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Alzheimer, um recomeço? Três histórias surpreendentes sobre a demência:motion bet
Especialistas alertam que a pandemiamotion betcovid-19 vai acelerar uma epidemiamotion betdemência que já existe hoje no mundo. A notícia preocupa, mas entre profissionaismotion betsaúde, pacientes e familiares, cada vez mais pessoas vêm propondo que busquemos formas diferentesmotion betpensar a doença. Não como o fim, mas como um possível recomeço.
Nesta reportagem, três mulheres cujas mães viveram ou vivem hoje com demência e uma médica geriatra compartilham visões sobre a doença que podem surpreender muita gente.
"Quando você recebe um diagnósticomotion betdemênciamotion betum ente querido seu, parece que tudo acabou", diz a geriatra Celene Pinheiro. "Só que nem sempre é assim."
"Foram os melhores anos da vida dela e os melhores anos dela comigo", diz Denise.
Ao compartilhar suas histórias e reflexões, as entrevistadas vão também oferecendo suas respostas para questões comuns entre pessoas afetadas pela demência.
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Como cuidar bemmotion betalguém que tem demência? Colocar um ente querido com demênciamotion betcasamotion betrepouso é abandoná-lo? Como o idoso com demência pode ser incluído na sociedade e quem se beneficia com isso? Até que ponto no desenvolvimento da demência a pessoa é capazmotion betse sentir amada ou hostilizada?
E quando aceitam fazer seus depoimentos, as mulheres (e sim, é sobre elas que recai, na grande maioria dos casos, a responsabilidademotion betcuidar) expressam um desejomotion betcomum: contribuir para que a sociedade conviva melhor com uma doença que, segundo a Organização Mundialmotion betSaúde (OMS), afeta hoje 50 milhõesmotion betpessoas no mundo e deve afetar maismotion bet150 milhõesmotion bet2050.
Denise e Eneide - Alzheimer, um recomeço?
Denise Marques tem 54 anos e é terapeuta. Sua mãe, Eneide Marques Cavalcante, recebeu o diagnósticomotion betdoençamotion betAlzheimermotion betjaneiromotion bet2015 e faleceumotion betdezembromotion bet2019 aos 85 anos.
"A minha mãe teve Alzheimer, é uma doença que quando a gente ouve a respeito, assusta. Mas eu aprendi que o Alzheimer não é terrível como falam."
Eneide tinha uma deficiência: ela nasceu sem a cabeça do fêmur, o maior osso da perna.
"Minha mãe foi criada pelos meus avós com muito amor, carinho e cuidado, devido à deficiência dela. E aí eu imagino o choque que ela teve quando se viu num casamento totalmente abusivo. E ela não conseguia sair porque meu pai ameaçava que se ela se separasse ele mataria todos nós — eu, minha mãe e meus avós."
No relatomotion betDenise, o horror da violência doméstica vivenciada por ela e outros familiares momentaneamente toma lugar central na narrativa.
"Quando meu pai chegavamotion betcasa, já estava todo mundo tremendo. De que jeito ele ia chegar? Ele voltava alcoolizado, uma força, entortava a torneira, arrebentava a geladeira. Era uma coisa muito violenta."
Mais adiante, veremos que, sobre o panomotion betfundo dos 35 anosmotion betabuso físico e psicológico que Eneide viveu, a doençamotion betAlzheimer que ela desenvolve terá um papel singular emmotion betvida — e namotion betsua filha.
Denise conta que seu pai morreumotion betjaneiromotion bet1997, mas a mãe nunca se recuperou da violência que sofreu e começou a fazer tratamento para depressão. Episódios estranhos, como aquelemotion betque Eneide entra na contramãomotion betuma rua movimentadamotion betCampinas e depois não se lembra do que fez (episódio descrito no início dessa reportagem), são para Denise um prenúncio do que estava por vir.
"Eu entendo que o Alzheimer é uma doença muito sorrateira, silenciosa", diz.
Dez anos mais tarde, Eneide tornou-se paciente da geriatra Celene Pinheiro.
"Eu conheci e acompanhei a dona Eneide por pelo menos dez, doze anos", diz a médica. "E uma coisa que chamava muito a atenção no relacionamento das duas é que ambas se tratavam muito mal."
