A Constituição prevê a possibilidadejogo dados blazeuma intervenção militar?:jogo dados blaze
'Limpeza ética'
Em gruposjogo dados blazeapoiadores da greve no WhatsApp e no Facebook, alémjogo dados blazeoutros movimentos, são comuns os pedidos por uma intervenção militar temporária, que promova uma "limpeza ética" no governo e conduza o país até a próxima eleição.
Segundo os difusores da ideia, esse tipojogo dados blazeintervenção seria diferentejogo dados blazeum golpe ou da imposiçãojogo dados blazeuma ditadura militar.
"Em 1964 as leis eram outras, eram outros tempos", diz num áudio que circulajogo dados blazegruposjogo dados blazeWhatsApp um homem que se identifica como militar da reserva da Aeronáutica. Ele diz que, nos golpes, os militares agem por conta própria. Jájogo dados blazeintervenções, segundo ele, "as forças são convocadas a agir pela população" - fator que conferiria legalidade aos atos.
O autor defende a realizaçãojogo dados blazegrandes manifestações pró-intervenção pelo Brasil. "Aí teremos o respaldo do mundo e da ONU, senão a ação cai por terra."
No grupo do Facebook "Adeptos da INTERVENÇÃO CONSTITUCIONAL DAS FFAA" (Forças Armadas), um membro que também se identifica como militar na reserva defende a convocação imediata "de uma Junta Civil e Militar Constitucional que dirija os destinos da Nação com Ordem e Progresso até as próximas eleições, sem urnas eletrônicas viciadas e fraudadas".
Segundo o autor, a iniciativa garantiria que "bandidos e corruptos presos cumpram realmente suas penas" e que "a população se sinta mais segura e protegida".
Subordinação ao presidente
Todos os juristas ouvidos pela BBC Brasil, no entanto, afirmam que a Constituição não dá respaldo a qualquer ação desse tipo e que a tomadajogo dados blazepoder pelos militares - ainda que temporária - equivaleria a um golpe. E caso os militares exerçam o poderjogo dados blazeforma autoritária e suspendam liberdades individuais para cumprir seus objetivos, como fizeram após o golpejogo dados blaze1964, o novo regime seria uma ditadura.
Para Elival da Silva Ramos, professorjogo dados blazeDireito Constitucional da USP e ex-procurador geral do Estadojogo dados blazeSão Paulo, a Constituição claramente subordina as Forças Armadas ao presidente da República.
No artigo 142, a Carta diz que as "Forças Armadas (...) são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativajogo dados blazequalquer destes, da lei e da ordem".
Segundo Ramos, é esse o trecho que legitima o empregojogo dados blazemilitaresjogo dados blazecrisesjogo dados blazesegurança pública - caso, por exemplo, do decretojogo dados blazeGarantia da Lei e da Ordem (GLO) que ampara a presença atualjogo dados blazemilitares no policiamento do Riojogo dados blazeJaneiro.
Mesmo nesses casos, porém, a iniciativajogo dados blazeconvocar as tropas cabe ao presidente da República e deve ser aprovada pelo Congresso. E há limites à ação das tropas. "O presidente não pode decretar uma intervenção nos demais poderes, por exemplo", diz o professor.
Alguns defensoresjogo dados blazeuma "intervenção constitucional" citam a possibilidadejogo dados blazeque o processo seja conduzido pelo Conselhojogo dados blazeDefesa Nacional, órgão que assessora o presidente da República nos assuntosjogo dados blazesoberania nacional e defesa do Estado democrático.
O conselho é composto pelos comandantes das Forças Armadas, o vice-presidente, os presidentes da Câmara e do Senado e os ministros da Justiça, Defesa, Relações Exteriores e Planejamento. Entre as atribuições do órgão está "opinar sobre a decretação do estadojogo dados blazedefesa, do estadojogo dados blazesítio e da intervenção federal".
Ramos afirma, porém, que o "órgão tem caráter meramente consultivo e serve unicamente ao presidente da República".
Para Sérgio Borja, professorjogo dados blazeDireito Constitucional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a transformação do Conselhojogo dados blazeDefesa num órgão capazjogo dados blazetomar decisões "representaria um atentado à fórmula constitucional".
Intervenção temporária
A defesajogo dados blazeuma intervenção que vigore até a próxima eleição ecoa o conteúdo do Ato Institucional nº 1 (AI-1), conjuntojogo dados blazenormas impostas pelos militares após o golpejogo dados blaze1964.
No documento, os comandantesjogo dados blazeExército, Marinha e Aeronáutica diziam agir para "restaurar no Brasil a ordem econômica e financeira e tomar as urgentes medidas destinadas a drenar o bolsão comunista".
Segundo o AI-1, as regras do ato vigorariam até 31jogo dados blazejaneirojogo dados blaze1966, datajogo dados blazeque assumiria um novo presidente, a ser eleito no ano anterior. As promessasjogo dados blazeuma intervenção temporária, porém, não foram cumpridas, e o Brasil só voltou a ter eleições diretas para presidente 25 anos depois,jogo dados blaze1989.
Estadojogo dados blazesítio
A advogada constitucionalista Vera Chemim diz que a greve dos caminhoneiros não se enquadra nas situaçõesjogo dados blazeque a Constituição permite a decretaçãojogo dados blazeestadojogo dados blazesítio e, por consequência, a suspensãojogo dados blazealgumas garantias constitucionais.
