Pão encarece 500% e vira símbolo da crise humanitária na Síria:

mulher carrega pilhapão | Reuters
Legenda da foto, Mulher carrega pilhapão, itemprimeira necessidade na mesa dos sírios e atualmenteescassez.
  • Author, Lyse Doucet
  • Role, Correspondente internacional-chefe da BBC News

O pão se tornou o barômetro do sofrimento dos sírios, mergulhadosuma guerra civil desde 2011. A comida mais básica da população está difícilencontrar e também está cada vez mais cara.

Nos últimos dois anos, o preço do pão aumentou 500%algumas áreas da Síria, segundo uma nova pesquisa da ONG ComitêResgate Internacional (IRC, na siglainglês) obtida pela BBC.

Quatrocada cinco sírios dizem quemaior preocupação é que a comida acabe.

"Os resultados do levantamento mostram que a fome ameaça várias partes da população síria", diz o presidente da IRC, David Miliband.

A pesquisa coincide com o lançamento pelas Nações Unidas, nesta segunda-feira, do maior apelo por ajuda humanitária já feito pela organização.

A ONU espera arrecadar US$ 6,5 bilhõesauxílio para a Síria.

Escassez

Em muitas cidades, a escassezcombustível, farinha e eletricidade faz com que padarias e pães sejam artigosluxo.

"Nós não comemos pão há nove meses", foi a frase que a BBC escutoumuitos sírios que abandonaram o subúrbioMoadamiya,Damasco,outubro.

Nas padarias admnistradas e financiadas pelo governo, o preço do pão não sofreu alterações nos últimos 20 anos. O tradicional pão árabe (chato e arredondado) ainda custa duas libras sírias (US$ 0,02).

Em um diafrio congelante, sírios socam as portasmetaluma grande padaria estatal no centro da capital, gritando por mais pão.

"Precisamos deste pão para as refeições", diz um homem que sai do local com um sacotrês quilos, com os quais espera alimentar a família e alguns amigos.

"Nas padarias particulares pagaríamos dez vezes mais", acrescenta outro homem.

A poucas ruas dali, um centrodistribuição do Programa MundialAlimentos da ONU está lotado. O diretor Matthew Hollingworth observa que as pessoas estão "comendo menos, com menos frequência, e que a qualidade da comida piorou".

"A produçãocereal caiu 40%" , diz ele. "E as importações não compensam essa queda."

Além da comida

Pessoas que enfrentam filas por uma caixamantimentos, distribuída mensalmente, também pedem cobertores e roupasinverno para as crianças. Esses itens continuam à venda, mas muitos sírios, obrigados a deixar suas cidades por causa da guerra, não têm dinheiro para comprá-los.

Alguns mudaramcidade três vezes para escapar dos combates. Eles perderam seus empregos e casas, entre outros bens.

"Eu preferiria moraruma barraca onde ficava a minha casa do que viver assim, sem dignidade", lamenta Um Aymad, que buscava mantimentos para alimentar seus 16 filhos e netos. Eles fugiramMoadamiya há um ano.

Valerie Amos
Legenda da foto, Amos: "Trata-seuma das maiores crises humanitárias dos tempos modernos"

Este é um pequeno retratouma nação onde, segundo a ONU, 6,3 milhõespessoas foram forçadas a deixar suas casas e onde, segundo a ONU, 75% da população dependeráajuda humanitária2014.

Sem falar dos mais2 milhõessírios que buscaram refúgio nos países vizinhos.

"Trata-se uma das maiores crises humanitárias dos tempos modernos", diz a subsecretária-geral da ONU para assuntos humanitários, Valérie Amos, durante uma breve visita a Damasco pouco antes do lançamento do apelo global da organização.

O último pedido por fundos, feito alguns meses atrás, foi por US$ 4,4 bilhões e era considerado o maior apelo humanitário já feito até então.

"Refugiados me disseram: 'Por que o mundo nos abandonou'?", relemebra Amos. "O mundo deveria realmente se unir para entender o que os sírios estão enfrentando."