'Uniforme deixa claro que você é serviçal, dá status para a patroa no shopping', diz ex-babá:sortudo cassino

O autor e cartunista Daniel Kondo (www.danielkondo.com) se inspirou na polêmica para criar a ilustração 'A realidadesortudo cassinopreto e branco (ou era uma vez no clube Pinheiros...)'

Crédito, Daniel Kondo

Legenda da foto, O autor e cartunista Daniel Kondo (www.danielkondo.com) se inspirou na polêmica para criar a ilustração 'A realidadesortudo cassinopreto e branco (ou era uma vez no clube Pinheiros...)'

sortudo cassino A decisão do Ministério Públicosortudo cassinoSPsortudo cassinoinvestigar um clubesortudo cassinoelite por exigir que babás vistam branco no estabelecimento gerou polêmica e abriu um debate nas redes sobre a exigência da roupa branca para as profissionais do ramo.

Inúmeras opiniões, contrárias e a favor, foram expressas, mas uma voz pareceu estar pouco representada: a das babás. O <link type="page"><caption> #SalaSocial</caption><url href="http://vesser.net/topicos/salasocial" platform="highweb"/></link>, da BBC Brasil, quer ouvir a opiniãosortudo cassinoquem trabalha ou trabalhou como babá. A exigência do uniforme no dia a dia do trabalho é válida, como ocorresortudo cassinoinúmeras profissões, ou pode se transformarsortudo cassinoinstrumentosortudo cassinosegregação?

Veja algumas das opiniões que já recebemos:

  • "Levo para o médico, passeios, balé, judô etc. Eu acredito que devemos ser identificadas pois há muito casossortudo cassinosequestros, roubos e tráficosortudo cassinocrianças", disse uma leitorasortudo cassinonossa página no Facebook.
  • Para outra leitora, que também já trabalhou como babá, a exigência do clube é "jogadasortudo cassinomarketing" para passar "ar elitizado".
  • "Se usar uniforme é por motivosortudo cassinosujeira durante o dia, não seria então o casosortudo cassinomães e pais usarem uniforme também? Ou avós, tios e tias?", questionou uma leitora que é babá na Inglaterra.
  • "Sou babá e quando vamos a esses clubes, nasortudo cassinomaioria, exigem uniformes. Há um tratamento diferenciado por parte dos funcionários e dos sócios. É como se não tivéssemos que estar ali. É puro preconceito. Já viajei para outros países e fui muito bem tratada. Não precisei usar uniforme e sempre me posicionei como quem está a trabalho naquele local."
  • "Este é um assunto muito falado entre as babás. Tem patroa que libera e outras que obrigam a usar. Para mim, usar uniforme é normal. É parte da profissão, como a empresa que exige o usosortudo cassinouniforme. Pessoalmente, acho que a peçasortudo cassinocima sempre precisa ser branca, por questãosortudo cassinohigiene. Se suja, você percebe logo e troca, mas com uma peça escura isso fica mais complicado. Mas a partesortudo cassinobaixo não acho necessário. Pode ser uma calça azul ou preta. Ou, quando vai para o litoral, acho que tem que poder usar bermuda."

<link type="page"><caption> Leia mais: Clube que obriga babá a usar branco é alvosortudo cassinoinvestigação do MP</caption><url href="http://vesser.net/noticias/2015/06/150615_clubes_babas_discriminacao_mdb.shtml" platform="highweb"/></link>

Destacamos abaixo o depoimentosortudo cassinoSilvana Félix,sortudo cassino41 anos, ao #SalaSocial. Se você trabalha ou já trabalhou como babá e quiser participar do nosso debate, deixe seu comentário abaixo ou <link type="page"><caption> em nosso fórum no Facebook</caption><url href="https://www.facebook.com/bbcbrasil/posts/10152973508597816" platform="highweb"/></link>.

"Fui babá durante 23 anos, mas, graças a Deus, não sou mais. A babá é quase invisível, tem que saber se fazersortudo cassinoinvisível. É diferentesortudo cassinouma cozinheira ousortudo cassinouma faxineira com seus papéis bem definidos. Dos empregados domésticos, acho que a babá é a que mais fica íntima dos patrões. Você levanta no meio da noite e encontra o patrãosortudo cassinocueca.

Tem horassortudo cassinoque esta intimidade é aceita e tem horas que não é. Não sabemos muito bem qual é o nosso papel. Fiquei cansada desta vida. Você tem que se dedicar muito, só tem folgasortudo cassino15sortudo cassino15 dias.

Trabalheisortudo cassinocinco casas esortudo cassinotodas tivesortudo cassinousar uniforme. O trabalhosortudo cassinobabá é complicado porque não se limita a trabalhar dentro da casa. Os patrões precisam nos levar para onde forem e precisamos estar 'apresentáveis'. É algo cultural. A maioria dos patrões gostasortudo cassinodeixar claro que somos babás e não uma parente ou uma amiga.

