Léa Campos, a mineira que enfrentou proibição na ditadura para se tornar 1ª árbitraas betfutebol do Brasil:as bet

Lea Camposas betfrente ao gol

Crédito, Museu do Futebol

Legenda da foto, Léa Campos foi uma das primeiras mulheres árbitrasas betfutebol do mundo. Ela precisou lutar pelo direitoas bettrabalhar

O Brasil era um dos muitos países onde o futebol feminino era proibido, assim como a Inglaterra. Uma lei aprovadaas bet1941 proibia que as mulheres brasileiras praticassem diversos esportes. Havelange - presidente da CBD desde 1958 - acreditava que a proibição também se aplicava à arbitragem. Léa Campos conta que ele deixouas betposição muito clara.

"Primeiro, Havelange me disse que o corpo da mulher não é adequado para arbitrar jogosas bethomens", contou Léa, agora com 77 anos, à BBC Sport. "Depois ele disse coisas como (que) ter períodos menstruais dificultaria minha vida. E terminou insistindo que não haveria mulheres na arbitragem enquanto ele estivesse no cargo."

E não foi a primeira vez que Léa batalhou para trabalhar no seu esporte do coração.

Lea Campos posa com timeas bethomens

Crédito, Museu do Futebol

Legenda da foto, Foto tiradaas betSão Paulo mostra Léa Campos com a bola, pronta para arbitrar o jogo

Dos concursosas betbeleza para o campoas betjogo

Léa Campos nasceuas bet1945, na pequena cidade mineiraas betAbaeté, a 200 kmas betBelo Horizonte. Ela começou a se interessar por futebol muito cedo e se lembra com orgulhoas betjogar com bolasas betmeia improvisadas. Léa sempre enfrentou a desaprovaçãoas bettodos os lados.

"Sempre tentei jogar futebol com os meninos na escola, mas os professores me interrompiam e diziam que não era adequado", relembra ela. "Os meus pais também diziam que não era coisa para meninas."

Para afastá-la do futebol, a mãe e o paias betLéa começaram a inscrevê-laas betconcursosas betbeleza. Ela costumava ganhar todos - e, ironicamente, uma das suas vitóriasas bet1966 acabou por ajudá-la a conseguir um emprego como relações públicas do time do Cruzeiro.

Léa Campos viajou com a equipe por todo o país e seu interesse pelo futebol se reacendeu, até que ela se deu contaas betque talvez pudesse participar do jogo, afinal - masas betoutra forma.

Lea Campos conversa com jogadores no campo

Crédito, Museu do Futebol

Legenda da foto, Léa Campos passou anos defendendo mudanças na legislação esportiva brasileira

"Se eu tentasse jogar, seria quase impossível conseguir apoio para a causa, já que era contra a lei naquela época", relembra ela. "Mas ser árbitra era uma formaas betentrar no jogo. Não havia nada específico na legislação contra isso. As mulheres foram proibidasas betchutar a bola, mas a lei não mencionava soprar apitos."

Teria sido a primeira do mundo?

Em 1967, Léa inscreveu-seas betum cursoas betarbitragemas betoito meses e foi aprovadaas betagosto. Mas ela pode não ter sido a primeira mulher do mundo a realizar esse feito. Identificar a primeira mulher árbitraas betfutebol é uma tarefa mais difícil do que parece.

Em 2018, a imprensa noticiou que a Fifa teria reconhecido a turca Drahsan Arda como a primeira mulher árbitraas betfutebol da história,as betcorrespondência enviada para ela. Arda recebeuas betlicençaas betarbitragemas betnovembroas bet1967 e apitouas betprimeira partidaas betjunhoas bet1968. Ela enviou os documentosas betcomprovação para a Fifa e recebeu uma resposta, que a entidade afirma ter sido mal interpretada. A carta teria simplesmente reconhecido que ela foi uma das primeiras mulheres árbitrasas betfutebol.

Outra candidata que chamou a atenção recentemente é a sueca Ingrid Holmgren, que se acredita ter sido credenciadaas bet1966. E existe ainda a austríaca Edith Klinger, que se acredita tenha trabalhado como árbitraas bet1935.

A Fifa não é capazas betconfirmar com certeza quem foi a primeira, mas reconhece a importânciaas betpesquisar essa questão e diz que está disposta a ajudaras betinvestigações mais profundas.

