Collor: 'impichado', inocentado e, agora, condenado a mais8 anosprisão:

Fernando CollorMello

Crédito, LiaMelo/Agência Senado

Legenda da foto, Ex-senador e ex-presidente Fernando CollorMello foi condenado a 8 anos e 10 mesesprisão pelos crimescorrupção passiva e lavagemdinheiro

Oito ministros votaram pela condenação e dois (Nunes Marques e Gilmar Mendes), pela absolvição.

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Além dos 8 anos e 10 mesesprisãoregime inicial fechado, Collor deverá pagar 90 dias-multa e dividir com os outros dois réus na ação o pagamentoindenização no valorR$ 20 milhões, por danos morais coletivos. Collor e Luis Amorim, um dos réus, também foram proibidosexercer cargos públicos pelo dobro do temposuas penas.

O ex-presidente foi quem teve a maior pena, proposta por AlexandreMoraes. O ministro argumentou que a culpabilidadeCollor foi maior por ele ter praticado crimes durante o mandato e por ter usadoinfluência política para obter benefícios particulares.

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Uma toneladacocaína, três brasileiros inocentes e a busca por um suspeito inglês

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Luis Amorim foi condeando a três anosreclusãoregime inicial aberto e Pedro Paulo, o terceiro réu no processo, a quatro anos e um mêsreclusãoregime inicial semiaberto.

Procurada antes da condenação, a defesaCollor negou qualquer irregularidade e sustentou que ele é inocente. Após a condenação, a defesa preferiu não comentar.

"O processo inteiro é baseado nos depoimentosdelatores e não há provas que os corroborem", defendeu Marcelo Bessa, um dos advogadosCollor no processo, no início do julgamento no STF.

"Em nenhum desses conjuntosfatos o Ministério Público fez prova suficiente ou capazgerar a mínima certeza com relação à culpabilidadeFernando Afonso CollorMello."

O julgamento, iniciado10maio no STF, é referente a uma denúncia apresentada2015 pela PGR.

Entre outras acusações, a PGR apontou que Collor, com a ajuda dos outros dois empresários condenados na ação, favoreceu a UTC Engenhariacontratos com a BR Distribuidora, recebendo para isso R$ 20 milhões.

Com seu poder político, Collor teria influenciado nas indicações à diretoria da BR Distribuidora e facilitado a negociaçãocontratos.

Fernando CollorMello

Crédito, Sergio Lima/Agência Brasil

Legenda da foto, PassagemCollor pela Presidência da República foi marcada por turbulências na economia e denúnciascorrupção

Boa parte das evidências do processo foram reveladas por delatores da Operação Lava Jato, como o doleiro Alberto Youssef, um dos primeiros a aderir à delação premiada durante as investigações.

De acordo com a vice-procuradora geral da República Lindôra Araújo, além dos relatos dos delatores, teriam sido colhidas provas como e-mails, extratos bancários e outros documentos que comprovariam as acusações.

Para o relator do caso no Supremo, ministro Luiz Edson Fachin, as provas colhidas pelo Ministério Público comprovaram que Collor exercia influência sobre o controle da BR Distribuidora e teria exercido seu poder para viabilizar os contratos com a UTC Engenharia.

Para Fachin, ficou também comprovado que houve lavagemdinheiro, através42 depósitos feitoscontas correntes do ex-presidente e 65contasempresas por ele controladas,forma a ocultar a movimentaçãoautoridades financeiras.

Gilmar Mendes e Nunes Marques, que votaram pela absolvição, argumentaram que não foram apresentadas provas suficientes contra os acusados, apenas depoimentos e documentos trazidos por delatores.

Caçadormarajás, 'impichado' e inocentado

Para além do julgamento no STF, Collor protagonizou uma carreira política das mais movimentadas e polêmicas desde a redemocratização do país, na década1980.

Ele é oriundouma das famílias mais tradicionais da políticaAlagoas, os CollorMello. A família tem empresas e emissorasrádio e televisão no Estado. Com esse prestígio, foi eleito governadorAlagoas1986.

E então, Collor foi eleito presidente1989, nas primeiras eleições diretas à Presidência da República após a ditadura militar (1964 -1985).

Emcampanha, fez forte oposição ao então presidente José Sarney (atualmente no MDB) e defendia o fimprivilégios às chamadas elites da burocracia brasileira.

Ao longo da disputa, ele ficaria conhecido como o "caçadormarajás",alusão a funcionários públicos com altos salários.

Collor venceu as eleiçõesum segundo turno apertado, disputado contra o hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Seu governo, no entanto, foi marcado por diversas turbulências. Na área econômica,equipe tentou debelar a hiperinflação que afetava o país na época, mas não obteve sucesso.

Uma das medidas mais controversas adotadas no período foi o confisco da poupançamilhõesbrasileiros e brasileiras,1990. A medida limitou a quantidadedinheiro que as famílias poderiam sacarsuas economias e pegou parte da populaçãosurpresa.

