'Não olhe nos olhos deles': como foi minha visita à megaprisãoaposta betsulBukele, símbolo da guerra contra facçõesaposta betsulEl Salvador:aposta betsul

Mas essa é ao mesmo tempo uma das principais razões para a enorme popularidadeaposta betsulBukele numa nação que foi abalada por notórias gangues — Mara Salvatrucha, Barrio 18, Los Revolucionarios e Los Sureños.

"Aqui estão os psicopatas, os terroristas, os assassinos que enlutaram o nosso país", anuncia o diretor do centro, que não quer ser identificado, mas se deixa filmar.

Ele será nosso guia durante a visita cuidadosamente calculada às celas.

"Não olhe nos olhos deles", ele nos avisa.

É madrugada, mas não importa: as luzes artificiais nunca se apagam. Uma rajadaaposta betsulvento passa através do tetoaposta betsultreliça, proporcionando uma breve pausa no calor. As celas podem atingir 35ºC durante o dia e não possuem outra fonteaposta betsulventilação.

A cadeia é chamadaaposta betsula "Alcatraz da América Central",aposta betsulreferência à prisãoaposta betsulsegurança máxima dos EUA que funcionou entre 1934 e 1963aposta betsuluma ilhota.

Mas a prisãoaposta betsulEl Salvador não aparenta nada degradada: tudo é novo e pintado recentemente.

Guardas encapuzados vigiamaposta betsulcima, com grandes armas na mão.

Abaixo, os presos sobem nos belichesaposta betsulquatro andares onde dormem; sem colchão ou lençol, deitam-se sobre o metal e comem com as mãos arroz e feijão, ovos cozidos ou macarrão.

"Qualquer utensílio pode ser uma arma mortal", justifica o diretor.

Não há mais nada entre as três paredesaposta betsulcimento, exceto duas pias para lavar as mãos e dois vasos sanitários para usar à vistaaposta betsultodos.

E não há mais nada a fazer senão ver o tempo passar.

Os reclusos só podem sair das celas durante 30 minutos ao dia, para fazerem exercício — utilizando apenas o peso do próprio corpo — no corredor central do bloco 3, que nós, jornalistas, estamos visitando.

Existem outras sete unidades como esta — prisões independentes dentro do enorme complexo que cobre o equivalente a sete estádiosaposta betsulfutebol, cercado por duas cercas eletrificadas e dois murosaposta betsulconcreto armado, e guardado por 19 torres.

Não está claro se os prisioneirosaposta betsulCecot foram detidos recentemente ou transferidosaposta betsuloutras prisões, ou exatamente por que foram selecionados para esta unidade.

Ou mesmo quantos presos realmente estão ali na prisão que, segundo o governo, pode acomodar até 40 mil pessoas.

Apesaraposta betsulmesesaposta betsulpesquisa, a BBC ainda não tem uma resposta para essas perguntas.

Questionamos o diretor, que responde: "Não podemos fornecer essa informação".

"Qual é a capacidade máximaaposta betsulcada cela?", nós insistimos.

"Onde cabem 10 pessoas, cabem 20", diz o diretor.

Por trásaposta betsulsua máscara anti-covid, vejo um sorriso.

Direitos humanos

Desde aaposta betsulinauguração,aposta betsul31aposta betsuljaneiroaposta betsul2023, a BBC solicitou frequentemente acesso à megaprisão.

O convite chegou finalmente no dia 6aposta betsulfevereiro atravésaposta betsuluma mensagem no WhatsApp do assessoraposta betsulimprensa internacional da presidência: "Iremos esta noite ao Cecot".

O pontoaposta betsulencontro e o horário nos foram informados apenas meia hora antes da hora marcada para a partida.

Dois dias haviam se passado desde que Bukele se declarou reeleito com 85% dos votos, alegando que seu partido havia conquistado quase todas as cadeiras na Assembleia Legislativa antes mesmoaposta betsulos cartórios contarem os votos.

"Esta seria a primeira vez que existiria apenas um partido num país com um sistema totalmente democrático. Toda a oposição foi pulverizada. El Salvador voltou a fazer história neste dia", comemorou Bukele da varanda do Palácio Nacional na tarde do dia das eleições.

No entanto, enquanto escrevo isto — cinco dias após as eleições —, El Salvador ainda não sabe os resultados finais devido a inúmeras falhas no sistemaaposta betsulcontagemaposta betsulvotos e a dúvidas sobre como os boletinsaposta betsulvoto foram administrados.

Ninguém questiona a vitória presidencialaposta betsulBukele; a atenção tem se voltado à disputa pelos 60 assentos na Assembleia Legislativa, cujo controle é crucial para o programaaposta betsulBukele.

Ao proclamar a vitória, Bukele exaltou conquistas do seu primeiro mandato na áreaaposta betsulsegurança e atacou os críticos dianteaposta betsuluma multidão entusiasmada na praça centralaposta betsulSan Salvador, a capital.

