O aeroporto fantasma feito pela Odebrechtsport365 apostaMoçambique, que o BNDES financiou e tomou calote:sport365 aposta

Legenda do vídeo, 'Só faltam os passageiros': caminhe pelo aeroporto internacional fantasmasport365 apostaMoçambique

O fracasso do empreendimento pesa nos bolsos dos dois países. Desde o finalsport365 aposta2016, Moçambique não paga as parcelas do empréstimo do BNDES, o branco brasileirosport365 apostafomento à economia brasileira, diluídosport365 apostaum prazosport365 aposta15 anos. É o primeiro calote que a instituição tomou entre todas as obras custeadas fora do Brasil - operações que passaram a ser postassport365 apostaxeque após a operação Lava Jato.

O pagamento do empréstimo não é a única conta que não fecha. O Aeroportosport365 apostaNacala opera no vermelho desde que foi inaugurado. Só o seu custosport365 apostaoperação é quatro vezes maior que as receitas. O saldo negativo recai sobre os outros aeroportossport365 apostaMoçambique, geridos todos pela mesma empresa estatal.

Não bastassem a faltasport365 apostavoos,sport365 apostapassageiros e as contassport365 apostaatraso, há suspeitassport365 apostacorrupçãosport365 apostatorno do aeroporto. Tanto Odebrecht como Embraer relataram ao Departamentosport365 apostaJustiça dos Estados Unidos terem pagado propina para autoridades moçambicanas com o objetivosport365 apostafechar negócios.

Áreasport365 apostaembarque e controlesport365 apostapassaportes sem ninguém
Legenda da foto, Áreassport365 apostaembarque e desembarque internacional nunca foram usadas | Foto: Amanda Rossi/BBC Brasil

Sonho brasileiro: Vale, Odebrecht, OAS e agronegócio

A construção do aeroporto foi sugerida ao governo moçambicano pela Odebrecht. Não se baseousport365 apostauma demanda reprimidasport365 apostapassageirossport365 apostaNacala, uma região com 375 mil habitantes, mas simsport365 apostauma suposta esperançasport365 apostacrescimento futuro, puxado por empresas brasileiras.

É por Nacala, uma cidade portuária, que a Vale exporta a maior parte do carvão que extrai nas minassport365 apostaMoatize, tambémsport365 apostaMoçambique, uma das maiores reservas do minério do mundo. Esse é o maior investimento do Brasil na África, assinado durante o governo Lula e estimadosport365 apostaUS$ 8,2 bilhõessport365 apostadólares.

A expectativa erasport365 apostaque a exportaçãosport365 apostacarvão por ali atraísse outros negócios. No caminho entre Moatize e Nacala, por exemplo, o braçosport365 apostacooperação internacional do Itamaraty e a FGV Agro (vinculada à Fundação Getúlio Vargas) esperavam estimular a expansão agrícola - do agronegócio brasileiro, inclusive.

Mas, por enquanto, as previsões se frustraram. Quando as obras do porto da Vale e do aeroporto da Odebrecht acabaram, o desenvolvimento estancou. "Na fasesport365 apostaconstrução, houve muito movimento. Depois, a empresa só traz carvão, embarca e vai embora", explica José Ferreira, economista da Agência para a Promoçãosport365 apostaInvestimento e Exportaçõessport365 apostaNacala.

Além disso, as economias brasileira e moçambicana entraramsport365 apostacrise. "Infelizmente, depois que o Aeroportosport365 apostaNacala foi inaugurado, houve esse esfriamento econômico, criou este buraco. Mas tenho fésport365 apostaque Nacala vai cumprir seu papel. Não acredito que o aeroporto possa fechar um dia porque não vem avião", afirma o diretor Tambajane.

Hoje, somam-se placassport365 apostavende-sesport365 apostaNacala. Postossport365 apostatrabalho fecharam.

"Estou a procurar serviço, qualquer serviço, mas não há mais empregos", diz Vitorino Mario,sport365 aposta25 anos. Ele trabalhou por dois anos para a empreiteira brasileira OAS, que construiu o portosport365 apostacarvão da Vale. Está desempregado há três anos, desde que as obras acabaram, fazendo bicos para sustentar os três filhos.

O quintal da casa onde vive, perto do porto, está ocupado por uma pequena carpintariasport365 apostaoutros ex-operários da OAS. Depoissport365 apostatrabalharem para a empresa, "a vida voltou a ser como era antes", diz Bachir Severino. O sonhosport365 apostadesenvolvimento brasileirosport365 apostaNacala durou pouco.

