Como 'Ainda Estou Aqui' inspira jovens a compartilhar no TikTok históriasrealsbet afiliadopais e avós torturados na ditadura:realsbet afiliado

Crédito, Arquivo pessoalrealsbet afiliadoMaria Petrucci

Legenda da foto, O pairealsbet afiliadoMaria sofreu traumas e sempre falava sobre o assunto com muito receio e medo

Os relatos foram compartilhados graças a uma trend no TikTok, inspirada no filme Ainda Estou Aqui, do diretor Walter Salles, e que rendeu postagens virais, com maisrealsbet afiliadoquatro milhõesrealsbet afiliadovisualizações.

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A obra entrou na lista preliminar dos 15 indicados para a categoriarealsbet afiliadoMelhor Filme Estrangeiro do Oscar, e o resultado definitivo daqueles que concorrerão será divulgadorealsbet afiliado17realsbet afiliadojaneirorealsbet afiliado2025.

Um dos primeiros vídeos foi orealsbet afiliadoMaria, onde ela segura a foto 3x4 do pai, preso na época, e escreve: "O impactorealsbet afiliadover esse filme sendo filharealsbet afiliadoum preso político da ditadura que hoje tem Alzheimerrealsbet afiliadoestado avançado".

O post tinha como trilha sonora a música É Preciso Dar um Jeito, Meu Amigo, do cantor Erasmo Carlos, e que compõe o longa.

Após essa publicação, outros jovens começaram a compartilhar relatos sobre pais e avós que sofreram com a perseguição, destacando como o filme se tornou um marco para que o tema fosse falado abertamente.

"Eu não imaginei que ia ter essa repercussão e muitas pessoas jovens perguntando o que foi a ditadura. Fiquei feliz que pude contribuir para que outras pessoas pudessem ter mais consciênciarealsbet afiliadotodo o prejuízo que muitas famílias sofreram. Vi um paralelo com a história do meu pai", diz Maria.

Codinome Frederico

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Logo que ingressou na faculdaderealsbet afiliadoadministração pública na décadarealsbet afiliado1970, o pairealsbet afiliadoMaria, Sérgiorealsbet afiliadoAzevedo, hoje com 78 anos, entrou para o movimento estudantil e ajudou pessoas que eram perseguidas pela ditadura.

Ele e os amigos usavam um apartamento para salvar e abrigar indivíduos e deixá-losrealsbet afiliadosegurança.

"Eles chamavamrealsbet afiliado'aparelho' e funcionava como uma espécierealsbet afiliadoesconderijo. Para dificultar a identificação, ele também usava o nomerealsbet afiliadoFrederico", diz Maria.

Na época, ele tinha uma amiga chamada Anita e os dois combinaramrealsbet afiliadose encontrarrealsbet afiliadouma praça no bairro do Leblon, na zona sul do Riorealsbet afiliadoJaneiro. Ela demorou muito a aparecer no local e quando ele e um amigo estavam indo embora, foram surpreendidos por militares.

"Os militares os pisotearam e os levaram para a penitenciária da Tijuca", relembra a estudante.

Chegando ao local, ele passou cinco diasrealsbet afiliadouma cela, deitadorealsbet afiliadouma esteira no chão, com um militar armado ao seu lado.

"Ele ficou por voltarealsbet afiliadodois meses na prisão e, nesse meio tempo, ocorreram diversas situações que o impediramrealsbet afiliadoser torturado", conta. Na primeira vez, segundo Maria, os militares haviam encontrado jovensrealsbet afiliadooutro grupo e não realizaram a tortura.

"Provavelmente acharam um outro grupo mais significativo. E talvez não desconfiaram dele, porque ele realmente escondeu muita gente relevante no apartamento", acrescenta.

Em um outro momento, ele foi levado para uma sessãorealsbet afiliadotortura na qual as pessoas eram chamadasrealsbet afiliadoordem alfabética.

Por ter o nome S, ele estava entre os últimos e, bem naquele dia, o horário para tortura havia acabado. "Ele nunca agradeceu tanto por ser Sérgio e ter o S no nome", relembra.

Em outro momento, um militar o acorda no meio da noite e pergunta se ele era o Frederico e diz "que não queria estar na pele dele e que ele havia caído".