"Quando elas chegavam à clínica, nesse relacionamento conflituoso — a filha falava às vezesmotion betforma ríspida com a mãe — as minhas secretárias já vinham: 'doutora, nossa, como ela trata mal a mãe! Coitada da nona Eneide!'. E eu falava: 'gente, calma. A gente não deve julgar. A gente deve ouvir. E entender o cenário onde essa relação se construiu.' E foi o que acabou acontecendo", conta Celene.
Em seu depoimento, Denise oferece pistas sobre como era o relacionamento com a mãe: "A Eneide que eu conhecia era extremamente rígida. Eu a chamavamotion betgeneral."
"Quando eu comecei o relacionamento com minha namorada, a minha mãe não aceitoumotion betjeito nenhum", ela recorda. "Ficou muito indignada e não permitia que eu conversasse com ela sobre isso."
De repente, a relação entre mãe e filha se transforma, conta Celene.
"Quando ela (Denise) leva (Eneide) para a instituição, e a demência da dona Eneide avança mais um pouquinho, a hora que eu vejo, as duas começam a se relacionarmotion betuma forma leve, bem humorada, alegre, afetuosa. Um afeto muito grande da Denise para com a Eneide."
A médica conta que não entendia o que estava acontecendo. Até que, um dia, quando visitavamotion betpaciente na clínicamotion betrepouso, Denise lhe faloumotion betseu relacionamento, e da recusa da mãemotion betaceitar a homossexualidade da filha.
Mas o Alzheimer mudaria tudo isso.
"Quando a dona Eneide desenvolve a demência, essas convenções sociais caem por terra", conta Celene. "E ela começa a dar espaço para essa aproximação que, eu acho, a Denise desejava tanto."
Dois anos após a mortemotion betEneide,motion betentrevista por Zoom à BBC News Brasil, Denise ri, maravilhada, ao recordar os últimos quatro anos na vida da mãe. Não ficou nada mal resolvido, diz.
"Quando a minha mãe chegou nesse nível maior do Alzheimer, virou a chavinha. Como se essa couraça que ela desenvolveu para se protegermotion bettanto sofrimento na vida tivesse caído, vindo abaixo."
"E aí foram os melhores anos da minha mãe, e os melhores anos meus com ela. Conheci aquela mulher alegre, risonha, que fazia todo mundo sorrir. Carinhosa, abraçava, beijava. Foi uma coisa incrível. Eu vejo que o Alzheimer deu para a minha mãe e para mim uma oportunidademotion beta gente fazer um resgate. Foi uma história linda."
Os efeitos inesperados da demência
Na experiênciamotion betEneide, a doençamotion betAlzheimer não apagou apenas regras e convenções sociais. A demência fez também o que anosmotion betterapia e medicamentos não tinham conseguido fazer: eliminou da memóriamotion betEneidemotion betexperiência traumáticamotion betviolência.
"No caso da Eneide, a demência foi um presente, porque ela pôde apagar essa memória muito triste e pôde voltar a ser a pessoa alegre que ela era antes", reflete Celene. Mas, infelizmente, não é assim para todos, diz a médica.
"Eu conheço uma senhora que até hoje repete: 'não bate na criança'. Porque o marido dela era muito violento com os filhos. Até hoje ela verbaliza isso: 'Ai, coitadinha, não bate.' Tem pessoas que ficam com essas recordações por terem um valor afetivo muito grande."
Lígia e Áurea - Levar pessoa com demência para a instituição é abandonar?
A donamotion betcasa Lígia Galli tem 59 anos. Sua mãe, Áurea Moraes Galli, tem 81 anos e recebeu o diagnósticomotion betdemênciamotion bet2012. Desde então, Áurea vivemotion betuma instituiçãomotion betlonga permanência (ILPI).
"Minha mãe sempre foi uma pessoa ativa, prestimosa com a casa, com os cuidados com os filhos. Fazia tricô, crochê, bordado. Ela cozinhava extremamente bem, fazia pinturas a óleo lindíssimas", conta Lígia.
