7criar aposta betanoSetembro: a elite que 'tupinizou' o próprio nome pela Independência:criar aposta betano

Litogravuracriar aposta betano1861 do Viscondecriar aposta betanoJequitinhonha

Crédito, DOMÍNIO PÚBLICO/ACERVO DIGITAL/BIBLIOTECA BRASILIA

Legenda da foto, Viscondecriar aposta betanoJequitinhonha foi precursor da OAB e um dos exemplos mais famososcriar aposta betano'tupinização' do nome pela Independência

Outra forma com que membros do alto escalão da sociedade da época empregaram o índio para avançar o interesse pela Independência foi através da onomástica, ao alterar os próprios nomes. É um processo que ficou conhecido como "tupinização" ou,criar aposta betanoforma mais abrangente, "indianização" dos sobrenomes, já que não apenas termos do tupi eram usados.

A lógica por trás do fenômeno é simples.

Como havia disputa entre os que queriam a volta à subordinação a Portugal e os independentistas, somente se dizer na vanguarda da Independência do que era então parte do Reino Unidocriar aposta betanoPortugal, Brasil e Algarves parecia insuficiente. Precisava-se, além do mais, compor o próprio nome com algo ligado à terra brasileira.

Pinturacriar aposta betanoindígenacriar aposta betanopraia

Crédito, Domínio público/Wikimedia Commons

Legenda da foto, Quadro Iracema (1881),criar aposta betanoJosé Mariacriar aposta betanoMedeiros, retratando a heroína do romancecriar aposta betanoJosécriar aposta betanoAlencar

"A valorização do elemento indígena durante a Independência foi sobretudo simbólica", explica João Paulo Pimenta, professor do Departamentocriar aposta betanoHistória da Universidadecriar aposta betanoSão Paulo (USP). "Simbólica porque o processocriar aposta betanoIndependência foi,criar aposta betanoparte, o processocriar aposta betanocriaçãocriar aposta betanoantagonismos, entre Brasil e Portugal, que não existiam antes e geraram identidades diferentes, separando os portugueses do Brasil e os portuguesescriar aposta betanoPortugal."

Uma parte fundamental da criação desses antagonismos consistiucriar aposta betanouma "referência intermediária" pela identificação dos grupos favoráveis à Independência como parte da América, diz Pimenta. "A valorização permitiu criar a imagemcriar aposta betanoque havia pautas e histórias diferentes entre Brasil e Portugal, entre América e Europa. Por isso, há também uma posturacriar aposta betanocolocar nos nomes referências ao continente americanocriar aposta betanogeral."

O 'manifesto nativista' do Viscondecriar aposta betanoJequitinhonha

"Estamos falando, a partir desse período,criar aposta betanocomo uma determinada elite se apropria do que é ser índio e dos valores indígenas", aponta Vania Moreira, professora titular e do programacriar aposta betanoPós-Graduaçãocriar aposta betanoHistória pela Universidade Federal Rural do Riocriar aposta betanoJaneiro (UFRRJ). "Foi um primeiro momentocriar aposta betanoutilização do imaginário acerca do indígena, que se desdobra na literatura com o Romantismo e o desejo da criaçãocriar aposta betanouma cultura eminente brasileira."

O professor emérito pela Universidadecriar aposta betanoSorbonne e da Fundação Getulio Vargas, Luiz Felipecriar aposta betanoAlencastro, aborda o movimentocriar aposta betanotrocacriar aposta betanonomes ocorrido durante a Independência no texto "Vida privada e ordem privada no império", que consta da coletânea História da vida privada no Brasil (1997). Já que não havia regulação jurídica da matéria até a publicação do Código Civilcriar aposta betano1916, as alteraçõescriar aposta betanonome podiam ser promovidas com relativa facilidade. Além disso, o númerocriar aposta betanoprenomes tradicionais portugueses parecia reduzido, aponta Alencastro.