Maria conta que o pai chegou a pensar que fora delatado pelos amigos, mas, ao chegar na salarealsbet afiliadotortura, viu seu amigo ensanguentado e, mesmo assim, o companheiro disse que aquele não era o Frederico que os militares estavam buscando.

"Até hoje a gente não sabe se ele quis poupá-lo ou se não era ele mesmo. Ele passou 'raspando' por sessõesrealsbet afiliadotortura", conta a jovem.

Após quase dois meses, ele consegue ser solto com a ajudarealsbet afiliadoum militar conhecido da família, que o ajuda com argumentosrealsbet afiliadoque ele tinha bons antecedentes e que já havia estudado no colégio naval na adolescência.

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, O pairealsbet afiliadoMaria tem Alzheimerrealsbet afiliadoestado avançado e não se recorda da tortura que sofreu na ditadura

Ao sair da cadeia, Maria conta que o pai era vigiado constantemente por militares e precisou mudarrealsbet afiliadocasa. Ele havia passadorealsbet afiliadoum concurso para ser fiscalrealsbet afiliadorenda e sofreu ameaças para assumir o cargo, o que o fez desistir.

"Eles não queriam que alguém contra o regime ocupasse um cargo público", conta.

Só depoisrealsbet afiliadomuito tempo e com uma liminar na Justiça, que ele conseguiu,realsbet afiliadofato, pleitear o cargo.

Depois, passou por processosrealsbet afiliadoexílio, quando foi estudar para um mestrado no Chile e na Argentina, até retornar ao Brasil, nos anos 70.

Devido a todas as adversidades, Sérgio sofreu traumas e sempre falava sobre o assunto com muito receio e medo. "Ele falava baixo, falava com medo. Chegou a dar depoimento na Comissão Nacional da Verdade e ficou realmente nervoso", relembra a filha.

Fim dos sonhos e Alzheimer

Mesmo não sofrendo tortura física, as sequelas psicológicas foram graves,realsbet afiliadoacordo com Maria. Ele conta que o pai tomou por muito tempo ansiolíticos e, mesmo após anos, ainda tinha receiorealsbet afiliadofalar sobre tudo que viveu na prisão.

A estudante também relata que o pai parourealsbet afiliadosonhar, literalmente, anos após sair da cadeia.

"Ele não tinha mais a experiênciarealsbet afiliadosonhar como as pessoas normais. Quando ele saiu da prisão, ele sonhava muito com tortura, tirando a camisa, a calça, para se 'desidentificar'", diz.

"Como fazia abusorealsbet afiliadoansiolíticos, teve um comprometimento psíquico e neural. Então, ele realmente não sonhava com nada ou não se lembrava. E também não tinha mais esperança com a vida. Tornou-se uma pessoa muito pessimista", acrescenta.

Em 2018, Sérgio foi diagnosticado com demência e a doença foi evoluindo. Ele precisou se retirar da faculdaderealsbet afiliadoque dava aula e foi tendo uma piora no quadrorealsbet afiliadosaúde.

Atualmente, por decisão da família, ele viverealsbet afiliadouma ILPI (Instituiçãorealsbet afiliadoLonga Permanência), e tem dificuldaderealsbet afiliadoreconhecer as filhas. "Hoje, ele já estárealsbet afiliadoestágio avançado do Alzheimer e muito debilitado. Tem dificuldade para se comunicar, para formar frase", diz.

Mesmo diante da condição, Maria acredita que os resquícios da ditadura ainda permanecem. "Uma vez eu estava cantando Chico Buarque para ele e ele disse para eu não cantar aquilo que iam me prender", relembra.

Para a jovem, a identificação com o filme veio justamente daí, já que, para ela, a cena mais emblemática foi quando a atriz Fernanda Montenegro, que interpreta Eunice no fim da vida, reconhece o marido na televisão e esboça reação sem dizer uma palavra.

"Foi muito impactante. Ela ressurgerealsbet afiliadosi mesma. Fiquei muito comovida com esses paralelos", diz.

Para ela, a obra é fundamental para preservar a históriarealsbet afiliadotodas as pessoas que passaram por algum tiporealsbet afiliadotortura nessa época, alémrealsbet afiliadomostrar para outras que duvidam que isso existiu.

"Tenho relatorealsbet afiliadoamigos que foram assistir com pais conservadores. E sórealsbet afiliadoconseguirem ter empatia e entender o que pelo menos foi o regime militar, fico feliz. É muito importante a empatia que o cinema proporciona", diz.

