Churrasco, queijo nobre e até ‘jegueterapia’: Nordeste tenta resolver problema dos jumentos soltos nas estradas:cbet university
Não há estatísticas precisas sobre acidentes com jumentos no Nordeste. Os dados são organizados como "acidentes com animais", mas a Polícia Rodoviária Federal (PRF) assegura que a maioria envolve asininos.
Somente nas estradas federais que cortam a região houve 8.050 acidentes com animaiscbet university2012 a agosto deste ano, com 1.647 feridos graves e 259 mortes. E desde 2015 foram maiscbet university27 mil apreensõescbet universityanimais.
Convênios com prefeituras
Diante da situação, a PRFcbet universityalguns Estados busca soluções para ao menos diminuir o númerocbet universityasnos nas rodovias.
No Maranhão, por exemplo, a polícia e a Agência Estadualcbet universityDefesa Agropecuária (Aged) celebraram um convênio no ano passado para que o governo abrigasse animais apreendidos.
De lá para cá, porém, a agência ainda não disponibilizou espaços para receber os bichos.
"Ficamos, assim, 'espremidos' entre dois crimes: a prevaricação, por não retirar os animais das rodovias, e maus tratos aos animais, por não ter condiçãocbet universityabrigá-loscbet universityforma apropriada", informou,cbet universitynota, a PRF no Maranhão.
A agência diz que o convênio não andou por faltacbet universitydinheiro e parceiros, e porque falta aprovar uma lei que permita "a expropriação e doação dos animais a terceiros".
"Não dispomoscbet universityrecursos financeiros para custear exames necessários e obrigatórios à manutenção desses animaiscbet universityqualquer propriedade ou mesmo à doação", informou.
Recorrendo a 'Jesus'
Convênios com prefeituras também não deram certo no Rio Grande do Norte. Mas lá jumentos encontram abrigo na fazendacbet universityJesus, apelido do agricultor Eribaldo Nobre,cbet university52 anos.
Numa fazendacbet university500 hectarescbet universityApodi, na divisa com o Ceará, Jesus planta melancia, milho e sorgo e há três anos recebe animais abandonados - a fazenda é sedecbet universityuma associaçãocbet universityproteção animal.
Ele cuidacbet universitycercacbet university400 jumentos, sendo 150 fêmeas, ecbet universitymaiscbet universitycem cachorros e gatos. O local chegou a abrigar 1,2 mil jumentos, mas reduziu o acolhimento por causa da seca que atingiu a região e matou centenascbet universityanimais.
"Perdi maiscbet university700 fêmeas ano passado", disse Jesus, hoje animado com o recente anúncio da instalação, na cidade vizinhacbet universityFelipe Guerra,cbet universityuma empresa para beneficiamento do leitecbet universityjumenta.
O objetivo do negócio é produzir queijo pule, uma iguaria com mercado cativo na Europa e na Ásia, onde o quilo do queijo chega a valer R$ 3 mil.
"Estou planejando comprar maquinário para fazer a ordenha e vender meu leite. Mas o que vou fazer com tantos machos, que sustento sozinho?", questiona ele, para quem os machos deveriam ser abatidos - sem sofrimento - para aproveitar carne e couro.
Bacias leiteiras
Quem toca o projeto do queijo pule - o que anima Jesus - são investidores chineses e ingleses.
A empresa Green Building quer criar uma bacia leiteira na regiãocbet universityFelipe Guerra para fornecimento do insumo. "Queremos mudar o pensamento do nordestino, mostrando a eles o valor dos asininos", declarou a firmacbet universitynota.
A empresa diz que irá incentivar a criação dos animais e organizar pontoscbet universitycoleta do leite, com câmarascbet universityresfriamento.
O governo promete apoiar. "Vamos buscar linhascbet universityfinanciamento e queremos aproveitar fazendas que tiveram problemascbet universityseca nos últimos cinco anos. Muitas estão vazias, e vamos colocar jumentos soltos nas estradas nelas", disse o secretáriocbet universityAgricultura, Guilherme Saldanha.
Segundo um estudocbet university2015cbet universitypesquisadores da Universidade Federal e do Instituto Federal do Rio Grande do Norte, o leitecbet universityjumenta é alimento seguro, similar ao leite humano e com menor teorcbet universitygordura.
Churrascocbet universityjumento
Outra possibilidade ligada ao consumo envolve a própria carne do animal.
A solução ganhou famacbet university2014, quando o promotor Silvio Brito, que atuavacbet universityApodi (RN), organizou um churrasco com carne do animal para sensibilizar autoridades e imprensa para a alternativa.
A ideia revoltou alguns defensores dos animais, que chegaram a ameaçar o promotor nas redes sociais.
