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Do petismo ao bolsonarismo: Itaim Paulista ilustra como PT perdeu força na periferiabetano pixSP:betano pix
Os números das últimas eleições a presidente dão substância a esse diagnóstico. Nas eleições entre 2002 e 2014, candidatos a presidente da República pelo PT, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, venceram com certa folga por ali,betano pixambos os turnos.
Jábetano pix2018, a siglabetano pixesquerda perdeu essa hegemonia: Jair Bolsonaro venceu Fernando Haddad nos dois turnos. No segundo, teve 55% dos votos válidos, contra 45% do petista.
O cenário é semelhante ao das últimas eleições para a Prefeitura. Postulantes petistas venciam no Itaim Paulista desde a disputabetano pix2000. O próprio Haddad saiu vitorioso no bairro quando foi eleito prefeito,betano pix2012. Quatro anos depois, ele perdeu a eleição municipal para João Doria no primeiro turno, sendo derrotado no Itaim ebetano pixtodos os outros bairros da periferia.
Dessa forma, o Itaim Paulista é uma espéciebetano pixmicrocosmo da perda gradualbetano pixforça que o PT vem sofrendobetano pixbairros dos extremosbetano pixSão Paulo, como Itaquera e Guaianases, ambos na zona leste. Os vitoriosos nesses locais têm sido candidatosbetano pixdireita, como Doria e Bolsonaro.
Mas nãobetano pixtodos. Próximo do Itaim, a maioria dos moradoresbetano pixCidade Tiradentes se manteve fiel ao PT na disputa contra Bolsonaro,betano pix2018. O mesmo ocorreu na zona sul, como no Grajaú,betano pixParelheiros e Capão Redondo.
Para a eleição municipal deste ano, o enfraquecimento na periferia promete ser trágico para os petistas, que nas últimas décadas concorreram com chancesbetano pixvitória justamente por causa dessa forte penetraçãobetano pixregiões mais pobres da cidade.
Neste ano, o candidato do partido à Prefeitura é Jilmar Tatto — na última pesquisa eleitoral do Datafolha, divulgada na semana passada, ele apareceu com apenas 1% das intençõesbetano pixvoto.
Mas quando isso mudou?
Para Mendes, que mora no Itaim Paulista desde que nasceu, a trocabetano pixperfilbetano pixvotação é um processobetano pixanos, e não tem uma causa única. "Vejo que o PT se afastou um pouco da população. Várias obras que o partido fez no bairro não ganharam o carimbo do PT, as pessoas não sabem que foi gente do partido que conseguiu essas melhorias", explica.
"Mas tem outros fatores também, como a crise econômica e a influência das igrejas evangélicas. Há uma região que faz parte do Itaim, o Jardim Helena, que tem 50 igrejas evangélicas, a maioria bem pequena. A gente contou… E não é um bairro grande, não", diz.
'O PT quebrou o Brasil'
O aposentado Pedro Menesesbetano pixFarias, 63, é um dos moradores do Itaim que se tornaram evangélicos. Ele era católico até 2012, quando passou a frequentar a Igreja Mundial do Poderbetano pixDeus, do famoso pastor Valdemiro Santiago. Hoje, é fielbetano pixuma denominação local chamada Igreja Apostólica Jesus é o Resgate.
"Agora sou evangélico, mas o Deus que eu sigo é o mesmo que eu seguia no sertão da Paraíba, quando eu sentava numa pedra e não tinha nem sombra. Então eu olhava pra cima e falava assim: 'só Deus mesmo pra criar isso aqui'", diz.
Nascidobetano pixCabaceiras, no semiárido paraibano, Farias se mudou para São Paulo aos 19 anos,betano pixbuscabetano pixuma vida longe da seca. "Era muito difícil sobreviver por lá. Cheguei aqui e logo arrumei um trabalho na (fábricabetano pixpneu) Goodyear. Fiquei 14 anos", conta.
