Leilão testa novo modeloexploração do pré-sal:

Plataformapetróleo vistapraiaNiterói
Legenda da foto, Plataforma vistapraiaNiterói; leilão desta segunda será testenovo marco regulatório
  • Author, Ruth Costas
  • Role, Da BBC BrasilSão Paulo

O leilão da BaciaLibra - maior licitação da história do país, nesta segunda-feira – será o primeiro grande teste para o novo marco regulatórioexploraçãopetróleo no país, aprovado2010.

Libra, uma das bacias do pré-sal, é a mais importante reserva petrolífera já descoberta no Brasil e a estimativa da Agência Nacional do Petróleo (ANP) é que possa produzirdez anos até 1,4 milhãobarrispetróleo por dia – maismetadetoda a produção atual brasileira.

Por voltaduas da tarde desta segunda-feira (horaBrasília), será anunciado que empresa – ou empresas – ganharão o direitoexplorar a reservaparceria com a Petrobras.

A abertura dos envelopes com as propostas, porém, também deve dar indicações sobre até que ponto esse novo marco foi capazatrair o interesse das empresas estrangeiras para o pré-sal efomentar a concorrência entre elas.

As novas regras substituem o sistemaconcessões pelo chamado "regimeprodução compartilhada" e vêm sendo criticadas por analistasorientação liberal por, supostamente, abrir espaço para um excessointervenção estatal que inibiria investimentos privados no setor.

Sindicatos, movimentos sociais e alguns acadêmicos também têm protestado contra o leilão por ver no novo modelo o problema oposto. Para eles, a Petrobras deveria explorar o pré-sal sozinha e, ao fazer parcerias com estrangeiras, estaria "privatizando" uma das maiores riquezas brasileiras.

Pelas novas regras, a Petrobras terá um mínimo30%participação e será a operadoratodos os projetos – decidindo desde o ritmo até a tecnologia usada na exploração dos poços. O Estado terá amplos retornos financeiros e uma agência estatal será criada para supervisionar a exploração do pré-sal, a PPSA.

"É bem possível que o resultado do leilão indique que o governo precisará fazer ajustes nas novas regras para futuras licitações", acredita Carlos Assis, chefe do setorenergia e recursos naturais da consultoria EY.

A avaliação final sobre os resultados da disputa deve depender basicamentetrês fatores, segundo analistas consultados pela BBC Brasil.

Númeroparticipantes

Plataformapetróleo (Foto BBC)
Legenda da foto, ANP estima que LIbra opssa produzir até 1,4 milhõesbarrispetróleo por dia

Primeiro, quantos consórcios participarão do leilão. Um total11 empresas se inscreveram na disputa e, até domingo, 4 haviam depositado garantias integrais que lhes permitem fazer lancesnomeum consórcio.

A interpretação do mercado éque, quanto maior o númeroconsórcios participando, maior o sucesso do modeloatrair as empresas estrangeiras e mais competitivo o leilão.

Entre a noitesexta-feira e a manhãsábado, porém, começaram a surgir na imprensa rumoresque apenas um consórcio participaria da disputa – o grupo do qual faria parte a Petrobras.

O ministroMinas e Energia, Edison Lobão, tevevir a público para assegurar que o leilão ocorreria mesmo assim.

"Não sabemos quantos irão participar. Isso importa, mas importa pouco. O importante é que haja participantes - um ou maisum", disse Lobão. "Como dizia um grande líder chinês, não importa a cor do gato, importa que ele cace o rato."

O segundo fator que deve servirbase para as avaliações sobre o leilão diz respeito à "agressividade" das propostas.

De acordo com as regras do novo modelo, ganhará a licitação o consórcio que se dispuser a dar uma parcela maior para a União do chamado lucro-óleo (ou lucro-petróleo) – o petróleo extraído da reservaquestão, descontados os custosprodução e pagamentoroyalties.

O edital para Libra estabelece que o Estado deve ficar com um percentual mínimo41,65% desse lucro. Quanto mais competitivo o leilão, mais essa porcentagem tende a aumentar.

