Uma viagem ao pedaço da Amazônia onde se fala japonês:faz um sportingbet aí meme

E deveriam aprender com vizinhos que estavamfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu há mais tempo do que eles: os ribeirinhos.

"Ele (Sakaguchi) via o ribeirinho produzindo com harmonia", conta à BBC News Brasil o agricultor Michinori Konagano, membro da colônia e um dos principais discípulos do ex-diretor da cooperativa.

Konagano,faz um sportingbet aí meme65 anos, é um dos 46 mil japoneses que migraram do Japão para o Pará entre 1952 e 1965. Ele veio com os pais, aos 2 anosfaz um sportingbet aí memeidade.

Da varanda espaçosa na fazenda onde Konagano recebeu a equipe da BBC News Brasil, sente-se o aroma agridoce do cacaufaz um sportingbet aí memefermentação.

Guardadasfaz um sportingbet aí memearmazéns, as amêndoasfaz um sportingbet aí mememaior qualidade são exportadas para fábricasfaz um sportingbet aí memechocolate no Japão.

A fazenda também produz,faz um sportingbet aí meme230 hectaresfaz um sportingbet aí memeárea cultivada, vários outros tiposfaz um sportingbet aí memefrutas, como açaí, cupuaçu e pitaya, alémfaz um sportingbet aí mememadeira e óleos vegetais.

Se hoje Konagano convive com a abundância efaz um sportingbet aí memepropriedade é vista como referência na região, ele conta que, na infância, chegou a passar fome.

"Perguntava para minha mãe e meu pai: 'por que tem tanta fartura na natureza, mas nosso quintal é pobre?'", diz.

Na época, a família era adeptafaz um sportingbet aí memeoutro modelofaz um sportingbet aí memeprodução, comumfaz um sportingbet aí memegrande parte da Amazônia: derrubar a floresta e cultivar um só tipofaz um sportingbet aí memealimento,faz um sportingbet aí mememonocultura.

"Hoje, eu me sinto culpado por ter derrubado e queimado. A degradação foi muito grande naquela época", lembra.

As coisas só começaram a mudar quando, guiada por Sakaguchi, o diretor da cooperativa, a famíliafaz um sportingbet aí memeKonagano adotou o novo modelofaz um sportingbet aí memeprodução inspirado nos ribeirinhos.

Segundo Konagano, Sakaguchi notou que os ribeirinhos tinham ao redorfaz um sportingbet aí memesuas casas árvores frutíferasfaz um sportingbet aí memevárias espécies que lhes davam colheitas ao longo do ano todo.

"Eles não tinham tanto recurso financeiro, mas tinham uma vida saudável", diz Konagano.

As famílias japonesas começaram a testar esse modofaz um sportingbet aí memeprodução,faz um sportingbet aí memeescala maior efaz um sportingbet aí memeforma padronizada.

Nos camposfaz um sportingbet aí memepimenta arrasados pela praga fusariose, espalharam árvoresfaz um sportingbet aí memegrande porte e várias frutíferas, experimentando diferentes combinações.

Desde então, os campos abertos e degradadosfaz um sportingbet aí memesuas fazendas voltaram a ter aspectofaz um sportingbet aí memefloresta.

Animais que tinham sumido - como preguiças-reais, raposas e pacas - reapareceram.

E a comunidade, que antes dependiafaz um sportingbet aí memeum só produto, passou a ter várias fontesfaz um sportingbet aí memereceita.

Ao longo do processo, o grupo se tornou ainda um exemplo para pesquisadores e agricultoresfaz um sportingbet aí memevários países que buscam alternativas a métodos agrícolas convencionais e que buscam maneirasfaz um sportingbet aí memegerar renda sem destruir a Amazônia

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'Era só mata'

O êxito do novo sistema fez Tomé-Açu recuperar parte da diversidade que tinha quando os primeiros japoneses chegaram ali.

“Era só mata”, lembra Hajime Yamada, última pessoa viva presente na primeira levafaz um sportingbet aí memeimigrantes a aportarfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu.

Hoje com 96 anos, Yamada tinha 2 quando seus pais chegaram ao Brasil a bordo do navio Montevideo Maru,faz um sportingbet aí meme1929.

Yamada morafaz um sportingbet aí memeuma imponente casafaz um sportingbet aí mememadeira erguida nos temposfaz um sportingbet aí memebonança da pimenta-do-reino, nos anos 1950.

Na construçãofaz um sportingbet aí memedois andares, feita conforme antigas técnicas arquitetônicas japonesas, colunas e vigas são unidas por encaixes, e não há pregos nem parafusos.

