'A selva não era a ameaça, a selva os salvou': como sobreviveram as 4 crianças que passaram 40 dias na Amazônia colombiana:bets bola fazer aposta

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Os menores foram protegidos pela natureza, diz professor

A mídia colombiana falabets bola fazer apostaum "milagre",bets bola fazer apostaum "resgate" e do "heroísmo" do exército. Mas para Alex Rufino, indígena Ticuna especialistabets bola fazer apostacuidados da selva, essa linguagem manifesta um desconhecimento do mundo indígena.

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Mais do que perdidas, diz ele, as crianças estavambets bola fazer apostaseu ambiente, sob os cuidados da selva e da sabedoriabets bola fazer apostaanosbets bola fazer apostapopulações indígenasbets bola fazer apostacontato com a natureza.

O fotógrafo e professor universitário afirma que as crianças estiveram vulneráveis durante esses 40 dias: o alimento é escasso e a relação com os animais pode ser tão complementar como fatal.

Mas eles também estavambets bola fazer apostasintonia com a natureza, diz ele. "Protegido pela Selva"

Logo após dar uma aula para crianças sobre a Amazônia, Rufino conversou por telefone neste sábado com a BBC News Mundo (serviçobets bola fazer apostaespanhol da BBC) sobre a forma como enxerga esse caso.

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Legenda da foto, As crianças apresentavam sinaisbets bola fazer apostadesnutrição. Eles foram levados para um hospital para tratamento médico
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bets bola fazer aposta BBC News Mundo - Como as crianças conseguiram sobreviver na selva?

bets bola fazer aposta Alex Rufino - As crianças intuitivamente aprendem muito com seus pais. Quando vão caçar, para colher frutas. Sua observação é essencial. Eles estão aprendendo o que pode ser útil para eles e o que não é.

Às vezes, eles ficam doentes por tentarem coisas que não deveriam, mas é aí que estão os irmãos mais velhos, ajudando-os a descobrir o que é prejudicial.

Cada árvore, cada planta, cada animal indica onde estamos, o que está disponível e quais são as ameaças. E as crianças sabem interpretar isso.

Além do aprendizado, eles se ajudam com os animais. Por exemplo, os macacos, que por se alimentarembets bola fazer apostamaneira semelhante a nós, com muitas frutas doces, servembets bola fazer apostaguia. Há uma convivência entre nós e eles, que, por estarem nas árvores, jogam comida no chão. O desafio é se adaptar ao seu movimento, que é rápido.

Não se tratabets bola fazer apostaimitá-los, masbets bola fazer apostaseguir e observar seus passos para encontrar comida. A quebrabets bola fazer apostaum galho, por exemplo, é uma indicação do caminho a seguir. Seu som e seu passo dão alertas dos animais (de onça,bets bola fazer apostajibóia).

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Legenda da foto, Professor indígena afirma que as crianças correm maior perigo fora da selva, diante do julgamento da população que desconhece a visãobets bola fazer apostamundo dos povos originários da Colômbia

Nessa relação com o macaco podemos nos camuflar e nos proteger.

Os militares disseram que parte da dificuldadebets bola fazer apostaencontrá-las era que as crianças estavambets bola fazer apostamovimento. Por que elas fizeram isso?

Porque quem está na selva não pode ficar parado. Por instinto, você se move.

Porque na selva não esperamos sair, mas sim encontrar comida e coisas que nos permitam passar melhor a noite.

bets bola fazer aposta BBC News Mundo - Como você descreveria a selvabets bola fazer apostaque eles estavam?

bets bola fazer aposta Rufino - É uma selva muito escura, muito densa, onde estão as maiores árvores da região. É uma área que não foi explorada. As populações são pequenas e ficam próximas ao rio, não na selva.

Há frio, insetos, umidade.

É perigoso, porque é o corredor da onça, da sucuri, da cobra verrugosa, uma das maiores cobras venenosas da América.

