que atualmente o mormo é uma "doença endêmica" no rebanhox6bet como funcionaequinos e jumentos no Estado. E que trabalhadores que manipulam os animais,x6bet como funcionaespecial osx6bet como funcionafrigoríficos, "correm sérios riscosx6bet como funcionacontaminação por via respiratória e mucosas (pelos olhos, por exemplo)".

O promotor Julimar Barreto Ferreira, titular da Promotoria Regional Ambiental do Recôncavo Sul, abriu um inquérito para investigar o caso e outras denúnciasx6bet como funcionairregularidades. "Não podemos criar e manter um mercado que coloca a espécie e os trabalhadoresx6bet como funcionagrande risco. É isso que está acontecendo hoje na Bahia", diz, por telefone.

'Símbolo para o cristão'

jumentos na caatinga

Crédito, Felix Lima

O CRMV-BA acredita que, sem uma cadeia produtiva, o ritmo dos abates e a demanda chinesa pelo ejiao podem praticamente dizimar a populaçãox6bet como funcionajumentos no Nordestex6bet como funcionapoucos anos, diagnóstico compartilhado por entidades como o Fórum Nacionalx6bet como funcionaProteção e Defesa Animal, a Frente Nacionalx6bet como funcionaDefesa dos Jumentos e a The Donkey Sanctuary.

Esse cenário foi registrado na própria China, segundo um estudo dos pesquisadores Richard Bennett e Simone Pfuderer, da Universidadex6bet como funcionaReading, no Reino Unido.

Em 2000, o país tinha por voltax6bet como funciona9 milhõesx6bet como funcionacabeças —x6bet como funciona2016, o número caiu para 2 milhões. Em 2000, a produção anualx6bet como funcionaeijiao erax6bet como funciona1,2 tonelada — jáx6bet como funciona2016, foram 5 toneladas. Estima-se que o país precisex6bet como funciona5 milhõesx6bet como funcionapelesx6bet como funcionajumento por ano, mas, desde 2017, o estoque interno não é mais capazx6bet como funcionasuprir a demanda.

A soluçãox6bet como funcionaparte do empresariado chinês foi buscar animaisx6bet como funcionaoutros países, como o Quirguistão, que perdeu 57%x6bet como funcionaseu rebanhox6bet como funcionajumentos desde 2017, segundo estudo da ONG The Donkey Sanctuary. Países como Mali, Gana e Etiópia recentemente proibiram o abate, embora ele ainda ocorra clandestinamente.

No Brasil, um estudo da USP aponta que criar um jumento para o abate custariax6bet como funcionamédia R$ 4 mil — a gestaçãox6bet como funcionaum filhote leva 13 meses. Por outro lado, um estudo da ONG britânica estima que,x6bet como funcionatodos os animais recolhidos no meio ambiente, 20% morrem antesx6bet como funcionachegar aos frigoríficos.

Nas últimas décadas, a espécie perdeu a importância na agricultura sertaneja depoisx6bet como funcionaser trocada por motocicletas. Livresx6bet como funcionaestradas e na caatinga, os jegues se reproduziram sem política pública voltada para o controle ou questões sanitárias. Vagando por rodovias, eles também se envolveramx6bet como funcionagraves acidentesx6bet como funcionacarro.

No início da década passada, o poder público tentou fomentar o consumox6bet como funcionacarnex6bet como funcionajumento, como ocorrex6bet como funcionaalguns países, mas o projeto não decolou por uma questão cultural: a população se recusa a comerx6bet como funcionacarne.

Para Gislane Brandão, advogada e coordenadora da Frente Nacionalx6bet como funcionaDefesa dos Jumentos, o cenário no Nordeste escancara "uma grande omissão do poder público". "Onde estão as barreiras sanitárias, a regulação do transporte, a cadeia produtiva? Os jumentos estão sofrendo, morrendo, sumindo. E as autoridades estão se omitindo sobre a situação", diz.

Por meio da Adab, o governo da Bahia afirma que não éx6bet como funcionaresponsabilidade da agência criar uma cadeia produtiva e que uma recente portaria dita que "fêmeasx6bet como funcionaterço final da gestação não serão consideradas aptas ao abate", uma medida que, para agência, ajuda a renovação do rebanho. Na mesma norma, diz a Adab, "fica estabelecido que animais abaixox6bet como funciona90 kg também não podem ser encaminhados para abate."

Já o Ministério da Agricultura alega que é responsável pela fiscalização sanitária dos frigoríficos, mas que não está entre suas competências o "controle sobre o númerox6bet como funcionaanimais existentes ou criados, nem sobre riscosx6bet como funcionaextinção". Informou, ainda, que a fiscalizaçãox6bet como funcionaórgãos ligados a pasta "garante que os animais chegam (ao abatedouro) com saúde e sem sinaisx6bet como funcionamaus-tratos durante o transporte."

Em Amargosa, o prefeito Júlio Pinheiro conta que o grupo chinês prometeu criar uma cadeia produtiva do animal, alémx6bet como funciona"trazer novas espécies para a região", o que ainda não aconteceu. Ele não acredita que o jumento possa ser dizimado. "Essa avaliação é um equívoco. A última estimativa do IBGE falax6bet como funcionaquase 1 milhãox6bet como funcionaanimais, boa parte solta na caatinga e nas rodovias, colocandox6bet como funcionarisco a vida das pessoas, sem assistência zootécnica e veterinária que dê um bem-estar aos animais. A gente acredita que isso não vai acontecer com uma produção com abate controlado, com inspeção e normas", diz.

Em uma praça da cidade, o professor Joelson Alcântara, ativista da causa animalx6bet como funcionaAmargosa, pensa diferente. Para ele, além da importância histórica para o sertanejo, o jumento também é um símbolo religioso para o cristão.

"Na Bíblia, Jesus monta um jumento quando ele entrax6bet como funcionaJerusalém. É um animal tão importante que participou da vidax6bet como funcionaJesus Cristo, e está sendo exterminado por uma questão financeira. Não tem explicação", diz.

Na música Apologia ao Jumento (1976), Luiz Gonzaga também cita Jesus quando canta que o jegue "é sagrado": "E na fuga para o Egito/ Quando o julgo anunciou/ O jeguin foi o transporte que levou nosso Senhor".

E continua: "O jumento é nosso irmão, quer queira quer não/ O jumento sempre foi o maior desenvolvimentista do sertão/ Ajudou o homem na lida diária/ ajudou o homem/ ajudou o Brasil a se desenvolver".

raya

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