Retratosfaz um sportingbet aí memeseus antepassados e quadros com ideogramas japoneses - condecorações recebidas por seu papel na comunidade - enfeitam as paredes da sala.

A primeira casafaz um sportingbet aí memeYamadafaz um sportingbet aí memeTomé-Açu, no entanto, era bem diferente.

"Era uma barraca cobertafaz um sportingbet aí memecavaco, pisofaz um sportingbet aí memechão. Só tinha sala, não tinha quarto. Pobre mesmo", descreve.

Yamada conta que a casa ficava no meio da floresta e recebia visitasfaz um sportingbet aí memeonças-pintadas, atraídas pelas galinhas criadas pela família.

Questionado se temia o felino, Yamada ri: "Eu tremia".

Ele mostra a fotofaz um sportingbet aí memeuma onça abatida pertofaz um sportingbet aí memesua casa por um caçador japonês.

"Essa chegou a atacar um senhor brasileiro e quase o matou", lembra.

Yamada conta que seus pais eram camponeses da Provínciafaz um sportingbet aí memeHiroshima e deixaram o Japão rumo ao Brasilfaz um sportingbet aí memebuscafaz um sportingbet aí memeuma vida melhor.

Desde 1895, os governos dos dois países tinham um acordo que estimulava a vindafaz um sportingbet aí memejaponeses para o Brasil.

Com o pacto, o governo brasileiro buscava suprir a faltafaz um sportingbet aí memetrabalhadores rurais após a abolição da escravatura,faz um sportingbet aí meme1888.

Já o Japão queria aliviar tensões sociais causadas pela pobreza no campo.

Os japoneses começaram a chegar ao Brasilfaz um sportingbet aí meme1908 e se concentraramfaz um sportingbet aí memeSão Paulo.

Foi então que o governador do Pará, Dionísio Bentes, pensoufaz um sportingbet aí memeatrair uma parte do grupo para seu Estado, interessadofaz um sportingbet aí memedesenvolver a agricultura local.

Ele ofereceu aos japoneses um lotefaz um sportingbet aí meme600 mil hectaresfaz um sportingbet aí memeflorestafaz um sportingbet aí memeTomé-Açu e outros quatro lotes menores nos municípiosfaz um sportingbet aí memeMonte Alegre e Marabá, que ficam a centenasfaz um sportingbet aí memequilômetrosfaz um sportingbet aí memedistância,faz um sportingbet aí memeoutros pontos do Estado.

As primeiras 43 famílias partiram do portofaz um sportingbet aí memeKobe, no centro do Japão, rumo ao Paráfaz um sportingbet aí meme24faz um sportingbet aí memejulhofaz um sportingbet aí meme1929.

A viagem até Tomé-Açu levou quase dois meses e teve baldeações no Riofaz um sportingbet aí memeJaneiro efaz um sportingbet aí memeBelém.

O trajeto entre a capital paraense e o destino final, hoje transpostofaz um sportingbet aí memepouco maisfaz um sportingbet aí meme3 horas por estradas asfaltadas, na época levava 12 horas e era todo percorrido por rios.

Cada família recebeu um lotefaz um sportingbet aí meme25 hectares.

"A gente plantava muita verdura, mas o brasileiro não comia muita verdura naquela época", lembra Yamada.

Segundo ele, o gosto nipônico por folhas era inclusive alvofaz um sportingbet aí memebrincadeiras dos brasileiros, que comparavam os japoneses a bichos-preguiça.

A convivência amigável entre os grupos, porém, sofreu um abalo durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), quando o Brasil declarou guerra aos países do Eixo (Japão, Itália e Alemanha) e impôs controles sobre imigrantes dos três países.

Em Tomé-Açu, os japoneses passaram a ser vigiadosfaz um sportingbet aí memeperto pelas autoridades.

"Se polícia encontrava três japoneses conversando, eram presos. Encheram o xadrez", diz Yamada.

Com o fim da guerra, as restrições se encerraram. Mas Yamada não conseguiu festejar por descobrir que, antes do fim do conflito, o Japão havia sofrido um ataque nuclear dos Estados Unidos.

Uma das duas bombas atômicas lançadas sobre o Japão destruiu a cidade natalfaz um sportingbet aí memeYamada, Hiroshima.

"A bomba deixou muita gente doida por aqui", lembra. "Se eu tivesse ficado lá, acho que teria morrido também."

Ele conta quefaz um sportingbet aí mememãe chorou por vários dias ao saber do ataque contra a cidade.