'Meu pai foi torturado e teve o tímpano perfurado'

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Celso Lungaretti foi preso pelo regime militar quando era guerrilheiro

A estudante Luana Lungaretti,realsbet afiliado22 anos, cresceu ouvindo sobre o impacto da ditadura militar na vidarealsbet afiliadoseu pai, Celso Lungaretti, hoje com 74 anos.

Jornalista e ex-guerrilheiro da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), ele foi preso aos 19 anosrealsbet afiliadouma operação que desarticulou o grupo ao qual pertencia.

Celso foi preso no dia 16realsbet afiliadoabrilrealsbet afiliado1970 e levado para a sede do DOI-CODI, na zona norte do Riorealsbet afiliadoJaneiro.

Durante o temporealsbet afiliadodetenção, foi submetido as sessõesrealsbet afiliadotortura que incluíam choques elétricos e espancamentos.

"Choques nos dedos, nos testículos e com eletrodos atados nos ouvidos,realsbet afiliadoforma que sentíamos como se um raio atravessasse nosso cérebro", relembra Celso,realsbet afiliadoentrevista à BBC News Brasil.

Ele sofreu agressões pelo tenente Ailton Joaquim, que, segundo Sérgio, era considerado um dos mais violentos da época. O militar chegou a ministrar uma aula práticarealsbet afiliadotortura na Vila Militar,realsbet afiliadooutubrorealsbet afiliado1969, para um gruporealsbet afiliadosargentos e oficiais.

"Em uma dessas sessões, ele teve o tímpano do ouvido direito estourado, uma lesão que resultourealsbet afiliadoanosrealsbet afiliadocrisesrealsbet afiliadolabirintite e cirurgias", conta Luana.

"Fiz três cirurgias, mas até hoje continua perfurado. O buraco só diminuiurealsbet afiliadodiâmetro, mas, se entrar água, infecciona", afirma o jornalista.

Crédito, Arquivo pessoalrealsbet afiliadoLuana Lungaretti

Além dos danos físicos, as marcas psicológicas e sociais foram severas. "Ele passou quase um ano tentando se reerguer psicologicamente após a prisão. Ainda assim, enfrentou difamações e foi acusado injustamenterealsbet afiliadodelatar seus colegas. Isso o isolourealsbet afiliadomuitas pessoas e comprometeurealsbet afiliadocarreira profissional por décadas", relata a filha.

Ele chegou a ficar um ano preso, e levou praticamente o mesmo temporealsbet afiliadoque ficourealsbet afiliadocárcere para se recuperar. "Não tinha dinheiro para pagar terapeuta, mas fui superando os traumas e revolta represada", diz.

Segundo Celso, pelo menos 20 pessoas que ele conhecia pessoalmente foram assassinadas durante a luta armada ao participarrealsbet afiliadouma comunidade alternativa, a conviterealsbet afiliadoantigos amigos dele da escola.

Para driblar a hostilidade e os preconceitos, ele chegou a usar pseudônimos para assinar trabalhos na imprensa e conseguir trabalho.

A história do pai nunca foi um tabu dentrorealsbet afiliadocasa. Desde cedo, Luana ouviu sobre o período repressivo e como ele moldourealsbet afiliadovisãorealsbet afiliadomundo.

"Meu pai nunca se calou sobre o que viveu. Ele sempre participourealsbet afiliadodebates, deu entrevistas e escreveu sobre o tema. Em 2005, publicou o livro Náufrago da Utopia, onde relatarealsbet afiliadotrajetória na guerrilha e as marcas deixadas pela ditadura", ressalta.

Ao assistir ao filme Ainda Estou Aqui, a estudante sentiu-se representada."Foi impossível não me emocionar e pensar no que meu pai enfrentou. Era como se eu pudesse sentir, mesmo que minimamente, o que ele viveu na pele", diz.

No entanto, a experiência foi marcada por limitações: tanto ela quanto Celso têm deficiência auditiva, e a ausênciarealsbet afiliadolegendas nos cinemas brasileiros dificultou o acesso.

"Uma pessoa que me acompanhava precisou escrever pelo WhatsApp o que acontecia para que eu pudesse entender." O pai da jovem ainda não conseguiu assistir ao longa, justamente pela faltarealsbet afiliadoacessibilidade.

