Carbonara é 'mais americano que italiano': uma conversa com o historiador que causou 'revolta' na Itália:www vaidebet

Legenda da foto, Debates sobre molhos como o carbonara 'incendiaram' redes sociais recentemente

Afinal, quemwww vaidebetsã consciência, ousaria levantar dúvidas sobre a autenticidade da cozinha italiana, elevada à condição sacrossanta, e da qual praticamente todo cidadão se orgulha, um legítimo cartãowww vaidebetvisita a turistaswww vaidebettodo o mundo?

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Grandi disse, por exemplo, que a receitawww vaidebetcarbonara é americana e o queijo parmesão "com características originais" só pode ser encontrado no Estadowww vaidebetWisconsin, nos Estados Unidos.

Crédito, Arquivo pessoal/Alberto Grandi

Legenda da foto, Alberto Grandi é autor do livro "Denominaçãowww vaidebetOrigem Inventada. As mentiras do marketing sobre os produtos típicos italianos"

Isso poucos dias depoiswww vaidebeto governo italiano ter proposto a candidatura da culinária italiana ao patrimônio mundial da Unesco, o braço da ONU para educação e cultura.

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O contra-ataque, quase que naturalmente, veiowww vaidebettodos os lados.

A começar por Matteo Salvini, líder do partido nacionalista Liga e atual ministrowww vaidebetInfraestrutura, para quem o docente é um "especialista invejoso" que alimenta "jornais que tem inveja da excelência gastronômica italiana".

A Coldiretti, principal organizaçãowww vaidebetcultivadores agrícolas da Itália, classificou as afirmações do professor como "um ataque surreal aos pratos simbólicos da cozinha italiana".

Em entrevista à BBC News Brasil, Grandi afirma que a ideiawww vaidebetnomear a cozinha italiana para patrimônio da Unesco é "muito triste".

"Qual o motivo para isso? A cozinha italiana é como as outras, como a francesa, a chinesa, a brasileira. Cada uma tem awww vaidebetidentidade, awww vaidebethistória. Não há nenhuma razão estrutural para dizer que a nossa seja melhor. A cozinha italiana só é a melhor para quem gosta dela."

O processowww vaidebetavaliação da Unesco deve ser concluído até dezembrowww vaidebet2025.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Para Grandi, origem italiana do macarrão com molhowww vaidebettomate é falsa

Crisewww vaidebetidentidade

Para Grandi, o apego dos italianos à própria culinária é algo recente.

"A cozinha tornou-se um elementowww vaidebetidentidade para os italianos para alémwww vaidebetqualquer razoabilidade. Estou convencidowww vaidebetque a Itália está perdendowww vaidebetidentidade e apela àwww vaidebetgastronomia para ter um sensowww vaidebetnação. É por isso que as minhas declarações causam tanto clamor", diz.

"Na minha opinião, a cozinha italiana é muito boa, repletawww vaidebetreceitas riquíssimas,www vaidebetinteresse histórico ewww vaidebetprodutos extraordinários, mas é apenas uma opinião entre sete bilhõeswww vaidebetseres humanos."

"Muitas das especialidades culinárias que acreditamos ser antigas são na realidade invenções recentes. A origem arcaicawww vaidebetmuitas destas receitas são mentiras, narrações publicitárias inventadas a partir dos anos da décadawww vaidebet1970, após a crise industrial italiana. Os empresários e agricultores precisavam construir uma nova imagem italiana atraente para os mercados internacionais, sem terem que investirwww vaidebetpesquisa e inovação."

Para Grandi, que é naturalwww vaidebetMantova, na região Emilia-Romagna (norte da Itália), a imigração italiana é outro fator que contribuiu para a reputação da cozinha italiana internacionalmente.

"Os italianos se espalharam pelo mundo. Na minha cidade, por exemplo, quase todos os que emigraram foram para o Brasil. Esses italianos no Brasil também são fundamentais para a história da cozinha italiana."

"Além disso, a nossa culinária é muito simples, tanto com relação aos ingredientes quanto às preparações, o que lhe permite uma dimensão doméstica."

Pizza e espaguete

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, 'A pizza que conhecemos hoje, e que é um produto extraordinário, foi criada por imigrantes italianos nos Estados Unidos', diz Grandi

Segundo Grandi, símbolos da culinária italiana conhecidos internacionalmente, como pizza e queijo parmesão, alémwww vaidebetespaguete ao molhowww vaidebettomate e à Carbonara, são cercadoswww vaidebet"mitos".

"A pizza que conhecemos hoje, e que é um produto extraordinário, foi criada por imigrantes italianos nos Estados Unidos. Antes disso, aqui na Itália era um produto muito ruim, para pessoas desesperadas e que passavam fome", diz.

"Na realidade, a ideiawww vaidebetum discowww vaidebetmassa consumida com algum ingrediente por cima sempre existiuwww vaidebettodo a região mediterrânea, com diferentes nomes. E ao contrário do que se pensa, foi nos Estados Unidos, e nãowww vaidebetNápoles, que a pizza tornou-se um produto rico, com o molhowww vaidebettomate e demais elementos que a identificam."

Outra "grande mentira", acrescenta Grandi, é que a pizza margherita tenha sido inventada especialmente para a rainha da Itália Margherita di Savoia.

"Naquela época teria sido ofensivo oferecer pizza para uma rainha. Era comidawww vaidebetgente pobre. Esta lenda surgiu pelo menos 40 anos depois da viagem dela à Nápoles".

Para o historiador, a origem italiana do espaguete com molhowww vaidebettomate também é falsa. Assim como o da Carbonara.

