5 argumentosTrump para chamar a China'inimiga' - e o que háverdade nisso:
As relações entre Washington e Pequim não têm sido fáceis. As duas maiores economias do mundo têm dominado o comércio mundial nos últimos anos.
Mas nem por isso todo mundo concorda com algumas das críticasTrump, incluindoteoriaque o aquecimento global é um ardil criado pelas autoridades chineses para afetar a competitividade da indústria americana.
Para Mike Rosenberg, professorgestão estratégica da UniversidadeNavarra (Espanha), Estados Unidos e China são rivais, mas não inimigos, como Trump argumenta.
"Do pontovista geopolítico, nos últimos 50 ou 60 anos, os Estados Unidos se envolveram ativamente nas economiasJapão, Filipinas e outros países do Sudeste Asiático, que os chineses veem comoáreainfluência", explica o acadêmico à BBC Mundo, o serviçoespanhol da BBC.
Pequim se sentiria, então, por vezes intimidada por Washington.
Um sentimento que não é arrefecido pelas posições do novo presidente dos Estados Unidos. Na segunda-feira, o jornal estatal China Daily criticou comentários feitos por Trump sobre a política da "China unificada" - a recusaPequimaceitar a independênciaTaiwan.
Em um editorial, o jornal indicou que o governo chinês será forçado a adotar uma postura mais agressiva caso Trump não mudepostura.
O texto dizia que Trump "está brincando com fogo" ao comentar os acenos diplomáticos que Trump fez a Taiwan desde a eleiçãonovembro. Ele teria quebrado um protocolodécadas entre os dois países,que Washington tem vínculos formais com a ChinavezTaiwan, considerada por Pequim uma província separatista.
No sábado, um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lu Kang, disse que a política da "China unificada" não é negociável.
Mas quais são os principais argumentosTrump para colocar a China como "inimiga" dos Estados Unidos? Confira a seguir:
1. A China "roubou" empregos dos americanos
No início2016, pesquisadores do InstitutoTecnologiaMassachusetts (MIT) publicaram um estudoque analisaram as relações comerciais entre Estados Unidos e China, fortalecidas nos anos 90 e consolidadas por um acordo junto à Organização Mundial do Comércio (OMC),2001.
Os autoresO Choque da China concluíram que essa relação "afetou dramaticamente um grande númeroindústrias que empregavam muita mãoobra nos Estados Unidos".
"Nesses setores, os postostrabalho moveram-semassa para a China", escreveram os pesquisadores.
"Quando os empregos desapareceram, os trabalhadores mais bem preparados puderam se recuperar, mas muitos não conseguiram, e comunidades inteiras foram castigadas economicamente."
Um dos responsáveis pelo estudo, o economista David Autor, admite que o comércio também cria empregos, mas apresenta números que reforçam a visão negativa do processo.
"Entre 1999 e 2011, o crescimento das importações americanas da China custaram ao país cerca2,4 milhõespostostrabalho".
"Certamente o comércio contribui para reduzir os preçoscertos produtos e serviços, o que reduz o custovida. Mas, para os trabalhadores que perderam seus empregos, o fatoas coisas serem 10% mais baratas não é suficiente para compensar", afirma Autor.
Trump prometeu durante a campanha que puniria empresas americanas que transferissem postostrabalho para a China.
"Os chineses estão usando o nosso país para reconstruir o deles. Temos que impedir que roubem nossos empregos", disse o bilionáriosetembro, durante um dos debates presidenciais.
O republicano também ameaçou impor taxaçãoaté 45% sobre produtos chineses, na esperançarecuperar postos perdidos para a China.
"Economistas já disseram que isso não é uma meta plausível, pois muitos processosmanufatura estão ficando cada vez mais automatizados", explica,um artigo intitulado A feia verdade sobre as políticasDonald Trump para a China, Sara Hsu, colunista da revistaeconomia e negócios Forbes.
"A redesupermercados Walmart tentou fazer isso (repatriar a produção), mas se viu incapazfabricar produtos com os mesmos baixos custos quando usou mãoobra americana, e se viu forçada a mecanizar a produção", escreve Hsu.
De acordo com a colunista, o aumentotarifas resultará um aumentopreçosconsumo e o impacto dna geraçãoempregos será pequeno.
Para Mike Rosenberg, está claro que a China aproveitou as oportunidades oferecidas pela globalização.
"Creio que as empresas americanas são as principais culpadasbuscar mãoobra mais barata na China".
Ele diz ainda que o eleitorado que votouTrump acreditando na promessa do retornoempregos "não sabe que as fábricas que saírem da China não voltarão aos Estados Unidos".