Se o percentual da proposta vencedora for igual ou muito próximo a 41,65%, devem ganhar força as análisesque o novo modelo é pouco atrativo e eficiente. Se for muito acima, o governo poderá celebrar.

Perfil das empresas

Por fim, o último fator que deve servirparâmetro para uma análise dos resultados do leilão é o perfil das empresas do consórcio vencedor.

Segundo analistas, a presença dominanteestatais nesse consórcio poderia ser um indicativoque o novo modeloexploração petrolífera é ineficiente para atrair grandes empresas privadas.

Além disso, caso a Petrobras termine com uma fatia muito grande no consórcio vencedor, também surgirão dúvidas sobre a capacidade técnica, administrativa e financeira da empresafazer os investimentos necessários dentro dos prazos estipulados para que Libra alcance seu picoproduçãodez anos.

O governo esperava que um total40 empresas participassem da disputa, mas, como mencionado anteriormente, apenas 11 se interessaram, das quais 6 são estatais.

Estão na disputa a Petrobras (que pode aumentarparticipação nos projetos), as chinesas CNOOC e CNPC, a hispano-chinesa Repsol/Sinopec, a colombiana Ecopetrol, a japonesa Mitsui, a indiana ONGC Videsh, a portuguesa Petrogal (que também conta com participação chinesa), a malaia Petronas, a anglo-holandesa Shell e francesa Total.

"Não me surpreende que as gigantes do setor ficaramfora do leilão", diz WalterVitto, da consultoria Tendências, referindo-se ao fatoempresas como a britânicas BP e a americana ExxonMobil não terem se interessado.

"Entre as empresas privadas, há muitas incertezas sobre esse novo modelo. Por exemplo, não se sabe ao certo como atuará a nova estatal para o pré-sal", dizVitto.

Para ele, tais incertezas fazem das estatais chinesas as favoritas na disputa por Libra.

"Elas estão mais dispostas a abrir mãosua rentabilidade, porque seu principal objetivo é estratégico: ter acesso a reservaspetróleo", explica.

Assis, da EY, também aponta as asiáticas como favoritas.

"A exigênciaum 'bônusassinatura' (valor pago logo na assinatura do contrato)R$15 bilhões também ajudou a afastar as privadas, que estão mais preocupadasobter retornoum horizonte mais curto", acredita o especialista.

Defesa

O governo defende a recente mudança regulatória, argumentando que o novo modelo seria altamente atrativo para o setor privado tendovista as grandes possibilidadeslucro do pré-sal.

Também diz que as novas regras atenderiam ao interesse públicomaximizar os recursos provenientes da exploração dessas reservas para investimentoseducação e saúde.

"Essa riqueza imensa que está abaixo do mar e da terranada nos servirá se continuar ali deitadaberço esplêndido", disse o ministro Lobão no sábado.

O novo marco regulatório também têm regras sobre o conteúdo nacional mínimocada projeto – ou seja, o percentual mínimobens e serviços nacionais que devem ser usados na operação.

A promessa ligada a tais exigências, segundo a diretora da ANP Magda Chambriad, é que a exploraçãoLibra, e do pré-salgeral, ajudará a ativar alguns segmentos da indústria e do setorserviçosalto valor agregado, contribuindo para uma "mudança estrutural na economia brasileira".

"Em média 50% dos bens e serviços que vamos usar (nesses projetos) terãoser adquiridos na indústria local. E vamos precisarplataformaságuas profundas, equipamentos sofisticados. Isso significa uma (oportunidade de) inserção tecnológica importante para o Brasil", disse Chambriard,entrevista recente a BBC.

Alguns analistas, porém, são céticosrelação a tais promessas.

"É muito difícil calcular qual será o efeito total desses projetos sobre a economia", opinaVitto.

"Se, por um lado, essas indústriasponta receberão um estímulo extra, por outro elas podem acabar desviando mãoobra altamente qualificada e capitaloutros setores", completa.