"Então eu notei muita diferença, retomando, após a morte do meu pai. Quando eu ia visitá-la, a casa estava muito suja, muito largada, com um cheiro ruim, comida estragada na geladeira. Era uma coisa que chocava a mim porque minha mãe não passava nem pertomotion betum tipomotion betcomportamento assim."
Logo, Lígia percebe que a mãe não pode mais viver sozinha. Seu depoimento nos remete a um dilema quase universal entre pessoas afetadas pela demência: cuidarmotion betcasa ou levar para uma ILPI?
"Várias pessoas falarammotion betcolocar minha mãe numa clínica, mas para mim, naquele momento, aquilo era impensável. Aquela ideiamotion betque a gente vai abandonar o idoso, largar aos cuidadosmotion betestranhos", diz.
Lígia decide levar a mãe para morar com elamotion betIndaiatuba, interiormotion betSão Paulo. Ela conta que, no começo,motion betfilha, que tinha 7 anosmotion betidade, achava certas situações engraçadas.
"Porque minha mãe ainda mantinha um bom humor", lembra. "Com piadas, com coisas engraçadas, que começaram a ser misturadas com momentosmotion betraiva, mau humor, desespero,motion betfalar sozinha,motion bettirar a fralda e guardar as fezesmotion betgaveta."
"Começou um drama muito grande", lembra Lígia. De um lado, a filha, aos prantos. De outro, uma mãe que agora precisavamotion betatenção 24 horas por dia.
"E quanto mais difícil a situação ficava, mais eu achava que tinhamotion betser capazmotion betcuidar", lembra.
Para ter um poucomotion betdescanso, Lígia começa a levar Áurea para passar o diamotion betuma clínica.
"Quando eu chegavamotion betcasa, o dia que ela ficavamotion betcasa, eu abria a porta e sentia o cheiromotion betfezes. Eu brigava com ela. Sentava no banheiro, fechava tudo, chorava, chorava. Senão eu ia realmente perder a paciência com ela."
Do consultório, a geriatra Celene Pinheiro acompanhou a lutamotion betLígia para cuidar da mãe.
"A Lígia é minha paciente. Ela veio me contando como foi o diagnóstico da mãe,motion betdoençamotion betAlzheimer."
"Ela estava se desdobrando, se desgastando, sofrendo, até que ela fala: 'meu Deus, só tem uma saída: pedir ajuda especializada'", recorda a médica.
Mas Lígia ainda precisoumotion betum último empurrão. Um dia, ela recebe um telefonema da clínica onde a mãe estava passando o dia. Áurea tinha caído e sofrido várias fraturas.
"Depois desse acidente, para mim ficou claro que ela tinhamotion betir para uma clínicamotion betlonga permanência", diz Lígia.
"Minha prima ainda brincou: 'coitada da tia Aurinha. Deus teve que quebrar amotion betmãe toda para você entender que era horamotion betlevar ela para uma clínica. Para ter um tratamento adequado e você também,motion betficar cuidandomotion betvocê e damotion betfilha.'"
Quando você leva um idoso com demência para uma ILPI, está atendendo a uma necessidade dele, diz Celene Pinheiro.
"Eu falo para os filhos dos meus pacientes, você sabe ler e escrever? Quando seu filho entrou na idademotion betser alfabetizado, você levou para a escola, para que ele fosse alfabetizado por especialistasmotion betfazer isso. Não está abandonando seu filho."
Quando se tratamotion betum idoso com demência, você temmotion betpensar assim, prossegue a médica. "Você sabe cuidar, mas às vezes a pessoa precisamotion betalgo a mais."
Livre da responsabilidademotion betcuidar, Lígia passa a se relacionar com a mãemotion betmaneira diferente.
"Ela me disse que pela primeira vez, depoismotion betmuito tempo, se sentia filha da mãe dela", diz a geriatra.
E é como filha que Lígia viverá um encontro inesquecível com a mãe.
"Um dia, chegueimotion betuma visita e estava tão triste, tão abalada, com tanto problema da minha filha, do meu marido, faltamotion betdinheiro…", conta.
"Minha mãe estava no terraço sozinha, sentei e comecei a conversar com ela. Até hoje eu converso com ela, como se ela entendesse. Acaba saindo sem querer e acho que alguma coisinha sobra, lá dentro da cabecinha dela. E eu deitei no colo dela. E chorei tanto, tanto. Falei, 'poxa mãe, estou com tanto problema'."
