Carlos Lamarca: há 50 anos era morto o guerrilheiro que marcou a vidaapostas sul americanaBolsonaro:apostas sul americana
Lamarca fugiu. Mas a operação montada, com estradas interditadas, monitoramentos generalizados e revistasapostas sul americanatoda parte, impressionou aquele estudanteapostas sul americana15 anos chamado Jair. Conforme ele mesmo já declarou: foi naquele dia que decidiu que iria se alistar no Exército. Ironicamente, tornaria-se capitão — mesma patente do seu antípoda guerrilheiro.
Herói ou vilão
Apropriado pela esquerda como um herói e tachado pela direitaapostas sul americanavilão, quem afinal foi Carlos Lamarca?
"Para entender essa dinâmica, é preciso antes distinguir memóriaapostas sul americanahistória", argumenta a historiadora Juliana Marques do Nascimento, pesquisadora da Universidade Federal Fluminense (UFF).
"Memória é uma imprecisão graças àapostas sul americanarelação com o presente e também com sentimentos, ideologias. Por isso, para as esquerdas, especialmente as alas mais progressistas, as memórias sobre Lamarca tendem a ser mais positivas, idealizadas. Enquanto para a direita, essas memórias são repulsivas, aliadas ao pensamentoapostas sul americanadireita da época", pondera ela.
"Já a história, a historiografia, tem uma pretensão científicaapostas sul americanaolhar para o passado, por isso usa métodos bem formulados, para que seja uma ciência. Ela é mais objetiva, embora não esteja isentaapostas sul americanasubjetividade", acrescenta. "A história enxerga Lamarca como frutoapostas sul americanaseu tempo: foiapostas sul americanafato uma pessoa com pensamentos inclinados mais para as ideiasapostas sul americanaesquerda, embora ele fosse originalmente das bases das Forças Armadas."
Ela frisa que o personagem foi "completamente avesso ao golpe civil-militarapostas sul americana1964", demonstrava "profundo incômodo com o cenário político" e arquitetou uma "organização mais atuante, tanto na oposição ao novo regime, quanto na luta pela construção do socialismo no Brasil".
A pesquisadora atenta que "a historiografia não é alheia e não nega as violações dos direitos humanos perpetrados pela ditadura". Mas reconhece que o grupoapostas sul americanaLamarca não conseguiu chegar às camadas populares.
"A trajetória política dele e a liderança entre as esquerdas revolucionárias são fatos inegáveis. Mas é importante ressaltar que essa imagemapostas sul americanalíder,apostas sul americanafigura política proeminente, não chegou às massas populares, que eram seu alvo. A ditadura foi bem sucedida na blindagem da informação que não fosseapostas sul americanainteresse do governo", explica Nascimento.
"Lamarca foi um líder para as esquerdas revolucionárias que pouco ou nada atingiram as camadas populares. Foi um líder para um nicho muito específico no Brasil da ditadura. E se tornou vítima da ditadura: foi assassinado por suas ideias políticas", afirma.
Ela frisa, contudo, que no discursoapostas sul americanaLamarca a volta da democracia não era uma questão aventada. "Seus escritos não nos deixam esquecer. Eles não pretendiam a mera voltaapostas sul americanauma democracia liberal como a que estava instaurada antes da ditadura", diz. "Mas, sim, o rompimento com a estrutura capitalista, por meio da implementação do socialismo pela via revolucionária. Não tem nadaapostas sul americanapacifico."
Para o historiador Victor Missiato, pesquisador do Grupo Intelectuais e Política nas Américas, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), e professor do Colégio Presbiteriano Mackenzie Brasília, é preciso considerar que a sedimentação do tempo acabou cristalizando uma imagemapostas sul americanadiversos personagens do período da ditadura.
Após a redemocratização, guerrilheiros passaram a ser vistos como "gente que lutava pela democracia" — o que não correspondia exatamente aos objetivos desses grupos. "Uma parte da esquerda nos últimos anos transformou a trajetória deles militantes. A maioria defendia a revolução enquanto projeto social e não necessariamente a democracia", contextualiza Missiato.