O trauma da guerra, segundo ele, só foi superado nas décadasfaz um sportingbet aí meme1950 e 1960 com a expansão das lavourasfaz um sportingbet aí memepimenta-do-reino.

Foi quando as famílias puderam construir casas maiores, comprar caminhões e abrir comércios.

A riqueza atraiu para Tomé-Açu migrantesfaz um sportingbet aí memevários Estados. Hoje, japoneses e seus descendentes são uma pequena parcela da população localfaz um sportingbet aí meme67,5 mil habitantes.

Mas sinaisfaz um sportingbet aí memesua presença são notadosfaz um sportingbet aí memevários pontos, como no templo budistafaz um sportingbet aí memeTomé-Açu, nos vários restaurantes japoneses da cidade e nos túmulos com ideogramas no cemitério.

A maior marca que os japoneses deixaram no município, no entanto, fica emfaz um sportingbet aí memezona rural e ganhou até uma sigla: o Sistema Agroflorestalfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu (Safta).

'Mottainai'

Emfaz um sportingbet aí memevaranda perfumada pelo cacaufaz um sportingbet aí memefermentação, Michinori Konagano diz que, ao desenvolverem o sistema, as famílias nipo-brasileiras também resgataram técnicas agrícolas ancestrais japonesas que estavam sendo abandonadas.

Para fertilizar suas agroflorestas, várias famílias recorrem à liteira da mata, composta por folhas, galhos e frutosfaz um sportingbet aí memedecomposição. Outras usam palhafaz um sportingbet aí memearroz ou estercofaz um sportingbet aí memeanimais.

Os métodos eram comuns no Japão antes do advento da adubação química.

Como muitos agricultoresfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu também dispensam agrotóxicos, boa parte da produção da comunidade é orgânica.

Konagano diz que as técnicasfaz um sportingbet aí memeadubação se relacionam com a expressão japonesa "mottainai" (勿体無い), que significa literalmente "que desperdício" e costuma ser direcionada a crianças que deixam um último grãofaz um sportingbet aí memearroz no prato.

O conceito, no entanto, tem um sentido filosófico mais amplo e derivafaz um sportingbet aí memeantigas crenças budistas.

Em entrevista à BBCfaz um sportingbet aí meme2020, Tatsuo Nanai, diretorfaz um sportingbet aí memeuma ONG japonesa criada para divulgar a expressão, explica que o conceito "pode ser aplicado a tudofaz um sportingbet aí memenosso mundo físico" e supõe "que os objetos não existem isoladamente, mas estão conectados uns aos outros".

Konagano diz que um dos exemplos da aplicação do conceito emfaz um sportingbet aí memefazenda se dá na colheita do cacau.

Em vezfaz um sportingbet aí memelevar o fruto inteiro para o armazém onde suas amêndoas são processadas, funcionários abrem o cacau assim que ele é colhido.

As sementes são separadas, e as cascas, lançadas ao pé das árvores, ajudando a fertilizar o solo.

Também são usados na adubação da fazenda resíduosfaz um sportingbet aí memefrutos processados. Nada se desperdiça.

Modelofaz um sportingbet aí memeexpansão

Para Osvaldo Kato, pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, as agroflorestas geridas pelas famílias nipo-brasileirasfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu são o maior e mais bem-sucedido experimento econômico desse tipo no Brasil.

Naturalfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu e netofaz um sportingbet aí memejaponeses, Kato é agrônomo com doutoradofaz um sportingbet aí memeAgricultura Tropical pela Universidadefaz um sportingbet aí memeGöttingen, na Alemanha.

Na Embrapa desde 1979, ele tem se dedicado a pesquisar e difundir sistemas agroflorestais pelo Brasil.

Kato conta que, nos últimos anos, o método tem conquistado adeptosfaz um sportingbet aí memediferentes partes do país, assim comofaz um sportingbet aí memeoutras nações latino-americanas e africanas.

Ele lista, entre as vantagens econômicas do sistema, a diversificação das fontesfaz um sportingbet aí memereceita e a economia com insumos externos, como adubos e pesticidas.

Entre os benefícios ambientais, cita a capacidadefaz um sportingbet aí memerecuperar solos esgotados, a alta absorçãofaz um sportingbet aí memecarbono nas lavouras e maior biodiversidade.

Kato afirma que muitas comunidades tradicionais e indígenas praticam variações desse método desde tempos imemoriais - caso, aliás, dos ribeirinhos que inspiraram os japonesesfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu.

Mas Kato diz que, nesses casos, as comunidades costumam usar técnicas agrícolas para manejar florestas.

