Ucrânia ainda tem solução política, mas o tempo está se esgotando:ésporte da sorte

Opositores do governo transportam corpoésporte da sortemanifestante morto na Ucrânia (foto: Reuters)

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Alternativa diplomática para solução da crise na Ucrânia é cada vez mais limitada

"Ela vem do oeste", resumiu ele depois, me explicando o que ocorrera. Estava claro para mim um dos mais importantes fatos a respeito do país, aésporte da sortefamosa divisão, que hoje está na raiz da violência na ex-república soviética.

Raízes históricas

A divisão, com o oeste mais nacionalista, falando ucraniano, e o leste próximo à fronteira russa, com forte influência dos poderosos vizinhos, se manteve durante toda a era soviética, tendo origem anterior à Revoluçãoésporte da sorteOutubro.

Até o início do século 20, boa parte do país pertencia à Rússia czarista, enquanto que o leste, incluindo o hoje bastião oposicionistaésporte da sorteLviv, estava ligado ao Império Áustro-Hungaro.

Mas a ligação dos russos com o território ucraniano vemésporte da sortemuito antes. A Ucrânia foi berço da civilização russa, que lá floresceu no século 9 até ser obliterada pelo avanço dos mongóis, no século 13. O renascimento com Ivan, o Terrível (1530-1584), viria com a sede para recuperar os territórios perdidos para Genghis Khan e seus sucessores.

Isso explica parte do interesse histórico da Rússia pela Ucrânia. O legado soviético só acrescenta peso a isso.

A Ucrânia foi um dos signatários originais do fim da URSS. Mas a assinatura,ésporte da sorte8ésporte da sortedezembroésporte da sorte1991, do tratado que criaria a Comunidadeésporte da sorteEstados Independentes (CIS) só viria sete dias depoisésporte da sorteum referendo na Ucrânia terminar com apoioésporte da sorte90% da população à independência, refletindo o apelo nacionalistaésporte da sortevoga na ocasião.

Mas a separação ucraniana nunca foi bem absorvidaésporte da sorteMoscou, onde uma influente elite ucraniana tinha poderésporte da sortedecisão durante os anos soviéticos e permaneceuésporte da sorteMoscou mesmo após o surgimento do novo país.

Pactoésporte da sorteelites

Após a independência, a estabilidade da Ucrânia foi garantida por um pacto das elites. Com o respaldo russo, como nos tempos soviéticos, a Ucrânia permaneceu unida.

Em 2004, o presidente russo, Vladimir Putin, imaginou que a política ucraniana caminharia pelas trilhas tradicionais com o apoioésporte da sorteMoscou. Viktor Yanukovych – que vem do leste do país - foi eleito presidenteésporte da sorteeleições contestadas e,ésporte da sortepouco tempo, a contestação se transformouésporte da sorteum turbilhão laranja nas ruasésporte da sorteKiev.

A Revolução Laranja forçou Putin, pegoésporte da sortesurpresa, a aceitar um novo acordo com as elites nacionalistas do oeste, representadas por Yulia Timoshenko e Viktor Yushchenko, que então se tornaria presidente. Viriam anos difíceis nas relações entre os dois países, marcados por disputas no fornecimentoésporte da sortegás russo ao país.

Yanukovich finalmente chegaria ao poderésporte da sorte2010,ésporte da sorteum momentoésporte da sorteenfraquecimento da oposição nacionalista. De volta à Presidência russaésporte da sorte2012, Putin avançou com seu plano para restabelecer boa parte da esferaésporte da sorteinfluência soviética.

O lançamentoésporte da sorteuma União Aduaneira unindo Belarus, Rússia e Cazaquistão,ésporte da sorte2010, e da proposta para uma União Econômica Euroasiática com esses e outros países, surgiram como antagonistasésporte da sorteuma possível ampliação da União Europeia rumo à Ucrânia, vista por Moscou como candidata natural a integrar essas organizações.

Finalmente, a frágil estabilidade entre as elites ucranianas foi destruída quando Yanukovych, enfrentando grave crise econômica, tomouésporte da sortedecisãoésporte da sortenão buscar uma maior integração com a União Europeia, desencadeando os protestos que hoje fazem sangrar o país. Em seguida, a Rússia lhe cederia uma ajudaésporte da sorteUS$ 15 bilhões para salvar a economia.

Cenários

A atual situação da Ucrânia contempla alguns possíveis cenários para a resolução do conflito. Nenhum deles mostra uma saída fácil.