"É muito questionável [classificarmo-los] como líderesapostas sul americanauma verdadeira democracia ou responsáveis pela recondução da democracia brasileira", pondera. "Durante muito tempo, esses guerrilheiros eram vistos como sujeitos revolucionários, e não atores pela democracia"
"A apropriaçãoapostas sul americanaLamarca eapostas sul americanaoutros passa por duas fases: na primeira, como um guerrilheiro a la Che Guevara. Atualmente, como um daqueles que lutaram contra a ditadura e defendiam uma verdadeira democracia", complementa. "Isso vem sendo reconstruído pela historiografia mais vulgar, enquanto a mais acadêmica trata dele como uma figura mitológica."
Tenente-coronel da reserva da Polícia Militar do Estado, o historiador Sérgio Marques defende que sejam lembradas "as vítimas que morreram nas mãos da esquerda" e "acabaram sendo jogadas para debaixo do tapete, como se não existissem". "A respeito desse período turbulento do Brasil, houve atentados aos direitos humanosapostas sul americanaambos os lados", acredita ele.
Marques também questiona a versãoapostas sul americanaque os guerrilheiros lutavam pela democracia. "Isso é uma falácia, uma mentira. Todos os documentosapostas sul americanatodos os grupos revolucionários, ninguém falavaapostas sul americanademocracia, não existia nada a respeito dessa questão. Eles pretendiam substituir a ditadura existente no Brasil por uma ditadura do proletariado, ora modelo cubano, ora modelo soviético ou chinês", afirma.
Biografia
"Lamarca é um homem do tempo dele, um tempo do ápice da Guerra Fria, a oposição entre os sistemas capitalista e socialista", prossegue Marques. "Ele ganhou prioridade aqui no Brasil porque foi o homemapostas sul americanamaior patente que pegouapostas sul americanaarmas. Mas não lutava pela democracia, e sim pela construçãoapostas sul americanaum estado voltado para a ditadura do proletariado."
O jornalista e ex-deputado federal Emiliano José, que na ditadura foi perseguido, preso e torturado, publicou,apostas sul americanaparceria com o também jornalista Oldackapostas sul americanaMiranda, a biografia 'Lamarca: O Capitão da Guerrilha'.
Para ele, o guerrilheiro "ficará na história como um dos heróis da resistência". "Isso é inegável, queiram ou não seus adversários, exatamente os saudosos da ditadura ou aqueles que eventualmente tenham participado dela", diz. "Aqui não há dois lados: Lamarca foi um dos grandes combatentes da ditadura."
Nascidoapostas sul americanauma família simples do Rioapostas sul americanaJaneiro, com pai sapateiro e mãe donaapostas sul americanacasa, Carlos Lamarca foi um adolescente que defendia pautas nacionalistas — como a campanha "o petróleo é nosso" — e encantou-se com 'Guerra e Paz', do escritor russo Leon Tolstoi (1828-1910).
Aos 17 anos alistou-se na Escola Preparatória dos Cadetes. Depois, foi para a reputada Academia Militar das Agulhas Negras,apostas sul americanaResende. Desde cedo destacava-se como bom atirador. Segundo registros, costumava vencer torneios militaresapostas sul americanatiro.
Escalado para integrar um dos 20 contingentes do exército brasileiros do chamado Batalhão Suez — que atuaram na Forçaapostas sul americanaPaz da Organização das Nações Unidas na regiãoapostas sul americanaGaza —, Lamarca ficou 18 meses no Oriente Médio, a partirapostas sul americana1962. Foi nessa época que passou a flertar com ideias socialistas.