Lígia continua.
"Ela passou a mão na minha cabeça e falou: 'ah, coitadinha, ela tá triste.' E falou: 'eu te amo'. Foi a primeira vez, na minha vida, que eu ouvi a minha mãe falar 'eu te amo'. Eu chorei muito, emotion betseguida ela começou a cantar 'boi, boi, boi, boi da cara preta…'. Que é uma música que ela canta até hoje."
"Foi um consolo", conta. "O momentomotion betamor que eu nunca tinha recebido da minha mãe a minha vida inteira. Recebi aquele dia."
Em seguida, sorrindo entre as lágrimas, Lígia pede: "Você tem um lencinho aí pra mim?"
Como se comunicar com quem tem demência? O poder da linguagem não verbal
Ao ler o relato desse precioso encontro entre mãe e filha, alguns talvez se perguntem: mas então, onde é que estava esse sentimento que Áurea expressa? Onde fica guardado o amor?
Talvez não haja uma resposta, claro. Mas o episódio sugere que pessoas com demência são, sim, capazesmotion betsentir e expressar amor.
Para Celene, essa história ilustra a importância da comunicação não verbal com pessoas que têm demência.
"Se a Lígia falasse para a mãe, 'mãe, eu estou triste', talvez a mãe não compreendesse porque, muitas vezes, ela não entende o significado da palavramotion betsi. Mas à medida que ela deita no colo da mãe, se coloca nessa posiçãomotion betfragilidade e chora, e externa esse sentimento dela, a mãe percebe pela posição, e pelo choro, a situação que a filha está passando. E aí ela compreende, e fala: 'tadinha, ela está triste'."
Na verdade, pondera a médica, não se tratamotion betentender com a razão.
"Ela entendeu da forma como ela podia, ou (melhor), acho que ela não entendeu, ela sentiu. Tem coisas que não passam pelo campo da compreensão, passam pelo campo do sentimento."
Por outro lado, observa a médica, uma expressão facial hostil, ou alarmada, pode assustar a pessoa que tem demência.
"Isso é muito nítido. Às vezes, você pode falar uma coisa que não seja agressiva, mas por uma feição agressiva, a pessoa se assusta."
Um dilema e um privilégio
Antesmotion betconcluirmos a históriamotion betLígia e Áurea, é importante ressaltarmos que, para a grande maioria dos brasileiros, o dilema vivido por Lígia — cuidarmotion betcasa ou na instituição? — é quase um privilégio. E por que privilégio?
Segundo Celene Pinheiro, que alémmotion betgeriatra é também presidente voluntária da regional paulista da Associação Brasileiramotion betAlzheimer e Outras Demências (ABRAz), estima-se que entre 1,5 e 2 milhõesmotion betpessoas vivam hoje com alguma formamotion betdemência no Brasil.
Faltam estudos sobre o tema, a médica explica, e os números são imprecisos. Ainda assim, aqui vão dados preliminares fornecidos pela Frente Nacionalmotion betFortalecimento às ILPIs:
- Haveria 7 mil ILPIs no Brasil, abrigando por voltamotion bet300 mil idosos.
- Dessas ILPIs, 5% apenas seriam públicas. Outras 35% seriam filantrópicas (muitas das quais pagas) e 60% particulares.
- Entre as pagas, as mensalidades oscilariam entre 70%motion betum salário mínimo e R$ 20 mil reais.
Ou seja, há uma carência gritantemotion betILPIs no país. E entre as instituições que existem, a maioria está fora do alcance do brasileiro comum.
Para esses brasileiros, a mensagem da geriatra é: peça ajuda.
"Procure a assistente social no postomotion betsaúde mais próximo", ela sugere. "Busque saber que recursos estão disponíveis. Medicamentos? Fraldas?"
Ela prossegue.
"É importante que a família se sensibilize e se mobilize para cuidar desse idoso. Muitas vezes, fica uma só pessoa cuidando, isso é muito cruel com quem cuida", comenta.
Por fim, diz Celene, as instituiçõesmotion betapoio (entre elas a ABRAz) oferecem uma gamamotion betserviços. Aconselhamento jurídico, por exemplo.