O que se pode afirmar sem sombraas betdúvidas é que Léa Campos foi uma das primeiras. Mas a aprovação no cursoas betarbitragem foi apenas o começoas betuma longa batalha contra o patriarcado da CBD. Depoisas betterminar seus estudos, a entidade se recusou a concederas betlicença, alegando que a legislação que proibia as mulheresas betjogar futebol no Brasil também proibia que elas atuassem na arbitragem.

"Procurei assistência jurídica e me garantiram que não havia nada na lei que fizesse essa distinção", conta ela. "Mas as autoridades não queriam ouvir."

Seguiram-se anosas betdefesa do seu caso junto à CBD e João Havelange. Ela tentou obter apoio organizando jogos amistosos que ela pudesse apitar, alguns disputados por mulheres e frequentemente interrompidos pela polícia. Em temposas betsevera repressão no Brasil, essa "dissidência" não era menosprezada. Léa afirma que foi presa "pelo menos 15 vezes".

Até que,as bet1971, ela recebeu uma carta que lhe deu mais energia para lutar pelaas betcausa: um convite para participar da Copa do Mundoas betFutebol Feminino, um torneio não oficial que se realizaria no México. Ela não queria perder essa oportunidade, mas, para isso, precisava passar por Havelange - até então, um obstáculo intransponível.

O único caminho seria recorrer a alguém superior a ele. E, pela segunda vez, o passadoas betLéa nos concursosas betbeleza veio ao seu auxílio.

Lea Campos desfilaas betcarro aberto dirigido por militar

Crédito, Museu do Futebol

Legenda da foto, Léa Campos quando foi coroada "Rainha do Exército", no seu Estado-natalas betMinas Gerais

A audiência com o presidente - e a surpresa

Um dos diversos concursosas betbeleza vencidos por Léaas betMinas Gerais foi oas bet"Rainha do Exército". Ela pediu a um comandante local que a ajudasse a conseguir uma audiência com o presidente Médici, que estava por visitar a capital mineira.

Ela conseguiu três minutos. E disse ao presidenteas betBelo Horizonte que precisava que ele anulasse a decisãoas betHavelange.

"Médici olhou para mim e disse que gostariaas betse reunir comigo no palácioas betBrasília, dentroas betdois dias", conta Léa. "Nem preciso dizer que eu estava apavorada. Nós vivíamos uma ditadura e eu estava desafiando o sistema. Cheguei a pensar que seria presa ou que 'desapareceria'".

Léa Campos voou para Brasília e foi recebida para o almoço com Médici. Paraas betsurpresa, ele entregou a ela uma carta pedindo a Havelange que emitisseas betlicençaas betarbitragem. O general também fez uma revelação surpreendente: Léa tinha admiradores no círculo familiar do presidente.

"Um dos filhosas betMédici acompanhava minha carreira com muito interesse e tinha até um livroas betrecortes com fotografias e artigosas betjornais sobre mim", ela conta. "A coleção dele era até maior que a minha!"

Essa deve ter sido a razão pela qual Médici concordouas betsobrepor-se a Havelange. De qualquer forma, nem mesmo o futuro presidente da Fifa ousaria questionar as ordens do presidente da República. Em julhoas bet1971, Havelange convocou uma entrevista coletiva e afirmou que, após "uma mudançaas betopinião", Léa Campos seria autorizada a trabalhar como árbitra.

"Ele fez até um discurso para a imprensa contando que tinha a honraas betanunciar que o Brasil teria a primeira mulher árbitra do mundo e que isso estava acontecendo no mandato dele", relembra Léa.

Algumas semanas mais tarde, Léa viajou para atuar como árbitra na Copa do Mundo Feminina, mas infelizmente sofreu com a altitude da Cidade do México e não chegou a apitar. Ao voltar para casa, ela estava finalmente autorizada a fazer seu trabalho - masas betlicença não a protegeu do preconceito.

Lea Campos sorrindoas betárea externa

Crédito, Museu do Futebol

Legenda da foto, A históriaas betLéa Campos foi contadaas bet2019, na exposição "O Museu do Impedimento", com curadoria conjunta da Google Arts & Culture e do Museu do Futebolas betSão Paulo

A carreira no apito

Léa Campos apitou 98 partidas - a maior parteas betdivisões inferiores,as betvárias partes do Brasil. Nesses jogos, a presençaas betuma mulher árbitra era anunciada como uma espécieas betatração exótica.