Ainda na área econômica, Collor deu início a um processoabertura do país a produtos importados, especialmenteáreas como a indústria automobilística.

Foi na área política, contudo, que o governoCollor sofreu os maiores reveses.

Nos primeiros mesessua gestão, surgiram os primeiros rumores sobre a atuação do tesoureirosua campanha à Presidência, o empresário Paulo César Farias, conhecido como PC Farias. À época, os rumores eramque o empresário teria pedido propina a empresáriostrocavantagenscontratos com o governo federal.

Em 1992, seu irmão, Pedro CollorMello, concede uma entrevista à Revista Veja e diz que PC Farias era, na verdade, uma espécie"testaferro"Collor. As suspeitas eramque despesas pessoaisCollor eram pagas com recursossobras da campanha1989. O então presidente negou as acusações.

As declarações deflagram uma crise política que resultauma Comissão ParlamentarInquérito (CPI) para investigar as relações entre o presidente e o seu ex-tesoureiro.

A crise se agravou e,setembro1992, foi instaurado um processoimpeachment contra Collor. No dia 29 daquele mês, ele foi afastado temporariamente do cargo.

O caso foi então à votação no Senado. Diante da possibilidadeter seu afastamento comprovado e ter seus direitos políticos cassados por oito anos, ele renuncia no dia 29dezembro. Apesar disso, o Senado aprova o impeachment e cassa seus direitos políticos.

Em 1994, apesar do impeachment, Collor foi absolvidoum processo criminal no STFque foi acusadoter tido suas contas pagas por corruptores. Na época, os ministros da Corte alegaram não terem encontrado provas suficientes sobre as acusações.

Collor e Bolsonaro

Crédito, Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Legenda da foto, Nos últimos anos, Collor se aproximou e se tornou um apoiador do agora ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)

Volta à política

Em 2002, Collor retornou à cena política. Disputou e perdeu as eleições para o governoAlagoas.

Quatro anos depois,2006, foi eleito senador, cargo para o qual foi reeleito2014.

Foi justamente a partir2014 que ele, assim como outros políticos do país, passaram a ser alvos da Operação Lava Jato. Ele foi alvomandadosbusca e apreensão cumpridos pela Polícia Federal no âmbito das investigações conduzidas pela operação.

A partir2018, Collor se aproximou e se tornou um grande apoiador do então candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PL).

Em 2022, já no fimseu mandato como senador, Collor disputou a eleição para o governoAlagoas, mas perdeu para Renan Filho (MDB), filho do senador Renan Calheiros — que chegou a ser ministro da Justiça do governoCollor, nos anos 1990.

Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil no início do julgamento avaliaram que o processo terá pouco impacto sobre seu legado.

"Apesarter sido o primeiro presidente da República após a redemocratização, o fatoele ter sido alvoum impeachment corroeu muito do capital político que ele poderia ter. Além disso, nos últimos anos, ele não se firmou como uma liderança regional representativa", disse o professorRelações Internacionais da Escola SuperiorPropaganda e Marketing Fabio Andrade, que também coordena o Legislab, uma entidade que pesquisa o funcionamento do Poder Legislativo no Brasil.

Para o professorCiência Política da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Marco Antonio Teixeira, ainda que Collor seja condenado, dificilmente a sentença contrária iria representar uma grande alteração no legado políticoCollor.

"Ele tem um passado maior do que qualquer novidadetermoseventual condenação. Ele renunciou à Presidência da República e ela não foi considerada e nada supera isso. Hoje, ele não tem cargo algum. Se for condenado, o impacto será pequeno", disse Teixeira.

Andrade destacou, porém, que uma condenação por um processo oriundo da Operação Lava Jato seria um fato inusitado.

"Nos últimos anos, a gente viu uma sériedecisões judiciais revertendo condenações ou mesmo invalidando processos que tiveram origem na Lava Jato. Seria um fato curioso ter um ex-presidente condenadoum processouma operação com um legado tão controverso", disse Andrade.

As controvérsiasrelação à Lava Jato se fortaleceram após 2019, quando foram divulgados os conteúdosconversas supostamente mantidas entre procuradores da República que atuava na operação e então juiz federal (atual senador) Sergio Moro.

Lideranças do PT eoutros partidosesquerda alegaram que as conversas revelavam uma espécieconluio entre os procuradores e o então juiz. Tanto os procuradores da Lava Jato quanto Moro negaram qualquer irregularidade.

Nos últimos anos, porém, uma sériedecisões reverteram condenações originadasprocessos da operação. A mais conhecida delas foi a decisão do STFanular as condenações contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após a avaliaçãoque ele deveria ter sido julgado por outras varas que não a vara federalCuritiba onde Moro atuou.

Para Fabio Andrade, a condenaçãoCollor teria, porém, um impacto negativo na cena política.

"Acho que uma possível condenação dele nesse caso, por ser um ex-presidente, reforçaria uma opinião negativa que a população brasileira já tem sobre a classe políticageral", avaliou.