Copa do Mundo: por que a seleção argentina é tão branca?:jogos fps online
"Por que não há negros na seleção da Argentina?".
Uns acusam que é racismo. Outros retrucam que foram escolhidos os melhores.
É um fato que o time argentino não tem jogadoresjogos fps onlinepele retinta ou um pouco mais clara como a maior estrela da França, Kylian Mbappé.
Mas um olhar mais atento para la Albiceleste mostra que não são todos brancos.
"É evidente que há jogadores afrodescendentes oujogos fps onlineascendência indígena", diz o ativista e advogado Alí Delgado, professor da Universidadejogos fps onlineBuenos Aires (UBA).
A questão é que muitas pessoas, especialmente entre os argentinos, não os reconhecem assim, diz Delgado. "E o resto do mundo não os vê assim, porque não compreende a questão racial aqui na Argentina."
Talvez, então, a pergunta deva ser um pouco diferente: Por que a seleção da Argentina é tão branca?
"Quando pensamosjogos fps onlineum time nacional cremos que é um reflexo daquele país. Acho que estamos vendo isso com a Argentina", diz Erika Edwards, professorajogos fps onlineHistória Latina da Universidade do Texasjogos fps onlineEl Paso, nos Estados Unidos.
Edwards aponta que há vários jogadores argentinos que poderiam ser descritos como morochos, pessoasjogos fps onlinepele escura - como Maradona -, mas não necessariamente considerados negros.
"Eles refletem a diversidade racial argentina, e essa diversidade precisa ser reconhecida."
'Aqui não há negros'
Delgado, Edwards e muitos outros apontam que foi criado ao longo da história da Argentina o mitojogos fps onlineque o país é uma exceção na América Latina, uma nação brancajogos fps onlinedescendentesjogos fps onlineeuropeus.
O presidente Alberto Fernández dissejogos fps onlineuma coletivajogos fps online2021, por exemplo, que "os mexicanos vieram dos índios, os brasileiros vieram da selva, mas, nós, os argentinos chegamos nos barcos" e teve que se retratar.
"Na primeira metade do século 20, recebemos maisjogos fps online5 milhõesjogos fps onlineimigrantes que conviveram com nossos povos originários. Nossa diversidade é um orgulho", justificou-se.
O presidente argentino disse ainda que não quis ofender ninguém e se desculpou com quem havia se sentido invisibilizado.
O sentimentojogos fps onlineser invisível é compartilhado por muitosjogos fps onlineum país onde não é incomum ouvir: "Aqui não há negros".
A principal bandeira do movimento negro no país é a luta pelo reconhecimento da existência dos afrodescendentes, escreve o sociólogo Guillermo Orsijogos fps onlineum artigo recente.
O mito da homogeneidade racial na Argentina não "reflete a realidade histórica", diz Orsi, mas "tem se espalhado pela população desde os tempos da colonização e independência, permanecendo quase intacto até o fim da primeira década do século 21, quando começou a ser postojogos fps onlinequestão".
Quantos argentinos são negros?
A verdade é que a Argentina não sabe exatamente quantos afrodescendentes tem, porque, até pouco tempo, não havia perguntado.
O Censojogos fps online2010 foi o primeiro a incluir essa pergunta e, mesmo assim, só para uma parte da população.
O resultado foi que haveria 149,5 mil afrodescendentes entre os 40,1 milhõesjogos fps onlineargentinos, 0,37% do total. A títulojogos fps onlinecomparação, no Brasil negros são mais da metade.
Ativistas e acadêmicos dizem que o número é na realidade muito maior.
Dificuldades na realização do censo, operacionais, financeiras e políticas, podem ter prejudicado a contagem, explica Eva Lamborghini, pesquisadora do Grupojogos fps onlineEstudos Afrolatinoamericanos (Geala) da UBA.
"A inclusão da pergunta foi um feito histórico dos ativistas, mas a campanhajogos fps onlinesensibilização à ela e à categoriajogos fps onlinesi foi muito escassa,jogos fps onlineum país onde ainda hoje essa identificação é desconhecida pela maioria", afirma.
Um teste piloto para o censo feito cinco anos antes,jogos fps onlinebairrosjogos fps onlineBuenos Aires e Santa Fé, apontou, por exemplo, que haveria 2 milhõesjogos fps onlineafrodescendentes na Argentina, ou seja, cercajogos fps online5% da população.
"Imagino que deve ter ao menos o dobro, e estou sendo conservador", afirma Alí Delgado.
Uma conta mais precisa deve sair do Censojogos fps online2022, o primeiro que perguntará a todas as pessoas se elas têm ascendência africana.
"A expectativa é que o número cresça, não só pelo alcance da pergunta, mas porque se passaram dez anos do último censo e se avançou muitojogos fps onlinetermos do reconhecimento afro no país", diz Lamborghini.
'Negação da negritude'
Delgado também avalia que o percentual oficial vai subir, mas ainda assim não irá refletir a realidade.
"Muitas pessoas não sabem que são afrodescendentes - ou não se interessamjogos fps onlinesaber - e pensam que são brancos. Historicamente, muitas pessoas começaram a ocultar familiares negros, e as famílias foram eliminando outros elementos da cultura africana", afirma.
Além disso, há quem não quer ser visto como negro, diz Delgado, por não entender que a ascendência africana faz parte do que é a Argentina ou para escapar dos estigmas associados a ser identificado assim.
