ControvérsiaLula com Israel ameaça ofuscar plano do Brasil para o G20?:
Essas reações ganharam destaque na imprensa internacional,um dos momentos mais estratégicos deste ano para o governo brasileiro.
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Esta é a primeira vez que o Brasil ocupa a presidência rotativa do G20, grupo que reúne as 19 maiores economias do mundo, além da União Europeia e da União Africana.
O encontro desta quarta e quinta-feira (21/2 e 22/2), na Marina da Glória, reúne os chefes da diplomacia do grupo, entre eles o SecretárioEstado americano, Antony Blinken, emprimeira visita ao Brasil, e o ministroRelações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov.
Os ministros vão discutir os pontos que estarão na agenda oficial da CúpulaLíderes do G20, marcada para 18 e 19novembro, também no RioJaneiro.
Com a presença dos chefesgoverno e Estado, a reunião da cúpula é considerada o principal evento diplomático do Brasil2024.
"O fatoo Brasil sediar não só a cúpula,novembro, mas as reuniões preparatórias ao longo do ano, é uma oportunidade excelente para o presidente Lula relançar o Brasil como um paísliderança global,destaque internacional", diz à BBC News Brasil o cientista político Maurício Santoro, colaborador do CentroEstudos Político-Estratégicos da Marinha do Brasil.
"Depoisalguns anosostracismo, dos conflitos do governo Bolsonaro, o Brasil estariavolta agora a um papel mais ativo na agenda internacional", ressalta Santoro.
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No entanto, a controvérsia com Israel pode roubar a atenção das prioridades da presidência brasileira do G20, que incluem reformas na governança internacional, a inclusãopaíses africanos no grupo, o combate à fome e às mudanças climáticas e o "protecionismo verde", termo que descreve o uso da agenda da sustentabilidade por certos países para promover interesses protecionistas.
"Já afetou negativamente outras agendas globais do governo", avalia Santoro.
"As declarações foram dadas durante a viagem do presidente à África, uma viagem importante também para esse relançamento da política externa africana do Brasil,trazer a União Africana para o G20."
"Esses deveriam ter sido os grandes temasdiscussão", afirma Santoro. "Mas o presidente cometeu um erro ao transformar essa viagem no centrouma controvérsia sobre Israel, Gaza e o Holocausto", opina.
O analista Carlos Gustavo Poggio, especialistarelações Brasil-EUA e professorRelações Internacionais do Berea College, no Estado americano do Kentucky, ressalta que a presidência do G20 tem uma importância simbólica e representa um palco relevante para o Brasil.
"No longo prazo, não creio que (a presidência) deve ter muita repercussão. Mas certamente é um momento importante, inclusive para trazer dividendos doméstico para Lula, para se apresentar como líder", diz Poggio à BBC News Brasil.
Gaza
As guerras entre Israel e Hamas e entre a Rússia e a Ucrânia devem ser discutidas pelos ministros no encontro desta semana.
Esses conflitos também estiveram na agenda da reuniãoLula com o secretárioEstado americano, nesta quarta-feira,Brasília.
Em nota divulgada após o encontro, o Palácio do Planalto afirmou que "o secretário agradeceu a atuação do Brasil pelo diálogo entre Venezuela e a Guiana. O presidente Lula reafirmou seu desejo pela paz e fim dos conflitos na Ucrânia e na FaixaGaza. Ambos concordaram com a necessidadecriaçãoum Estado Palestino".
Segundo Poggio, as declaraçõesLula "têm uma repercussão doméstica bastante forte, e uma repercussão internacional importante".
No entanto, o analista lembra que, mesmo entre os países do G20, "a condenação ao que Lula disse não é unânime".
"Há países (no G20) que têm adotado postura bastante antagônica com Israel, como a África do Sul", salienta Poggio.
Israel não faz parte do G20, mas membros do grupo estão entre seus aliados, como Estados Unidos, França, Reino Unido e Alemanha. Até o momento, porém, não houve reação oficialoutros governos, alémIsrael, às declaraçõesLula.
O conflitoGaza foi iniciado depois que o Hamas atacou Israel7outubro do ano passado. Segundo o governoIsrael, o ataque deixou mais1,2 mil israelenses mortos, e cerca240 foram levados como reféns.
A retaliação israelense já deixou mais29 mil palestinos mortos, e mais1 milhãopessoas foram obrigadas a deixar suas casas, segundo as autoridadesGaza.
Lula condenou o ataque do Hamas a Israel. Também buscou cessar-fogo, mas as propostas foram vetadas pelos Estados Unidos no ConselhoSegurança da ONU.
À medida que a violência aumentou, porém, o presidente brasileiro endureceu suas críticas à retaliação israelense. No mês passado, o Brasil se uniu a uma iniciativa da África do Sul para denunciar Israel por genocídio junto à Corte InternacionalJustiça.
No encontro na Etiópia, Lula manifestou preocupação com a crise humanitária e disse que países ricos deveriam aumentar a ajuda a Gaza.
"O que está acontecendo na Faixa Gaza e com o povo palestino não existenenhum outro momento histórico. Aliás, existiu: quando Hitler resolveu matar os judeus", disse o presidente,entrevista a jornalistas.
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, disse que, com a comparação, Lula "desrespeitou a memória6 milhõesjudeus mortos pelos nazistas" e agiu como "antissemita".
Para Santoro, a atual controvérsia reflete um "lado mais estrutural dos problemas que o presidente Lula tem enfrentado no seu novo mandato". Santoro afirma que há uma divisão grande na política global entre países desenvolvidos edesenvolvimento.
"E as duas grandes linhasfissura são exatamente a guerra na Ucrânia e a GuerraGaza", observa.
"O Brasil optou por posições muito alinhadas ao Sul Global,defender uma agenda muito voltada para os paísesdesenvolvimento e muitas vezes entrandoconflitos com Estados Unidos, União Europeia, Japão."
Santoro considera esses conflitos muitas vezes "gratuitos". "Não envolvem efetivamente algum grande interesse nacional brasileiro", diz.
Ele cita como exemplo falasLula dizendo que o presidente russo, Vladimir Putin, seria bem-vindo no Brasil apesarhaver uma ordemprisão internacional contra ele.
"Há um ruído entre o que são as posições trabalhadas pelos diplomatas profissionais do Brasil, pelo que são, por exemplo, os votos brasileiros na ONU, e o que são as declarações individuais do presidente Lula", afirma.
Santoro salienta que o Brasil vem tendo posições muito consistentes, ao criticar tanto o governoIsrael quanto condenar os atentados do Hamas, ainda que tenha optado por não classificar o Hamas como um grupo terrorista, seguindo a faltaconsenso na ONU sobre o tema.
"São posições muito mais moderadas, muito mais cuidadosas, do que aquelas que o presidente Lula tem expressadosuas declarações maisimproviso."