Dentre tantos, o caso "mais célebre, se não o mais radical", escreve o estudioso, é provavelmente o do viscondecriar aposta betanoJequitinhonha — denominação geográfica tambémcriar aposta betanoraiz indígena, que tem o significadocriar aposta betano"rio largo".

O baiano, nascidocriar aposta betano1794, chamava-se Francisco Gomes Brandão e era filhocriar aposta betanoum traficantecriar aposta betanoescravos. Formou-secriar aposta betanoPortugal, na Universidadecriar aposta betanoCoimbra, obtendo os diplomascriar aposta betanofilosofia e direito, sendo inclusive um dos precursores da OAB, ao presidir instituto que à época se prestava a representar a classe dos advogados.

Ao retornar a Salvador, entrou a militar pela Independência. No anocriar aposta betano1824, esforçando-se para mostrar a determinação pela causa, trocou seus nomes portugueses por "um verdadeiro manifesto nativista", afirma o historiador, passando a se chamar Francisco Gê Acaiabacriar aposta betanoMontezuma.

"Gê", ou "jê", é um termo que faz menção aos tapuias, expressão genérica para designar grupos indígenas que não falavam tupi-guarani, enquanto Acaiaba é um vocábulo tupi, referente à cajazeira. Já Montezuma é uma referência ao imperador do povo pré-colombiano mexica (ou asteca) à época da invasão das tropas espanholas, no início do século 16. "Colocar um termo asteca nome também era uma formacriar aposta betanose dizer americano e alinhado a um certo povo considerado civilizado", afirma Pimenta, da USP.

Dom Pedro 1º também está no balaio. Ao passar a frequentar a loja maçônica do Grande Oriente, fundadacriar aposta betanojunhocriar aposta betano1822 no Riocriar aposta betanoJaneiro, o primeiro imperador do Brasil recebeu, como era costumeiro, um nomecriar aposta betanobatismo: tornou Pedro Guatimozín, referência a outro imperador mexica.

Um exemplocriar aposta betanoindianização com elementos indígenas puramente locais ocorreu com um ramo da famíliacriar aposta betanosenhorescriar aposta betanoengenhos Fonseca Galvão,criar aposta betanoPernambuco, "que mudou o nome legitimamente português", como escreve Gilberto Freyrecriar aposta betanoCasa Grande e Senzala (1933), para Carapeba, termo tupi que faz referência a um peixe da família dos guerrídeos. Clérigos e militares também acharam espaço na tendência.

Quadro mostra os nativos acompanhando passivamente o ato litúrgico representado como o inaugural na então colônia portuguesa

Crédito, Domínio público/Wikimedia Commons

Legenda da foto, O quadro Primeira Missa no Brasil (1861),criar aposta betanoVictor Meirelles, mostra os nativos acompanhando passivamente o ato litúrgico representado como o inaugural na então colônia portuguesa

O número 5 da Gazeta Pernambucana, publicadocriar aposta betanonovembrocriar aposta betano1822 e disponível no arquivo da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, chama atenção para um ataque sofrido por um padre e deputado pró-Independência da província — algo que na opinião do periódico seria injustificado por se tratarcriar aposta betanoalguém favorável à causa do Brasil. A Gazeta, então, listou diversos nomes "tupinizados",criar aposta betanoindivíduos que estariam, assim, automaticamente identificados com a separação política, merecendo proteção.

Entre eles, estavam o padre Martinho Caetano Pegado, do Bispadocriar aposta betanoPernambuco, que adicionou um "Jacarandá" a seu nome e acabava por expressar seu apoio a Dom Pedro 1º, recém-feito imperador. Outro destaque tinha o padre Bento Januáriocriar aposta betanoLima, tambémcriar aposta betanoPernambuco, que para se diferenciar justapunha um "Camará", termo referente a uma plantacriar aposta betanotupi. Manuel Alexandre Taveira, segundo tenentecriar aposta betanoartilharia ligeira da província, "preferindo morte à escravidão e ao despotismo", rogou aos "verdadeiros patriotas" do Império o seu reconhecimento pelo nome modificado pela palavra "Canetudo".

