'Voos da morte' na Argentina: como Justiça tenta fechar ferida aberta há 45 anos:bet365 ganhar 200 reais

Um dos aviões abandonadosbet365 ganhar 200 reaisCampobet365 ganhar 200 reaisMayo

Crédito, Gustavo Molfino

Legenda da foto, Durante o regime militar na Argentina ocorreram os chamados "voos da morte"

Demorou maisbet365 ganhar 200 reaisquatro décadas para que a Justiça pudesse reconstituir como ocorreram aqueles voos e finalmente condenar essa prática.

E o trabalho ainda não acabou.

Estima-se que 30 mil pessoas desapareceram durante a ditadura militar na Argentina entre 1976 e 1983

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Estima-se que 30 mil pessoas desapareceram durante a ditadura militar na Argentina entre 1976 e 1983

Em 2017, a Justiça condenou 29 ex-militares a prisão perpétua. Também houve outras 19 sentenças entre 8 e 25 anos pelos crimesbet365 ganhar 200 reaissequestro, tortura e desaparecimentobet365 ganhar 200 reaispessoas durante o último período militar. Essa decisão histórica ficou conhecida como "Megacaso da ESMA" — siglabet365 ganhar 200 reaisEscola Superiorbet365 ganhar 200 reaisMecânica da Marinha.

Mas, no ano passado, um novo julgamento começou.

Agora, o Ministério Público busca comprovar a existência dos "voos da morte" operados a partir do Campobet365 ganhar 200 reaisMayo, base militar no nordeste da provínciabet365 ganhar 200 reaisBuenos Aires onde funcionava outro centrobet365 ganhar 200 reaisdetenção clandestino, para que aqueles que comandavam essa operação possam ser julgados e condenados.

"Vamos reparar, mesmo que seja o mínimo, todos os danos que foram causados às famílias das vítimas", diz à BBC News Mundo (serviçobet365 ganhar 200 reaisnotíciasbet365 ganhar 200 reaisespanhol da BBC) Mercedes Soiza Reilly, integrante da equipe do procurador-geral Marcelo García Berro.

Como funcionavam os "voos da morte"?

De 1976 a 1983, um dos maiores centros clandestinosbet365 ganhar 200 reaisdetenção do regime militar que governou a Argentina nesse mesmo período funcionou no prédio da ESMA, na zona norte da Cidadebet365 ganhar 200 reaisBuenos Aires.

Embora o número exatobet365 ganhar 200 reaispessoas que foram alojadas ali contrabet365 ganhar 200 reaisvontade não seja conhecido, as organizaçõesbet365 ganhar 200 reaisdireitos humanos afirmam que houve até 5 mil detentos.

Vários "voos da morte" teriam decolado desta pistabet365 ganhar 200 reaisCampobet365 ganhar 200 reaisMayo,bet365 ganhar 200 reaisBuenos Aires

Crédito, Gustavo Molfino

Legenda da foto, Vários "voos da morte" teriam decolado desta pistabet365 ganhar 200 reaisCampobet365 ganhar 200 reaisMayo,bet365 ganhar 200 reaisBuenos Aires

No Megacaso da ESMA, para além dos abusos, torturas, furtosbet365 ganhar 200 reaisbebês e homicídios, foi também possível comprovar a existência da organização dos "voos da morte".

Eles aconteciambet365 ganhar 200 reaisuma a duas vezes por semana, principalmente entre 1976 e 1977. Um grupobet365 ganhar 200 reaisrefénsbet365 ganhar 200 reais25 a 30 pessoas, cada uma delas meticulosamente selecionada, era conduzido para uma sala isolada da ESMA.

Lá, as pessoas recebiam injeções com uma substância — geralmente pentotal ou Ketalar — que as deixava sonolentas. Posteriormente, elas eram despidas.

E então eram transferidas por caminhão para o Aeroporto Metropolitano Jorge Newbery, da Cidadebet365 ganhar 200 reaisBuenos Aires, embarcadasbet365 ganhar 200 reaisum avião do Exército e depois,bet365 ganhar 200 reaispleno voo, atiradas no Rio da Prata ou no mar.

De todos os voos da ESMA — e acredita-se que tambémbet365 ganhar 200 reaisoutros centrosbet365 ganhar 200 reaisdetenção clandestinos — não há sobreviventes.

