Violência contra a mulher: novos dados mostram que 'não há lugar seguro no Brasil':cbet medical abbreviation

Mulheres dando as mãos

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Apenas 8% dos municípios brasileiros têm delegacias da mulher

Os novos dados corroboram o que outras pesquisas já mostravam. Grande parte das mulheres que sofreram violência dizem que o agressor era alguém conhecido (76,4%). Mulheres pretas e pardas são mais vitimadas do que as brancas; as jovens, mais do que as mais velhas.

Silhuetacbet medical abbreviationmulher

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, 27,4% das mulheres brasileiras com 16 anos ou mais sofreram algum tipocbet medical abbreviationviolência nos últimos 12 meses, diz pesquisa

Em conversa com a BBC News Brasil, Bueno comentou o resultado da pesquisa e a situação da violência contra a mulher no Brasilcbet medical abbreviationmodo geral. Para ela, o país avançoucbet medical abbreviationmuitos aspectos, apesarcbet medical abbreviationas taxascbet medical abbreviationassassinatoscbet medical abbreviationmulheres terem mudado pouco.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista:

cbet medical abbreviation BBC News Brasil - O padrãocbet medical abbreviationviolência contra as mulheres no Brasil é muito parecido há anos. Qual foicbet medical abbreviationreação ao ver os dados da pesquisa?

cbet medical abbreviation Samira Bueno - Há uma sériecbet medical abbreviationnúmeros impressionantes. Há 536 casos por hora no Brasil e quase a mesma proporçãocbet medical abbreviationmulheres que dizem ter sido vítimacbet medical abbreviationalgum tipocbet medical abbreviationviolência sexual. O númerocbet medical abbreviationmulheres que sofreram espancamento é assustador (1,6 milhão). Todos esses dados remetem à violência doméstica: 76,4% das mulheres conheciam o autor da violência, a maior parte aconteceu dentrocbet medical abbreviationcasa.

Mas quando olhamos para o assédio, o espaço público tampouco é seguro. O númerocbet medical abbreviationmulheres assediadas fisicamente no transporte público, quase 4 milhões, é enorme. Não tem um espaço onde a mulher efetivamente está segura. A mulher está sofrendo violência dentrocbet medical abbreviationcasa, aí ela pega o metrô para ir para o trabalho, onde também vai ser assediada. Qual é o lugar seguro, então? Ele existe?

cbet medical abbreviation BBC News Brasil - Na última semana, dois casoscbet medical abbreviationviolência contra mulheres se tornaram públicos: no Rio, uma mulher foi espancada por um homem que ela conheceu na internet, ecbet medical abbreviationSão Paulo, um homem ejaculou na pernacbet medical abbreviationuma mulhercbet medical abbreviationum trem. O que esses casos mostram sobre como o assunto é tratado no Brasil?

cbet medical abbreviation Samira Bueno - No caso do homem que ejaculou na menina no transporte público, ela pediu ajuda dentro do trem e ficou todo o mundo olhando para a cara dela sem fazer nada. Depois, um guarda perguntou a ela se ela tinha certeza que a mancha na roupa dela não eracbet medical abbreviationágua. Como isso ainda acontece? Ela tinha acabadocbet medical abbreviationsofrer uma violência como essa, que é humilhante, que te faz sentir violada. Foi à delegacia, ficou uma hora e meia esperando, foi mal atendida.

Plataformacbet medical abbreviationmetrô

Crédito, OSWALDO CORNETI

Legenda da foto, 37,1% das brasileiras relatam ter sido vítimacbet medical abbreviationassédio no último ano; 7,8% foram assediadas fisicamente no transporte público

A mulher que foi espancada ficou quatro horas sofrendo agressão e pedindo ajuda e levou quatro horas para alguém fazer alguma coisa.

Isso tudo mostra como ainda somos coniventes com a violência contra a mulher. São tantos tiposcbet medical abbreviationviolência,cbet medical abbreviationtantos espaços distintos, mas as respostas que nos são dadas são as mesmascbet medical abbreviationtodo lugar.

cbet medical abbreviation BBC News Brasil - A razão para isso é mais cultural ou relacionada a políticas públicas?

cbet medical abbreviation Samira Bueno - A origem é cultural. Podemos ter as melhores políticas públicas,cbet medical abbreviationpunição a agressores, mas se elas não incorporarem uma perspectivacbet medical abbreviationprevenção, pensandocbet medical abbreviationcomo é possível alterar normais sociais e culturais, não vamos resolver o problema.

Temos a Lei Maria da Penha, a alteração na lei do estupro, a lei do feminicídio, acbet medical abbreviationimportunação sexual, são todas boas, mas a lei por si só não resolve o problema. O menino que vê o pai batendo na mãe vai bater na esposa. A menina que sofre violência sexual dentrocbet medical abbreviationcasa e muitas vezes nem sabe que aquilo é uma violência. Se ouvir falar sobre isso na escola, vai identificar que talvez ela seja vítima.