Jáapostas sul americanavolta ao Brasil, Lamarca passou a atuar, dentro do Exército, na formaçãoapostas sul americanagruposapostas sul americanaesquerda, mesmo após o golpe que instaurou a ditaduraapostas sul americana1964. Foi um dos primeiros a integrar o grupoapostas sul americanaextrema-esquerda Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). No fimapostas sul americana1968, ele esteve com o também guerrilheiro Carlos Marighella (1911-1969), cofundador do grupo Ação Libertadora Nacional (ALN).
"Lamarca tinha o sonhoapostas sul americanaser militar, desde menino. E foi um excelente militar. Só que viu que o Exército brasileiro, inegavelmente, serviu sempre a 'casa grande', aos interesses das classes dominantes do Brasil", comenta Emiliano José.
"Ele carrega essa singularidade:apostas sul americanater sido um excelente militar. Mas entendeu que nesse Exército ele não podia mais continuar. Aí jogou tudo pelos ares e foi à luta armada, para enfrentar a ditadura", diz ainda José.
Em janeiroapostas sul americana1969, Lamarca entrou para a clandestinidade. Desertou do Exército, acompanhadoapostas sul americanaum sargento, um cabo e um soldado. Numa Kombi, subtraíram ainda das Forças Armadas 63 fuzis, três metralhadoras e munições.
Sua vida então passou a se organizarapostas sul americanarefúgios organizados por companheiros, normalmente apartamentos discretosapostas sul americanaque ele se enclausurava — os chamados "aparelhos". Apaixonou-se pela militante Iara Iavelberg (1944-1971), da VPR, e eles passaram a viver um relacionamento. Seus disfarces não se resumiam aos paradeiros desconhecidos. Lamarca se submeteu,apostas sul americanajunhoapostas sul americana1969, a uma plástica no nariz.
No mesmo ano, seu grupo guerrilheiro experimentou uma fusão com o Comandoapostas sul americanaLibertação Nacional (Colina), resultando no Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares), que teve entre seus quadros a depois presidente Dilma Rousseff.
Depoisapostas sul americanaum anoapostas sul americanapreparação teórica, com muitas leituras e debates, o grupoapostas sul americanaLamarca se embrenhou pelas matas do Vale do Ribeira, no interior paulista. A ideia era utilizar o local como localapostas sul americanatreinamento para a guerrilha armada.
Informado do que se passava, o Exército enviou 2,5 mil homens à regiãoapostas sul americanaRegistro,apostas sul americana21apostas sul americanaabril. A operação foi cinematográfica, com helicópteros esquadrinhando a mata, bloqueiosapostas sul americanaestradas, 120 detidos e até um avião da Força Aérea bombardeando pontos suspeitos.
Lamarca e seus companheiros conseguiram fugir, mata adentro. Dos 17 do grupo inicial, dois foram presos e oito se misturaram à população. O ex-capitão tinha apenas seis junto a ele. Foi esse grupo que acabou protagonizando o ocorridoapostas sul americanaEldorado Paulistaapostas sul americana8apostas sul americanamaio daquele ano — o noticiário destacava cada passo, sempre com uma narrativa favorável aos militares. Isso entusiasmava jovens como Bolsonaro.
"O atual presidente, ele carrega uma frustração profundaapostas sul americananão ter podido ser um dos torturadores da ditadura. Ele revela isso permanentemente, ao nomear seus ídolos", diz Emiliano José. "Ele queria como menino ter combatido o Lamarca, mas é tudo fantasia dele [qualquer eventual participação na caçada]. Não se dá importância às fantasias e frustrações profundas dele não ter estado naquele tempo como um torturador, um carrasco. Não era possível, até pela idade, tudo."
Depoisapostas sul americanacapturar policiais militares, Lamarca conduziu um acordo — libertando-osapostas sul americanatroca da reabertura da estrada. Nessa fuga, os guerrilheiros mataram um tenente policial militar, que era feito como refém.