Moroubetano pixvários bairrosbetano pixSão Paulo, mas,betano pix1982, o salário fixo e o emprego estável lhe deram uma casa própria no Itaim Paulista, região ocupada por migrantes nordestinos e onde os imóveis eram mais baratos. "Naquela época, o bairro não tinha luz nas ruas, só dentro das casas. Água encanada já tinha, sim, mas a maioria das ruas não era asfaltada. Era bem precário", diz.
Nos anos 1990, conta, o local sofreu com uma explosãobetano pixviolência. "A criminalidade era alta. Teve um mês que contei 28 homicídios só perto da minha casa. Era uma matança miserável. Tinha grupo extermínio, e o pessoal se matando entre eles", explica o aposentado, acrescentando que, hoje, os homicídios diminuíram muito. Para ele, o maior problema da região nesse quesito são os assaltos a casas, pedestres e carros.
Até agosto deste ano, a delegacia do Itaim Paulista registrou seis homicídios dolosos (quando há intençãobetano pixmatar), segundo dados da Secretaria da Segurança Pública. No ano passado, foram quatro e,betano pix2018, houve 14 casos. Já os roubos somam 1.935 casos até agostobetano pix2020 — roubobetano pixcarros foram 207. Em todo o ano passado, o Itaim teve 2.949 assaltos, e 533 roubosbetano pixveículos.
Esse aumento da violência contra o patrimônio é um dos motivos que transformaram Fariasbetano pixum eleitorbetano pixBolsonaro, que tem a segurança pública como umabetano pixsuas principais bandeiras. "Hoje a violência está banalizada. No Brasil tem muita mordomia para bandido, bandido hoje é um herói. São Paulo está entregue aos 'noias' e às drogas", afirma.
No campo político, Farias já votoubetano pixcandidatosbetano pixcorrentes ideológicas diferentes: Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma, Aécio Neves e, na última eleição, Bolsonaro.
"Acreditei muito no Lula, eu o defendia com unhas e dentes, achava que ele iria acabar com a fome, como se ele fosse um Papai Noel. O primeiro mandato dele foi muito bom, mas o segundo o pessoal passou a mão, roubou muito. Depois, ainda votei na Dilma, mas desisti. O PT quebrou o país. Se eles não tivessem saqueado o Brasil, nós seríamos um paísbetano pixprimeiro mundo", explica.
Outro fator que contou embetano pixconversão ao bolsonarismo foram questõesbetano pixcomportamento e moral. "A base do Brasil é a família, e hoje as famílias estão desestruturadas… Ninguém respeita mais ninguém. Veja as escolas, os alunos não respeitam mais os professores. Eu, por mim, colocaria escolas militares. Nelas, tem disciplina", afirma, citando os colégios cívico-militares, uma das principais promessasbetano pixBolsonaro para a educação.
Para a eleição municipal, Farias ainda não escolheu candidato, mas afirma que não deve votarbetano pixCelso Russomanno (Republicanos), que é apoiado por Bolsonaro e pela Igreja Universal do Reinobetano pixDeus. "Voto com minha consciência, não é porque o Bolsonaro falou que vou votarbetano pixque ele quer", diz.
A influência das igrejas
Para Vinicius do Valle, doutorbetano pixciência política pela USP e autor do livro Entre a religião e lulismo: um estudo com pentecostaisbetano pixSão Paulo (Ed. Recriar), embora grandes igrejas sejam mais famosas, as pequenas denominaçõesbetano pixbairro estão mais próximas dos fiéis.
"Como estratégiabetano pixmarketing, as grandes igrejas, como Mundial e Universal, colocam seus templosbetano pixlocaisbetano pixmaior visibilidade, como grandes avenidas ou estações do metrô. Então, no geral, as igrejas menores ou pentecostais ficam mais próximas do fiel. Às vezes erguem um templobetano pixuma garagem", explica Valle, que estuda as igrejas evangélicas na periferia paulistana.