O lugar dos indígenas no pós-Independência

Outro tipocriar aposta betanomenção expressa dos pró-Independência aos indígenas ocorria na formacriar aposta betanocriaçãocriar aposta betanomeioscriar aposta betanoimprensa, diz Moreira. Este é o casocriar aposta betanoJosé Bonifáciocriar aposta betanoAndrada e Silva, considerado o "Patriarca da Independência" e encabeçador do primeiro ministério formado por brasileiros.

Após o seu pedidocriar aposta betanodemissão do gabinetecriar aposta betanoDom Pedro 1º, fundoucriar aposta betano1823 um jornalcriar aposta betanotendência antilusitana e nativista com nome "O Tamoyo". O título da publicação era uma referência ao grupo indígena que combateu os portugueses no período colonial.

"Era necessário fincar o pécriar aposta betanoalgo genuinamente brasileiro nessa época para construir a identidade do Estado que estava se erguendo. Mas não percamoscriar aposta betanovista que o que se tem a partir do Marquêscriar aposta betanoPombal e que também é o objetivocriar aposta betanoBonifácio é um projetocriar aposta betanoassimilação do indígena,criar aposta betanomiscigenação dele com outras raças, até que acriar aposta betanoidentidade desapareça", afirma Fernanda Sposito, historiadora e professora da Universidade Federal do Paraná.

Ela se refere ao Diretório dos Índios, iniciativa legislativacriar aposta betano1757criar aposta betanoPombal, primeiro-ministro português. Trata-secriar aposta betanouma lei assimilacionista que colocava os aldeamentos indígenas sob administraçãocriar aposta betanoum diretor e intencionava transformar os índioscriar aposta betanovassalos do reicriar aposta betanoPortugal.

Autora da dissertação "Nem cidadãos, nem brasileiros", defendida na USPcriar aposta betano2006, Sposito afirma que o processocriar aposta betanoformaçãocriar aposta betanoEstado brasileiro não incluiu os indígenascriar aposta betanonenhuma dessas duas categorias. Ela também lembra que o indígena não é sequer mencionado na Constituiçãocriar aposta betano1824 outorgada por Dom Pedro 1º.

"Na Assembleia Constituintecriar aposta betano1823, houve a discussão sobre quem era o brasileiro e, também, quem era o cidadão brasileiro. Vai se dizer que o indígena não é nenhum dos dois, porque vivecriar aposta betanoguerra com a sociedade e é um selvagem", aponta.

"O brasileiro era quem aderia à Constituição, então não importava se você não nascia aqui. O português podia ser considerado brasileiro, desde que residisse aqui à época e declarasse apoio à Carta", explica ela, citando o caso do próprio Dom Pedro 1º, portuguêscriar aposta betanoorigem.

Pintura mostra corpocriar aposta betanoíndio na praia, com padre ao lado

Crédito, Domínio público/Wikimedia Commons

Legenda da foto, Quadro o último Tamoio (1883),criar aposta betanoRodolfo Amoedo, retrata indígenacriar aposta betanoetnia que combateu portugueses e deu nome a jornalcriar aposta betanoJosé Bonifácio

O próprio Montezuma, que, como vimos acima, indianizou o próprio nome, sendo deputado da Constituinte, defendia a posiçãocriar aposta betanoque os índios estavam "fora do do grêmio da nossa Sociedade".

"Não são súditos do Império, não o reconhecem, nem por consequência suas autoridades, da primeira até a última, vivemcriar aposta betanoguerra aberta conosco; não podemcriar aposta betanoforma alguma ter direitos, porque não têm nem reconhecem deveres os mais simples", afirmou o deputado, segundo o Diário da Assembléia Geral, Constituinte e Legislativa do Império do Brasil, disponível pelo Senado Federal.

