Maduro negocia com TVsoposição e irrita chavistas:
- Author, Claudia Jardim
- Role, De Caracas para a BBC Brasil
O embate ideológico entre governo e oposição na televisão venezuelana pode estar com os dias contados. Mas o conflito na base chavista pode ter apenas começado. A nomeaçãoum apresentadorTV "convertido" ao governo como presidenteum dos canais estatais despertou a ira dos chavistas que desaprovam a aproximação do governo Nicolás Maduro com setores da mídia antes identificados com a oposição.
Críticas ao governo ganharam força depois que Maduro nomeou Winston Vallenilla como presidente da Televisora Venezuelana Social (Tves), emissora criada2007substituição ao canal privado RCTV, considerada à época uma dos principais opositores ao governo.
Naquele ano, o governo do presidente Hugo Chávez decidiu não renovar a concessão aberta da emissora, medida que gerou intensos protestosrua e transformou a RCTVum dos principais ícones do antichavismo.
Vallenilla era funcionário da RCTV. Quando o canal perdeu a concessão, o apresentador, considerado uma espécie"Luciano Huck venezuelano", migrou ao canal Venevisión, onde atua como animador do jogo A Guerra dos Sexos.
A "conversão"Vallenilla ao chavismo ocorreu no ano passado, logo após a morte do ex-presidente. Desde então, ele se tornou o apresentador oficial da campanha presidencialNicolás Maduro.
O pragmatismo adotado pelo governo Maduro, tantorelação a alguns setores da oposição como a correntes mais conservadoras do partido, preocupa a base chavista.
Para Mariclein Stelling, diretora do Observatório GlobalMeios da Venezuela, desde a morteChávez e após as recentes mudanças no campo econômico, os chavistas temem que o governo dê uma guinada à direita. "A reação do chavismorelação ao caso Vallenilla corresponde a esse temor do governo ir rumo à social-democracia", diz.
A ascensãoVallenilla à esteira governista veio com a indicaçãosua candidatura a prefeito do municípioBaruta, na grande Caracas, controlado pela oposição. Derrotado nas urnasdezembro,nomeação à frenteTves é vista por críticos como um prêmioconsolação.
Stelling considera que o governo,olhomelhorar a audiência do canal estatal, não calculou o impacto político ao nomear um ex-funcionário da RCTV como presidente.
"Vallenilla vem dos canais privados e o governo pensa que, por conhecer o trabalho televisivo por dentro, ele terá condiçõesdesenvolver uma proposta atrativa para a população", acrescentou.
Competitividade
Em entrevista a uma rádio local, Vallenilla disse que pretende transformar a Tvesum canal competitivo como as emissoras Televen e Venevisión - ambas acusadas pelo governoparticipação no golpeEstado contra Chávez2002.
"Sem nenhum tipotendência política, quero converter a Tves num canalentretenimento para toda a família, com uma mensagemalegria e informação", afirmou.
A mensagem, no entanto, não foi bem recebida por ativistas do chavismo. A polêmica gerada pelo caso Tves levou a hashtag #WinstonVallenilla a estar entre os tópicos mais comentados no Twitter venezuelano na terça-feira.
"O chavismo foi crítico do modelo televisivo que pariu Winston: jogos, sexismo, espetáculo vazio. Já se rendeu (ao antigo modelo)", escreveu um internauta identificado como @luiscarlos.
A reação não veio só dos apoiadores do governo. A atriz Erika La Vega, ex- namorada do líder opositor Henrique Capriles, alfinetou Wallenilla no Twitter, pedindo que ele empregasse os artistas que ficaram sem trabalho após o fim da concessao da RCTV.
Winston respondeu oferecendo emprego à atriz, irritando ainda mais os chavistas. "ÉrikaLa Vega, minha vida, te amo. Se precisartrabalho, será bem-vinda. Mas não há porque continuar motivando a intolerância", respondeu Vallenilla no microblog.
Aproximação
A ascensãoVallenilla ocorre dias depoisuma reunião entre o governo e as redestelevisão nacionais privadas para tratar do programaredução da insegurança e do programa"pacificação" do país. Especula-se que no encontro houve uma espécie"pactomoderação".
O escritor e jornalista venezuelano José Roberto Duque afirma que, caso exista um acordo, ele se basearia na seguinte equação: "O Estado cede no discurso radical, coloca figuras 'palatáveis' para a direita, que amenizem o discursoconfronto entre os setores. E os (canais) privados já não bombardeiam (o governo) a pontoconvocar rebeliões civis e militares, como ocorreu há alguns meses. Mas isso não é um fato comprovado."
Na Venezuela polarizada, no entanto, qualquer figura pública que deixaapoiar a um grupo e passa a defender o adversário cai numa espécielimbo político. Nem chavistas, nem opositores respeitam os que "pulam o muro". Esse parece ser o destinoVallenilla. O apresentador tinha tal graucompromisso com a RCTV que o ex-diretorredação do canal escreveu uma carta aberta para criticar"traição".