Uma vez, vi a babá do Eddie Vedder (vocalista da banda americana Pearl Jam) na praiasortudo cassinobiquíni com a patroa. Nem sempre eu podia colocar biquíni. Tem patrão que permite e outros que não permitem, e você temsortudo cassinoficarsortudo cassinouniforme do lado da piscina. Quando ia viajar, se o patrão dizia para levar maiô, sabia que ia poder entrar na piscina ou no mar. Se não, sabia que ia ter que ficar olhando sentada do ladosortudo cassinofora. Já tive que ir para a praia com o uniforme completo. Nem precisa o patrão dizer isso expressamente. Eles não falam. A babá tem que saber pegar estes detalhes.

Nos clubes, tem que irsortudo cassinobranco, não tem jeito, porque tem muita madame e essa exigência do uniforme. Certa vez,sortudo cassinoum clubesortudo cassinoelite do Rio, fui proibidasortudo cassinoentrar porque calçava chinelos. Era um domingo e eu estava com meus patrões e seus dois filhos, umsortudo cassinodois anos e outrosortudo cassinodez. Inclusive minha patroa estavasortudo cassinochinelo também, e o meu nem era qualquer chinelo, era bem bonitinho até.

Minha patroa reclamou, falou que era um absurdo, disse que os sócios estavamsortudo cassinochinelo porque, no Riosortudo cassinoJaneiro, todo mundo, pobre ou rico, usa chinelo. Mas não teve jeito. Disseram que era a regra do clube. Tivemos que voltar para casa para eu calçar um tênis. Não me senti mal, só achei uma grande besteira.

O uniforme deixa claro que você é serviçal. Serviçal é serviçal. Patrão é patrão. A roupa nos marca. É a mesma coisa no shopping. As patroas gostamsortudo cassinodesfilar no shopping com a babá. Elas estão pagando por isso e dá status. Não fica bem diante das amigas desfilar com a babá com roupa normal. Já trabalhei para patroasortudo cassino20 e poucos anos que exigia que a chamassesortudo cassinodona ou senhora. Era muito estranho chamar alguém tão mais novo desta forma.

Eu fiz faculdadesortudo cassinoRelações Internacionais e, uma vez, encontrei com uma amigasortudo cassinouma ex-patroa na faculdade. Quando liguei para a casa dela para combinar algo relacionado a um trabalho, a empregada me chamousortudo cassinodona e eu disse que não precisava disso. No dia seguinte, esta colega me deu uma super chamada, dizendo que a empregada tinhasortudo cassinome chamarsortudo cassinodona também.

Dizem que é bom usar uniforme porque deixa claro que a roupa está limpa, evidenciar o capricho da babá. Mas eu não trabalhava com bebê, mas com crianças maiores. Aí, a roupa branca é péssima porque você temsortudo cassinodeitar no chão, jogar bola. Isso suja muito a roupa, e você precisa trocar toda hora.

Tem preconceito? Tem. Mas é no clube, no restaurante,sortudo cassinotudo quanto é lugar. A tendência é se sentir diminuída. Uma vez, acompanhei a família para a qual trabalhava num almoçosortudo cassinobatizado. Os patrões disseram para eu ir para a cozinha para arrumar meu almoço e chamei outra babá para ir comigo. Quando chegamos à cozinha, fomos escorraçadas pela dona da casa, que dizia que aquela não era a hora da gente comer, que estávamos atrapalhando.

Depois, ela levou um prato só para nós duas, com dois garfos. Foi humilhante demais. Disse que não queria comer, e ela me achou petulante. A outra babá começou a chorar. Minha patroa depois me pediu desculpas, mas a outra babá acabou sendo demitida.

Não se tratasortudo cassinoaceitar ou não. Por exemplo, quando não falaram o nome das babás da Angélica. A gente não tem nome. Esse mundosortudo cassinobabá é assim. Faz parte entender que neste mundosortudo cassinoricos e babás é assim. Graças a Deus sei meu lugar. Já fui para vários hotéis e, enquanto os patrões comiam, eu comia sozinhasortudo cassinooutro lugar.

Se fosse só isso do uniforme, mas você vê muitas coisas, muitos detalhes. De pessoas que falam com a criança, mas não te dão nem oi. Já vi muitos casossortudo cassinoexploração. De patrões muito ricos que pagam meio salário mínimo para as meninas. Quando fui com uma família para a qual trabalhava para o Canadá, encontrei uma babá que não tinha roupas adequadas para o frio e os patrões não compraram nada para ela. Comigo aconteceu o mesmo. Os patrões disseram que iam comprar roupassortudo cassinofrio para mim e não fizeram isso. Mas eu reclamei e eles compraram, mesmo ficandosortudo cassinocara feia.

Tudo isso já me incomodou, mas me acostumei. Não somos vítimas nem quero ficar fazendo coitadismo. Eu ganhava bem. Ganhei muito dinheiro como babá. Não era uma coitadinha. Nunca questionei o uniforme porque ganhava bem. E com o dinheiro comprava meus livros, fazia minhas coisas.

Acho que no final, quando já não precisava tanto do dinheiro, eu passei a falar mais quando algo me incomodava. Aprendi a ter voz, porque sentar e chorar não vai resolver."

* Depoimento ao repórter da BBC Brasil Rafael Barifouse