Mas não vemos isso pelo medo ou perigo, mas pelo respeito. Cada centímetro da selva tem uma espiritualidade que você não pode invadir. Qualquer movimento implica um diálogo com o xamã, com o espaço. Caso contrário, isso pode afetarbets bola fazer apostasaúde ou segurança.

Cada coisa, cada árvore, é um ser que pode ensinar, um elo que pode dar remédio e comida e águabets bola fazer apostatroca. Por exemplo, as árvores têm a funçãobets bola fazer apostaproteger enquanto você dorme: elas são o grande ancestral, o grande protetor. Elas te dão abrigo, elas te abraçam.

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Legenda da foto, Rufino afirma que usar a palavra "milagre" para descrever o aparecimento das crianças, como fizeram a mídia e os governantes, é adotar uma narrativa da época colonial para olhar a população indígena

bets bola fazer aposta BBC News Mundo - Que técnicas as crianças podem ter usado para sobreviver na selva?

bets bola fazer aposta Rufino - Certamente encontraram muitas folhas úmidas e pequenos riachos, que não são necessariamente potáveis.

Mas há folhas que purificam a água, mas outras que são venenosas. Você tem que pegá-lasbets bola fazer apostauma certa maneira, lavá-lasbets bola fazer apostauma certa maneira e depoisbets bola fazer apostaum tempo usá-las para coletar água.

Também podem usar técnicas para limpar o corpo com folhas que servem para que mosquitos ou insetos não ataquem com tanta força.

Certamente, as crianças encontraram um pequeno arbusto que permite limpar os pés para evitar que as cobras as vissem ou as mordessem. Nessa idade, 14 anos, você já tem esse tipobets bola fazer apostasabedoria clara.

Eles podem ter comido algum tipobets bola fazer apostaminhoca. Desde uma formiga até um pássaro é comida. O que a onça deixa para trás é outra opção.

E, acimabets bola fazer apostatudo, acho que comiam frutas, como algumas sementes vermelhas e doces que abundam nesta época. Isso ajuda a não desidratar e dá energia. Há também pós que servem da mesma forma, como um substituto que dá calorias, que aquece o corpo.

Na selva você não percebe que está perdendo peso: sempre tem a ideiabets bola fazer apostaque está bem. Somente quando você conhece pessoasbets bola fazer apostafora é que percebe que era vulnerável. Você nunca pensa que vai morrer: você se concentrabets bola fazer apostaseguirbets bola fazer apostafrente.

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Legenda da foto, Aos 14 anos, idadebets bola fazer apostaum dos menores, já se tem conhecimento suficiente para sobreviver na selva, avalia Rufino

bets bola fazer aposta BBC News Mundo - Quão comum é um grupobets bola fazer apostaindígenas estar nessa situação na selva?

bets bola fazer aposta Rufino - É comum, sim, até a cada 10 diasbets bola fazer apostamédia um certo númerobets bola fazer apostapessoas ficarem à deriva, porque vão à procurabets bola fazer apostafrutas ou caça.

Não é que eles se percam, porque estãobets bola fazer apostaseu ambiente, mas estão à deriva, sem saber quando vão voltar ao seu abrigo. E isso é porque você não conhece o caminho, ou porque os donos daquele espaço, os espíritos da selva, decidiram que não é horabets bola fazer apostavoltar.

E essa é a perda mais complexa, porque se você for retirado à força da selva, os espíritos podem aparecerbets bola fazer apostaoutras formas. Sua vida ebets bola fazer apostasaída dependem da instância do processo que você está vivendo com a selva. Sair nem sempre é a coisa certa a fazer.

Se essas crianças se perderam porque os espíritos as quiseram, e não passaram por um processo com o xamã, e se não recebem o tratamento quebets bola fazer apostacultura exige, ainda correm perigo.

bets bola fazer aposta BBC News Mundo - O que você acha da narrativa segundo a qual isso foi um milagre?

bets bola fazer aposta Rufino - Os territórios indígenas sempre foram vistos com uma narrativa herdada da conquista, da religião católica, porém não falamosbets bola fazer apostamilagres, mas da ligação espiritual com a natureza.