Alunoscbet medical abbreviationsalacbet medical abbreviationaula com professore

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, 'A menina que sofre violência sexual dentrocbet medical abbreviationcasa e muitas vezes nem sabe que aquilo é uma violência, se ouvir falar sobre isso na escola, vai identificar que talvez ela seja vítima'

cbet medical abbreviation BBC News Brasil - Como a política pública pode intervir no aspecto cultural?

cbet medical abbreviation Samira Bueno - Agressores têm que ser presos, mas também têm que passar por processos que não ocorrem, mas deveriam, como os grupos reflexivos. Eles precisam entender que aquilo é uma violência, repensar seu comportamento. Temos que levar às escolas um ensinocbet medical abbreviationigualdadecbet medical abbreviationgênero, do que é a violência. No caso da violência doméstica, o homem vai repetir esse comportamento. É um padrão que precisa ser rompido.

A gente pode apostar na prisão como punição que vai alterar isso, mas sabemos que, se a ameaçacbet medical abbreviationprisão fosse uma formacbet medical abbreviationevitar que as pessoas cometessem crimes no Brasil, estaríamos numa situação melhor, pois temos a terceira maior população carcerária do mundo. Temos a lei do estupro há dez anos, mas não temos menos estupros por isso. O mesmo vale para a leicbet medical abbreviationdrogas. Legislação é um instrumento importante, mas por si só, não resolve o problema.

cbet medical abbreviation BBC News Brasil - Os dados mostram que mulheres negras seguem sendo mais vitimadas.

cbet medical abbreviation Samira Bueno - É impossível não falarcbet medical abbreviationracismo,cbet medical abbreviationcomo ele determina trajetóriascbet medical abbreviationvida. Quais são as condições econômicas das mulheres pretas? Em geral, vivemcbet medical abbreviationcondições piores do que a média das mulheres brancas. Isso é fruto do nosso legado escravocrata que nunca solucionamos. Isso fica evidente nos dadoscbet medical abbreviationassédio. Elas são mais vitimadas do que mulheres brancas. Parece que o corpo negro é um espaço público.

Mulher negra

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Vitimização também é maior entre mulheres pretas (28,4%) e pardas (27,5%) do que entre as brancas (24,7%)

cbet medical abbreviation BBC News Brasil - A taxacbet medical abbreviationmortes por violênciacbet medical abbreviationmulheres permanece relativamente estável no Brasil desde o início dos anos 2000. O Brasil evoluiu ou está estagnado no combate à violência contra a mulher?

cbet medical abbreviation Samira Bueno - Avançamos muito. O que interpretamos como violência é uma construção social e cultural. Já fomos muito mais tolerantes do que somos hoje. Veja o caso do Doca Street e da Angela Diniz (em 1976, ele a matou, na casa dela,cbet medical abbreviationCabo Frio, no Riocbet medical abbreviationJaneiro, após ela terminar a relação, e foi absolvido). Ele alegou que cometeu um atocbet medical abbreviationlegítima defesa dacbet medical abbreviationhonra. Hoje isso seria inaceitável.

cbet medical abbreviation BBC News Brasil - Como avalia o impacto da Lei Maria da Penha?

cbet medical abbreviation Samira Bueno - A Lei Maria da Penha é uma grande conquista. No papel, é muito boa. Não é só uma lei penal, é quase uma política pública inteiracbet medical abbreviationviolência contra a mulher. Ela engloba muitos aspectos - prevenção, medidas protetivas, trabalhos com autorescbet medical abbreviationviolência. Num caso como esses, o desafio é sempre o da implementação.

Tem, por exemplo, o obstáculo do pacto federativo - para a lei funcionar, você dependecbet medical abbreviationPrefeitura, Estado, União, do Executivo, do Judiciário, e muitas vezes a política não conversa. Fazer com que o serviçocbet medical abbreviationrede funcione é desafiador. Fazer com que esse serviço chegue para além das capitais (8% dos municípios têm delegacias da mulher) também é um desafio.

Vemos que também falta institucionalizaçãocbet medical abbreviationboas práticas. Quando projetos funcionam, não é por institucionalização, mas porque indivíduos lutam por eles.

cbet medical abbreviation BBC News Brasil - O presidente Jair Bolsonaro expediu um decreto que facilita a possecbet medical abbreviationarmas, umacbet medical abbreviationsuas principais promessascbet medical abbreviationcampanha. O maior acesso a armas pode afetar a violência contra mulheres?

cbet medical abbreviation Samira Bueno - O decreto autoriza a possecbet medical abbreviationarmas, ou seja, o direitocbet medical abbreviationter armascbet medical abbreviationcasa, que é justamente onde as mulheres morrem. Se cidadão que é um perpetradorcbet medical abbreviationviolência doméstica tem uma arma dentrocbet medical abbreviationcasa, é uma receita para a tragédia. Estamos dando um instrumento mais poderoso ao algozcbet medical abbreviationuma mulher.

Dadas as evidências científicas que temos da relaçãocbet medical abbreviationaumentocbet medical abbreviationarmacbet medical abbreviationfogo com aumentocbet medical abbreviationhomicídios e suicídios, e dadas as características da violência contra a mulher, muito provavelmente teremos um aumento do feminicídio, assim comocbet medical abbreviationlesões graves – como o caso da Maria da Penha, que levou um tiro do marido nas costas enquanto dormia e ficou paraplégica. Haverá também um impacto no sistemacbet medical abbreviationsaúde.

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