O surpreendente resultado da autópsiamtt cbetcérebromtt cbetatleta que matou amigo e se suicidou na prisão:mtt cbet

Cérebromtt cbetAaron Hernandez
Legenda da foto, Apesarmtt cbetaparência externa saudável, cérebromtt cbetHernandez estava profundamente danificado por Encefalopatia Traumática Crônica | Foto: Boston University

"A ETC é uma doença degenerativa que tem como gatilho inicial o trauma repetitivomtt cbetqualquer parte da cabeça", disse à BBC Brasil Paulo Caramelli, neurologista e professor da Universidade Federalmtt cbetMinas Gerais (UFMG), que estuda a doença.

A doença já foi conhecida como "demência pugilística", por afetar principalmente boxeadores, que costumam ser atingidos por golpes na cabeça.

No entanto, no início dos anos 2000, o neuropatologista americano-nigeriano Bennet Omalu causou controvérsia ao publicar seus estudos sobre um ex-jogadormtt cbetfutebol americano que havia morrido da doença. O caso foi retratado no filme Um Homem entre Gigantes,mtt cbet2015.

A ETC causa transtornosmtt cbetcomportamento como agressividade, depressão e faltamtt cbetcontrole emocional, alémmtt cbetdistúrbios cognitivos, como perdamtt cbetmemória e demência.

Ela tem, no entanto, diferentes níveismtt cbetgravidade, que geralmente aumentam à medidamtt cbetque a pessoa envelhece. Ou seja, quanto mais velho um atleta, por exemplo, mais grave costuma ser seu caso.

'Cavernas' no cérebro

O cérebromtt cbetHernandez foi levado ao Hospital da Universidademtt cbetBostonmtt cbetuma espéciemtt cbetoperação secreta, para evitar que o caso atraísse a atençãomtt cbetfãs e curiosos.

De acordo com o jornal The New York Times, o órgão foi levado para um laboratório foramtt cbetBoston e ganhou um pseudônimo.

Só três pessoas da equipe da neuropatologista Ann McKee - que há anos estuda a doençamtt cbetjogadoresmtt cbetfutebol americanos - conheciam a identidade do dono do órgão.

Examemtt cbetcérebromtt cbetAaron Hernandez
Legenda da foto, Segundo pesquisadores, o casomtt cbetex-jogador condenado por assassinato é o mais grave já registradomtt cbetalguémmtt cbetapenas 27 anos | Foto: Boston University

Ao fatiar o cérebromtt cbetpedaçosmtt cbetcercamtt cbet1,3 centímetros, os pesquisadores perceberam as "cavernas"mtt cbettamanho incomummtt cbetmeio ao órgão - que se expandiram na medidamtt cbetque o tecido cerebral diminuía.

De acordo com Paulo Caramelli, o visual é incomum porquemtt cbetuma pessoamtt cbet27 anos, as dobras do cérebro preenchem praticamente todo o espaço do crânio.

A equipemtt cbetMcKee também observou que o septo pelúcido, uma membrana que divide os dois lados do cérebro, estava perfurada - algo que costuma acontecer com pacientesmtt cbetETC por causa do trauma repetido na cabeça.

O principal sinal da doença, no entanto, só foi encontrado quando os pesquisadores colocaram o cérebromtt cbetHernandez no microscópio - o acúmulo da proteína tau, que mata as células nervosas.

A proteína ocorre normalmente no cérebro e é uma espéciemtt cbet"cimento" que dá estabilidade ao sistemamtt cbettransportemtt cbetsubstâncias dentro da célula nervosa, segundo Caramelli.

"Em algumas doenças degenerativas, como o Alzheimer e a ETC, ela modificamtt cbetestrutura e perde a função. Aí o neurônio não consegue funcionar e morre", explica.

O processo faz com que as conexões entre as áreas cerebrais que processam determinadas funções, como as emoções e a memória, deixemmtt cbetfuncionar normalmente.

