'A guerra levou tudo o que construímos': brasileira relata fuga desesperada no Líbano com filhos e mãe idosa:pix futebol
"Eu queria que meus filhos vivessem o que vivi. Conhecessem a cultura libanesa, aprendessem árabe e se conectassem às nossas origens", conta Jussara.
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No entanto, seus planos mudaram radicalmente com o aumento dos confrontos entre o grupo libanês Hezbollah e Israel desde a última segunda-feira (23/9).
Naquele dia, seu marido retornou ao Brasil, antes do início dos bombardeios mais intensos, enquanto Jussara permaneceu no Líbano com os filhos pequenos, uma meninapix futebolnove anos e um meninopix futeboldez anos, e a mãe idosa.
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Assim que os ataques aéreos israelenses se intensificaram, a vidapix futebolJussara se transformoupix futeboluma rotinapix futebolmedo e incerteza.
Ela conta que as bombas passaram a cair muito próximas àpix futebolcasa, na cidadepix futebolNabatia, no sul do Líbano, e cada novo ataque trazia o desesperopix futebolestar no meio do conflito.
"Eu via as explosões pelas janelas. O medo tomava conta, e eu sabia que precisava fazer algo para proteger meus filhos e minha mãe", relata.
A decisãopix futebolfugir se tornou inevitável quando, certa noite, o perigo estava mais próximo do que nunca. Jussara arrumou as malas às pressas e tentou sair da cidadepix futeboldireção à capital, Beirute.
"As ruas estavam tomadas por pessoas tentando escapar. Ficamos presos no trânsito enquanto as bombas explodiam. Vi uma criançapix futebol11 anos morrer dentropix futeboluma ambulância porque não conseguiram chegar ao hospital", recorda com a voz embargada.
"O choro da mãe daquela criança é algo que nunca vou esquecer."
Após uma longa e arriscada jornada que durou 13 horaspix futebolvez dos habituais 60 minutos, Jussara epix futebolfamília chegaram a Beirute, onde encontraram a cidade lotada e dominada pelo medo.
"Muitas pessoas estavam dormindo nas ruas porque não havia mais lugar. Eu consegui um quartopix futebolhotel, mas o medo não nos deixava", explica.
Em meio ao caos, ela tentou buscar ajuda do governo brasileiro, sem sucesso.
"Meus filhos são brasileiros, e mesmo assim não tivemos apoio para uma evacuação segura. Me senti completamente abandonada pelo meu próprio país. Cada bomba que cai faz você se perguntar se vai ver o próximo dia", desabafa.
Na segunda-feira, o Ministério das Relações Exteriores informou que um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) será enviado para resgatar brasileiros que estão no Líbano nos próximos dias. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou a repatriação dos cidadãos.
A operação, que está sendo coordenada pelo Itamaraty e pelo Ministério da Defesa, anunciará a data do voopix futebolbreve, após avaliar as condiçõespix futebolsegurança. O planejamento inicial da FAB prevê que o avião decole do aeroportopix futebolBeirute, que está aberto.
"A Embaixada no Líbano está tomando as providências necessárias para viabilizar a operação,pix futebolcontato permanente com a comunidade brasileira epix futebolestreita coordenação com as autoridades locais", diz a nota do Itamaraty.
A maior comunidadepix futebolbrasileiros no Oriente Médio atualmente está no Líbano. Ao todo, 21 mil brasileiros vivem no país.
'Futuro seguro no Brasil'
Jussara diz que, apesar das circunstâncias, não considera o Hezbollah ("Partidopix futebolDeus",pix futebolárabe), sediado no sul do Líbano e recebe financiamento do Irã, como uma organização terrorista, apesarpix futebolessa ser a classificação frequentemente atribuída por governos ocidentais.
Atualmente, muitos países, incluindo Israel, Estados árabes do Golfo e grandes potências como os Estados Unidos, o Reino Unido e a União Europeia, classificam o Hezbollah, que prega a destruição do Estadopix futebolIsrael, como organização terrorista. O Brasil não segue essa classificação.
O Hezbollah é acusado por diversos atentados, incluindo ataques suicidas, contra alvos israelenses, americanos epix futeboloutros países ocidentais especialmente no próprio Líbano epix futebolIsrael.
O grupo é acusado tambémpix futebolparticipaçãopix futebolações no exterior, como os ataques a bomba contra a embaixadapix futebolIsraelpix futebolBuenos Aires, que deixou 29 mortos,pix futebol1992, e contra uma organização comunitária judaica tambémpix futebolBuenos Aires,pix futebol1994, que matou 85 pessoas.
Para Jussara, o Hezbollah é um grupopix futebolresistência que sempre apoiou a população libanesa, principalmente as comunidades mais pobres e marginalizadas.
"Eu cresci no Líbano vendo o Hezbollah ajudar as pessoas, construindo escolas, hospitais e cuidando da nossa segurança. Eles não são terroristas, eles protegem a nossa terra. Sem eles, estaríamos completamente vulneráveis", afirma.
Ela reconhece que o conflito é extremamente complexo e doloroso, mas insiste que o Hezbollah faz parte da defesa do Líbano contra ameaças externas.
"As pessoas que vivem fora não entendem a importância deles aqui. Muitos acham que são apenas milicianos, mas a verdade é que eles estão aqui para proteger o país, especialmente do que consideramos ser agressões israelenses", diz.
