Como militares ganharam protagonismo inédito no Brasil desde a redemocratização:betboo kayıt

Temer se reúne com militaresbetboo kayıtBrasília

Crédito, Marcos Corrêa/Agência Brasil

Legenda da foto, Protagonismo militar aumenta à medida que a crise do sistema político se agrava

Essa tendência, que já se mostravabetboo kayıtnomeações para cargos estratégicos, no recurso frequente a operaçõesbetboo kayıtGLO e na intervenção federal na segurança pública do Rio, ficou escancarada durante a paralisação dos caminhoneiros.

Desde a redemocratização, o governo Temer é o primeiro a colocar um militar, o general Joaquim Silva e Luna, no comando do Ministério da Defesa, criadobetboo kayıt1999. É também o primeiro a colocar um Estado sob intervenção federal, o Riobetboo kayıtJaneiro.

Também é um militar o Secretário Nacionalbetboo kayıtSegurança Pública, general Carlos Alberto dos Santos Cruz, e a Funai (Fundação Nacional do Índio) chegou a ser comandada por outro, o general Franklimberg Ribeiro Freitas.

Retrato do general Sérgio Etchegoyen

Crédito, José Cruz/Agência Brasil

Legenda da foto, À frente do GSI, Etchegoyen (foto) comanda a Abin (Agência Brasileirabetboo kayıtInteligência)

Especialistas ouvidos pela BBC avaliam que isso aconteceu devido a características do governo Temer e ao momento por que passa o país. Eles dizem que esse protagonismo militar aumenta à medida que a crise do sistema político se agrava e que o governo com a pior avaliação das últimas décadas se apoia no prestígiobetboo kayıtque gozam as Forças Armadas.

Pesquisa Datafolha feitabetboo kayıtjulhobetboo kayıt2017 mostrou que as Forças Armadas são a instituiçãobetboo kayıtque brasileiros depositam mais confiança no país hoje, enquanto o Congresso, a Presidência e os partidos políticos caírambetboo kayıtdescrédito. O governo do presidente Temer, porbetboo kayıtvez, é considerado ruim ou péssimo por 70% dos brasileiros, também segundo o Datafolha.

Ainda antes da conclusão do processobetboo kayıtimpeachmentbetboo kayıtDilma Rousseff (PT), apareceram indíciosbetboo kayıtque nos bastidores do poder se buscava envolver os militares nos rumos políticos do país.

bloqueiobetboo kayıtcaminhoneirosbetboo kayıtCristalina,betboo kayıt25betboo kayıtmaio

Crédito, EPA

Legenda da foto, Na greve dos caminhoneiros, eram comuns as faixas pedindo intervenção militar

Numa gravação obtida por investigadores e divulgadabetboo kayıtmaiobetboo kayıt2016, o então senador licenciado Romero Jucá (MDB), atual líder do governo no Senado, defendia que a solução para "estancar a sangria" provocada pela operação Lava Jato seria "pôr o Michel (Temer)".

Mais adiante, Jucá,betboo kayıtconversa com Sérgio Machado, então diretor da Transpetro, afirmava que já estava "conversando com os generais, comandantes militares".

Segundo Jucá, estava "tudo tranquilo" e os militares iriam "garantir".

Temer, ainda presidente interino, recriou o GSI, um órgãobetboo kayıtassessoramento da Presidência da República para assuntosbetboo kayıtsegurança nacional que controla a Abin (Agência Brasileirabetboo kayıtInteligência) - e que havia sido extinto pelo governo Dilma Rousseffbetboo kayıt2015. Para o comando da pasta, ele nomeou Etchegoyen, que ocupava o cargobetboo kayıtChefe do Estado-Maior do Exército quando foi convocado.

Etchegoyen passou a ser uma das vozes mais influentes do círculo do presidente, segundo pessoas próximas a Temer. Teve papel importante no decretobetboo kayıtintervenção no Rio e atuoubetboo kayıtcrises como a dos refugiados venezuelanosbetboo kayıtRoraima e a greve dos caminhoneiros.