Bachir Severino segura carteirasport365 apostaidentificaçãosport365 apostatrabalhador da OAS
Legenda da foto, Bachir Severino mostra seu cartãosport365 apostaidentificação da OAS, ao lado do colega Ricardo Benjamim; eles trabalharam nas obras do portosport365 apostacarvão da Vale | Foto: Amanda Rossi/BBC Brasil

Cidade sem água encanada e sem emprego

Moçambique é um dos países mais pobres do mundo - 46% da população vive na pobreza, segundo estatísticas do país.

Nacala não foge à regra. Metade da cidade não tem água encanada, por exemplo. Nas margens da estrada que leva ao aeroporto, é possível ver diversas fontanárias - poços acionados por pressão manual - cercadassport365 apostamulheres e crianças com baldes nas mãos e nas cabeças.

O bairro Matchapue ilustra a precariedadesport365 apostainfraestruturas básicassport365 apostaNacala. Contam-se nos dedos as casas com água na torneira. Asport365 apostaFátima, com dois cômodos, é uma delas. A moçambicana fez da raridade um negócio: construiu um reservatório no quintal, que abastece com uma mangueira. A partir das 5h, os vizinhos chegam para encher seus baldes, ao custosport365 aposta5 meticais (R$ 25 centavos) cada.

Anchia Enusso,sport365 aposta21 anos, é uma das clientes, enchendo apenas um balde. "Só? Vai dar para quê?", perguntou a vendedora. "Hoje só tenho 5 meticais", respondeu a jovem, com a filha no colo. Nem ela nem a mãe trabalham fora. O pai é pedreiro. Tudo precisa melhorar no bairro onde vivem, mas o que mais faz falta é emprego, dizem elas.

Outros vizinhos se aproximam para reclamarsport365 apostaque também querem emprego. Juma Siaga, pescadorsport365 aposta48 anos, é um deles. Diz que a renda da pesca é muito baixa. O nicuzi, um peixinhosport365 apostauns 5 centímetros, por exemplo, é vendido secosport365 apostapequenas porçõessport365 aposta5 meticais - o mesmo preço do baldesport365 apostaágua.

Siaga esteve uma vez no Aeroportosport365 apostaNacala. Era a festasport365 apostainauguração, aberta ao público. Ficou encantado. "É grande, muito bonito, com muito vidro. A festa foi boa, havia música, dança, muita gente." Foi o diasport365 apostamaior movimento na história do terminal. Cercasport365 aposta500 pessoas apareceram para festejar.

Anchia, 21 anos, com a filha no colo, ao ladosport365 apostauma amiga,sport365 apostafrente ao reservatóriosport365 apostaágua da vizinha
Legenda da foto, Anchia Enusso e a amiga Mimi Assane compram baldessport365 apostaágua na casa da vizinha, uma das poucas com abastecimento encanado no bairro | Foto: Amanda Rossi/BBC Brasil

Sem voos, sem passageiros

O terminalsport365 apostaNacala é o primeiro aeroporto construídosport365 apostaMoçambique desde a independênciasport365 apostaPortugal,sport365 aposta1975.

É o mais moderno do país e o único que já obteve uma certificação para operar voos internacionais. No total, hásport365 apostaMoçambique onze aeroportos, seis deles internacionais. Os demais ainda estãosport365 apostaprocesso para obter a certificação.

O segundo aeroporto mais movimentado do país é justamente osport365 apostaNampula, vizinho dali. Como há poucos voos para Nacala, há quem voe para Nampula e depois faça o restante do percursosport365 apostacarro.

"É muito constrangedor ter que fazer duas horassport365 apostatáxisport365 apostaNampula a Nacala, sendo que há esse aeroporto aqui", diz a moçambicana Katia Manjate, que voousport365 apostaMaputo para Nampulasport365 apostaoutubro, para dar uma formação para rádios comunitáriassport365 apostaNacala.

O taxista Carlos José está acostumado a fazer esse trajeto. "Esse aeroportosport365 apostaNacala é muito grande mesmo, bem trabalhado. Só falta aviões. Fala-sesport365 apostafaltasport365 apostapassageiros. Assim, a LAM (Linhas Aéreassport365 apostaMoçambique) não consegue suportar as despesassport365 apostalevar avião para Nacala sem passageiros."

A LAM, única empresasport365 apostaaviaçãosport365 apostaMoçambique, estatal, chegou a realizar cinco voos semanais na rota Maputo-Nacala. Depois, reduziu a frequência para quatro voos,sport365 apostaseguida três, até chegar aos dois voos atuais.

"As companhias aéreas sempre se baseiam nas estatísticas. E nós sempre estamossport365 apostadesvantagem. Elas vão procurar onde há movimento. Vão ver que ésport365 apostaNampula. Dificilmente virão para Nacala. Então, nosso tráfego vai continuar a ser gerido pela LAM. Como companhia do Estado, a LAM não pode abandonar nenhuma escala, tem que cumprir seu dever social", afirma o diretor do aeroporto.