Já os japonesesfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu fazem o contrário. "Eles são agricultores e trouxeram a floresta para dentro da agricultura", diz.

Um exemplo dessa distinção é visual: nas agroflorestasfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu, os canteiros são plantadosfaz um sportingbet aí memelinhas retas, e as plantas são posicionadas conforme padrões regulares.

Já nas agroflorestasfaz um sportingbet aí memeindígenas e ribeirinhos, roça e mata se misturam, e as intervenções humanas se destacam menos na paisagem.

Segundo o pesquisador, outro ponto que distingue Tomé-Açufaz um sportingbet aí memeoutras experiênciasfaz um sportingbet aí memeagrofloresta é a preponderância do fator econômico.

"Eles diversificaram a produção como estratégia econômica. Os ganhos ambientais foram uma consequência", afirma.

Para ele, há um grande potencialfaz um sportingbet aí memeexpansão desses métodos, principalmente entre agricultores familiares.

Os principais entraves, segundo ele, são tecnológicos: como ainda não há muitas máquinas adequadas a esse sistema, boa parte do trabalho temfaz um sportingbet aí memeser manual.

Outro desafio é replicar o sistema cooperativistafaz um sportingbet aí memeTomé-Açu, que, segundo Kato, também foi fundamental para o sucesso da colônia.

A Cooperativa Agrícola Mistafaz um sportingbet aí memeTomé-Açu (CAMTA) hoje tem 172 cooperados e outros 1,8 mil agricultores familiares cadastrados como fornecedores.

A cooperativa difunde as melhores práticas entre seus membros e mantém uma agroindústria, construída com um financiamento do governo japonês, para processar e embalar alimentos.

Há ainda obstáculosfaz um sportingbet aí memeordem fundiária. Os japonesesfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu receberam terras do governo e detêm os títulos das áreas, o que lhes dá segurança e permite que peguem empréstimosfaz um sportingbet aí memebancos.

Muitas outras comunidadesfaz um sportingbet aí memeagricultores no Brasil, no entanto, vivem cenário distinto: não receberam terras, não têm os títulos das áreas onde moram e enfrentam dificuldades para receber financiamentos e assistência técnica.

Desafios na sucessão

Mas, se há barreiras à expansão do modelofaz um sportingbet aí memeTomé-Açu para outras regiões, a continuidade dos trabalhos nas fazendasfaz um sportingbet aí memefamílias nipo-brasileiras também enfrenta desafios.

Muitos filhos dos agricultores concluem os estudosfaz um sportingbet aí memeBelém e não voltam para Tomé-Açu.

Outros cursam faculdadesfaz um sportingbet aí memeoutras áreas, e há ainda os que resolvem migrar para o Japão, no caminho contrário ao dos antepassados.

É o casofaz um sportingbet aí memeJenifer Mineshita Miyagawa,faz um sportingbet aí meme26 anos. Nascidafaz um sportingbet aí memeTomé-Açu, ela se formoufaz um sportingbet aí memeBiomedicina e planeja passar alguns anos trabalhando no Japão para juntar algum dinheiro.

Ela não tem qualquer interessefaz um sportingbet aí memeassumir a fazenda da família, adepta do sistema agroflorestal.

Seu pai, o agricultor Tamó Mineshita, diz torcer para que algumfaz um sportingbet aí memeseus outros três filhos assuma a propriedade.

"Se não tiver sucessão, não tem jeito: é vender, arrumar outra profissão e ajudar os filhos naquilo que decidirem", afirma.

Mas se as novas gerações nipo-brasileirasfaz um sportingbet aí memeTomé-Açu não quiserem seguir os passosfaz um sportingbet aí memepais e avós, a experiência da comunidade pode se perder? Quem cuidará do legado da colônia?

Michinori Konagano aponta possíveis saídas.

"Vejo uma imensidãofaz um sportingbet aí memegente necessitandofaz um sportingbet aí memecomida. Por que não passar nosso conhecimento para todo mundo? Independentefaz um sportingbet aí memeser da colônia japonesa ou não", defende.

O agricultor tem posto a ideiafaz um sportingbet aí memeprática. Konagano diz já ter recebido centenasfaz um sportingbet aí memepesquisadores e agricultores interessadosfaz um sportingbet aí memereplicar seus métodos, e também viaja com frequência para dar palestras e oficinas.

Assim, ele espera que a sobrevivência do modelo criado pela comunidade não dependafaz um sportingbet aí memeseus descendentes.

"Eu tenho esse olho puxado, mas me sinto mais brasileiro do que japonês."