"Passamosaposta betsulpaís mais perigoso do mundo a país mais seguroaposta betsultodo o Hemisfério Ocidental, o país mais seguroaposta betsultodo o continente americano, e o que dizem? É uma violação dos direitos humanos'", disse.

"De quem são os direitos humanos? Não das pessoas honestas. Talvez tenhamos priorizado os direitos das pessoas honestasaposta betsuldetrimento dos direitos dos criminosos, foi tudo o que fizemos", continuou.

A visita que vários repórteresaposta betsulveículos da imprensa internacional realizariam dois dias depois poderia ser considerada uma continuação deste argumento.

Nosso destino foi a prisão que é símbolo da políticaaposta betsulsegurançaaposta betsulBukele e do "estadoaposta betsulexceção" — uma medida justificada como emergencial que concede poderes draconianos à polícia e aos militares — que estáaposta betsulvigor há dois anos.

Cercaaposta betsul70 mil pessoas foram detidas sob esta medida; El Salvador tem hoje a maior taxaaposta betsulencarceramento do mundo.

Organizações salvadorenhas e internacionaisaposta betsuldireitos humanos afirmam que muitos milharesaposta betsuldetentos não têm qualquer ligação evidente com crimesaposta betsulgangues.

Outros foram forçados a colaborar com as gangues, seja como vigias ou para esconder armas ou drogas para elas, por medoaposta betsulconsequências caso se recusassem a fazer isso.

A Cristosal, a principal organizaçãoaposta betsuldireitos humanos no país centro-americano, documentou casosaposta betsultortura e maisaposta betsul150 mortes sob custódia do Estado durante o "estadoaposta betsulexceção".

Num relatório publicadoaposta betsuldezembro, a Anistia Internacional criticou a "substituição gradual da violência das gangues pela violência estatal".

Nenhuma instituição externa ou ONG visita a prisão, diz-nos o diretor, que no entanto garante que a cadeia cumpre os padrões internacionais.

Segurança a qualquer custo

Depoisaposta betsulpassarmos pela segurança — revistas, perguntas sobre tatuagens e uma máquinaaposta betsulraio X que expõe até os intestinosaposta betsuluma tela —, somos levados a conhecer alguns prisioneiros.

O diretor queria que ficássemos cara a cara com os "inimigos".

Os guardas tiram cinco indivíduos pré-selecionadosaposta betsulsuas celas, mas não antesaposta betsulcolocarem algemasaposta betsulseus pulsos e tornozelos. Agachados e subjugados, eles ficamaposta betsulfrente para a parede.

Eles não têm permissão para conversar.

"Venha aqui. Vire-se, por favor. Tire a camisa."

O diretor nos apresenta o primeiro preso: Miguel Antonio Díaz Saravia, vulgo "Castor" e "assassino da [gangue] Mara Salvatrucha", nos dizem.

Em 2022, ele foi condenado a 269 anosaposta betsulprisão por raptar, torturar e assassinar, junto com outros membrosaposta betsulgangues, quatro soldadosaposta betsuloutubroaposta betsul2016.

Marvin Mario Parada, condenado pelo feminicídioaposta betsulAlison Renderosaposta betsul2012, uma estudanteaposta betsul16 anos e lutadoraaposta betsulestilo livre, também tem que nos mostrar seu torso tatuado.

"Lembro-meaposta betsulquando encontraram seu corpo desmembradoaposta betsulum canal láaposta betsulSan Vicente", me conta mais tarde um fotógrafo salvadorenho que está sentado ao meu ladoaposta betsulnossa volta à capital.

"Tive que cobrir a exumação e vi os legistas colocando os pedaços na mesa", continua a conversa macabra.

A próxima horaaposta betsulestrada torna-se uma revisãoaposta betsulhistóriasaposta betsulhorror eaposta betsulcrimes terríveis das gangues, como aqueleaposta betsulque 17 passageirosaposta betsulum micro-ônibus foram queimados vivosaposta betsul2010.

"Também passei anos sem poder visitar o meu tio, que morava no mesmo bairro", continua o fotógrafo, referindo-se às fronteiras invisíveis que durante décadas dividiram o mapa entre gangues rivais.

"Se você fosse lá, não voltaria."

Nos dias que antecederam as eleiçõesaposta betsul4aposta betsulfevereiro, eu ouvi histórias semelhantes nas feirasaposta betsulrua, nos bairros pobres, nos hotéis e nas praias.

Também escutei vários comentáriosaposta betsulapoio ao estadoaposta betsulexceção, o que indicava aquilo todas as sondagens previam: uma vitória iminenteaposta betsulBukele na votação.

Depoisaposta betsulviver por décadas com a extorsão à porta e a violência na próxima esquina, a maioria dos salvadorenhos com quem falei pareciam dispostos a pagar o preçoaposta betsulBukele pela segurança.