Fêmeas preferem gorilas que se dedicam aos filhotes, aponta estudo:

Imagem mostra dois gorilas adultos e um filhote na floresta

Crédito, Tierra Smiley Evans/UC Davis

Legenda da foto, Machosespécie encontradaRuanda dedicam bastante tempo cuidando dos filhotes da comunidade, sendo elessua prole ou não

E a resposta está no sexo - e na reprodução.

Imagem mostra gorila adulto carregando dois filhotes nas costas

Crédito, Terence Fuh Neba, WWF Central African Republic

Legenda da foto, Os gorilas machos que gastaram maiores porcentagensseu tempo com filhotes - ainda que não os seus - tiveram maior prole

O método

Conforme explicou à BBC News Brasil a antropóloga e psicóloga Stacy Rosenbaum, pesquisadora do DepartamentoAntropologia da universidade e principal autora da pesquisa, os cientistas utilizaram 100 horasobservação do comportamentoum grupogorilas-da-montanha.

"Então, calculamos a porcentagem do tempo que cada macho passou cuidando, tratando, ensinando filhotes e descansando com eles", explica a pesquisadora.

Em seguida, esses dados foram analisadoscomparação com o número totaldescendentes que cada macho havia produzido emvida.

"(E a conclusão foi que) os gorilas machos que gastaram maiores porcentagensseu tempo envolvidostais comportamentos geraram maior prole do que os outros, que se dedicaram menos", diz Rosenbaum, enfatizando que, para o estudo, ajustescontrole foram feitos para que o graudominância do membro do grupo, a idade e a longevidade não interferissem no resultado final da amostra.

Os dados mostram um cenário um pouco diferente do que o imaginário padrão sugere quando se pensaum grupogorilas. Sai a ideiaque a reprodução, no grupo, é dominada por um macho-alfa. E entra o poderescolha feminino.

Conforme ressalta o antropólogo Christopher Kuzawa, coautor do trabalho e professor do InstitutoPesquisa Política da mesma universidade, uma interpretação provável é que "as fêmeas optam por se acasalar com machos com base nessas interações", ou seja, os machos que "passam muito tempo com gruposfilhotes, que cuidam e descansam com eles, são os que têm mais oportunidades reprodutivas".

Rosenbaum lembra que há muito tempo se sabe que os gorilas-das-montanhas competem entre si, dentro do grupo, para ter "acesso às fêmeas" e conseguirem boas "oportunidadesacasalamento".

"Mas esses novos dados sugerem uma estratégia mais diversificada", comenta. "Os machos que cuidam dos filhotes são muito mais bem-sucedidos."

Gorila segurando galho

Crédito, Alice C. Gray

Legenda da foto, O estudo dá algumas pistascomo foi que os comportamentos paternos podem ter evoluído

De onde viemos

O estudo dá algumas pistascomo os comportamentos paternos podem ter evoluído, inclusive no caso dos seres humanos.

A antropóloga lembra que, tradicionalmente, os cientistas relacionam o cuidado parental masculino,forma geral, a uma estrutura social específica - a monogamia -, "que ajudaria a garantir que os machos cuidassemseus próprios filhos".

"Mas esta pesquisa (em que o comportamento foi observado entre animais não monogâmicos) sugere que há um caminho alternativo pelo qual a evolução pode ter gerado este comportamento,situaçõesgrupoque os machos podem não saber quais filhotes são seus", comenta.

A ilação, portanto, é: será que não foi assim também entre os ancestrais humanos?

O próximo passo dos pesquisadores é analisar se há hormônios específicos que auxiliam este comportamento - e provoca essa relaçãocausa e consequência.

Estudos anteriores do qual o antropólogo Kuzawa fez parte mostraram que,humanos, a testosterona diminui à medida que os homens se tornam pais. "E acredita-se que isto ajude a concentrar a atenção nas necessidades do recém-nascido", pontua.

No caso dos gorilas, os pesquisadores não sabem se algo semelhante ocorre.

Há dúvidas para ambos os cenários. Se os gorilas que estão envolvidos particularmenteinteração infantil experimentam declíniostestosterona e isso impediriacapacidadecompetir com outros machos, o nível baixo do hormônio poderia funcionar como algum atrativo para as fêmeas?

Ou, como eles são bem-sucedidos na atividade sexual, no caso dos gorilas, altos níveistestosterona e o comportamentopaternidade ativa não são excludentes?

Estas novas questões ainda precisam ser estudadas. Rosenbaum adianta que a ideia agora é justamente esta: caracterizar os perfis hormonais dos machos ao longo do tempo.

Imagem mostra gorila fêmea com filhote sobre as costas e outro caminhando ao seu lado

Crédito, Terence Fuh Neba, WWF Central African Republic

Legenda da foto, Os cientistas acreditam que as fêmeas optam por se acasalar com machos com base nessas interações

Poder feminino

Se ainda não se sabe ao certo qual é o mecanismo biológico que norteia o comportamento dos gorilas machos, o que os cientistas já cravam com segurança é que, nas comunidades desses animais, o papel feminino é fundamental na horaescolher quais genes serão passados adiante.

"Não sabemos ainda qual é o mecanismo que impulsiona tal correlação encontrada, mas a explicação mais plausível é que as fêmeas preferem machos que cuidam da prole", define Rosenbaum.

"Isso sugere que a escolha feminina pode ser um fator muito mais importante do que supúnhamos anteriormente na condução da trajetória evolutiva dos gorilas."

Ela enfatiza que, com base na pesquisa, pode-se dizer que as gorilas fêmeas "não são apenas observadoras passivas que acasalam com qualquer macho que vença as lutas".

"Elas têm preferências e as expressam. E suas escolhas têm importantes consequências evolutivas", diz.

E, enquanto estuda o mundo dos gorilas, a psicóloga não deixapensar nos seres humanos.

"Um dos mistérios da evolução humana é como foi que formas muito intensascuidados masculinos começaram, ainda entre nossos ancestrais já extintos. Nossa pesquisa sugere um caminho que a seleção natural pode ter tomado para obter formas rudimentares desse comportamento zeloso", aponta.