Para ele, o pontobetano pixvirada que tornou parte da periferia mais próxima da direita conservadora ocorreubetano pix2016, quando Doria se candidatou a prefeito com uma campanhabetano pixmarketing que se contrapunha mais fortemente ao PT.
"Até então, a maioria das igrejas já eram antipetistas, mas isso não se refletia nos discursos dos pastores, que, diante dessa situação, eram mais pragmáticos. Os fiéis ainda tinham uma forte identificação com o PT e com Lula, pois muitos participavambetano pixprogramas sociais. Depois, com os escândalos da Lava Jato, isso mudou: os pastores começaram a colocar na conta do PT os problemas da cidade, da economia e do que as pessoas estavam sofrendo", diz.
Em 2018, afirma Valle, o discurso "em defesa da família tradicional"betano pixBolsonaro foi bem recebido pela comunidade evangélica conservadora. "As igrejas foram o vetor principal desse discurso que pega muito a questão da sexualidade, muitas vezes bastante carregadobetano pixhomofobia. O PT passou a ser visto como um partido que não respeita a família cristã", diz.
No contexto do Itaim, o líder comunitário Euclides Mendes comenta que, para além do crescimento das evangélicas, a Igreja Católica também perdeu o protagonismo que já teve no cotidianos dos moradores.
"Várias obras e melhorias feitas nos anos 1990 e 2000, como a construçãobetano pixum viaduto ebetano pixum hospital, foram articuladas pela Igreja Católica junto à militância petista. Hoje isso não acontece mais", diz Mendes.
Já a cientista política Camila Rochabetano pixOliveira, pesquisadora do Centro Brasileirobetano pixAnálise e Planejamento (Cebrap), afirma que as igrejas evangélicas viraram uma espéciebetano pixcentrobetano pixsocialização na periferia.
"Com o aumento da escalada da violência dos anos 1990 e 2000, as pessoas passaram a ter medobetano pixsairbetano pixcasa, participam menosbetano pixfestas e eventos comunitários. Por conta disso, há uma dissolução dos laços sociais. Toda essa sociabilidade passa a ocorrer dentro dos templos. Essas redes são importantes para os moradores, onde muitos são acolhidos quando têm problemas e fazem até cursos. Quando o pastor falabetano pixpolítica, ele já tem essa identificação com o morador", explica.
Para ela, os escândalosbetano pixcorrupção e a crise econômica também são fortes fatores que explicam essa migração eleitoral. "O PT tinha essa bandeira da ética, que foi perdida depois do mensalão e da Lava Jato. Além disso, as pessoas não se conectaram com as políticas dos governos petistas, mesmo quando elas eram diretamente beneficiadas. Muita gente creditou a melhora das condiçõesbetano pixvida apenas ao mérito próprio", diz.
Desigualdades
O distrito do Itaim Paulista tem uma população aproximadabetano pix375 mil pessoas. Para moradores, a situação econômica local até melhorou nas últimas décadas, visto o aumento do trânsito nas avenidas, melhora no poderbetano pixconsumo e também a construçãobetano pixdezenasbetano pixprédios com condomínios fechados.
Por outro lado, regiões do Itaim ainda sofrem com enchentes dos córregos que alimentam o rio Tietê, que passa pelo bairro. Milharesbetano pixpessoas vivembetano pixcomunidades improvisadas às margens do rio. Em alguns casos, como na Vila Itaim, as ruas ficam alagadas por dias durante o períodobetano pixchuvas, no verão.
As desigualdadesbetano pixrelação a bairros centrais ebetano pixclasse média também ficam evidentes nos indicadores sociais e econômicos.
Dados do Mapa da Desigualdade, produzido anualmente pela ONG Rede Nossa São Paulo, apontam que o Itaim tem o segundo pior índicebetano pixáreas verdes entre as 32 subprefeituras da cidade, com apenas 3 m²betano pixcobertura vegetal por habitante — o Butantã tem 41 m² por morador.