"Tivemos uma ideia disso porque um colega foi levado por engano e depois voltou. E ele contou isso", dissebet365 ganhar 200 reais2001 Miriam Lewin, jornalista e sobrevivente da ESMA,bet365 ganhar 200 reaisdepoimento do Arquivo Oral da Memória Aberta, partebet365 ganhar 200 reaisuma aliançabet365 ganhar 200 reaisorganizaçõesbet365 ganhar 200 reaisdireitos humanos na Argentina.

Vista da Cidadebet365 ganhar 200 reaisBuenos Aires a partir do Rio da Prata

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, As vítimas sequestradas pelo regime militar eram dopadas e jogadas com vida no rio ou no mar

Lewin se refere aos depoimentosbet365 ganhar 200 reaisEmilio Assales Bonazzola, vulgo "Tincho", que tinha 34 anos e fora sequestradobet365 ganhar 200 reaisjaneirobet365 ganhar 200 reais1977. Em seguida, também veio o depoimentobet365 ganhar 200 reaisLidia Batista, que tinha 36 anos, sequestradabet365 ganhar 200 reaisdezembrobet365 ganhar 200 reais1978.

Ambos foram detidos na ESMA e retirados dos voos. Quando foram devolvidos ao centro clandestino, contaram a seus colegas o que havia acontecido com eles. É provável que mais tarde tenham sido "transferidos" novamente. Os dois estão desaparecidos até hoje.

"Em geral, não queríamos ouvir muito sobre isso, (...) pensamos que talvez tivesse acontecido apenas daquela vez, que não era a forma geralbet365 ganhar 200 reaiseliminação", lembrou Lewin.

Mais detalhes arrepiantes

Alguns corpos destruídosbet365 ganhar 200 reaispessoas lançadasbet365 ganhar 200 reais"voos da morte" começaram a aparecer nas costas da Argentina e do Uruguai entre 1976 e 1977.

Em Buenos Aires, os cadáveres foram enterrados como NN, ou seja, sem nome, embora autópsias tenham revelado que a causa da morte erabet365 ganhar 200 reaiscolisão com objetos duros a partirbet365 ganhar 200 reaisuma grande altura.

Roberto León Dios, um dos forenses que realizou várias autópsias, morreu misteriosamente alguns meses depois.

Vista traseira do avião abandonadobet365 ganhar 200 reaisCampobet365 ganhar 200 reaisMayo

Crédito, Gustavo Molfino

Legenda da foto, Os "voos da morte" começaram a ser descobertos quando surgiram corpos nas costas da Argentina e do Uruguai
Janela internabet365 ganhar 200 reaisum dos aviões do Campobet365 ganhar 200 reaisMayo

Crédito, Gustavo Molfino

Legenda da foto, Não há sobreviventes dos "voos da morte"

Outras pessoas começaram a falar do surgimento dos corpos, como o jornalista e autor Rodolfo Walsh, quebet365 ganhar 200 reais24bet365 ganhar 200 reaismarçobet365 ganhar 200 reais1977, no aniversário do primeiro ano do governo militar, escreveu uma "Carta abertabet365 ganhar 200 reaisum escritor à Junta Militar" no qual denunciou esses fatos.

No dia seguinte, Walsh foi atingido por diversas balasbet365 ganhar 200 reaispleno centrobet365 ganhar 200 reaisBuenos Aires. Seu corpo desapareceu.

O primeiro depoimento dos militares indicando que existiam "voos da morte" foi oferecido pelo ex-tenente-comandante Adolfo Scilingobet365 ganhar 200 reaisuma declaração ao jornalista Horacio Verbitsky publicada no livro O Voobet365 ganhar 200 reais1995.

"Foi uma Força Armada que se organizou para levar a cabo a última partebet365 ganhar 200 reaisum plano sistemático, que é o homicídio", detalha Soiza Reilly, da força-tarefa do Megacaso da ESMA. "Os voos da morte não foram a única forma que os militares usaram na Argentina para assassinar, mas foram amplamente utilizados na maioria dos centrosbet365 ganhar 200 reaisextermínio."

'Comidabet365 ganhar 200 reaispeixes'

A Justiça argentina levou décadas para coletar os dados que se repetiambet365 ganhar 200 reaisrelatosbet365 ganhar 200 reaissobreviventes, ex-militares e testemunhas.