"É fácil julgarpix futebolfora, mas para quem vive aqui, o Hezbollah faz parte da vida cotidiana. Eles oferecem suporte e proteção que muitas vezes o próprio governo libanês não consegue oferecer."
Com muito esforço, Jussara conseguiu passagens para sair do Líbano no próximo dia 22pix futeboloutubropix futebolum voo para a Turquia. No entanto, ela ainda não sabe se conseguirá partirpix futebollá rumo ao Brasil.
Até lá, ela permanecepix futebolBeirute, na esperançapix futebolquepix futebolfamília consiga deixar o país antes que a situação piore ainda mais.
Após o anúncio do governo brasileiro sobre a operaçãopix futebolresgate, a reportagem da BBC News Brasil voltou a contatar Jussara. Ela expressoupix futebolesperançapix futebolque "tudo dê certo".
"Eu tive que abandonar tudo: a casa, os investimentos, os sonhos. Tudo o que construímos no Líbano se foi com essa guerra. Só queremos viverpix futebolpaz."
Embora profundamente marcada pela violência e pelas perdas, Jussara também carrega um forte sentimentopix futebolfé.
"O povo libanês é cheiopix futebolfé, mesmopix futebolmeio ao sofrimento. Eu amo essa terra, mas hoje, como mãe, a segurança dos meus filhos está acimapix futeboltudo. Vou embora levando comigo as memórias da infância e a esperançapix futebolum futuro mais seguro no Brasil."
Enquanto aguarda ansiosamente a oportunidadepix futeboldeixar o Líbano, Jussara reflete sobre o impacto da guerra não apenas empix futebolvida, mas napix futeboltodas as famílias que lutam diariamente para sobreviver.
"O Líbano é um paíspix futebolpessoas fortes, mas não há como lutar contra as bombas. É doloroso deixar tudo para trás, mas quando se trata da vida dos nossos filhos, não há outra escolha."
Ela ainda sonhapix futebolretornar ao Líbano quando a situação estiver mais tranquila.
"Eu amo o Brasil e também o Líbano. Nunca enfrentei discriminação no Brasil por ser muçulmana. O povo brasileiro tem um grande respeito pelas religiões dos outros", afirma.
"Mas não sei como explicar, há algo na terra do Líbano que nos chama", acrescenta.
Incursão terrestre
Israel e Hezbollah parecem estar se aproximandopix futeboluma guerra total, após uma semanapix futebolescalada no conflito.
Israel começou bombardeiospix futebolBeirute e no sul do Líbano, e anunciou na segunda-feira (30/9) o iníciopix futebol"incursões terrestres limitadas" contra o Hezbollah.
Na semana passada, um ataque aéreopix futebolBeirute resultou na morte do líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah.
Israel alega que busca garantir o retorno seguro dos moradores deslocados nas áreaspix futebolfronteira, após quase um anopix futebolhostilidades relacionadas à guerrapix futebolGaza.
Embora o Hezbollah tenha sido enfraquecido, o grupo continua lançando foguetespix futeboldireção ao nortepix futebolIsrael e ainda possui um arsenal significativopix futebolmísseispix futebollongo alcance.
O ministério da Saúde do Líbano informou no sábado que os ataques israelenses mataram maispix futebol1.000 pessoas nas duas semanas anteriores, incluindo 87 crianças e 56 mulheres.
No domingo, os bombardeios israelenses continuaram, resultandopix futebolmais 100 mortes, enquanto o primeiro-ministro Najib Mikati alertou que até 1 milhãopix futebolpessoas — um quinto da população — podem ter abandonado suas casas.
As autoridades enfrentam dificuldades para oferecer assistência a todos, com abrigos e hospitais sob pressão.
Israel afirma que está atingindo locais do Hezbollah, incluindo depósitospix futebolarmas e munições, e acusou o grupopix futebolusar civis como escudos humanos.
Em um discurso na segunda-feira, o vice-líder do Hezbollah, Naim Qassam, descreveu os ataques atuaispix futebolfoguetes, drones e mísseis contra Israel como "o mínimo necessário" e afirmou que o grupo "sairá vitorioso" após uma ofensiva terrestre israelense.
O Hezbollah ainda conta com milharespix futebolcombatentes, muitos deles veteranos da guerra civil na Síria, alémpix futebolum arsenal substancialpix futebolmísseis, incluindo muitospix futebollongo alcance e guiados com precisão, capazespix futebolatingir Tel Aviv e outras cidades.
O que é o Hezbollah?
Hezbollah é um partido político xiita e um grupo armado com forte influência no Líbano, tanto no parlamento quanto no governo.
Controla a mais poderosa força militar do país. O grupo surgiu na décadapix futebol1980,pix futebolreação à ocupação israelense do sul do Líbano durante a guerra civil (1975-1990).
Com apoio militar e financeiro do Irã e alianças com a Síriapix futebolBashar al-Assad, o Hezbollah já realizou ataques letais contra forças israelenses e americanas.
Após a retirada das tropas israelenses do Líbanopix futebol2000, o Hezbollah assumiu o crédito pela vitória.
A guerrapix futebol2006 entre Hezbollah e Israel, desencadeada por um ataque do grupo, resultou na mortepix futebolcercapix futebolmil civis, mas o Hezbollah saiu fortalecido, expandindo suas capacidades militares.