Nos artigos 137 a 139, a Carta determina que o presidente poderá solicitar ao Congresso a imposiçãojogo dados blazeestadojogo dados blazesítio quando houver "comoção gravejogo dados blazerepercussão nacional ou ocorrênciajogo dados blazefatos que comprovem a ineficáciajogo dados blazemedida tomada durante o estadojogo dados blazedefesa", ou ainda quando houver "declaraçãojogo dados blazeestadojogo dados blazeguerra ou resposta a agressão armada estrangeira".
Nesses cenários, a Constituição permite, entre outros pontos, a suspensão da liberdadejogo dados blazereunião, a requisiçãojogo dados blazebens e intervençõesjogo dados blazeempresas públicas.
Segundo Chemim, os distúrbios causados pela greve não chegaram a esse níveljogo dados blazegravidade.
Além disso, ela afirma que mesmo sob estadojogo dados blazesítio as Forças Armadas continuariam subordinadas à Presidência. "Na Constituição Federal não há nenhum evento que justifique a tomadajogo dados blazepoder pelos militares."
Militares na política
Para a advogada Daniela Teixeira, vice-presidente da OAB-DF, "não existe nenhuma possibilidade na Constituiçãojogo dados blazeque se passe o comando supremo das Forças Armadas para um militar não eleito".
A Carta impede que a Presidência da República, chefia máxima das forças, fique vagajogo dados blazequalquer circunstância. Mesmo que um presidente e seus sucessores imediatos morram ou sejam afastados, há ritos para que o cargo seja imediatamente preenchido - ainda quejogo dados blazeforma temporária.
Assim, a autoridade da Presidência sobre as Forças Armadas sempre se mantém.
Mesmo quando militares concorrem a cargos eletivos, devem antes passar à reserva, pois a Constituição proíbe que eles integrem partidos políticos enquanto estiverem na ativa.
Rejeição entre comandantes
A hipótesejogo dados blazeuma intervenção militar tem sido rejeitada pelos três comandantes das Forças Armadas desde que a crise política se acirrou no país,jogo dados blaze2016.
Nos últimos dias, até mesmo o general Antônio Mourão - que, até passar à reserva,jogo dados blazefevereiro, era visto como um dos oficiais mais intervencionistas do Exército - criticou a possibilidadejogo dados blazeinterferência das Forças Armadasjogo dados blazemeio à greve dos caminhoneiros.
"Tem gente que quer as Forças Armadas incendiando tudo", disse Mourão. "Soluções dessa natureza a gente sabe como começam e não sabe como terminam."
O deputado federal e ex-capitão do Exército Jair Bolsonaro (PSL-RJ), pré-candidato à Presidência, também reprovou uma eventual intervenção.
"Na minha opinião, dos meus amigos generais, se (os militares) tiveremjogo dados blazevoltar um dia, que voltem pelo voto. Aí chega com legitimidade, não dá essa bandeira para o PT dizer 'abaixo a ditadura' ou 'foi golpe', porque aí foi golpe mesmo", afirmoujogo dados blazeentrevista à Folhajogo dados blazeS. Paulo, na terça-feira.
Em 2016, o comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, chamoujogo dados blaze"malucos" e "tresloucados" os que pediam a volta dos militares ao poder.
Em abril deste ano, porém, uma declaraçãojogo dados blazeVillas Bôas no Twitter animou grupos pró-intervenção e foi interpretada como uma ameaçajogo dados blazeinterferênciajogo dados blazeoutro poder.
Na véspera do julgamentojogo dados blazeum habeas corpus para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Villas Bôas disse que o Exército compartilhava do "anseiojogo dados blazetodos os cidadãosjogo dados blazebemjogo dados blazerepúdio à impunidade" e que a Força se mantinha atenta "às suas missões constitucionais".
Poder constituinte originário
Para Sérgio Borja, da UFRGS, o conceitojogo dados blazeintervenção militar constitucional não existe "em nenhum livro ou manualjogo dados blazedireito, e nunca ouvi nenhum professor falar a respeito".
Ele afirma que, desde que o direito moderno surgiu, no Império Romano, civis criam regras para tentar conter o poder dos militares.
Quando perdem o controle, nem sempre isso se deve a ofensivas da caserna. "Às vezes, (os governos civis) sucumbem diantejogo dados blazeuma rebelião popularjogo dados blazeimensas proporções."
Segundo o professor, o povo representa, no Brasil ejogo dados blazeoutros países, o "poder constituinte originário". Em seu artigo 1º, a Constituição diz que "todo o poder emana do povo".
"Num cenáriojogo dados blazeerupção do poder constituinte originário, o caos e a desordem poderiam exigir o emprego das Forças Armadas." Segundo ele, porém, essa situação não faria com que uma intervenção militar fosse constitucional.
"O poder constituinte originário sempre quebra a legalidade - uma legalidade sucumbe frente à outra que nasce."
Legitimidade X legalidade
Para o procurador Elival da Silva Ramos, há ocasiões extremasjogo dados blazeque os conceitosjogo dados blazelegitimidade e legalidade entramjogo dados blazechoque.
Ele cita os regimesjogo dados blazeAdolf Hitler na Alemanha (1933-1945) ejogo dados blazeJosef Stálin (1927-1953) na extinta União Soviética. Nos dois casos, segundo Ramos, os governos cometiam matanças sem violar as leis nacionais.
"Somente nessas situações justifica-se a quebra da legalidade para restabelecer o respeito a direitos fundamentais." Segundo Ramos, o Brasil não vive uma situação desse tipo.
Por outro lado, ele diz que quebrar a ordem constitucional é sempre perigoso.
"Quando se age fora da legalidade, passa-se a uma situaçãojogo dados blazeque tudo é possível e não há mais parâmetros. O risco é as coisas piorarem ainda mais."