Etchegoyen é crítico notório da Comissão da Verdade, criadabetboo kayıt2011, no governo Dilma Rousseff (PT), para investigar crimes cometidos durante a ditadura militar (1964-1985). Seu pai, o general Leo Guedes Etchegoyen, está entre os 377 agentes públicos que a Comissão considerou responsáveis pela repressão política. Quando o relatório da comissão foi concluído, a família fez uma nota repudiando o documento, que chamoubetboo kayıt"leviano" e "patético".

O ministro da Defesa, general Joaquim Silva e Luna

Crédito, Tomaz Silva / Agência Brasil

Legenda da foto, Silva e Luna é o primeiro militar a ocupar o ministério da Defesa desde que a pasta foi criada e a presençabetboo kayıtum general no comando da pasta causa mal estar com as outras duas Forças

Mas foi a nomeação,betboo kayıtfevereirobetboo kayıt2018, do general Joaquim Silva e Luna para o Ministério da Defesa que provocou mais reações negativas daqueles que veem como excessivo o papel concedido a militares no governo Temer.

"No GSI, é normal que haja um militar porque é uma posição que exige conhecimento técnico. Na Defesa, não. O ministério foi criado justamente para subordinar os militares aos civis", diz o cientista político da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Claudio Couto.

Couto lembra que o governobetboo kayıtJosé Sarney (1985-1990) também foi marcado pela influência das Forças Armadas: "Era um governo com tutela militar", diz o pesquisador. Primeiro presidente após a ditadura, Sarney era vicebetboo kayıtTancredo Neves, que morreu antesbetboo kayıttomar posse, e era do PDS (Partido Democrático Social), herdeiro do Arena, partido que apoiava o regime ditatorial antes do seu fim.

"Não faz nenhum sentido, depoisbetboo kayıttantos anosbetboo kayıttentativabetboo kayıtcontrolar os militares com a democracia civil, colocar um general no comando da Defesa. Provoca um desconforto entre a Marinha e a Força Aérea, que estão sendo comandadas agora pelo Exército", diz o pesquisador João Roberto Martins Filho, professor da Universidade Federalbetboo kayıtSão Carlos (UFSCar), que se dedica há décadas a estudar os militares.

Exército no comando da segurança do Rio

No círculobetboo kayıtministro mais próximos a Temer, as Forças Armadas têm o entusiasmobetboo kayıtRaul Jungmann, ex-ministro da Defesa e hoje chefe do Ministério Extraordináriobetboo kayıtSegurança Pública. Na cerimôniabetboo kayıtposse do seu sucessor na pasta da Defesa, general Silva e Luna, Jungmann disse: "Eu pude me reaproximar da grandeza, da significação, do compromisso, da qualidade do que fazem as Forças Armadas. Tenho a certeza que, com elas, por elas e, também pelo seu povo, o Brasil pode sonhar com um futuro melhor".

Militares ficham moradoresbetboo kayıtfavela do Rio

Crédito, Agência Brasil

Legenda da foto, Pela primeira vez desde o fim do regime militar há um estado sob intervenção federal, o Riobetboo kayıtJaneiro

Como ministro da Defesa, assinou, junto com Temer e os ministros Etchegoyen, Carlos Marun (Secretariabetboo kayıtGoverno) e Torquato Jardim (Justiça), o decretobetboo kayıtintervenção federal na segurança pública do Rio. Foi nomeado para o cargobetboo kayıtinterventor o general Walter Souza Braga Netto. A medida também colocou um militar, o general Richard Fernandez Nunes, no cargobetboo kayıtsecretáriobetboo kayıtSegurança do Estado.

O Exército, que antes dava apoio às operações conjuntas, passou então a comandar a segurança do Rio.

Operações da 'Garantia da Lei e da Ordem'

Jungmann é defensor da transferênciabetboo kayıtrecursos federais para operaçõesbetboo kayıtGarantia da Lei e da Ordem (GLO), que vêm sendo usadas com frequência para apagar incêndios na segurança pública. As missõesbetboo kayıtGLOs estão previstas na Constituição, mas só são realizadas com ordem expressa da Presidência da República e devem ser usadasbetboo kayıtcasos nos quais as forças tradicionaisbetboo kayıtsegurança pública não têm condiçõesbetboo kayıtlidar com graves situaçõesbetboo kayıtperturbação da ordem.