No momento, a única esperança do Aeroportosport365 apostaNacala é que o governosport365 apostaMoçambique proíba o tráfego internacional nos dois aeroportos mais próximos (Nampula e Pemba) e obrigue as empresas aéreas a alterarem as rotas.

A medida enfrentaria resistência das companhias, dos passageiros e tambémsport365 apostaempresários - Pemba é a nova promessasport365 apostadesenvolvimentosport365 apostaMoçambique, devido à descobertasport365 apostaenormes reservassport365 apostagás natural.

Navio abastecidosport365 apostacartão no porto da Valesport365 apostaNacala
Legenda da foto, Navio é abastecido no porto da Vale,sport365 apostaNacala, com o carvão extraído na regiãosport365 apostaMoatize; é o maior negócio do Brasil na África | Foto: Amanda Rossi/BBC Brasil

Propinasport365 aposta900 mil dólares da Odebrechtsport365 apostaMoçambique

A Odebrecht revelou para o Departamentosport365 apostaJustiça dos Estados Unidos que realizou "pagamentos corruptos" no valorsport365 apostaUS$ 900 mil para autoridades moçambicanas, entre 2011 e 2014, períodosport365 apostaconstrução do aeroporto.

Parte desse valor teria sido paga para obter "termos favoráveissport365 apostaum projetosport365 apostaconstrução do governo, que o governo não estava inclinado a aceitar".

O caso foi transferido para a Procuradoria da Repúblicasport365 apostaMoçambique. Procurado pela BBC Brasil por três semanas, o órgão se negou a comentar o caso. Até hoje, não revelou quem são os moçambicanos envolvidos na denúncia da Odebrecht. A empresa responsável pelos aeroportos do país africano também não respondeu a BBC Brasil.

O Aeroportosport365 apostaNacala também apareceu na operação Lava Jato. Um dos delatores da Odebrecht, Antoniosport365 apostaCastro Almeida, afirmou que uma funcionária da Câmarasport365 apostaComércio Exterior da Presidência da República (Camex) teria recebido 0,1% do valor do contrato para agilizar a aprovação do projeto no órgão - uma das etapas necessárias para liberar o financiamento no BNDES.

A empreiteira informou, por nota, que está colaborando com as investigações brasileiras e estrangeiras: "A qualidade e a eficácia da colaboração da Odebrecht vêm sendo confirmadas dia a dia, e têm sido instrumento valioso para a ação da Justiça brasileira dos paísessport365 apostaque a empresa atua. A empresa está comprometidasport365 apostacombater e não tolerar mais qualquer formasport365 apostacorrupção, e também está decidida a atuar sempre com ética, integridade e transparência".

Itamaraty disse que obra era 'imprescindível' e minimizou riscossport365 apostacalote

Desde o princípio da negociação do empréstimo do BNDES, estava claro que Moçambique não poderia oferecer garantias robustas.

"As dificuldades seriam as garantias oferecidas por Moçambique, um país pobre que não tinha capacidadesport365 apostaoferecer garantias. A gente fez uma estruturação para a garantiasport365 apostaMoçambique ser aceita", afirmou Castro Almeida na delação premiada.

Mesmo assim, a Embaixada do Brasilsport365 apostaMoçambique deu seu aval para o projeto. Em 2009, o então embaixador brasileiro no país, Antonio Souza e Silva classificou a obra como "imprescindível".

"O novo aeroportosport365 apostaNacala será um ponto central para a região nortesport365 apostaMoçambique, servindosport365 apostapassagem para outros aeroportos, aumentando o fluxosport365 apostapassageiros e carga", escreveu o diplomatasport365 apostatelegrama para o Itamaraty,sport365 apostaresposta a pedidosport365 apostainformações do Comitêsport365 apostaFinanciamento e Garantia das Exportações (Cofig).

"Quanto aos riscos, Moçambique não está disposto a ingressar numa espiralsport365 apostaendividamento irresponsável, conforme experiências passadas. O governo tem pautado suas iniciativassport365 apostalongo prazo com prudência e responsabilidade técnica", continuou o embaixador.

A análise se mostrou equivocada. Moçambique vive hoje uma severa crise da dívida, após o FMI descobrir que o país estava contraindo empréstimos ocultos, fora dos registros oficiais - não é o caso do crédito com o BNDES. Como consequência, a comunidade internacional congelou o repassesport365 apostarecursos externos, que suportavam nada menos que um terço do orçamento do Estado moçambicano.

O subsecretário-geral para promoção comercial do Itamaraty, Santiago Mourão, afirma que o Aeroportosport365 apostaNacala era visto pelo governosport365 apostaMoçambique como uma peça importante e estratégica para o desenvolvimento do país e imaginava-se que o corredor que vaisport365 apostaMoatize a Nacala seria um motor econômico regional.