O cercoapostas sul americana41 dias acabariaapostas sul americanauma maneira inesperada. Em 31apostas sul americanamaio, armados, Lamarca e os companheiros remanescentes decidiram tomar um veículo que passasse na estrada para fugirem. Renderam cinco soldados que trafegavamapostas sul americanaum caminhão do Exército, deixaram-nos sóapostas sul americanacuecas e, usando seus uniformes, passaram incólumes pelas barreiras. Na mesma noite, o veículo foi abandonado na Marginal do Tietê,apostas sul americanaSão Paulo.
O episódio transformou Lamarca no homem mais procurado do país. Para Emiliano José, toda essa "manobra espetacular" pode ter sido o que desencadeouapostas sul americanafamaapostas sul americanauma espécieapostas sul americanaChe Guevara brasileiro. Mas o biógrafo ressalta que essa comparação não é precisa. "Chamá-loapostas sul americanaChe é parte dos clichês da imprensa mundial, porque Che se transformouapostas sul americanauma figura pop, um pop star. Mas não cabia isso [esse tipoapostas sul americanacomparação]", diz.
Sua próxima aventura seria o sequestro do embaixador da Suíça no Brasil, Giovanni Bucher (1913-1992),apostas sul americana7apostas sul americanadezembroapostas sul americana1970. Na ação, um agente federal que atuava na segurança da embaixada foi morto a tiros por Lamarca.
No início do ano seguinte, o guerrilheiro saiu da VPR e passou a integrar o MPR-8. Depoisapostas sul americanameses confinado com elaapostas sul americanaum "aparelho" no Largo do Machado, no Rio, Lamarca partiu para o que seria o começoapostas sul americanasua vislumbrada guerrilha rural, no interior da Bahia.
Baseado na regiãoapostas sul americanaBuriti Cristalino, a 590 quilômetrosapostas sul americanaSalvador, ele escreveu muitas cartas para Iavelberg — e foi por meio dessas cartas, interceptada pela polícia, que seu paradeiro acabaria descoberto.
A operação foi montada pelo Doi-Codi baiano, que recrutaria 215 homens das três forças armadas, alémapostas sul americanaagentes federais, policiais do Dops e da Polícia Militar da Bahia.
Depoisapostas sul americana20 diasapostas sul americanauma caçadaapostas sul americanaque Lamarca se deslocou por maisapostas sul americana300 quilômetros pela mata, às 15h do dia 17apostas sul americanasetembro, o guerrilheiro foi encontrado descansando sob uma árvoreapostas sul americanaPintada, um povoado no municípioapostas sul americanaIpupiara. Foi morto com sete tiros.
"A forma como ocorreu o assassinato é bem emblemática", comenta a historiadora Nascimento. "Ele estava desolado, desnutrido, cansado. Foi localizado sem possibilidadeapostas sul americanarevide."
Mito
Mas é a própria polarização politico-ideológica da sociedade brasileira que deixa uma figura como Lamarcaapostas sul americanaproeminência. Seapostas sul americanatrajetória póstuma foi reconstruída pela redemocratização, sob os escombros dos porões da ditadura, o fatoapostas sul americanaele ser recuperado como símbolo antagônico pelo atual presidente Bolsonaro garante a sobrevivência do mito.
"O mito político não se baseia na razão, mas numa lógica afetiva. Não há neutralidade: ou você está a favor ou contra ele", diz o historiador Zenir Rodrigues dos Anjos Filho, queapostas sul americana2003 defendeu, na Universidade Federalapostas sul americanaUberlândia (UFU), a dissertaçãoapostas sul americanamestrado 'Carlos Lamarca: Significação, Mítica e História'.
"O mesmo argumento que coloca o mito como herói, coloca-o como bandido. O Lamarca é herói e é bandido. Ele sintetiza uma tragédia: se você procurar seus partidários, irão interpretá-lo como herói; adversários vão chamá-loapostas sul americanademônio", explica.
Nesse sentido, os sete tiros não serviram para matar Carlos Lamarca. Porque mitos resistem à morte. "Todos os mitos ressuscitam", diz Anjos Filho. "Todos vencem a tragédia, e no casoapostas sul americanaLamarca isso ocorreu com o fim do regime militar."