O tempobetano pixespera por uma consulta com um clínico geral ébetano pix25 dias no Itaim Paulista, enquanto no Itaim Bibi ébetano pix4 dias. A idade médiabetano pixque as pessoas morrem no Itaim Paulista é 61 anos; jábetano pixMoema, a média é 80 anos.
Se por um lado, o distrito do Butantã tem 53 equipamentos municipaisbetano pixcultura para cada 100 mil habitantes, o Itaim Paulista conta com apenas 1,73. Cada criança que mora na Consolação tem disponível um acervobetano pix10,4 livros infanto-juvenisbetano pixbibliotecas municipais, mas uma criança do Itaim tem apenas 0,3 livro.
"Acredito que na gestão do PT as pessoas tinham menos contato com o poder público, achavam que a subprefeitura tinha abandonado o bairro", explica Cacau Ras, 42, articulador cultural do Itaim e membrobetano pixum grupo que realiza eventos artísticos produzidos por coletivosbetano pixjovens.
Como muitos moradores, Cacau Ras era petista e até produziu jingles para candidatos do partido. Hoje, não declara voto no PT nembetano pixoutro partido, mas também não se sente próximo aos ideaisbetano pixBolsonaro. "Uma coisa que todo mundo comenta é que um vereador do PT, o João Antônio, que morava no Itaim, logo depois da eleição mudoubetano pixbairro. As pessoas ficaram muito decepcionadas, não se sentiam mais representadas", explica.
"Em 2018, a juventude comentava política principalmente com informações que recebia pelas redes sociais. Às vezes, a gente falava: 'isso que você falou não é verdade', mas a pessoa continuava acreditando. Hoje, vejo que uma parte dos jovens, que é mais articulada, se enxerga mais com o PSOL e com o Guilherme Boulos do que com o PT", diz.
De fato, Boulos aparecebetano pixterceiro na pesquisa Datafolha, com 12% das intençõesbetano pixvoto a prefeito, bastante à frentebetano pixJilmar Tatto, do PT, com 1%. Celso Russomanno lidera o levantamento, com 27%; Bruno Covas (PSDB) estavabetano pixsegundo, com 21%.
Transferênciabetano pixvotos
Embora Bolsonaro tenha tido alta votação na periferiabetano pixSão Paulo, não é certo que ele vá conseguir transferirbetano pixinfluência para Celso Russomanno, seu candidato na cidade.
A pesquisa Datafolha, divulgada na semana passada, apontou que 63% dos paulistanos não votariambetano pixjeito nenhumbetano pixum nome indicado por Bolsonaro — 16% votariam com certeza, e 18% talvez votassem.
A cientista política Camila Rochabetano pixOliveira, do Cebrap, afirma que os votosbetano pixdisputa hoje fazem partebetano pixuma espéciebetano pix"espólio do PT".
"A despeitobetano pixtudo, o PT ainda gozabetano pixuma apelo simbólico pra quem está nas classes mais baixas, como um partido que representa os trabalhadores. Mas estamos vivendo um momento importantebetano pixrearranjo da política. Essa herança eleitoral do PT estábetano pixdisputa pelo PSOL, PSB e outros partidos. O PSOL tenta pegar o eleitor pela esquerda, uma classe média baixa da periferia que é ligada a movimentos sociais e a discussõesbetano pixraça e gênero", diz.
Para Gisele Brito, mestrandabetano pixplanejamento urbano pela Faculdadebetano pixArquitetura e Urbanismo da USP, a periferia vive um momentobetano pixrenovação dos quadros políticos, principalmente oriundosbetano pixmovimentos sociais e coletivos com ações mais pontuais. "Há candidaturas coletivas e individuais (para vereador) com forte identificação com a periferia, e com movimentos surgidos nos bairros e que reivindicam um reconhecimentobetano pixsuas práticas como política. O PT não apresentou quadros novos nos últimos anos. O próprio Jilmar Tatto é um político bastante tradicional", explica.
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