A intimidação e a discriminação sexual foram presença constante no seu trabalho. Uma das charges publicadasas betjornal sugeria que jogadores ficariam excitados com uma mulher árbitra.

Ela relembra uma partida entre jogadores sub-23 - o clássico mineiro Cruzeiro x Atlético -as bet1972: "antes do jogo, um diretor do Atlético chegou pertoas betmim e levantou a camisa. Pude ver que ele tinha uma arma."

"O Cruzeiro ganhouas bet4 a 0. Depois do jogo, eu vi o mesmo homem no túnel. Perguntei se ele ainda queria atiraras betmim. Mas ele me deu um abraço e disse que eu tinha apitado bem", ela conta.

No geral, Léa Campos conta que não era tratadaas betforma diferente dos árbitros homens. "Sim, às vezes os jogadores ficavam com um poucoas betraiva", relembra ela. "Houve um que se recusou a deixar o gramado quando o expulsei. Mas,as betoutras ocasiões, os jogadores repreendiam uns aos outros quando falavam palavrões na minha frente. Na maior parte do tempo, eu me sentia muito respeitada."

E ela era feliz - até que veio um acidente horrível, que mudou aas betvida.

Lea Camposas betfoto dentroas betsala, mais atual

Crédito, Google Offside Museum

Legenda da foto, Léa Campos agora vive nos Estados Unidos -as betcasa desde os anos 1990

O acidente e a mudança

Em 1974, Léa Campos estava viajandoas betum ônibus que bateu na traseiraas betum caminhão. Ela sofreu lesões horríveis naas betperna esquerda, que por pouco não precisou ser amputada. E, para dar mais um toqueas betironia ao caso, João Havelange era diretor-presidente da Viação Cometa, a empresa a que pertencia o ônibusas betque ela viajava.

Léa passou por maisas bet100 cirurgias e ficou dois anosas betuma cadeiraas betrodas. Parte do seu tratamento foi realizadoas betNova York, nos Estados Unidos, onde ela conheceu o jornalista esportivo colombiano Luís Eduardo Medina, com quem se casaria nos anos 1990, quando se mudou para os Estados Unidos.

Lá, ela reinventouas betvida como confeiteira e teve muito sucesso entre a comunidade brasileira da regiãoas betNova York e Nova Jersey. Nos últimos anos,as betsaúde deteriorou-se e ela teve dois ataques cardíacos.

Mas a época mais difícil veioas betmaioas bet2020, com a pandemiaas betcovid-19: seu marido perdeu o emprego e o casal enfrentou sérias dificuldades financeiras. A situação chegou a um pontoas betque eles perderamas betcasa e precisaram passar a morar com um amigo.

Foi quando uma campanhaas betarrecadação entre os árbitros brasileiros juntou dinheiro suficiente para que Léa e seu marido alugassem um apartamentoas betNova Jersey. No momento, eles estão resistindo às dificuldades.

"Foi bonito o que eles fizeram e estou muito agradecida", afirma Léa. "Eles me fizeram ver que toda a minha luta não foias betvão e que consegui deixar um legado."

Ela fala com orgulho quando observa como as mulheres árbitras estão avançando no futebol. Léa deu um "soco no ar" quando a árbitra francesa Stéphanie Frappart tornou-se a primeira mulher a apitar uma partida da Champions League masculinaas bet2020.

"Acho que o sucessoas betStéphanie foi uma vitória para mim também", afirma ela. "Percebi que tudo aquilo por que passei valeu a pena. Eu me senti como uma árvore velha que ainda podia dar frutos."

Léa também afirma que o feito históricoas betFrappart demorou muito para vir. As mulheres árbitras avançaram muito desde os anos 1970, mas ela acredita que ainda existe muito preconceito.

"Por que nunca houve uma mulher apitando uma partidaas betCopa do Mundo masculina?", pergunta ela. "Eu realmente esperava que as coisas tivessem evoluído um pouco mais. Homens e mulheres passam pelo mesmo rigor no treinamentoas betarbitragem. Por que a distinção? É ridículo!"

Línea

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