Imposto global aprovado pela OCDE favorece países ricos, diz grupoPiketty:

Thomas Piketty

Crédito, AFP

Legenda da foto, 'Processoreforma foi diluídotal forma que beneficiará esmagadoramente os países ricos', escreve o grupoPiketty

A propostaum imposto mínimo global para multinacionais foi aprovada preliminarmente pelo G20julho deste ano. Na sexta-feira (8/10), a iniciativa teve novo avanço, após a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) anunciar um acordo reunindo 136 países — incluindo o Brasil e nações europeias antes relutantes, como Irlanda, Hungria e Estônia —torno da proposta. Paquistão, Sri Lanka, Quênia e Nigéria não concordaramaderir.

Pelo acordo, uma alíquota mínima15% será aplicada a partir2023 a multinacionais com faturamento anual acima20 bilhõeseuros (R$ 128 bilhões) e margemlucro superior a 10%. A expectativa da OCDE éque isso gere arrecadação anualUS$ 150 bilhões (R$ 830 bilhões).

Paulo Guedes

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Paulo Guedes mantém recursoscontas offshore fora do país

No entanto, um grupoeconomistas renomados — entre eles o americano Joseph Stiglitz, os franceses Thomas Piketty e Gabriel Zucman, a indiana Jayati Ghosh e o colombiano José Antonio Ocampo —, defensores há muito do imposto global para multinacionais, criticam o acordo firmado no âmbito da OCDE e defendem uma alíquota maior do que os 15% acordados.

Em carta divulgada na terça-feira (12/10) através do jornal francês Le Monde, eles afirmam que a alíquota15% é "um sucesso para a Irlanda, mas um fracasso para o resto do mundo"; que os grandes perdedores serão os paísesdesenvolvimento; e que poucas empresas (apenas cerca das 100 maiores) serão afetadas pelo acordo, num momentoque a necessidadereceitas para apoiar a saúde pública e a recuperação econômica é maior do que nunca, devido à pandemia.

O ICRICT (Comissão Independente para a Reforma da Taxação InternacionalEmpresas,tradução livre), como é chamado esse grupoeconomistas, defendia originalmente uma alíquota mínima global25%.

Na OCDE, a expectativa inicial erachegar a uma taxa básica21%, mas a pressãopaíses com tributação interna menor — como a Irlanda (12,5%) e a Hungria (9%) — fez com que o acordo fosse fechado com a alíquota nos atuais 15%. Além disso, os países ficariam proibidosadotar medidastributação unilateralmultinacionais.

Vencedores e perdedores

"Este processoreforma foi diluídotal forma que beneficiará esmagadoramente os países ricos", escreve o grupoPiketty, na carta publicada na véspera do encontro do G20.

"Uma reforma que poderia ter trazido maisUS$ 200 bilhõesaumentoreceita tributáriatodo o mundo a uma taxa mínima21%, trará apenas US$ 100 bilhões a 15%", continuam eles, prevendo uma geraçãoreceitas inferior aos US$ 150 milhões esperados pela OCDE.

Os economistas criticam ainda o critériodistribuição das receitas do tributo global, que deverá ser70 a 80% para os países sede dessas companhias e 20 a 30% para os países onde ocorrem as vendas. Por exemplo, a maior parcela da tributação sobre a Amazon iria para os Estados Unidos, seu país sede, e a parcela menor para os demais países usuários do serviço, entre eles, o Brasil.

"Ao priorizar a aplicação do imposto mínimo aos países onde as sedes das multinacionais estão localizadas, estima-se que a maior parte da receita adicional beneficiará apenas um pequeno númeropaíses ricos", consideram os membros do ICRICT.

"Há uma preocupação legítimaque um mínimo global tão baixo se torne a norma global, e que uma reforma que se destinava a garantir que as multinacionais pagassemparte justa acabe fazendo exatamente o contrário", afirmam os economistas.

Ainda segundo eles, a exigênciaum compromisso pelos paísesretirar ou se absterintroduzir novas medidas unilaterais para tributar gigantes digitais "é simplesmente injusta".

"Em geral, o acordo atual não se baseiauma compreensão adequada da realidade econômica por trás do funcionamento do impostorenda corporativo e reforça as desigualdades globais. Do pontovista dos paísesdesenvolvimento, só pode ser visto como uma solução provisória que eles foram forçados a aceitar", sentenciam.

O grupo defende que as negociações atuais devem continuar sob a presidência da Indonésia no G202022 e da Índia2023, para dar aos paísesdesenvolvimento uma voz efetiva.

O acordo anunciado pela OCDE na sexta-feira também foi criticado pela Oxfam, organização internacional que atua no combate à desigualdade.

"Este acordo é uma capitulação vergonhosa e perigosa ao modelobaixa tributaçãonações como a Irlanda. É uma zombaria à justiça e rouba os paísesdesenvolvimento devastados pela pandemiareceitas extremamente necessárias para hospitais, professores e melhores empregos", afirmou a organizaçãocomunicado.

"Este acordo é uma injustiça inaceitável. Ele precisauma revisão completa. A OCDE e o G20 devem trazer justiça e ambiçãovolta à mesa e entregar um plano tributário que não deixe o resto do mundo recolher suas migalhas e restos", completou com dureza a Oxfam.

Línea

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