Houve também resistência na cidade - o prefeito teve que ir a uma rádio negar que a carnecbet universityjumento fosse ser incluída na merenda escolar.
"O jumento pode fornecer até 100 kgcbet universitycarnecbet universityprimeira qualidade, uma peçacbet universitycourocbet universityalto valor (cercacbet universityR$ 120 a peça) e um leite que pode salvar a vidacbet universitymilhõescbet universitypessoas que sofrem com intolerância à lactose ou deficiência nutricional", diz Brito.
Diretora da ONG Bicho Feliz, que atua no Nordeste, Gislaine Brandão critica o usocbet universityjumentos para consumo da carne, couro ou leite.
"É um animal que vem sofrendo há décadas. Eles devem ser aposentados, livres, sem trabalho. O Estado brasileiro deveria cuidar melhor desses animais", afirma.
Abate controlado
Alegando alto riscocbet universityacidentes nas estradas com jumentos, o governo da Bahia anunciou que pretendia abater 2 mil desses animais até outubro deste ano. A carne seria usada para fabricaçãocbet universityração animal, a ser doada ao zoológicocbet universitySalvador.
O Ministério Público, contudo, não viu a solução como "adequada e ética" e recomendou a paralisação dos abates, interrompidoscbet universityjulho.
A Promotoria diz que 978 animais chegaram a ser abatidoscbet universityum frigorífico no interior do Estado que não tinha licença para essa atividade - o local acabou multadocbet universityR$ 50 mil pelo órgão ambiental estadual.
A Secretariacbet universityAgricultura do Estado diz que o frigorífico tinha licença quando recebeu autorização para abate e que atua "sem omissão e negligência diante das mortes dos jumentos nas estradas ou nos abates clandestinos".
Outras alternativas
Um estudocbet university2014 da comissãocbet universitymeio ambiente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil)cbet universityMossoró (RN) concluiu que o consumo da carnecbet universityjumento "não tem amparo cultural, comercial e econômico".
Como alternativa para conter o númerocbet universityanimais abandonados, cita a introdução dos bichoscbet universityparques ecológicos,cbet universityprojetos turísticos, reintroduçãocbet universityatividades rurais e até "jegueterapia",cbet universitytratamentos para pessoas com problemas locomotores e psicológicos.
"O jumento, por ser muito dócil ecbet universityporte pequenocbet universityrelação ao cavalo, vem sendo utilizadocbet universitymuitas clínicas com resultados positivos", diz a comissãocbet universityrelatório.
Para uma associação que trabalha com jumentos da raça "pêga", mais presentecbet universityMinas Gerais e São Paulo (mas com 6,2 mil animais registrados no Nordeste), o custocbet universitycriação do jumento é "muito alto para destinar ao consumo humanocbet universitysua carne, pele e leite".
Para que a produção do leite se tornasse viável economicamente, diz a associação, seria preciso investircbet universitymelhoramento genético, para aumentar o volume produzido.
"Devido à pouca quantidadecbet universityleite produzido pela jumenta, o mesmo é destinado apenas às crias. Contudo, os animais que não tem mais utilidade e representam um problema social poderiam ter essa destinação (abate)."
Numa região na fronteira do Rio Grande do Norte com o Ceará, três empresas agrícolas exportadorascbet universitybanana usam há quatro anos o jumento como animalcbet universitytração.
Em cada empresa,cbet university25 a 35 animais ajudam no transporte dos cachos da áreacbet universityprodução até a casacbet universityembalagem, por meiocbet universityum sistema chamado "cabo-via",cbet universityque frutas são enfileiradas no ar, dependuradascbet universityum fio e puxadas pelo animal com a ajudacbet universityum carrinho.
Muito usado na América Central, o sistema é uma exigênciacbet universityimportadores, para que a fruta não tenha contato com o chão.
Numa dessas empresas, a Agrícola Famosa,cbet universityRussas (CE), os animais transportamcbet university30 a 40 cachos por viagem - são seis viagens por dia.
O técnico agrícola da fazenda, Odirley Fernandes, disse que só não tem mais animais por causa da seca, que tem prejudicado a plantação. "Há dois anos eram 400 hectarescbet universitybanana, hoje temos pouco maiscbet university200 hectares."
Enquanto nenhuma alternativa decolacbet universityvez, o promotor que com um churrasco trouxe o assunto para a vitrine nacional lamenta a situação.
"Acredito firmemente no potencial econômico do jumento. Causa-me frustração o fatocbet universityas demais pessoas não verem isso. Todos os estudos e nossa experiência apontam que o jumento é um animalcbet universityqualidades extraordinárias", afirma.