Aaron Hernandez
Legenda da foto, Jogador despontou na NFL, mas foi condenado pelo assassinatomtt cbetum amigo aos 23 anos. Foto: Reuters

No casomtt cbetHernandez, a proteína tau apareciamtt cbettodo o córtex frontal, a parte do cérebro que controla a tomadamtt cbetdecisões, os impulsos e a inibição. E se espalhava pela amídala, que regula emoções como medo e ansiedade, e por outras partes do cérebro como o hipocampo, estrutura considerada a principal sede da memória e parte do sistema límbico (responsável por comportamentos sociais).

Mecanismo desconhecido

O cérebro foi considerado no estágio 3 da doença,mtt cbetuma escalamtt cbetum a quatro. Em um estudo anterior da própria equipemtt cbetMcKee, órgãos no estágio 3 geralmente pertenciam a ex-jogadores com,mtt cbetmédia, 56 anos.

Em uma coletivamtt cbetimprensa, McKee afirmou que o casomtt cbetHernandez era grave "de uma maneira como nunca vimos nos 468 cérebros que já examinamos, excetomtt cbetindivíduos muito mais velhos".

Em julhomtt cbet2017, o New York Times publicou os resultadosmtt cbetum novo estudo da pesquisadora feitomtt cbet202 cérebros - 111 deles erammtt cbetex-jogadores da NFL e destes, 110 tinham sinaismtt cbetETC.

A ligamtt cbetfutebol americano tem sido questionada sobre o assunto, mas não admitiu que o esporte seja responsável pelos danos à saúde dos atletas.

Os órgãos pertenciam a homensmtt cbet23 a 89 anos, que ocuparam todas as posiçõesmtt cbetum timemtt cbetfutebol americano.

Os pesquisadores também examinaram órgãosmtt cbetex-jogadores da ligamtt cbetfutebol canadense,mtt cbetjogadores semi-profissionais, universitários e do ensino médio. Dos 202 cérebros estudados, 87% tinham sinaismtt cbetETC. Os jogadores do ensino médio tinham casos mais brandos, enquanto que os atletas universitários e profissionais apresentavam mais danos.

"Já não é discutível se existe um problema no futebol Americano. O problema existe", disse McKee, na época, ao jornal americano.

Até agora, no entanto, a maior parte dos cérebros estudados foram doados pelas famílias dos jogadores porque já se suspeitava que eles pudessem ter a doença. Isso poderia gerar um viés nos resultados.

Falta ainda,mtt cbetacordo com Caramelli, um estudo mais abrangente para determinar qual seria, realmente, a frequência da ETC nos atletas.

Ann McKee
Legenda da foto, Pesquisadora se dedica a estudar cérebrosmtt cbetatletasmtt cbetfutebol americano e hóquei no gelomtt cbetbuscamtt cbetsinaismtt cbetdoença causada por pancadas repetitivas | Foto: Boston University

Assim como Ann McKee nas poucas entrevistas que deu sobre o tema, o neurologista brasileiro menciona diversas vezes a palavra "fascínio" ao falar do cérebromtt cbetHernandez.

Para ele, o fascínio despertado nos cientistas se deve ao fatomtt cbetque o mecanismo pelo qual as pancadas repetitivas na cabeça levam a uma alteração química no cérebro ainda não é conhecido.

É possível ainda que traumas menos graves, que não causem perdamtt cbetconsciência, mas também ocorrem repetidamente, possam ter algum papel na doença. Por exemplo, os que sofrem os jogadoresmtt cbetfutebol tradicional.

Em 2014, um estudo da USP mostrou que o ex-capitão da seleção brasileiramtt cbet1958, Hilderaldo Luís Bellini, sofriamtt cbetETC. Na Inglaterra, a doença também foi encontrada no cérebromtt cbetalguns jogadores.