Avião abandonadobet365 ganhar 200 reaisCampobet365 ganhar 200 reaisMayo

Crédito, Gustavo Molfino

Legenda da foto, Os militares usavam eufemismos para falar sobre os voosbet365 ganhar 200 reaisque mataram pessoas. O mais conhecido era "transferência"

Esses depoimentos falavambet365 ganhar 200 reaisseringas, frascosbet365 ganhar 200 reaisremédios, vômitos, marcas no chãobet365 ganhar 200 reaiscorpos arrastados e dos eufemismos usados ​​pelos captores para se referir aos "voos da morte": "transferências", "vão ser comidabet365 ganhar 200 reaispeixe", "eles subiram" ou "as freiras voadoras" (em referência a duas freiras francesas, Alice Domond e Leonie Duquet, que foram sequestradas, torturadas e jogadas vivas no Rio da Pratabet365 ganhar 200 reaisum desses voos,bet365 ganhar 200 reais1977).

"Esses eufemismos significavam que algo estava acontecendo com as pessoas no ar", reflete o promotor.

'Os aviões da morte'

Ainda há muitas perguntas sem resposta.

Não se sabe quantos voos ocorreram, se se estenderam para alémbet365 ganhar 200 reais1977 e quantas pessoas foram jogadas dos aviões no rio e no mar.

"Nos tribunais só se comprovaram os casosbet365 ganhar 200 reaisque os corpos foram encontrados. E este fato não é tão real. No centro clandestinobet365 ganhar 200 reaisCampobet365 ganhar 200 reaisMayo, passaram entre 3 mil e 4 mil vítimas, dizem, e há pouquíssimos sobreviventes. A maioria está desaparecida e há poucas descobertasbet365 ganhar 200 reaiscorpos", explica Soiza Reilly.

Cabinebet365 ganhar 200 reaisum dos aviões dos "vôos da morte"

Crédito, Gustavo Molfino

Legenda da foto, No caso dos "voos da morte", estão sendo julgados os ex-chefes do 601º Batalhãobet365 ganhar 200 reaisAviação ebet365 ganhar 200 reaisresponsabilidade pelo desaparecimentobet365 ganhar 200 reaisquatro pessoas

No novo julgamentobet365 ganhar 200 reaisum tribunalbet365 ganhar 200 reaisSan Martín, iniciadobet365 ganhar 200 reaisoutubrobet365 ganhar 200 reais2020, os réus são Santiago Omar Riveros, ex-chefe dos Institutos Militares do Campobet365 ganhar 200 reaisMayo, e quatrobet365 ganhar 200 reaisseus subordinados: Luis del Valle Arce, ex-comandante do Batalhãobet365 ganhar 200 reaisAviação 601; seu segundo oficial, Delsis Ángel Malacalza; o ex-oficialbet365 ganhar 200 reaisoperações Eduardo María Lance; e o então oficialbet365 ganhar 200 reaispessoal Horacio Alberto Conditi.

Eles são acusados ​​de sequestro e torturabet365 ganhar 200 reaisquatro pessoas na base militarbet365 ganhar 200 reaisCampobet365 ganhar 200 reaisMayo, que posteriormente desaparecerambet365 ganhar 200 reais"voos mortais".

As vítimas são Rosa Eugenia Novillo Corvalán, sequestrada entre outubro e novembrobet365 ganhar 200 reais1976 e cujo corpo foi encontrado no litoral da provínciabet365 ganhar 200 reaisBuenos Airesbet365 ganhar 200 reaisdezembro daquele ano; e Roberto Ramón Arancibia, sequestradobet365 ganhar 200 reaismaiobet365 ganhar 200 reais1977, com seu corpo recuperadobet365 ganhar 200 reaisfevereirobet365 ganhar 200 reais1978, também na costabet365 ganhar 200 reaisBuenos Aires.

Adrián Enrique Accrescimbeni e Juan Carlos Rosace foram privadosbet365 ganhar 200 reaisliberdadebet365 ganhar 200 reaisnovembrobet365 ganhar 200 reais1976 e seus corpos foram encontrados às margens do Rio da Pratabet365 ganhar 200 reaisdezembro daquele ano.