Um cenário é o da diplomacia. Primeiramente, a diplomacia tradicional,ésporte da sortemediadores e longas conversas. Até agora, a estratégia não se mostrou muito promissora e,ésporte da sorteuma atmosferaésporte da sorteânimos exaltados pelas mortes, só tende a se mostrar mais limitada.

Em segundo lugar, a diplomacia dura das sanções, pressionando o governo ucraniano a ceder na marra. A União Européia anunciou sanções nesta quinta-feira, mas – como bem mostra a experiência iraniana – elas podem não ser eficientes. Ainda mais com o governoésporte da sorteYanukovych recebendo um forte respaldoésporte da sorteMoscou.

Outro cenário é o estabelecimentoésporte da sorteuma força-tarefa envolvendo representantes do governo russo, dos EUA, da União Europeia, da oposição e da Presidência ucraniana. A negociação visaria o estabelecimentoésporte da sorteum novo pacto das elites ucranianas, sendo que as pró-UE esperariam,ésporte da sortealguma forma, uma nova promessaésporte da sorteintegração com o bloco.

Contudo, dificilmente Moscou aceitaria ceder muito a essas elites a favor da integração com o bloco europeu. Também é difícil saber que tipoésporte da sorteproposta seria aceita pela oposição nesta altura dos acontecimentos. A violência evoluiu a tal ponto que é possível que ela não aceite apenas mais promessas.

Como parte desse pacto, Yanukovich poderia simplesmente ceder, voltando atrás emésporte da sortedecisãoésporte da sortenão se aproximar da UE. Mas isso pode não ser suficiente, já que a oposição provavelmente também exigiriaésporte da sortesaída e que fosse julgado pela morteésporte da sortemanifestantes.

Uma alternativa semelhante, ainda como parte do pacto, é que a oposição ceda. Nesse caso, seria essencial que União Europeia flexionasse seus músculos e a estimulasse a aceitar isso.

Nesse caso, surgem as seguintes questões: a União Europeia está preparada para abrir mão da Ucrânia? Está preparada para dizer a aqueles que dizem estar lutando pelos valores europeus que devem desistir desses valores? Não seria isso uma perigosa contradição, que enviaria um sinal a Moscouésporte da sorteque pode fazer o que bem entender?

Guerra civil e divisão

Talvez o cenário mais apocalíptico seja este: Yanukovich mantémésporte da sorteatual posição e tenta eliminar a oposição, enquanto que a oposição tenta assumir o controle. Trata-se precisamente do que vem ocorrendo, com uma tendênciaésporte da sorteescalar para uma guerra civil.

Um conflito generalizado,ésporte da sortetodo o país, ainda não está ocorrendo. Por enquanto, a violência se concentraésporte da sorteKiev, sem sinaisésporte da sorteescalada no leste, mas com episódios preocupantesésporte da sortepontos do oeste.

Na cidadeésporte da sorteLutsk, manifestantes armados invadiram o gabinete do governador local, o arrastaram para fora e o algemaram. Centenas acompanharam discursosésporte da sorteum palco improvisado,ésporte da sortemeio a pedidosésporte da sorterenúncia do presidente.

Também há informaçõesésporte da sorteque oposicionistas invadiram uma prisãoésporte da sorteLviv e libertaram todos os detentos – aparentemente sem que a polícia esboçasse reação. Em outra cidade do oeste, Ivano-Frankivsk, manifestantes teriam tomado bases da polícia e das forçasésporte da sortesegurança e da Promotoriaésporte da sorteJustiça.

Daniel Sanford, repórter da BBCésporte da sorteKiev, fala que "o apoio silencioso que muitos na Ucrânia Ocidental, particularmenteésporte da sorteLviv, estão dando à violência (…) significa que uma separação entre Ucrânia Ocidental e Ucrânia Oriental está sendo discutida abertamente, apesarésporte da sortepoucas pessoas afirmarem querer isso".

Se o silêncio está se transformandoésporte da sorteações clarasésporte da sorteapoio aos oposicionistas,ésporte da sortedesafio ao poder institucionalizado no oeste – como os recentes desdobramentos no oeste sugerem – é sinal que a divisão está sendo levada mais a sério.

Mas é difícil imaginar que uma separação ocorra sem um confronto maior, envolvendo também o ainda mais silencioso leste próximo à fronteira russa – e, possivelmente, a própria Rússia.

*Rafael Gomez é mestreésporte da sorteestudos da Rússia e da Europa Oriental pela Universidadeésporte da sorteBirmingham, Reino Unido