"As dificuldades financeiras com que Moçambique se confrontou não estavam previstas naquele momento. Mas percalços econômicos do país não invalidam a ideia do projeto."

Diretor do Aeroportosport365 apostaNacala Jeronimo Tambajane dentro da salasport365 apostaembarque internacional, que nunca foi usada
Legenda da foto, Diretor do Aeroportosport365 apostaNacala, Jeronimo Tambajane administra uma moderna estruturasport365 apostaaviação, mas faltam voos e passageiros | Foto: Amanda Rossi/BBC Brasil

Perdão da dívida resultou no novo calote

O empréstimo para o Aeroportosport365 apostaNacala só foi possível porque o Brasil perdoou dívidas anterioressport365 apostaMoçambique, no valorsport365 apostaUS$ 315 milhões - não é possível emprestar para quem tem nome sujo na praça brasileira.

O perdão, ocorridosport365 aposta2004, foi o primeiro do governo Lula e um dos maiores já concedidos pelo Brasil. A dívida havia sido assumida durante a ditadura militar, nas décadassport365 aposta1970 e 1980.

"Qual foi o grande favor que nós fizemos? Nós liberamos as pessoas para fazerem novas dívidas. É apenas isso. Eles não iam pagar porque não tinham dinheiro", disse Lula,sport365 apostaentrevistasport365 apostadezembrosport365 aposta2013.

O BNDES argumenta que o empréstimo tinha por objetivo estimular a exportaçãosport365 apostaserviçossport365 apostaempresas brasileiras. O dinheiro foi fornecido diretamente para a Odebrecht. A estatalsport365 apostaaeroportossport365 apostaMoçambique tem 15 anos para pagarsport365 apostavolta.

O banco informou, por nota, que o financiamento para a construção do Aeroportosport365 apostaNacala "seguiu o trâmite usual por que passa qualquer pedidosport365 apostafinanciamento ao BNDES". Acrescentou que "o governosport365 apostaMoçambique continua inadimplente com o BNDES nesses contratos e a renegociação seguesport365 apostacurso, sob condução do Governo brasileiro". O BNDES acionou o Segurosport365 apostaCrédito à Exportação da União, para cobrir as parcelas não pagas.

Após a eclosão da Lava Jato, os créditos do BNDES para projetossport365 apostainfraestrutura brasileiros na África despencaram. Em 2016, somaram 1% da média anual registrada nos oito anos anteriores - US$ 6 milhões contra US$ 446 milhões.

Passageiros embarcamsport365 apostaaeronave Embraer 190, operada pela LAM (Linhas Aéreassport365 apostaMoçambique) no Aeroporto Internacionalsport365 apostaNacala
Legenda da foto, Aeronave Embraer 190 faz a única rota comercial do Aeroportosport365 apostaNacala; empresa admitiu ter pagado propina para fechar a venda | Foto: Amanda Rossi/BBC Brasil

Embraer admitiu ter pagado propina na vendasport365 apostaaviões

A pistasport365 aposta3,1 quilômetros do Aeroportosport365 apostaNacala é frequentada pelos aviões Embraer 190 e Embraer 145. São aeronavessport365 apostatamanho médio, bem menores do que a pista pode suportar. Elas fazem sucesso na África, que não tem um mercado aéreo robusto para aviões com muitos assentos.

Dos sete aviões da Linhas Aéreassport365 apostaMoçambique, cinco são da Embraer. A comprasport365 apostaparte deles está sendo investigada.

A empresa brasileira revelou para as justiças americana e brasileira ter pagado US$ 800 mil ilicitamente pela vendasport365 apostadois modelos 190 para a LAM - justamente o que faz a única rota comercial para Nacala - no valorsport365 apostaUS$ 32 milhões cada, entre 2008 e 2009.

Segundo a denúncia, autoridades moçambicanas solicitaram pagamentos ilegais e receberam uma oferta inicialsport365 apostaUS$ 50 mil. O valor teria sido visto "como um insulto" pelos moçambicanos, que esperavam muito mais. Esse teria sido o recado passado por telefone pelo então presidente da LAM para um executivo da Embraer.

"Poderíamos nos safar com US$ 800 mil", teria sugerido o moçambicano. A fabricantesport365 apostaaviões diz ter realizado dois pagamentossport365 apostaUS$ 400 mil cada para atender o pedido.

O caso também está sendo investigado pela Procuradoria da Repúblicasport365 apostaMoçambique, que se restringiu a informar que a fase do processo "não recomenda a partilhasport365 apostainformação". A LAM não respondeu à BBC Brasil.

Em nota, a Embraer afirmou que reconhece a responsabilidade pelos atossport365 apostaseus funcionários e agentes e lamenta o ocorrido. "A companhia aprendeu e evoluiu com essa experiência e dará continuidade àsport365 apostatrajetóriasport365 apostasucesso."