"O custo da mãoobra nos Estados Unidos torna impossível fabricar muitos produtos lá."
2. A China está 'violentando' os EUA com suas exportações baratas
Na campanha eleitoral, Trump disse que a China era responsável pelo "maior roubo da história mundial".
Acusou o país asiático"violentar" os Estados Unidos com suas exportações baratas.
No mês passado,entrevista à BBC, o ministo das Finanças da China, Shi Yaobin, disse que os benefícios foram mútuos para os dois países.
"China e Estados Unidos têm imensos intercâmbios econômicos, que produziram benefícios tangíveis para os povos dos dois países. Esses benefícios deveriam ser reconhecidos pelo presidente."
Para Mike Rosenberg, tanto China quanto Estados Unidos "fazem o que têmfazer".
"A políticaexportações da China tem toda a lógica do mundo para os chineses. Faz sentido também que os Estados Unidos não tenham posto barreiras contra produtos chineses, pois um mundo com livre comércio beneficia a todos, sobretudo os Estados Unidos", explica Rosenberg.
3. 'A China manipula seu câmbio'
Outra acusaçãoTrump é que a China desvaloriza deliberadamentemoeda, o yuan, para derrubar os preços globais das exportações.
"Essa acusação tem sido fontedebate há anos, mas economistas indicam que a taxacâmbio nominal é muito menos importante que a taxacâmbio real, que reflete mãoobra, tecnologia e outros custosprodução", diz Susan Hsu.
E o colunista do jornal New York Times,Neil Gough, que escreve sobre economia chinesa, ressalta que Pequim está fazendo justamente o contrário.
"A China gastou centenasbilhõesdólaressuas reservas internacionais para apoiar o valorsua moeda e evitar que se debilite mais drasticamente", escreveu Gough,setembro.
No entanto,agosto2015, as autoridades chinesas adotaram uma política monetária que derrubou o valor do yuan e provocou pânico nos mercados. E uma das consequências mais imediatas foi o aumento da competitividade das exportações chinesas.
4. A balança comercial entre os dois países desfavorece os EUA
Os ataquesTrump à China são motivados pelo argumentoque o comércio entre os dois países desfavorece os Estados Unidos.
Mas o desequilíbrio na balança comercial, que Trump classifica como negativo para os Estados Unidos, também reflete, segundo Sara Hsu, "um maior consumo dos Estados Unidos, cujo PIB per capita é sete vezes superior ao da China".
De acordo com o Banco Mundial, o PIB per capita americano émais US$ 56 mil, ao passo que o chinês é estimadocercaUS$ 8 mil.
Na China, estima-se que cerca120 milhõespessoas, o que equivale a quase 40% da população americana, vivam abaixo da linhapobreza (menosUS$1 por dia).
Mas os números da balança comercial não contradizem Trump. De acordo com o Escritório do Censo Americano, as exportações dos Estados Unidos para a China contabilizaram US$ 104,1 bilhões entre janeiro e novembro2016, enquanto as exportações chinesas atingiram US$ 423,4 bilhões.
Ou seja: houve déficit comercialUS$ 319,2 bilhões.
5. O 'guru' Navarro
Em 22dezembro, Trump anunciou Peter Navarro para chefiar o recém-criado Conselho NacionalComércio.
Professoreconomia da Universidade da Califórnia, Navarro é uma figura influente no pensamento econômicoTrump.
Doutor pela Universidade Harvard, ele é autordois livros sobre a potência asiática. Um deles, Morte pela China, virou até um documentário,que o narrador pede um boicote aos produtos chineses para "defender os Estados Unidos e proteger suas famílias".
Em maio do ano passado, Navarro disse haver cada vez mais sinais da proximidadeum colapso econômico da China e acusou o paíssubsidiar ilegalmente exportações, roubar propriedade intelectual e explorar trabalhadores.
Meses mais tarde, afirmou que o acesso da China à OMC debilitou a base industrial americana e "nossa capacidadenos defendermos e a nossos aliados".
Mark Wu, da Escola da DireitoHarvard, disse à BBC Mundo que não estáacordo com as táticasTrump, mas corrobora alguns dos argumentos do presidente - eNavarro - no que diz respeito a problemas comerciais enfrentados pelos Estados Unidos no comércio com a China.
"Eles incluem subsídios da China a certos setores, e o dumping no exterior do seu excedenteprodutos siderúrgicos e a imposiçãorestrições à exportaçãocertas matérias primas. Isso beneficia os produtores chinesesdetrimento das empresas e trabalhadores americanos".