"Aqui na UFMG estamos fazendo um estudo com jogadoresmtt cbetfutebol brasileiros na ativa. Não esperamos encontrar ETC exatamente, mas queremos saber se há pelo menos alterações sutis no cérebro", diz Caramelli.

"No caso do futebol tradicional, o impacto é bem menor do que no americano e no boxe, sem dúvida. E ainda não sabemos qual é o papel do organismomtt cbetcada indivíduo, que pode ser mais suscetível à doença."

Outro desafio é o fatomtt cbetque, até agora, a ETC só pode ser diagnosticada após a morte. Não se tem ideia, portanto,mtt cbetcomo interpretar alteraçõesmtt cbetcomportamentomtt cbetjogadores e nem se, no casomtt cbetum diagnóstico, interromper a prática do esporte poderiamtt cbetfato ajudar.

"Surgiu agora um examemtt cbetque você pode ver o acúmulo da proteína taumtt cbetuma pessoa viva. Está sendo testado para pacientesmtt cbetAlzheimer, mas ainda não sabemos se serviria para ETC", afirma.

Violência?

Os estudos existentes, segundo Caramelli, mostraram que a maioria dos ex-jogadores mais jovens que sofriammtt cbetETC - com até 30 ou 40 anos - sofriam maismtt cbetdepressão, ansiedade e agressividade.

Já os mais velhos eram afetadosmtt cbetmaneira semelhante ao malmtt cbetAlzheimer, e tinham mais alterações cognitivas.

Cérebromtt cbetAaron Hernandez
Legenda da foto, Ao contrário do que seria normalmtt cbetuma pessoamtt cbet27 anos, cérebromtt cbetHernandez tinha cavidades largas e tecido atrofiado | Foto: Boston University

"Não há dúvidas nesse momentomtt cbetque os mais jovens,mtt cbetestágios iniciais da doença, têm mais alteraçõesmtt cbetcomportamento", afirma.

Para os pesquisadores, no entanto, isso ainda não indica com certeza que o avanço precoce da doença era a causa dos episódios violentos protagonizados por Hernandez emmtt cbetcarreira meteórica na NFL.

Ele começou no esporte quando adolescente na Flórida e chegou a ganhar um título nacional com um time localmtt cbet2008, mas Hernandez foi rebaixado no rankingmtt cbetjogadores por causa do envolvimentomtt cbetuma brigamtt cbetbar.

Ele foi contratado pelo New England Patriots, um dos times mais famosos do país,mtt cbet2013. Mas menosmtt cbetum ano depois, ummtt cbetseus amigos apareceu morto a tiros.

O ex-jogador foi condenado pelo assassinato e acusado por outras duas mortes ocorridasmtt cbet2012. Dias após ser inocentado no segundo caso, ele se enforcou com um lençol na prisão.

O caso se tornou emblemático da crescente preocupação dos americanos com a violência exibida por jogadoresmtt cbetfutebol americano fora dos campos.

Em 2012, o jogador Jovan Belcher, que também tinha ETC, matoumtt cbetnamorada a tiros e cometeu suicídiomtt cbetseguida.

Os advogadosmtt cbetHernandez anunciaram que processarão a NFL, pedindo compensação para a filhamtt cbet4 anosmtt cbetidademtt cbetAaron Hernandez pela perdamtt cbetseu pai.

Dias depois, o vice-presidentemtt cbetcomunicações da NFL, Joe Lockhart, afirmou que a liga vai "contestar vigorosamente as alegações" do processo e que "qualquer tentativamtt cbetpintar Aaron Hernandez como vítima é equivocada".

"A história pessoal dele era complexa, e não se presta a respostas simples. Precisamos lembrar que ele foi condenado por homicídio, e seu históricomtt cbetproblemasmtt cbetcomportamento começou bem antesmtt cbetjogar da NFL", afirmou à imprensa.

"Há muitos pontos aqui. A ciência ainda não descobriu como conectá-los."

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