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Luana conta que a históriarealsbet afiliadoseu pai nunca foi taburealsbet afiliadocasa

A repercussão do filme e dos vídeos no TikTok, onde Luana compartilhou a históriarealsbet afiliadosua família, é, para ela, uma oportunidaderealsbet afiliadoconscientizar as novas gerações.

"A maioria que defende, muitas vezes, é influenciada por opiniões extremistas e,realsbet afiliadoalguns casos, sem fundamento sobre o assunto. Falta mais estudo e, principalmente, humanidade", diz Luana.

Questionados sobre as pessoas que pedem para que a ditadura retorne, ambos são categóricos nas respostas. Para eles, defender a volta desse regime é fruto da faltarealsbet afiliadoinformação.

"Tais pessoas, ou estão sendo enganadas por gente inescrupulosa que lhes impingem mentiras cabeludas aproveitandorealsbet afiliadoinocência, ou são seres desumanos ao extremo", diz Celso.

A filha ainda faz um apelo para que essas pessoas se coloquem no lugar das minorias,realsbet afiliadoquem perdeu alguém erealsbet afiliadoquem teve que lutar.

"Viver com medo, viver sendo vigiado, viver sob cautela o tempo todo, viver sem direitos. Isso não é viver, e não podemos permitir que se repita."

'Minha avó ficou exilada por dez anos na França'

Crédito, Arquivo pessoalrealsbet afiliadoElisa Nunes

Legenda da foto, Vera Tuderealsbet afiliadoSouza precisou abandonarrealsbet afiliadovida no Brasil durante a ditadura militar

A avó da estudante Elisa Nunes, Vera Tuderealsbet afiliadoSouza, precisou abandonarrealsbet afiliadovida no Brasil durante a ditadura militar.

"Minha avó era muito jovem, praticamente da minha idade, e teve que largar tudo para acompanhar meu avô, que era da luta armada. Ela não era militante, mas ajudava pessoas perseguidas, como o Rubens Paiva", conta Elisa.

Vera acabou sendo identificada pelas autoridades após ajudar na fugarealsbet afiliadoum amigo, que acabou capturado. A situação se tornou insustentável, e ela partiu para o exílio na Françarealsbet afiliado1969. Lá, ingressou no Partido Comunista Francês e passou a observar as diferenças sociais e políticasrealsbet afiliadorelação ao Brasil.

"Ela via como políticas públicas, saúde e educaçãorealsbet afiliadoqualidade mudavam a vida das pessoas, e isso marcou muito a visão dela", explica a neta.

Mesmo politicamente ativa no exílio,realsbet afiliadoavó enfrentou dificuldades financeiras. Sem formação acadêmica completa, fez trabalhos manuais e passeava com cachorros para sustentar as filhas gêmeas. "A ditadura roubou isso dela, e ela teve que se virar com o que dava para criar minha mãe e minha tia", relata Elisa.

Segundo a jovem, a avó conta que o período, apesar dos desafios, foi importante para a formação política dela, que agora tem 81 anos. "Ela nunca escondeu essa parte da vida para a família, sempre contou suas experiências. Foi uma época difícil, mas que trouxe muito aprendizado para ela e meu avô."

Elisa também explorou a história da avó emrealsbet afiliadomonografia do ensino médio, que abordava o papel das mulheres na ditadura.

"Usei os relatos dela para mostrar como era ser mulher na linharealsbet afiliadofrente naquele período. Foi muito especial trazer essa memória para o trabalho", afirma.

A identificação da família com o filmerealsbet afiliadoWalter Salles foi imediata. "Assistimos juntos porque sabíamos que nos reconheceríamos nos personagens. Somos uma famíliarealsbet afiliadoclasse média, e a trajetória deles lembra muito a da minha avó."

Ao levar a históriarealsbet afiliadoVera para o TikTok, a estudante quis destacar a força e resiliência da avó.

"Ela é uma heroína invisível, a mulher que eu mais admiro no mundo. É importante contar essas histórias para que ninguém esqueça o que aconteceu e para que possamos entender melhor nosso passado."

Para Elisa, a faltarealsbet afiliadopunição aos responsáveis pelo regime contribui para o esquecimento coletivo.

"Os culpados nunca foram punidos, e isso cria um fatorrealsbet afiliadoesquecimento muito grande nas pessoas. Muitos defendem a ditadura sem saber o que realmente aconteceu”, diz