"Às vezes, a orientação jurídica permite que a pessoa viabilize recursos para cuidar desse idoso."
As associações também oferecem suporte emocional e oportunidades para que cuidadores e outras pessoas afetadas pela demência se encontrem, se apoiem mutuamente, troquem experiências e recebam informações práticas sobre como cuidar, explica.
A médica deixa claro que tudo isso está longemotion betser suficiente. Mas diz que profissionaismotion betsaúde como ela e entidadesmotion betapoio vêm pressionando autoridades e políticos para que promovam mais pesquisas sobre as demências e aumentem a ofertamotion betserviços emotion betinstituições públicas para pacientes.
Não por acaso, acabamotion betser aprovado no Senado um projetomotion betlei que institui uma política nacionalmotion betenfrentamento à doençamotion betAlzheimer e outras demências.
"Vamos avançar para aumentar o acesso ao cuidadomotion betqualidade e às instituições", diz.
Mas nem todo paciente com demência precisa ser cuidadomotion betuma instituição. A história que encerra essa reportagem é uma experiênciamotion betcuidar bem —motion betcasa.
Ivani e Luzia - O que é um bom evoluir da demência?
Ivani Alexandre, professora aposentada, tem 59 anos. Sua mãe, Luzia da Silva, com 81 anos, vive com Alzheimer e outras demências há pelo menos 8 anos.
"Minha mãe costurava, quando foi para a minha casa ainda costurou. Costurou uma colchamotion betretalhos maravilhosa, mas nos últimos retalhos foi muito difícil, e eu falo que essa colchamotion betretalhos foi a história da minha aceitação."
"Eu insistindo e e eu percebendo que cada dia ela tinha uma dificuldade. Ela não gravava o que tinha feito no dia anterior e a gente começava do zero. Sempre começando do zero. Mas foi super bacana essa colcha, e aí eu entendi."
Celene Pinheiro diz que começou a atender Luziamotion bet2012.
"A Ivani percebeu que era entrando nesse mundomotion betnovas necessidades da dona Luzia, e atendendo a essas necessidades, que ela ia conseguir tanto estimular a dona Luzia como também trazer muito mais conforto e serenidade", diz.
As demências são doenças degenerativas e progressivas, diz a médica. Elas vão piorar — mas podem evoluirmotion betformas diferentes.
O bom evoluir da demência se apoiamotion betdois grandes pilares, explica. Um é a saúde geral do paciente — que dependemotion betfatores como boa alimentação, exercícios físicos e o controlemotion betdoenças crônicas como diabetes, por exemplo.
O outro grande pilar tem a ver com as interações sociais, a qualidade do ambiente, o entorno da pessoa.
"Tem casosmotion betpessoas que têm diagnósticomotion betdemência há bem maismotion betdez anos e estão estáveis porque têm engajamento social, uma vivência interessante com a família, uma vida bem organizada no sentido da rotina", diz. "Você vê que essas pessoas evoluem melhor."
Aqui, a médica tocamotion betum ponto central ao novo jeitomotion betpensar a demência que surge no Brasil e no mundo: chegamotion betsegregação. A pessoa com demência precisa ser incluída na sociedade, ela defende.
Como incluir a pessoa com demência e quem ganha com isso?
Como educadora, Ivani já tinha familiaridade com o conceitomotion betinclusão. Ela conta que, quando era professoramotion beteducação física, adorava ver crianças com deficiência e sem deficiência fazendo aula juntas. Ela diz à BBC News Brasil que, hoje, pratica inclusãomotion betcasa, com a mãe.
A família moramotion betuma chácara. Luzia é incentivada a contribuir com pequenas tarefas, como debulhar feijão, por exemplo.
"A coordenação fina dela ainda é muito boa", explica.
Mas a história vai ficar ainda mais interessante. Por causa da pandemia, a netamotion betIvani, Dyanna, com 4 anosmotion betidade, vem passar uma temporada na chácara.
Agora, são quatro geraçõesmotion betconvivência: Luzia, Ivani e seu marido, o filho do casal e a neta. "A gente foi construindo um relacionamento", conta.