"Neste caso vamos provar a existência dos voos (de morte) no Campobet365 ganhar 200 reaisMayo, abet365 ganhar 200 reaismecânica e as suas operações, e como este batalhãobet365 ganhar 200 reaisoperações forneceu aviões à força-tarefa que ali trabalhava para fazer a prática mortal", diz o promotor.

Ao contrário dos voos militares que partiam no final da décadabet365 ganhar 200 reais1970 do Aeroparque Jorge Newbery ou do aeroporto internacionalbet365 ganhar 200 reaisEzeiza, o 601º Batalhãobet365 ganhar 200 reaisAviaçãobet365 ganhar 200 reaisCampobet365 ganhar 200 reaisMayo possuía pistabet365 ganhar 200 reaispouso própria, o que facilitava viagens a qualquer hora sem chamar atenção.

Promotores e integrantes da investigação sabiam que no Campobet365 ganhar 200 reaisMayo havia aviõesbet365 ganhar 200 reaisdesuso e que alguns poderiam ter protagonizado "os voos da morte". Mas quando eles fizeram uma inspeçãobet365 ganhar 200 reaisdezembro passado, eles ainda assim ficaram surpresos.

Dois dos aviões que foram usados ​​para despejar pessoas no rio e no mar há maisbet365 ganhar 200 reais40 anos ainda estavam lá, abandonados, mas impregnadosbet365 ganhar 200 reaishistória.

São o Twin Otter com registro AE-106 e Fiat G-222 com registro AE-260, AE261 e AE-262.

Avião abandonadobet365 ganhar 200 reaisCampobet365 ganhar 200 reaisMayo

Crédito, Gustavo Molfino

Legenda da foto, "Os voos da morte" foram a última partebet365 ganhar 200 reaisum ciclo repressivo que tinha como característica o desaparecimentobet365 ganhar 200 reaispessoas

"Em 1977, o exército trouxe aviões Fiat G222 da Itália e hoje eles estão abandonados no Campobet365 ganhar 200 reaisMayo. São os aviões da morte. Fizemos uma inspeção e subimos nos aviões da morte", detalha Soiza Reilly.

Este modelobet365 ganhar 200 reaisaeronave tem a particularidadebet365 ganhar 200 reaispossuir portasbet365 ganhar 200 reaiscorrerbet365 ganhar 200 reaisambos os lados da fuselagem, que podem ser utilizadas para o lançamentobet365 ganhar 200 reaispára-quedistas.

Mas nos "voos da morte" eles as usavam para jogar pessoas.

Haverá justiça?

"Acho que sim", diz Soiza Reilly, que acredita que a sentença será conhecida no finalbet365 ganhar 200 reais2021.

"A Argentina é muito pró-ativabet365 ganhar 200 reaismatériabet365 ganhar 200 reaisdireitos humanos e nunca ficoubet365 ganhar 200 reaisbraços cruzados. Do Ministério Público temos provas suficientes para que os responsáveis ​​recebam a pena pelo que fizeram", afirma.

O procurador afirma que todas essas estruturas militares funcionavam como parte uma grande engrenagem, onde cada um cumpria abet365 ganhar 200 reaisfunção. A Aeronáutica cumpriu seu papelbet365 ganhar 200 reaiscolaborar com a eliminação final das vítimas por meio do usobet365 ganhar 200 reaisaviões.

"Se entendemos essa sequência, esse é o plano sistemáticobet365 ganhar 200 reaisrepressão", diz.

Monumentobet365 ganhar 200 reaisfrente ao Parquebet365 ganhar 200 reaisla Memoria nas margens do Rio da Prata, Buenos Aires.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, A justiça argentina busca lidar com maisbet365 ganhar 200 reais40 anosbet365 ganhar 200 reaisimpunidade

A pesquisadora do Conicet, Valentina Salvi, concorda que o caminho dos tribunais é o mais claro e contundentebet365 ganhar 200 reaistermosbet365 ganhar 200 reaisreparação às vítimas ebet365 ganhar 200 reaisconstruçãobet365 ganhar 200 reaisuma verdade no país.

"Os voos da morte foram os mais secretos (do regime militar)", afirma.

"Na Argentina foram anosbet365 ganhar 200 reaisimpunidade. Existe uma grande dívida política e ética", conclui Salvi.

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