Sujeitos da história

A professora da Universidade Federal Ruralcriar aposta betanoPernambuco (UFRPE), Mariana Dantas, chama a atenção para o fatocriar aposta betanoque a apropriaçãocriar aposta betanonomes indígenas e seus retratos na pintura e na literatura pela elite serviram para moldar a ideiacriar aposta betanoque a população indígena "está no passado, e não no presentecriar aposta betanoconstrução do país".

"A referência aos tamoios como um grupo heroico, no caso do periódicocriar aposta betanoBonifácio, se localiza no tempo longínquo. É o mesmo casocriar aposta betanoIracema: ela morre, desaparece e só serve para deixar um legado", diz Dantas. "A ideia, não muito óbvia, mas que se insinua nas entrelinhas, é que o indígena está sumindo e, aos poucos, vai sendo esquecido da história".

"É uma ideia que,criar aposta betanoalguma forma, perdura até hoje: acriar aposta betanoque o índio bom, para a nossa sociedade, é o índio morto", sentencia Pimenta, da USP.

Dantas ressalta que é preciso levarcriar aposta betanoconsideração o indígena como um sujeito político, que, diferentementecriar aposta betanoum espectador, é agente da história. "Não é como no quadro do Victor Meirelles", diz ela,criar aposta betanoreferência à pintura A primeira missa no Brasil,criar aposta betano1861.

A própria experiência dos indígenas contemporâneos da Independência mostra o graucriar aposta betanosua participação política. Pesquisadora do papel dos índios nas revoltas liberaiscriar aposta betanoAlagoas e Pernambuco emcriar aposta betanotesecriar aposta betanodoutorado, que lhe valeu o Prêmio Arquivo Nacionalcriar aposta betanoPesquisacriar aposta betano2015, a historiadora avalia que os nativos se organizavam a favor ou contra os processos políticos estudados com base nos próprios interesses, como a defesa e o acesso à terra.

"Há uma multiplicidadecriar aposta betanoformascriar aposta betanoluta indígena, mas o nexo comum entre várias participações políticas do índio no século 19criar aposta betanoPernambuco, Ceará, Espírito Santo ou Rio Grande do Sul, é a inserção deles nas redescriar aposta betanorelação local procurando principalmente defender o acesso coletivo à terra coletiva", diz ela, citando ainda que a luta pela negociação do uso da mãocriar aposta betanoobra compulsória do indígena era outro guia para a posição deles.

Quadro mostra chegadacriar aposta betanoportugueses a praia

Crédito, Acervo Museu Paulista (USP)/Wikimedia Commons

Legenda da foto, O quadro a Fundaçãocriar aposta betanoSão Vicente (1900),criar aposta betanoBenedito Calixto, registracriar aposta betanoforma romântica a vinda dos portugueses para São Vicente

Deste modo, índios se associavam a um político local porque este contribuíra,criar aposta betanoalguma maneira, para prevenir a invasãocriar aposta betanoseu território — o aldeamento próximo ao povoamento colonialcriar aposta betanoque viviam, elucida Dantas.

Havia gruposcriar aposta betanoíndios, inclusive, que chegaram a defender a restauraçãocriar aposta betanoDom João 6º, durante a Guerra dos Cabanos, já que associavam o regime monárquico à concessãocriar aposta betanoterras que tinham a seu dispor, explica.

"Tematizar a história indígena não é só citar que os índios estão ali, mas colocá-loscriar aposta betanoposiçãocriar aposta betanoprotagonismo. Nós nos esquecemos dacriar aposta betanopresença porque nos acostumamos com o índio mítico do passado fundador", diz Moreira, docente da UFRRJ.

"O fatocriar aposta betanoeles terem acampado na Praça dos Três Poderes é um indicador do engajamento político que têm", afirma,criar aposta betanoreferência às manifestaçõescriar aposta betanogrupos indígenascriar aposta betanoBrasília na última semana,criar aposta betanomeio ao julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre o marco temporal da demarcaçãocriar aposta betanoterras.

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