Bisneta e bisavó passam a fazer refeições juntas. Luzia torna-se "a ajudante"motion betDyanna e participa das atividades escolares. "Minha mãe sempre prestativa", comenta Ivani. "Afinal, ela quer ser útil."
"Por exemplo, meu filho e minha neta fizeram um bilboquê e a minha mãe brincou junto", lembra. "Ela mostrou uma habilidade, todo mundo ficou admirado, aplaudiu, e ela ficou toda feliz, sorridente."
Ivani não se esquivamotion betfalar do aspecto mais dolorido dessa convivência com a demência.
"Sinto falta do sorriso, que é a presença dela mesmo. Não gosto muito quando ela está com aquele ar ausente, isso me machuca. E a minha neta trouxe essa vivacidade para a minha mãe."
Luzia, pormotion betvez, também oferece a Dyanna oportunidadesmotion betse incluir e fazermotion betcontribuição.
"Havia alguns momentosmotion betque minha mãe falava para a Dyanna: 'ah, vou embora'."
"Ela levantava, ia saindo, e não dava tempomotion beta Dyanna vir contar para mim, para eu tomar uma atitude."
Esse, aliás, é um quadro comum entre pacientes com demência. Durante certos períodos do dia, ficam inquietos e começam a vagar, forçar as portas e querer ir embora. Médicos chamam esse comportamentomotion betSíndrome do Pôr do Sol. Dyanna logo aprende a lidar com ele.
"Ela corria atrás da minha mãe, pegava pela mão e explicava: 'não, bisa, você mora aqui.' Aí ela levava a minha mãe no quarto: 'olha, aqui é seu quarto, aqui é seu banheiro.' Ela estava repetindo os gestos que tinha me visto fazer", conta. "Ela se prontificou a ser cuidadora também."
O depoimentomotion betIvani é repletomotion betmomentos encantadores,motion betque bisavó e bisneta parecem habitar um mundo só delas. Dyanna e Luzia pescando. Dyanna sentada na poltrona ao lado da cama da bisavó, trocando histórias.
"A conversa ia longe! E eu ouvindo atrás da porta, para saber se estavam fazendo arte."
E o episódiomotion betque Dyanna tenta convencer a a avó a sentarmotion betum pequenino balanço, feito sob medida para a criança.
"Se eu não tivesse surtado, eu deveria ter filmado: 'Não, bisa, senta aqui, põe uma perna, depois põe a outra… não, não tem problema, não vai acontecer nada'."
Ivani ri, deliciada, ao recordar o episódio.
"E minha mãe simplesmente indo… não têm amarras, nenhuma das duas."
Poder trocar histórias, conviver e participar da vida da família eleva muito a autoestima da pessoa que tem demência, diz Celene. Mas para a geriatra, a históriamotion betIvani, Luzia e Dyanna mostra que não só o idoso se beneficia.
"A criança também, começa a perceber o outro, a não olhar só para si."
"E ganha a cuidadora Ivani, que aprendeu tanto e tem tido momentos tão ricosmotion betconvívio."
Dizendo adeus aos poucos
Ao longomotion betvárias entrevistas à BBC News Brasil, Celene Pinheiro não esconde seu desejomotion betmudar a imagem que se faz das demências. Mas ela reconhece: "Ninguém quer termotion betenfrentar um casomotion betdemência na família."
Por outro lado, "quantos perdem familiaresmotion betforma repentina e sofrem tanto", observa. A demência pode ser a oportunidademotion betuma despedida gradativa.
"Quando você percebe que essa é uma condição que vai levar tempo para acontecer, e que você pode fazer dele um tempo bom, e se permitir ter esses momentos bonitos, é muito engrandecedor."
Mas as palavras finaismotion betCelene Pinheiro vão para quem não conseguiu se enxergar nos relatosmotion betLígia, Ivani e Denise.
Ela conta que,motion bet18 anosmotion betgeriatria, já viu muitas famílias saírem do consultório ou da salamotion betpalestras se sentindo culpadas.
"Não estamos pregando modelos virtuosos, que devam ser erguidos", explica. "Conhecemos muito mais histórias tristes do que bem sucedidas. Mas, quem sabe ouvir histórias positivas nos ajuda a vislumbrar outras possibilidades?"
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