A cada vez que uma GLO é decretada, o governo federal pode, ainda que não seja regra, transferir recursos para a Defesa. O valorbetboo kayıtrecursos para a Operação São Cristóvão, nome dado à ação das tropas federais na greve dos caminhoneiros, foibetboo kayıtR$ 80 milhões.

Em númerobetboo kayıtGLOs, no entanto, Temer não é tão diferentebetboo kayıtsua antecessora na Presidência. Dados do Ministério da Defesa mostram que,betboo kayıtdois anosbetboo kayıtgoverno, ele decretou 14 GLOs, médiabetboo kayıtsete por ano, contra 27betboo kayıtDilma,betboo kayıtcinco anosbetboo kayıtgoverno, médiabetboo kayıtcinco por ano.

Na era Temer, houve varredurasbetboo kayıtpresídios, militares nas ruas do Distrito Federal, Pernambuco, Espírito Santo, Rio Grande do Norte e, finalmente, no Riobetboo kayıtJaneiro, onde o governo foi além, decretando a intervenção federal.

Militares fazem escoltabetboo kayıtcaminhãobetboo kayıtgasolina

Crédito, Tânia Rego / Agência Brasil

Legenda da foto, Durante a greve dos caminhoneiros, todo o território nacional ficou sob uma missão militarbetboo kayıtGarantia da Lei e da Ordem

"No que diz respeito ao empregobetboo kayıtGLOs, o governo Temer apenas dá continuidade ao que outros fizeram, que é empregar as Forças Armadas a cada soluço na segurança pública. A diferença é que eles foram se tornando cada vez mais frequentes", diz Renato Sérgiobetboo kayıtLima, diretor-presidente do Fórum Brasileirobetboo kayıtSegurança Pública.

A Constituição prevê que as Forças Armadas poderiam ser usadas, a pedido da Presidência da República, para a garantia da lei e da ordem. As normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das forças foram definidas numa lei complementarbetboo kayıt1999, na época do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), mas a regulamentação e o manual que descreve os procedimentos a serem seguidos pelas Forças Armadas na eventualidadebetboo kayıtdecretaçãobetboo kayıtGLO só vierambetboo kayıt2013, no governo Dilma.

Dentro das Forças Armadas, essa exposição toda está longebetboo kayıtser unanimidade. Em dezembrobetboo kayıt2017, o comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, criticou o emprego excessivobetboo kayıtsuas forças. "Preocupa-me o constante emprego do Exércitobetboo kayıt'intervenções' (GLO) nos Estados. Só no Rio Grande do Norte, as Forças Armadas já foram usadas 3 vezes,betboo kayıt18 meses", disse ele no Twitter, ressaltando ainda que a segurança pública deveria ser tratada pelos Estados como prioridade máxima.

retrato general Braga Netto

Crédito, Tomaz Silva / Agência Brasil

Legenda da foto, Para cuidar da segurança no Rio, foi nomeado interventor federal o general Braga Netto

"E se, no caso da intervenção do Riobetboo kayıtJaneiro, houver uma morte, uma repressão mais violenta? Há muitos militares preocupados com a imagem da instituição", diz o professor da UFSCar. Para ele, o mesmo vale para a greve dos caminhoneiros. "Eles sabem que estão seguindo, como a lei manda, um governo altamente impopular, e eles têm medobetboo kayıtserem queimados na fogueira da crise geral. Infelizmente, eles estão sendo usados com uma frequência assustadora."

Para o professor do programabetboo kayıtpós-graduação da Escolabetboo kayıtComando e Estado-Maior do Exército (Eceme) e pesquisador do Observatório Militar da Praia Vermelha, no Riobetboo kayıtJaneiro, Carlos Frederico Coelho, há quem avalie que é uma situação perde-perde.

"Se der errado, a culpa é dos militares. Se der certo, vão pedir mais, afinal, elas (as Forças Armadas) já vêm sendo empregadas para diversos fins. Nesse sentido, cumpre proteger o ofício militar, que não pode ser banalizado. Alémbetboo kayıtaumentar a pressão sobre as Forças Armadas, o emprego constante gera incertezas sobre as proteções jurídicas necessárias."

Atendendo a essa preocupação, o governo Temer aprovou,betboo kayıt2017, lei que transfere para a Justiça Militar o julgamentobetboo kayıtcrimes dolosos contra a vida praticados contra civis por militares quandobetboo kayıtatividade operacional, como nas missões do tipo GLO.