E se a releitura dele estava já meio esquecida no imaginário, o fatoapostas sul americanaseu nome ter sido trazido à tona nos últimos anos pela biografia do atual presidente contribui para incensá-lo novamente. Porque, segundo Anjos Filho, "um mito só morre quando deixaapostas sul americanafazer sentido". "Ele se alimenta do oposto, do negativo. Se você tentar destruir um mito, você vai construí-lo cada vez mais", diz.
Para o historiador Victor Missiato, o mito Carlos Lacerda é calcado pelo fato peculiarapostas sul americanaele ter sido um "militar desertor" que teve "vitórias importantes enquanto guerrilheiroapostas sul americanaações contra bancos e também contra o Exército". "Ao longo do tempo, essas histórias foram construídas como aapostas sul americanaalguém que desafiava a ordem autoritária, lutando por um ideal", pontua.
Mas ele mesmo ressalta que a historiografia "é um eterno campoapostas sul americanaconflitos". "Com a ascensãoapostas sul americanacamposapostas sul americanadireita ao poder, houve embates a uma certa leitura cristalizada que predominou entre os anos 1990 a inícioapostas sul americana2000. Nesse sentido, podemos encaixar Lamarca como vilão e como herói", comenta. "Isso vai enriquecendo a figura do personagem, porque seapostas sul americanaum lado ele é vistoapostas sul americanauma forma eapostas sul americanaoutro,apostas sul americanaforma diferente, as novas pesquisas vão enriquecendoapostas sul americanabiografia. Quem quiser fazer uma análise mais ampla consegue ter mais informações."
"Nos últimos anos, sobretudo nos governos Dilma Rousseff e, agora, Jair Bolsonaro, houve tentativas, a partirapostas sul americanavitórias eleitorais,apostas sul americanareinterpretar a história daquele momento", diz o historiador, lembrando do passadoapostas sul americanaRousseff como guerrilheira e a carreira militar do atual presidente do Brasil. "Com Bolsonaro, é mais forte ainda, quando ele ressalta um papelapostas sul americanacapitão do Exército que não corresponde àapostas sul americanatrajetória dentro do Exército."
O historiador se refere ao fatoapostas sul americanaque a carreira militarapostas sul americanaBolsonaro foi curta e marcada por polêmicas. Documentos do próprio Exército, produzidos nos anos 1980, ressaltam que ele era avaliado por superiores como alguém com "excessiva ambiçãoapostas sul americanarealizar-se financeira e economicamente", alémapostas sul americanaser visto como donoapostas sul americanatemperamento agressivo. Em 1986, ele chegou a ser preso por 15 dias. Em 1988, foi para a reserva — a partirapostas sul americanaentão, empreenderia uma carreira política.
Frisando que foram três vítimas fatais das atividadesapostas sul americanaCarlos Lamarca, o historiador e militar Sérgio Marques afirma que ser chamadoapostas sul americana"Che Guevara brasileiro" não deve ser motivoapostas sul americanaorgulho. "Porque Che Guevara era um homem que matava pessoas, infringia direitos humanos, não respeitava valores humanitários", acusa.
"Mas a figuraapostas sul americanaLamarca acabou sendo tomada pela esquerda como uma grande referência. Evidentemente, ele tinha um ideal. Se era certo ou errado, isso é outra coisa. Mas ele era um idealista, acreditava naquilo que fazia", considera. "No meu modoapostas sul americanaver, não é correto pegarapostas sul americanaarmas e matar outras pessoas."
Emiliano José, seu biógrafoapostas sul americanaprimeira hora, ressalta que Lamarca é "parte da história brasileira e, inegavelmente, um grande símboloapostas sul americanatodos os que tombaram ao longo da caminhada na luta contra a ditadura", dentre os "covardemente assassinados" pelas forças repressoras.