"Até a Segunda Guerra Mundial os italianos não costumavam comer macarrão. Até então, este alimento econômico era comum apenaswww vaidebetNápoles, onde era chamadowww vaidebet'maccheroni' e era consumido pelas ruas, sem molho e exclusivamente com as mãos. Existem milhareswww vaidebetregistros históricos que confirmam isso."

"Foi apenas depois da chegada na Itália do tomate proveniente do continente americano que os italianos passaram a adotar esse alimento porque era econômico e fácilwww vaidebetser preparado e conservado."

"Na época, o governo fascista chegou inclusive a combater o seu consumo por considerá-lo uma moda americana."

Sobre a carbonara, Grandi cita Luca Cesari, historiador da alimentação e autor do livro Uma Breve História da Massa, que dizia se tratarwww vaidebet"um prato americano nascido na Itália".

Acredita-se que o prato tenha sido feito pela primeira vez por um chef italianowww vaidebet1944 para soldados americanoswww vaidebetRiccione usando raçõeswww vaidebetbacon e ovos.

"A culinária italiana é realmente mais americana do que italiana", disse Grandi ao Financial Times.

Grandi também diz que a versão "original" do famoso queijo Parmegiano Reggiano, um dos produtos símbolos da Itália e fabricadowww vaidebetParma, na regiãowww vaidebetEmilia Romagna, só pode ser encontrada no estado americanowww vaidebetWisconsin se forem analisadas forma e consistência.

E mais: o historiador diz ter ouvidowww vaidebetum importante produtorwww vaidebetParmigiano DOP (Denominaçãowww vaidebetOrigem Protegida,www vaidebettradução livre para o português) que se hoje o produto italiano fosse feito com leite francês ele seria "ainda melhor".

A denominação DOP representa uma garantia legalwww vaidebetque o queijo foi feito por artesãos treinados na áreawww vaidebetorigem, usando apenas ingredientes locais e métodos tradicionais milenares.

Ela é usada para uma variedadewww vaidebetprodutos alimentícios, incluindo vinagre balsâmico, azeite, salame, presunto e outros.

No entanto, o Parmigiano Reggiano é um dos produtos mais importantes que recebeu esta honra.

Vinhowww vaidebetcorte

A cultura enológica italianawww vaidebetqualidade também é recente, na visãowww vaidebetGrandi.

"Os romanos já bebiam vinho e na Idade Média a bebida também era muito comum, mas se hoje bebêssemos o vinho como ele era produzido, adoeceríamos ou morreríamos, porque era um lixo."

Segundo o historiador, as produções italianaswww vaidebetvinho passaram a ter atenção à qualidade apenas a partirwww vaidebet1900.

"Até então, com raras exceções, a maior parte da produção vinícola italiana era destinada como vinhowww vaidebetcorte para a indústria francesa. A grande transformação ocorreu nos últimos 40 anos."

"Hoje o Prosseco, que é um produto relativamente novo, é um dos vinhos mais vendidos do mundo porque atende a um certo tipowww vaidebetconsumidor,www vaidebetsociedade."

Gastronacionalismo

Outro exagero, segundo Grandi, diz respeito à quantidadewww vaidebetprodutos agrícolas e alimentares com seloswww vaidebetreconhecimento europeu DOP (Denominaçãowww vaidebetOrigem Protegida) e IGP (indicação geográfica protegida).

"Não sou contrário ao sistemawww vaidebetproteção que no início era necessário para evitar que cada país do bloco estabelecesse suas próprias regras, mas na Itália temos hoje cercawww vaidebet800 produtos com estes selos", questiona.

"Alémwww vaidebetser um exagero, é quase sempre inútil porque obter este reconhecimento não garante que o produto terá sucesso fora da Itália. Confunde-se a causa com o efeito: não é a certificaçãowww vaidebetum consórcio a conferir o sucesso a um produto, e sim o contrário."

"Os produtos típicos com maior reputação no exterior, que são os queijos Grana Padano, Parmigiano Reggiano, presuntowww vaidebetParma, vinagre balsâmico e o vinho Prosecco, são bem aceitos independentemente da proteção que eles possuem, porque têm qualidades próprias que se adaptam a muitas cozinhas e a muitas formaswww vaidebetserem consumidas."

O historiador afirma ainda que os certificadoswww vaidebetorigem não coíbem a falsificação dos mesmos no exterior.

"Pelo contrário", diz ele, "o verdadeiro certificadowww vaidebetqualidade é a falsificação. Ninguém falsifica o que é ruim".

Para Grandi, a certificação pode inclusive prejudicar os produtores menores.

"Tudo isso é consequência do chamado 'gastronacionalismo', um fenômeno populista e nacionalista utilizado por muitos políticos para colocar a bandeira italianawww vaidebetprodutoswww vaidebetconsumo e contrastar outras culturas."

Reações

Segundo a Coldiretti, a reportagem do Financial Times prejudica diferentes setores econômicos italianos.

"Um artigo inspiradowww vaidebetuma publicação antigawww vaidebetum autor italiano que poderia até fazer sorrir se não escondesse implicações econômicas ewww vaidebetemprego preocupantes."

"A candidatura da cozinha italiana a Patrimônio da Humanidade é uma oportunidade para proteger e reforçar a identidade da cozinha italiana, a mais apreciada do mundo, com o recorde histórico alcançado pelas exportações agroalimentares Made in Italy, que atingiram o valor recordewww vaidebet60,7 bilhõeswww vaidebetacordo com a análisewww vaidebetColdiretti sobre dados do Istat (Institutowww vaidebetPesquisa Italiano), também impulsionados pela demanda pela culinária italiana."

- Este texto foi publicadowww vaidebet