"Em um mundo racista, isso nunca é positivo", afirma o advogado. "O negro é exótico, hipersexualizado, te olham muito mais na rua, o segurança te segue na loja, não se vive tranquilo."
Além disso, o negro é com frequência considerado um estrangeiro à primeira vista, diz Delgado: "Não se concebe o negro argentino. Muitas vezes me perguntam na ruajogos fps onlineonde eu sou".
A isso se somam o retrato histórico dos negros apenas como escravizados, ausentesjogos fps onlineeventos importantes, uma "negação absoluta da negritude" da Argentina, diz Delgado, e a faltajogos fps onlinerepresentatividade na sociedade hoje.
"Praticamente não há negros nas universidades, são menos ainda entre os professores. Não há na política, pelo menos não nos lugares mais importantes, ou nos âmbitos empresariais ou da Justiça", afirma Delgado.
Silêncio racial
Os negros são parte da história e da sociedade argentina, apesarjogos fps onlineisso não ficar imediatamente óbvio com a seleçãojogos fps onlinefutebol masculina.
O país foi uma colônia espanhola e recebeu dezenasjogos fps onlinemilharesjogos fps onlineafricanos escravizados nesta época. Os negros eram no fim do século 18 cercajogos fps onlineum terço da população,jogos fps onlineacordo com dados históricos.
Então, como eles se tornaram menosjogos fps online1%?
Uma explicação corrente é que muitos teriam morrido nas guerras travadas no país no século 19, mandados para a "linhajogos fps onlinefrente" dos conflitos.
Outra afirma que os negros, por serem mais pobres, padeceram maisjogos fps onlineepidemias, especialmente ajogos fps onlinefebre amarela, na mesma época.
Ou ainda que a população negra declinou depois da abolição do tráficojogos fps onlineescravos, o que deixoujogos fps onlinecompensar as altas taxasjogos fps onlinemortalidade.
Estudos acadêmicos já refutaram essas hipóteses, mas elas são ainda muito citadas nos debates sobre a questão racial no país.
O que ocorreu foi na verdade um progressivo "apagamento" dos negros da sociedade, explica Edwards, desde que a Argentina decidiu, no final do século 19 e início do século 20, atrair imigrantes europeus como partejogos fps onlineum projetojogos fps onlinenação mais moderna - e branca.
"O númerojogos fps onlineimigrantes que chegou foi imenso, não dá para negar que essa quantidadejogos fps onlinepessoas teve um efeito na proporçãojogos fps onlinenegros na sociedade", afirma Edwards, que escreveu um artigo para o Washington Post sobre o assunto.
A historiadora Florencia Guzmán, que coordena o Geala, recorda que a Constituiçãojogos fps online1853 estabeleceu que os cidadãos não seriam mais distinguidos por cor ou raça.
"O silêncio racial podia parecer progressista no plano jurídico, mas, na prática não era tanto, porque constituiu a Argentina como um país branco e europeu com a massiva imigração europeia, um 'crisoljogos fps onlineraças'", afirma Guzmán.
'Quem quer ser oprimido?'
Delgado afirma que, ao mesmo tempo, os negros foram por muito tempo contabilizados na população, junto com indígenas e outras etniasjogos fps onlinepele mais escura, como trigueños.
"Foi um genocídio discursivo. Criou-se uma categoria racial que meteu a todos no mesmo saco, e isso foi uma viajogos fps onlineescape para muita gente, porque não era positivo ser negro. Quem quer ser oprimido?", afirma o pesquisador.
Guzmán aponta que os recenseadores tinham ainda uma concepção "restritiva e dicotômica" da população negra.
"Eles consideravam negros só os africanos ou a populaçãojogos fps onlinecor antesjogos fps onlinetoda miscigenação. Essa concepção 'purista' não poderia levar a outra coisa que não a subestimar a presença dos descendentesjogos fps onlineafricanos no país e à homogeneização da população na construçãojogos fps onlineuma imagemjogos fps onlineum país branco, sem raças", afirma.
A Argentina também passou por uma miscigenação maior do que, por exemplo, o Brasil, o que "ampliou o conceitojogos fps onlinenegritude", diz Delgado.
"Se a pessoa não tem pele bem escura ou cabelo crespo, não é considerada negra. Isso também reduz muito a quantidadejogos fps onlineafrodescendentes."
Mas a seleção argentina já teve jogadores negros no passado, lembra Delgado, inclusive entre os seus campeões mundiais.
O goleiro Héctor Baley, o "Chocolate", foi da seleçãojogos fps online1978, e o volante Héctor Henrique, o "Negro Henrique", jogoujogos fps online1986.
"Então, houve negros no passado, há visivelmente afrodescendentes hoje e haverá outros no futuro, mas a negritude é distinta."
O pesquisador diz ainda que, na final da Copa, o time da França também não refletirá a população do país e que isso diz muito mais sobre seu colonialismo.
Edwards concorda com a parte do colonialismo, mas considera que a seleção argentina "reflete a Argentinajogos fps onlinemuitas formas".
"Acho isso muito interessante e que tem algo a dizer da imagem que o país temjogos fps onlinesi mesmo. Se é uma imagem correta ou não, deixo para os argentinos responderem."
Este texto foi publicado inicialmentejogos fps onlinebbc.comhttp://vesser.net/internacional-64009276