"Podemos e devemos analisar os equívocosapostas sul americanasua trajetória, mas isso, esses caminhos trilhados durante a luta, só são possíveisapostas sul americanaserem reconhecidos muito à frente, com os anos já passados", pondera José. "Fato é que ele se revoltou contra a ditadura, as mortes, as torturas e os desaparecimentosapostas sul americanapessoas, quadro patrocinado sobretudo pelo Exército brasileiro, pelas Forças Armadas."
"Seu lado, o do combatente, do sujeito indignado frente aos crimes da ditadura, esse lado ninguém poderá apagar jamais. Compõe a história do Brasil", afirma. "É inegável que as classes dominantes tentem tratar [personagens assim] como bandidos. Mas não há como. A ditadura foi um regimeapostas sul americanaterror e morte. E eu sei o que é isso, como sobrevivente, porque passei quatro anosapostas sul americanauma prisão e fui torturado."
Emiliano José ressalta que 50 anos, para a história, é muito pouco. Portanto, a biografiaapostas sul americanaalguém como Carlos Lamarca permanece "em construção" — não à toa, seu livro, cuja primeira edição dataapostas sul americana1980, já teve outras 17 edições, todas com muitas alterações e ampliaçãoapostas sul americanaconteúdo.
Para a historiadora Nascimento, é preciso relativizar: "as memórias das esquerdas sobre a ditadura civil-militar tendem a ser mais simpáticas aos opositores, apesar disso a gente temapostas sul americanaressaltar que as organizações revolucionáriasapostas sul americanaluta armada têm constantemente os seus objetivos e suas estratégias desvirtuadas pelos discursos memoriais".
"Lamarca parece ser muito importante para as esquerdas atuais, mas seus pensamentos e convicções são apagados do processo", acrescenta ela.
"Para os mais progressistas, ficou a imagem do capitão que queria romper comapostas sul americanavida legal,apostas sul americanafamília,apostas sul americanacarreira,apostas sul americananomeapostas sul americanauma luta contra a ditadura. Há um apagamento do lado mais radicalapostas sul americanaLamarca, isso porque ainda que dentro das esquerdas, o radicalismo, a tentativaapostas sul americanarevolução, quando colocadaapostas sul americanapráticaapostas sul americanafato, e a implementação do socialismo pela via revolucionária, são consideradas táticas violentas demais", afirma.
Nascimento diz que "para as esquerdas atuais", a biografiaapostas sul americanaLamarca assume aspectos "mais brandos". "Um 'Che Guevara' menos revolucionário, com o único e digno objetivoapostas sul americanapôr fim ao regime autoritário, libertar a população brasileira reinstaurando a democracia como ela era conhecida antes", explica. "Não era o queapostas sul americanafato Lamarca pretendia."
"Por muitos anos a narrativaapostas sul americanamemória hegemônica sobre a ditadura foi advinda principalmente das esquerdas liberais, que valorizavam todas as tentativasapostas sul americanaresistência", acrescenta. "Porém, nos últimos anos, sobretudo depoisapostas sul americana2013, vozes que antes estavam subterrâneas ou não encontravam lugar e legitimidade nos debates públicos ressurgiram com mais força, com um discursoapostas sul americanavalorização da ditadura. Negando que tenham havido assassinatos, desaparecimentos e o uso da tortura como políticaapostas sul americanaEstado."
Ela explica que foram esses mesmos discursos, à direita, que passaram a ressaltar "as eventuais mortesapostas sul americanasoldados e civis que ocorreram durante as ações revolucionárias". É um cenário que ela classifica como "batalha por memórias".
Iara Iavelberg
A historiadora Nascimento está pesquisando, na Universidade Federal Fluminense, a biografiaapostas sul americanaIara Iavelberg. "Se você tem a impressãoapostas sul americanaque pouco se fala sobre os outros militantes que atuavam com Lamarca, imagine o que sobra então para as militantes mulheres", comenta. "Principalmente o caso da Iara: que ficou única e exclusivamente conhecida como companheiraapostas sul americanaum líder, e ainda é lembrada dessa forma."