Governo 'pega carona'betboo kayıtaprovaçãobetboo kayıtmilitares

Renato Sérgiobetboo kayıtLima, do Fórum Brasileirobetboo kayıtSegurança Pública, acha que há na população brasileira um sentimento difusobetboo kayıtreivindicaçãobetboo kayıtordem, "que se exacerba num momentobetboo kayıtcrises diversas", um ambiente que explica os índicesbetboo kayıtconfiança depositados nos militares.

Ministro Raul Jungmann

Crédito, Tânia Rego / Agência Brasil

Legenda da foto, Agora no Ministério da Segurança Pública, Raul Jungmann (foto) costumava fazer a ponte com os militares

"Num ambiente político extremamente contaminado, a sociedade se volta para a instituição cujo símbolo é a estabilidade e o profissionalismo", agrega o professor da Eceme Carlos Frederico Coelho.

E foi o governo Temer que, para o pesquisador João Roberto Martins Filho, da UFSCar, deu o empurrão necessário para recolocar os militaresbetboo kayıtpapelbetboo kayıtdestaque nos acontecimentos do país.

"Os militares do Exército saíram da posição discretabetboo kayıtque estavam durante a crise que levou ao impeachment da presidente Dilma. Saíram dessa posição porque o governo Temer, com a fraqueza que o caracteriza desde o começo, se apresentou desde o início como uma espéciebetboo kayıtgoverno da ordem. E, conscientemente, envolveu as Forças Armadas nessa perspectiva como única formabetboo kayıtse manter", diz ele.

Generais rechaçam a ideiabetboo kayıtintervenção militar

Desde os atos a favor do impeachmentbetboo kayıtDilma Rousseffbetboo kayıt2015 que vinham aparecendo,betboo kayıtmanifestaçõesbetboo kayıtrua, pedidos por intervenção militar - e estes ganharam força nos protestosbetboo kayıtcaminhoneiros.

Militares ligados ao governo reiteram que este não encontra eco nas Forças Armadas. O general Etchegoyen disse, na última terça-feira (29), que intervenção militar "é um assunto do século passado" e que nenhum militar das Forças Armadas está "pensando nisso".

Em entrevista ao jornal O Estadobetboo kayıtSão Paulo, o general Silva e Luna, da Defesa, disse que os pedidosbetboo kayıtintervenção o incomodam porque dão a impressãobetboo kayıtque as Forças Armadas estão por trás desse movimento, o que, segundo ele, não é verdade.

Protesto caminhoneiros

Crédito, Marcelo Pinto / Aplateia

Legenda da foto, Um movimentobetboo kayıtextrema direita que pede intervenção militar ganhou força nos protestos

Quando foi decretada GLObetboo kayıttodo o território nacional, o comandante do Exército, general Villas Bôas, disse, no Twitter: "Mais uma vez, o Exército será empregadobetboo kayıtuma operaçãobetboo kayıtgarantia da lei e da ordem, a fimbetboo kayıtatender às necessidades da população afetada pela 'greve dos caminhoneiros'. Como sempre, agiremos com base na CF (Constituição Federal),betboo kayıtapoio às instituições e pela democracia".

O atual comandante do Exército, que é visto por quem acompanha as Forças Armadas como moderado, revelou,betboo kayıt2017, que lutava contra uma doença degenerativa que o levou à cadeirabetboo kayıtrodas. Ainda assim, permaneceu no comando da instituição.

No entanto, especialistas como João Roberto Martins Filho, da UFSCar, sugerem que Villas Bôas pode estar sob pressãobetboo kayıtsetores mais conservadores do Exército.

"Há uma identificação do oficialato (oficiais) com o que a classe média expressa dentro dessa crise. Houve uma guinada mais conservadora (nessa classe)", diz Martins Filho, que vê com preocupação os rumos da relação entre as Forças Armadas e a sociedade neste momento.

"Estávamos caminhando lentamente para o controle democrático das Forças Armadas, mas não havia ainda uma mentalidade democrática dentro delas. Há um respeito aos limites legais, mas isso é diferentebetboo kayıthaver uma consciência e uma cultura democrática. Essa, eu acho, infelizmente não chegou", avalia.