É a palavra que vende, mas eu falaria mais do abraço da mãe que é a selva, da mãe que cuidabets bola fazer apostavocê.

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Legenda da foto, Integrante da comunidade indígena Taita na base aérea militar na Colômbia, no diabets bola fazer apostaque foram resgatados os menores perdidos na selva

É difícil entender isso, eu sei, mas é uma boa oportunidade para a sociedade, o ser humano, conhecer as diferentes visõesbets bola fazer apostamundo que existem nos territórios.

Mais que um milagre, é preciso entender que na selva existem seres que protegem, que acompanham. A selva não é só verde, mas também energias milenares com as quais as populações se relacionam, aprendem e se ajudam.

As crianças nunca esquecerão o aprendizado desses 40 dias. Eles são a face visível do que é ser criança na selva. Sem a queda do avião, ninguém olharia para como as crianças vivem na selva, como se relacionam com ela, como morrem ou sobrevivem dependendo do processo que estão vivenciando.

A mesma mãe, que virou espírito após o acidente, os protegeu. E só agora vai começar a descansar.

bets bola fazer aposta BBC News Mundo - E o que você acha da ideiabets bola fazer apostaque as crianças estavam desaparecidas?

bets bola fazer aposta Rufino - Bem, elas estavam perdidas no sentidobets bola fazer apostaque não encontraram seu lugar, onde estábets bola fazer apostafamília. Mas não, as crianças estavam perdidas, porque estavambets bola fazer apostaseu ambiente, que conhecem e sabem conduzir.

Falar que elas estavam perdidas é supor erroneamente que estavambets bola fazer apostauma selva descuidada,bets bola fazer apostauma suposta tragédia, mas para nós não é assim: elas estavambets bola fazer apostaseu ambiente,bets bola fazer apostaseu lugar.

Por exemplo, a chuva: você pode pensar que isso os afeta, mas na realidade os protege, os banha, os limpa. E ainda: a chuva impedebets bola fazer apostaencontrá-los, porque encontrá-los é,bets bola fazer apostaalguma forma, quebrar o curso natural da selva.

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Legenda da foto, Fidencio Valencia, avô dos sobreviventes do acidente, agradeceu as orações e apoio no processobets bola fazer apostabusca

bets bola fazer aposta BBC News Mundo - Você acha que na leiturabets bola fazer apostatodo esse caso há uma certa incompreensão sobre os indígenas?

bets bola fazer aposta Rufino - Completamente. Desde a própria narrativa do milagre, a ignorância é evidente. Porque além do imediatismo, você tem que entender como o território funciona. Os próprios avós falaram dos duendes que poderiam ajudar.

Fala-se mais do exército, das instituições, dos heróis que supostamente os salvaram. Mas, na realidade, para nós, a selva não era a ameaça: foi a própria selva que os salvou.

Desejo que as crianças tenham a dignidade que merecem, o respeito pelo seu território e pelabets bola fazer apostacultura. Este é um território muito atingido por grupos armados, mineração, etc., e esperamos que essas crianças estejam bem.

Não devemos pressioná-las a nos contar o que aconteceu com elas.

bets bola fazer aposta BBC News Mundo - Você acredita que as crianças ainda seguembets bola fazer apostaperigo?

bets bola fazer aposta Rufino - Claro. Além do mais, acho que elas correm mais perigo agora do que quando estavam na selva. Porque estãobets bola fazer apostafora, por causa da mídia, por causa do próprio olhar da sociedade que julga, que falabets bola fazer apostamilagres, que os pressiona a ser algo que não são, a receber tratamentos que talvez não precisem.

É fundamental que se respeite o curso natural que a selva destinou para eles.