"É uma personagem fascinante", concorda o jornalista Emiliano José. Nascidaapostas sul americanauma famíliaapostas sul americanacomerciantes judeusapostas sul americanaSão Paulo,apostas sul americana1944, ela casou-se aos 16 anos com um médicoapostas sul americana25. Em 1963, ingressou no cursoapostas sul americanapsicologia da Universidadeapostas sul americanaSão Paulo.
"Ficava na Rua Maria Antônia [em São Paulo], o maior epicentro social e político universitário da época", pontua Nascimento. "Lá ela entrouapostas sul americanacontato com um mundo novo, ampliou referências sociais e políticas e encontrou formasapostas sul americanase libertarapostas sul americanaseu casamento tão restrito, com casos extraconjugais e engajando-se nas organizaçõesapostas sul americanaesquerda." Desquitou-seapostas sul americana1965.
Iavelberg passou a integrar gruposapostas sul americanaestudo e células esquerdistas. A partirapostas sul americana1965, lecionouapostas sul americanacursinho pré-vestibular organizado e conduzido por militantes da USP. "Há relatosapostas sul americanaque ela fomentava muitos debates políticos e comportamentais entre os alunos, falandoapostas sul americanapílula anticoncepcional e da Guerra do Vietnã", diz Nascimento.
Tornou-se líder estudantil e, depoisapostas sul americanaformada, passou a lecionar psicologia nas Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e na Universidade Metodista, além da própria USP, como instrutora voluntária. Em 1968, foi para a clandestinidade.
"Esteve muito próximaapostas sul americanamilitantes como Dilma Rousseff", diz Nascimento. Na historiografia, é forte a teseapostas sul americanaque ela teria sido responsável por subsidiar a formação intelectualapostas sul americanacunho marxistaapostas sul americanaCarlos Lamarca, durante o períodoapostas sul americanaque tiveram um relacionamento amoroso. Apesarapostas sul americanaser fato que ela realmente encarregou-se da formação teóricaapostas sul americanaquadros guerrilheiros, Nascimento diz que é preciso lembrar que "o próprio Lamarca era muito dedicado e corria muito atrás para aprofundar suas informações, que ele mesmo considerava muito básicas".
"Ela não dava aula para ele. Mas eles discutiam muito [os temas] entre si", pontua.
Sua morte,apostas sul americana20apostas sul americanaagostoapostas sul americana1971, praticamente um mês antes daapostas sul americanaLamarca,apostas sul americanaSalvador, é bastante controversa. Oficialmente,apostas sul americanaacordo com a certidãoapostas sul americanaóbito, teria sido suicídio com um tiro — para evitar ser presa pelos agentes da repressãoapostas sul americanauma operação. Por conta disso, ela foi sepultadaapostas sul americanaala reservada asuicidas no Cemitério Israelitaapostas sul americanaSão Paulo.
Em 2003, depoisapostas sul americanauma batalha judicial, a família conseguiu a exumação do corpo, com perícia para investigar aapostas sul americanacausa-mortis. Um especialistaapostas sul americanamedicina legal concluiu que o tiro que a matou foi disparadoapostas sul americanalonga distância. Seus restos mortais foram, então, removidos do espaço reservado aos suicidas e sepultados novamente na proximidade dos túmulosapostas sul americanaseus familiares.
Para a historiadora Nascimento, estudar a trajetóriaapostas sul americanaIavelberg é retirar uma mulher da invisibilidade. "Embora ela tenha tido uma militância, principalmente teórica, anterior ao Lamarca, e tendo se mantido na militância por escolha dela, mesmo durante o relacionamento amoroso com ele, todas as notícias que saíam a seu respeito a retratavam como uma pessoa que usava seu sex appeal para influenciar as decisões políticas do Lamarca", enfatiza. "As informações estava sempre atreladas à figura dela, como sexy, sensual, bonita, e foi criada uma imagem fútil dela para deslegitimar ainda mais a imagem dele. E toda a história [de Iavelberg] foi apagada."
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